Marianne Faithfull insiste que foi o seu namorado que matou Jim Morrison
Quase a lançar o seu novo álbum, a cantora diz que foi o seu namorado, Jean de Breteuil, o responsável pela morte do vocalista dos Doors, falando ainda da sua relação com Amy Winehouse e do seu consumo de drogas. (...)

Marianne Faithfull insiste que foi o seu namorado que matou Jim Morrison
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento -0.2
DATA: 2014-08-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Quase a lançar o seu novo álbum, a cantora diz que foi o seu namorado, Jean de Breteuil, o responsável pela morte do vocalista dos Doors, falando ainda da sua relação com Amy Winehouse e do seu consumo de drogas.
TEXTO: A história de como o então namorado de Marianne Faithfull estava envolvido na morte de Jim Morrison já tinha sido contada, mas a cantora voltou àquela noite de 1971 numa entrevista à revista Mojo para dizer que Jean de Breteuil, seu companheiro e dealer de heroína, levou a Jim Morrison aquela que terá sido a sua dose final, demasiado forte. “Ele foi ter com o Jim Morrison e matou-o. Tenho a certeza que foi um acidente”, disse à Mojo. “A droga era muito forte? Sim. E ele morreu. E eu não sabia nada disto. De qualquer maneira, todos os que estavam ligados à morte do coitado estão agora mortos. Menos eu”, explicou. A cantora disse ainda que nessa noite de 1971, em Paris, sabia que De Breteuil, que fornecia estupefacientes a muitas outras celebridades e que morreria meses depois em Tânger, ia ter com Morrison e que não foi também por ter “pressentido problemas”. “Pensei, vou tomar alguns tuinals [barbitúricos] e não vou estar lá”, conta. Esta não é então a primeira vez que Marienne Faithfull fala da noite em que o vocalista dos Doors morreu e associa Jean de Breteuil a esse momento. Na sua autobiografia Faithfull – An Autobiography, que assinou em 1994 com o escritor e fundador da Rolling Stone, David Dalton, a cantora britânica recorda a noite em que o seu namorado foi ter com Morrison. “Ele voltou de madrugada muito agitado e acordou-me. Eu estava completamente drogada com tuinals. Sem nenhuma razão aparente ele começou a bater-me”, escreve. “Ele estava com medo; Jim Morrison tinha morrido de overdose e ele tinha fornecido a droga. ”O nome do dealer tem sido associado à morte de Morrison na imprensa nos últimos anos, bem como a tese de que um tipo de heroína "demasiado pura" lhe teria sido fornecido. “Ninguém está vivo para contar com certeza aquilo que aconteceu no apartamento no quarto andar que Pamela [Courson, a namorada do vocalista] partilhava com Morrison na Rue Beautrellis. Morrison morreu lá, na banheira, aos 27 anos. Apenas duas pessoas fizeram parte desta tragédia: Pamela e um dealer francês aristocrático chamado Jean de Breteuil. Ambos morreram pouco depois”, escreveu o Observer em 2002. Na entrevista à Mojo, Marianne Faithfull fala também de como a morte de Amy Winehouse, também aos 27 anos, em 2011, a afectou. “Amy era muito, muito cautelosa na minha presença. Ela sabia que eu sabia [do seu abuso de drogas] e não queria que eu dissesse nada. É uma mistura de narcisismo e auto-depreciação. Conheço bem esse sentimento. É como se houvesse um vidro entre nós e o mundo, e não conseguimos receber todo o amor que nos dão. Não podia ter feito mais que abaná-la! ‘Sua parva estúpida! Acorda!”, conta. Marienne Faithfull prepara-se para lançar o seu novo álbum, Give My Love to London, a 29 de Setembro, com músicas de Nick Cave, Roger Waters ou Anna Calvi. Na mesma altura será lançado o livro Marianne Faithfull: A Life on Record, uma compilação de fotos da sua carreira como modelo comentadas pela própria.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte medo abuso cantora
PJ investiga "médicos" que convencem doentes a filmar-se
Uma voz que se faz passar por médico telefona a solicitar um exame urgente. Trata a vítima pelo nome e, na conversa, refere pormenores clínicos da suposta doente. Na conversa pede à mulher para filmar as suas partes íntimas e enviar logo que possível as imagens pelo telemóvel. Tudo devido a um tumor grave. Na maioria dos casos, são mulheres que tiveram de se sujeitar a um exame há pouco tempo e estão fragilizadas com a hipótese de uma doença oncológica. (...)

PJ investiga "médicos" que convencem doentes a filmar-se
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-04-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Uma voz que se faz passar por médico telefona a solicitar um exame urgente. Trata a vítima pelo nome e, na conversa, refere pormenores clínicos da suposta doente. Na conversa pede à mulher para filmar as suas partes íntimas e enviar logo que possível as imagens pelo telemóvel. Tudo devido a um tumor grave. Na maioria dos casos, são mulheres que tiveram de se sujeitar a um exame há pouco tempo e estão fragilizadas com a hipótese de uma doença oncológica.
TEXTO: "Quem faz isto deve ter acesso a elementos clínicos, já que na conversa refere pormenores da situação de saúde da pessoa", explica um responsável da Polícia Judiciária (PJ) ao PÚBLICO. O método não é novo. Há vários anos que começaram a aparecer esquemas de alegados testes ao cancro da mama feitos através de telemóvel com intuitos de cariz sexual. Em Novembro de 2008 foram conhecidos dois casos. Na primeira situação, uma mulher que tinha feito um exame de rastreio ao peito recebeu um telefonema da suposta directora do serviço de Oncologia do São João afirmando que tinha vários nódulos nos seios. Tinha de se dirigir ao hospital com a máxima brevidade para uma consulta. Durante a chamada, a doente foi convencida a tirar fotografias ao peito para enviar por MMS. Só não o fez porque o número da alegada médica ficou incontactável. O outro caso envolveu uma mulher de 40 anos, acompanhada no Hospital de Penafiel, que tinha feito um exame ginecológico. Poucos dias depois, a notícia chegava como uma bomba: cancro no colo do útero. Durante três horas, a alegada clínica fez um exame via telefone à vítima e à filha, de 15 anos, com o argumento de que a doença era hereditária. A alegada médica fez com que as duas mulheres fizessem penosas apalpações a várias partes do corpo, em busca de nódulos. A situação repete-se agora com novas queixas, algumas já com alguns meses, noticiadas ontem pelo "Correio da Manhã". A Polícia Judiciária está a investigar vários casos em Aveiro, Coimbra e Viseu, confirmou ontem o PÚBLICO. Mas não há certeza de que em todos eles o suspeito seja o mesmo. A investigação não é fácil, já que os telefonemas, acreditam os investigadores, serão feitos através de telemóveis que funcionam com cartões descartáveis, que depois de cometido o ilícito são inutilizados. Outro inspector aconselha as vítimas a nunca se filmarem em situações como estas.
REFERÊNCIAS:
Entidades PJ
Pinto Monteiro defende agravamento das penas para abusos sexuais de menores
O procurador-geral da República defendeu hoje o agravamento das penas do crime de abuso sexual de menores, preconizando "uma pena por cada crime". (...)

Pinto Monteiro defende agravamento das penas para abusos sexuais de menores
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.5
DATA: 2010-05-25 | Jornal Público
SUMÁRIO: O procurador-geral da República defendeu hoje o agravamento das penas do crime de abuso sexual de menores, preconizando "uma pena por cada crime".
TEXTO: Pinto Monteiro falava aos jornalistas à margem da IV conferência europeia sobre Crianças Desaparecidas e Exploradas Sexualmente, que decorre em Lisboa. Para o procurador-geral, a existência da figura de crime continuado deve dar lugar à atribuição de uma pena por cada crime, uma alteração que implicará a revisão do Código Penal. Esta posição de Pinto Monteiro vem sendo defendida há algum tempo, tendo já motivado uma directiva do procurador-geral da República para o Ministério Público. Sublinhando que esta não é sua competência, Pinto Monteiro defendeu contudo a alteração da legislação em matéria de abuso sexual de menores, por considerar que o crime continuado (que atribui uma só pena a vários crimes de um agressor sobre uma criança) resulta em penas mais leves. "Uma pena por cada crime", defendeu Pinto Monteiro, ideia partilhada pela presidente do Instituto de Apoio à Criança, Manuela Eanes, também presente na conferência, que se realiza no mesmo dia do Dia Internacional das Crianças Desaparecidas. Manuela Eanes frisou que o crime continuado favorece o agressor, lembrando que têm existido exemplos recentes de penas "demasiado leves" para estes crimes. Na conferência, em que participaram os ministros da Administração Interna e da Justiça e o provedor da justiça, todos foram unânimes em reconhecer o abuso sexual de menores como um crime "hediondo" e na necessidade de serem tomadas medidas para o travar. O provedor da justiça divulgou que a unidade sobre direitos das crianças do organismo a que preside recebeu desde Novembro 279 queixas, que resultaram na abertura de 27 processos. Alfredo José de Sousa revelou ainda que decorre na Madeira uma inspecção aos centros de crianças institucionalizadas. O ministro da Administração Interna, Rui Pereira, anunciou que entre 2008 e 2010 foram sinalizadas pelas forças de segurança 18 menores suspeitos de serem vítimas de tráfico, tendo sido confirmados seis casos. A média de idades é 15 anos e são sobretudo raparigas. Sem comentários a notícias sobre escutas À margem do debate, o procurador-geral da República escusou-se a responder a questões dos jornalistas sobre o caso Face Oculta. Segundo o Diário de Notícias de hoje, o PGR não enviou para a Comarca do Baixo Vouga, para destruição, os despachos de arquivamento das certidões extraídas deste processo relacionadas com escutas que envolviam o primeiro-ministro. Pinto Monteiro limitou-se a afirmar que "as leis são para cumprir", acrescentando que "quando as leis se cumprirem acaba-se com este fait-divers". A notícia de hoje do Dário de Notícias surge depois de no dia 5 de Maio a comarca do Baixo Vouga ter anunciado a destruição da última das certidões extraídas do Face Oculta contendo escutas de conversas entre o primeiro-ministro e o arguido Armando Vara. O juiz presidente da Comarca do Baixo Vouga, Paulo Brandão, disse então que deixava de existir qualquer escuta envolvendo José Sócrates, "quer em registo áudio, quer em suporte documental", no âmbito do Face Oculta, relacionado com suspeitas de crimes económicos ligados a empresas privadas e do sector empresarial do Estado. Segundo o procurador-geral da República, José Sócrates surgiu em 11 escutas, mas considerou que "não existem elementos probatórios que levem à instauração de procedimento criminal". Já o presidente do STJ considerou nulas as escutas que envolvem Sócrates, ordenando a sua destruição no dia 13 de Novembro de 2009. Para os investigadores haveria indícios da prática, por parte do primeiro-ministro, do crime de atentado contra o Estado de direito por alegadamente pretender controlar a comunicação social através de empresas públicas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave crime direitos social criança sexual abuso agressor
Esperança de vida continuou a aumentar em Portugal em 2007/2009
A esperança de vida à nascença e aos 65 anos continuaram a aumentar em Portugal no triénio 2007/2009, mantendo-se mais elevada nas mulheres, segundo dados hoje divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). (...)

Esperança de vida continuou a aumentar em Portugal em 2007/2009
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: A esperança de vida à nascença e aos 65 anos continuaram a aumentar em Portugal no triénio 2007/2009, mantendo-se mais elevada nas mulheres, segundo dados hoje divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
TEXTO: Segundo as Tábuas de Mortalidade, os valores definitivos da esperança média de vida à nascença foram em 2007/2009 de 75, 80 anos para os homens, de 81, 80 para as mulheres e de 78, 88 para ambos os sexos. No triénio anterior - 2006-2008 - eram de 75, 49 para o sexo masculino, de 81, 74 para o sexo feminino e de 78, 70 para ambos. Também a esperança de vida aos 65 anos aumentou entre 2007 e 2009, sendo de 18, 19 anos para os dois sexos e de 16, 36 e de 19, 67 para homens e mulheres, respectivamente. Em comparação, estes valores eram no triénio 2006/2008 de 18, 13, 16, 25 e 19, 61. Assim, as mulheres que entre 2007 e 2009 tinham 65 anos podem contar alcançar os 84 anos, enquanto os homens podem esperar atingir os 81 anos.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens sexo mulheres
Amantes de padres escrevem ao Papa para pedir fim do celibato
São 40 mulheres que dizem saber do que falam quando defendem que um padre tem de "amar e ser amado". (...)

Amantes de padres escrevem ao Papa para pedir fim do celibato
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-05-29 | Jornal Público
SUMÁRIO: São 40 mulheres que dizem saber do que falam quando defendem que um padre tem de "amar e ser amado".
TEXTO: Stefania Salomone, uma funcionária administrativa de Roma com 42 anos, já teve duas relações com padres católicos. Decidiu criar um site para encontrar mulheres com a mesma experiência e hoje está em contacto com cinco dezenas: 40 assinaram uma carta aberta dirigida ao Papa Bento XVI para lhe pedir o fim do celibato obrigatório. Descrevem-se como "mulheres de todas as partes de Itália que estiveram ou estão numa relação com um padre ou um religioso", habituadas a viver "em segredo" e a experimentar "diariamente as dúvidas, os medos e as inseguranças dos nossos homens". Um padre, escrevem estas italianas, "precisa de viver com os outros seres humanos, experimentar sentimentos, amar e ser amado". A carta está na Internet desde o fim de Março, altura em que o tema do celibato voltou à agenda do Vaticano a propósito das denúncias de abusos sexuais. A ideia de escrever ao Papa surgiu depois de este ter reafirmado "o valor sagrado do celibato". A obrigatoriedade do celibato, dizem as 40 mulheres, não é uma lei divina, mesmo que a Igreja a apresente como "vontade de Deus". É antes uma "regra humana", introduzida por "razões de interesse económico e de conveniência", que não se encaixa na vida de muitos padres e faz com que a maioria destas relações acabe "em vergonha". É por saberem isso que elas pedem a Bento XVI para admitir que talvez estes homens só consigam cumprir plenamente os seus deveres de padres quando as suas vidas forem completadas com o casamentoA missiva foi entretanto traduzida e publicada em sites espanhóis e ingleses e noticiada pela agência on-line GlobalPost. Apesar de o texto ser apoiado por 40 mulheres, apenas três signatárias publicaram os seus nomes. Para além de Stefania Salomone, assinam Antonella Carisio, de 41 anos, e Maria Grazia Filippucci. O Vaticano recusa comentar. As mulheres descrevem experiências diferentes com pontos em comum. Dizem, por exemplo, que "uma das declarações mais recorrentes dos padres às suas "companheiras" se resume em poucas palavras: "Preciso de ti para ser quem sou", isto é, um padre". A maioria "não está disponível para desistir da vida de padre por uma mulher, querem as duas coisas", disse Stefania Salomone à GlobalPost. Quando descobertos, os padres tendem a abandonar as mulheres, sendo-lhes muito difícil deixar a Igreja. Um anel de noivadoAntonella Carisio conta ter tido um caso com um padre brasileiro que dormia frequentemente em sua casa. Edecir Calegari, que conheceu quando ambos geriam o centro de juventude da sua paróquia, quis até ser apresentado ao filho dela e ao resto da família como seu companheiro. A relação acabou por ser descoberta e denunciada por outro padre e o seu amante foi transferido para Roma: "Quando ele se foi embora até me deu um anel de noivado". Entretanto, Calegari regressou ao Brasil como missionário, algo que prometera nunca fazer. Carisio "era uma amiga e uma confidente, mas nunca estive apaixonado por ela", diz o padre, questionado pela GlobalPost. Calegari afirma lamentar "profundamente" o que aconteceu e garante que defende o celibato. Carisio diz que nunca lhe pediu para renunciar à sua vocação: ele entrara no seminário aos 12 anos e não imaginava a possibilidade de ter outra vida, explica. Para além disso, era admirado por todos os amigos e pela família: "Sempre lhe disseram que ele estava a dedicar a vida a algo superior, melhor do que tudo". Essa crença e a incapacidade de abandonarem a posição que vêem como um privilégio são partilhadas por muitos. B. , uma advogada da Toscana de 40 anos, disse à GlobalPost que o padre com que se envolveu "era crítico dos aspectos mais reaccionários da Igreja e do celibato compulsivo", mas isso mudou quando um novo bispo lhe ofereceu novas oportunidades. Mas também há os que escolhem as mulheres: segundo a revista La Civiltà Cattolica, desde o Concílio Vaticano II (1962-65) perto de 60 mil padres deixaram a Igreja para casar.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens lei humanos filho mulher mulheres deveres vergonha
O mundo alucinante dos controladores aéreos
São poucos, ganham bem e vivem sob pressão. Ser controlador de tráfego aéreo é uma profissão exigente, num mundo que gira cada vez mais ao ritmo dos aviões. Foi preciso um vulcão para que a opinião pública tomasse súbita consciência da dimensão do trabalho dos homens e mulheres que mandam no céu. (...)

O mundo alucinante dos controladores aéreos
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: São poucos, ganham bem e vivem sob pressão. Ser controlador de tráfego aéreo é uma profissão exigente, num mundo que gira cada vez mais ao ritmo dos aviões. Foi preciso um vulcão para que a opinião pública tomasse súbita consciência da dimensão do trabalho dos homens e mulheres que mandam no céu.
TEXTO: Quando era miúda, Filipa corria para a janela do seu quarto, na Avenida de Roma, em Lisboa, sempre que ouvia um avião a fazer-se à pista do aeroporto. "Largava tudo e ia a correr, nem percebia bem porquê", recorda. Hoje, são os aviões que vêm ter com ela: Filipa é controladora de tráfego aéreo e trabalha na torre da Portela. Ela é uma das cerca de 400 pessoas que gerem o movimento dos aviões nos céus de Portugal. É uma classe bem paga e com um horário de trabalho simpático. Mas alguém se sente capaz de fazer o que eles fazem?O espaço aéreo português é enorme. Está dividido em duas grandes áreas, cada uma a cargo de um centro de controlo de tráfego aéreo. O de Lisboa gere o tráfego sobre o continente e área marítima adjacente, bem como do arquipélago da Madeira. O de Santa Maria, nos Açores, encarrega-se de uma vasta área do Atlântico Norte. Feitas as contas, são muitas centenas de aviões por dia - durante o mês de Abril, contaram-se 34. 580 (média de mais de mil por dia) em Lisboa, e Santa Maria "guiou" outros 10. 317. Ou seja, muitos mais do que aqueles que, efectivamente, se dirigem aos aeroportos portugueses. Os dados são da NAV Portugal, a empresa que tem como missão prioritária a prestação de Serviços de Tráfego Aéreo nas Regiões de Informação de Voo (RIV) sob a responsabilidade portuguesa - Lisboa e Santa Maria. E explicam-se pela situação geográfica do nosso espaço aéreo. A área atlântica é sobrevoada por uma percentagem relevante dos aviões que fazem a ligação entre a Europa e as Américas, enquanto o espaço continental e madeirense recebe o grosso das ligações entre a Europa e as Canárias, um destino turístico maciço para os mercados europeus. Foi preciso um vulcão para que a opinião pública, e não só em Portugal, tomasse súbita consciência da dimensão e importância que o tráfego aéreo assume para as sociedades modernas. A paralisação forçada pelas cinzas em suspensão do Eyjafjallajokull, na Islândia, lançou o caos na Europa. Milhões de pessoas ficaram em terra, sem alternativa para viajar. As pistas transformaram-se em parques de estacionamento de aeronaves - e isto é um grande problema, porque o tráfego aéreo mundial atingiu tais proporções que só consegue funcionar em rotatividade. Há mais aviões do que aqueles que cabem nos aeroportos. Se pararem todos ao mesmo tempo, não há onde arrumá-los. . . Eles resolvem equaçõesE assim chegamos ao mundo alucinante das pessoas cuja função é manter este impressionante enxame de aeronaves no ar e dentro dos parâmetros de segurança. Os aviões têm de respeitar rotas, distâncias mínimas em voo, prioridades na aterragem e descolagem. Tudo isto num universo tridimensional e em constante movimento. "O nosso trabalho é a resolução permanente de uma equação: num espaço finito, colocar lá dentro o maior número de aviões possível em condições de segurança. " Falou um matemático. Pedro Barata, 40 anos, controlador de tráfego aéreo em Lisboa, licenciou-se em Matemática Aplicada antes de fazer o curso de acesso à sua profissão. Durante algum tempo, pensou-se que esta seria uma área profissional reservada a alunos de ciências, mas a realidade aí está para desmentir este preconceito. Filipa Figueiredo, 32 anos, a menina que via passar aviões na Avenida de Roma, licenciou-se em Comunicação Social. Carlos Amorim, 25 anos, aluno do curso de controladores de tráfego aéreo que decorre actualmente na NAV, é biólogo; a sua colega Ana Sá, 24 anos, tem um "canudo" de Reabilitação Psicomotora. As condições de acesso à profissão (porque quem termina o curso tem, desde logo, garantia de emprego, uma vez que a NAV Portugal abre cursos na exacta medida das suas necessidades de pessoal) são um grau universitário com os três primeiros anos completos (bacharelato ou licenciatura), 25 anos de idade limite, com referência ao final do ano em que se candidata, e domínio das línguas portuguesa e inglesa. É claro que, nos dias que correm, uma formação que garante emprego, ainda por cima bem remunerado, é um íman irresistível: sempre que abre um novo concurso na NAV Portugal (e têm sido dois por ano nos tempos mais recentes), amontoam-se centenas de candidatos. Todos são sujeitos a testes físicos - problemas de audição, visão ou dicção são complicados nesta profissão - e psicotécnicos. Estes são determinantes. "Procuramos as características fundamentais para o exercício da profissão: raciocínio lógico, visão espacial, capacidade de organização e planeamento, capacidade para trabalhar sob stress, saber trabalhar em equipa", enuncia José Matos, controlador de tráfego aéreo e adjunto da direcção de operações da região de Lisboa. Migrantes à forçaNem todos vêm para aqui por vocação. Filipa tinha este sonho de infância e não é difícil explicar porquê: a mãe era controladora de tráfego aéreo, o pai, Gonçalo, comissário de bordo. O irmão, Francisco, já agora, acabou por se tornar piloto da TAP e, por estes dias, não é raro que da torre da Portela lhe chegue um toque mais pessoal nas normalmente secas e codificadas mensagens entre o controlo aéreo e as aeronaves. Do outro lado da linha está a irmã. . . "Lembro-me de ir ter com a minha mãe à torre, de ver os aviões. . . Ainda trabalhei três anos em publicidade, como copywriter. Tentei uma vez entrar no curso de controladores aéreos, não deu, insisti e à segunda consegui. "Carlos e Ana, que em breve veremos no simulador que replica o trabalho na torre de controlo do aeroporto de Lisboa, contam uma história diferente. Para eles, esta foi uma oportunidade num mundo laboral que ignora os recém-licenciados. Ana achou que esta ocupação vinha ao encontro de coisas que tinha trabalhado ao longo da sua vida, "responsabilidade, atenção, capacidade para gerir multitarefas. . . "Já Carlos responde à pergunta "Porquê controlador de tráfego aéreo?" com outra questão: "E por que não?" Tal como Ana, também ele é do Porto, também ele um completo estranho a este mundo da aviação. "Surgiu a oportunidade, candidatei-me e fui passando testes. A verdade é que primeiro estranha-se e depois entranha-se", confessa, usando a fórmula publicitária criada por Fernando Pessoa para a Coca-Cola. Agora, já a meio dos 14 meses de formação inicial, este biólogo com os olhos postos no céu não tem dúvidas: "Isto é fascinante!" O curso não é remunerado e o vínculo à empresa só é efectivado no final da formação, que envolve, primeiro, uma componente teórica, depois o trabalho em simulador e, finalmente, um período de trabalho acompanhado num determinado órgão de controlo aéreo (torre, radar). São perto de dois anos a investir numa carreira. Mas, para quem segue em frente (e são a maioria, já que, como salienta José Benvindo, coordenador do actual curso, a "selecção rigorosa à partida" limita o número de chumbos), a aposta vale a sempre a pena. "Teria de ponderar mais se soubesse que ia passar 14 meses em formação e depois não teria garantia de emprego. . . ", assume Ana Sá. Espera-os uma carreira bem remunerada, com um horário apetecível, regalias acima da média e idade de reforma, em funções operacionais, aos 57 anos. Os controladores de tráfego aéreo trabalham três dias e folgam dois. Nesses três dias, cumprem, sequencialmente, os turnos da manhã (8h/14h), tarde (14h/22h) e noite (22h/8h), o que os obriga a uma rotatividade intensa e exige alguma capacidade de adaptação. Paulo Encarnação, presidente da Associação Portuguesa de Controladores de Tráfego Aéreo (APCTA), também ele chegado à profissão "sem uma motivação especial que não a curiosidade", confessa o seu fascínio por um ofício que lhe dá "prazer". Mas ressalva algumas regras para enfrentar as exigências de uma actividade que pode ser altamente stressante e exige empenhamento total. "É muito importante saber descansar e, para muitos, grupo em que me incluo, há um conjunto de actividades lúdicas, nomeadamente a prática desportiva, que nos permitem manter os níveis de stress mais baixos. "Os sacrifíciosE como é que a família entra nesta equação? Quando se é mais novo, até se pode achar que os horários disfuncionais são parte do encanto da profissão, como diz Filipa (ela aponta ainda outros aliciantes: a remuneração, a adrenalina e. . . o facto de poder vestir informalmente). Mas como conjugar as rotinas familiares com uma profissão que foge às rotinas? "A família precisa de se adaptar. . . É complicado ao princípio, mas depois encontra-se um ritmo. Afinal, nós temos tempos de descanso exactamente para limitar os níveis de ansiedade e temos de os aproveitar. Estar com a família faz parte desse processo de "esquecer" o trabalho", explica Pedro Barata, que também frequenta um ginásio e gosta, essencialmente, de estar com pessoas nas suas pausas do trabalho. Os sacrifícios na vida pessoal não passam apenas por faltar à festa do amigo, porque não convém fazer noitadas ou beber álcool na véspera de ir trabalhar; ou não ir ao almoço de família, porque um domingo é um dia normal de trabalho para um controlador de tráfego aéreo. Passam também por enfrentar o cenário mais ou menos inevitável de enfrentar algum tempo longe de casa. "O fluxo normal consiste na colocação dos recém-formados nas ilhas, nomeadamente no controlo de Santa Maria, que é onde abrem vagas. E estas vagas são as deixadas abertas por controladores com mais anos de serviço que regressam ao continente", explica José Matos. Pedro Barata esteve quatro anos e meio em Santa Maria, Filipa Figueiredo quatro, Paulo Encarnação nove. Mais tarde ou mais cedo, cumprido este aparente ritual de iniciação, aparece a oportunidade de regressar a "casa". Sacrifícios pessoais, quem os não faz em nome de uma carreira? Mas num ponto a profissão de controlador aéreo estabelece uma fronteira clara: são poucas as actividades humanas em que o grau de responsabilidade seja maior. Isso, um nível de formação apurado (e dispendioso) e o reduzido número de pessoas habilitadas a cumprir a tarefa (em contraponto com um tráfego aéreo cada vez mais exigente) explicam que esta seja uma classe profissional bem paga e com regalias acima do comum. O nível inicial de rendimentos de um controlador de tráfego aéreo está estipulado nos 2800 euros; o topo de carreira, 14 degraus acima, aproxima-se dos 4000. Sobe-se de categoria automaticamente ao fim de alguns anos de serviço (a princípio de dois em dois, mais para acima o período alarga-se). Mas a estas verbas há que juntar uma remuneração operacional, que varia conforme o órgão de controlo (torre, radar) e o local em que se trabalha (Lisboa "vale" mais do que um pequeno aeroporto nas ilhas, por exemplo). Há ainda que contar com diuturnidades, feriados e horas extraordinárias. Contas feitas por alto, são sempre uns milhares de euros por mês e o topo de carreira pode aproximar-se dos 15. 000. São números que impressionam, ainda por cima associados a mais de 30 dias de férias por ano, folgas a cada três dias, meia hora de repouso a cada duas horas de serviço nos postos mais exigentes. E etc. . . e etc. . . Num país habituado a invejar quem ganha bem, não surpreende que não haja propriamente uma grande abertura para falar dos ordenados dos controladores de tráfego aéreo. Mas, se estes dados podem aguçar o interesse de jovens à procura de emprego, pouco mais fazem pelo cidadão comum do que deixá-los a pensar que erraram a carreira. Afinal, cobiçar este nível de vida é o mesmo que ter inveja do ordenado de um cirurgião. E quem é que se sente habilitado a fazer o trabalho dele?Sim, há sustosHá coisas que não há dinheiro que pague. "Houve uma situação em que estive envolvido, as coisas não correram bem e ocorreu uma infracção das regras de segurança. O inquérito posterior provou que foi o piloto quem cometeu o erro, mas nessa altura ficamos completamente acelerados e abalados", recorda Pedro Barata. "Foi um grande susto, que pode deixar marcas durante dias, semanas. "Quando ocorre uma situação destas, o controlador é imediatamente retirado da sua posição de trabalho, "para sua segurança e das pessoas a bordo das aeronaves". Segue-se um inquérito pormenorizado, tendo em vista o apuramento das causas da falha no sistema. A regra na aviação civil é que cada acidente ou incidente seja aproveitado para aprender e evitar a repetição de erros no futuro. Mas, para um controlador de tráfego aéreo, a recuperação da autoconfiança depois do abalo é sempre um processo muito pessoal. "E nós precisamos de ter autoconfiança, uma vez que estamos a resolver problemas em tempo real. "Paulo Encarnação nunca enfrentou uma situação "verdadeiramente complicada", mas classifica como comuns casos de urgência médica (um passageiro com um ataque cardíaco, por exemplo) ou emergência mecânica (problemas numa aeronave - na esmagadora maioria dos casos não envolvem risco imediato, mas requerem a abertura de um corredor prioritário para aterragem na pista mais próxima). Filipa Figueiredo recorda um episódio passado em Santa Maria, quando um pequeno avião manteve o rádio em silêncio durante toda a travessia do espaço aéreo, o que impossibilitava o cálculo da sua posição. No mar, não há radares e por isso a posição é calculada em função das últimas coordenadas reportadas, da velocidade da aeronave e das condições meteorológicas. "De repente, apareceu para aterrar em Santa Maria, já pensávamos que tinha caído. . . "Contra estas pequenas omissões humanas não há, por vezes, tecnologia que baste. O centro de controlo de Santa Maria está ao nível do que de melhor existe no mundo e a NAV Portugal orgulha-se de ser não só uma empresa bem equipada, como também inovadora. " O sistema de Gestão de Tráfego Aéreo de Lisboa foi desenvolvido aqui, na área da empresa dedicada precisamente ao desenvolvimento de sistemas e tecnologias de informação. Em termos de procedimentos, somos também pioneiros na Europa: há um ano que pusemos em prática na Região de Informação de Voo de Lisboa o Projecto Free Route Airspace Lisboa FIR, que consiste em permitir que os operadores escolham o ponto de entrada e de saída no nosso espaço aéreo, garantindo-lhes desta forma rotas mais directas e consequentemente poupanças em tempo de voo, consumo de combustível e redução de emissões de CO2", informa José Matos. Apesar deste bom desempenho, e de níveis de produtividade que colocam a empresa portuguesa entre as sete ou oito melhores da Europa, a verdade é que o cenário do céu único europeu coloca questões de sobrevivência à NAV Portugal. Quem o enfatiza é Paulo Encarnação, que lembra a intenção europeia de criar "cinco ou seis blocos operacionais" - um deles seria o ibérico. "O nosso receio é que, sendo a NAV uma empresa de um país pequeno, corre o risco de ser absorvida pela sua congénere espanhola, a AENA, que está pior classificada mas é muito maior. " A questão está no ar desde 1999 e, por agora, resta à NAV Portugal continuar a apostar na excelência do seu serviço. Edifício auto-suficienteE é isso que podemos ver em Lisboa, no edifício 118 do aeroporto. Um centro de controlo de tráfego aéreo é uma infra-estrutura à prova de falha. Tem de ser. Todos os sistemas são redundantes, alguns chegam a ter dois apoios para eventual substituição. O edifício está equipado com geradores que lhe permitem funcionar um mês sem alimentação eléctrica do exterior. É, ao contrário do que sucede na torre de controlo de um aeroporto, um edifício virado para o seu interior. Lá em baixo, o coração do sistema: a sala de controlo. O pé-direito alto é o equivalente a três andares convencionais, as luzes apontam para cima e fornecem iluminação indirecta, não há janelas para o exterior ao nível visual de quem trabalha nos 26 postos colocados em semicírculo, cada um com telefones, monitores e equipamentos de comunicação. Nem todos são usados em simultâneo e, no meio, uma ilha de monitores e cadeiras marca as posições de supervisão. Ao lado, há uma zona de serviços de apoio. Há três posições reservadas ao controlo de aproximação (o passo do meio entre o controlo em rota e a torre do aeroporto - neste caso, também as torres de aeródromos como os de Cascais, Sintra ou Alverca), nos outros que estão em funções há sempre duas pessoas por cada sector: um controlador executivo e um controlador de apoio. Durante o dia, o espaço aéreo a cargo de Lisboa divide-se em sete sectores; à noite, com menos movimento, podem ser apenas dois. Nas suas bases, a Força Aérea tem pessoal específico para estas funções, mas nesta sala também há um posto, a um canto, reservado aos militares. Aqui, os aviões são ícones navegando num mar de coordenadas, o silêncio só é quebrado pelas comunicações cifradas (sempre em inglês) entre o controlador e os pilotos. A maior parte das aeronaves referenciadas nestes monitores nem sequer vão aterrar em Portugal. As que vão pousar, nomeadamente em Lisboa, depressa deixam de ser um sinal no computador para passarem a ser uma luz à distância. Na torre de controlo da Portela, como em todas as outras, afinal, é de navegação à vista que (também) se fala. Assim que chegamos, a referência mental que se impõe é a de que estamos num farol. A subida ao andar superior por uma escadaria de madeira bastante íngreme - "Cuidado com a cabeça!" - só reforça essa impressão inicial e, chegados lá acima, a visibilidade a 360 graus confirma tudo. Estamos num farol, efectivamente, um ponto de referência para toda a manobra no aeroporto. Há aviões que querem partir e outros que se aproximam para a aterragem. Os que chegam precisam de saber onde vão estacionar, os que se fazem ao caminho têm de ser colocados por ordem para a descolagem. Como em tudo na vida, a realidade conspira constantemente para dificultar a vida a quem tem de gerir todo este movimento. "Quer fotografar com um avião a aterrar? Bom, vamos ter de esperar oito minutos. . . " É normal, os períodos de maior movimento são o início da manhã e o final da tarde - e nessas alturas nem se pode andar a fazer reportagem na torre. . . Espera-se então alguns minutos e, subitamente, o sossego foi-se. À chegada, as coisas estavam tão calmas que um observador mais desatento nem perceberia o que faziam aquelas pessoas de auscultadores nos ouvidos e olhar atento aos monitores à sua frente, pequenas placas de plástico ao alcance da mão para aí colocarem as tiras de papel que saem da impressora mesmo ao lado - são os códigos dos aviões que se movimentam no aeroporto. De repente, a tal aterragem por que se esperou vários minutos é seguida de mais três ou quatro, enquanto outros tantos aviões se movimentam na placa rumo às posições de descolagem. É preciso intercalar as aterragens com as descolagens, calcular os tempos de aproximação com os de manobra na pista, apontar portas de desembarque a quem chega e passar quem parte para o controlo aéreo. Parece uma confusão, mas para quem está treinado tudo isto é rotina, tudo isto é normal. Ou talvez nem por isso. . . "O que é feito da British?", interroga-se Filipa, que neste final de manhã está de serviço na torre e nota a falta de aviões da companhia britânica. "Estão em greve", respondem-lhe do lado. Vencer os medosUm controlador de tráfego aéreo tem formação permanente. Porque as situações de maior tensão e complexidade não são comuns, de vez em quando eles são sujeitos à "tortura" do simulador, onde supervisores os sujeitam aos cenários mais exigentes. Lembra Filipa Figueiredo: "Uma vez comunicaram-me: "Há uma bomba na torre. " E eu, mesmo sabendo que estava numa simulação, ainda perguntei: "Isto é a sério?" É que há sempre algum maluco ao telefone a inventar coisas destas. . . Mas não, era mesmo a simulação, e aí temos de tomar as medidas necessárias para enfrentar a situação. "É uma espécie de regresso às origens. É por aqui, por esta sala com um enorme painel vídeo a servir de horizonte, que passam os candidatos à formação, quando já cumpriram a parte teórica do curso e começam a testar verdadeiramente as suas aptidões para o trabalho de torre. Lá à frente, dois formandos colocam-se na habitual posição executivo/apoio, ladeados por um instrutor que lhes vai dando indicações e tomando notas. Pretende-se que a sua intervenção seja cada vez mais reduzida à medida que os alunos vão ganhando experiência. Num plano superior, cá atrás e para lá de um vidro, sentam-se três pessoas: um supervisor, no meio, vigia todo o exercício e assume os papéis de apoio - bombeiros, meteorologia, estrutura aeroportuária. Ao seu lado, dois pilotos. Um comanda aviões que querem descolar, o outro apresenta-se para aterragem. De vez em quando, o ritmo intensifica-se - "Vai ser apertadinho, este!", comenta alguém acerca de uma descolagem entre duas aterragens. Mas deu. Só que, quando calha (leia-se, quando a mente maquiavélica dos instrutores assim o determina), alguma coisa "corre mal": por exemplo, um avião aborta a aterragem - diz-se, na gíria aeronáutica, que "borregou" -, o que obriga a acertar o passo de todas as outras operações em curso. Progressos técnicosAna assiste de fora ao que normalmente vive lá dentro. "É giro porque depois, na vida civil, damos por nós a usar estas expressões. Dizemos Roger quando percebemos; falo de pista em vez de estrada, de tráfego em vez de trânsito. . . " Tudo normal. "É fascinante vê-los crescer, como pessoas e como profissionais. Os alunos chegam aqui e começam por atender o telefone com um "Alô", ou "Estou"; depois, ao fim de algum tempo, já dizem "Transmita". . . " É indisfarçável o orgulho na voz de José Benvindo. O ambiente é cordial. Os agora alunos serão, a médio prazo, colegas de profissão. Mas isso não implica uma avaliação menos rigorosa. "Lido muito bem com o stress na profissão, mas no curso sentia-me ansiosa, com medo de chumbar. Muitas vezes, quando as coisas não corriam bem, saía de lá a chorar", recorda Filipa. Cada um reage à sua maneira. Carlos, por exemplo, garante que a exigência do curso o motiva a dar o seu melhor "e mais um bocadinho". Filipa e a mãe, Maria Adelaide, foram durante alguns anos colegas de profissão. Agora a segunda, com 58 anos, reformou-se, numa altura em que ser mulher nesta actividade deixou de ser uma coisa rara. "Quando entrei, em 1973, éramos no máximo umas oito em 70 ou 80 controladores", recorda. Ao contrário da filha, não teve qualquer influência familiar na sua decisão de seguir esta profissão. Não foi bem uma decisão. . . "Estava na faculdade a terminar Bioquímica quando respondi, eu e umas colegas, a um anúncio para um part-time. Afinal, era o curso de controladores de tráfego aéreo. . . " Maria Adelaide viu muita coisa mudar nas últimas décadas. "Os progressos tecnológicos foram imensos!", atira, para a filha responder em tom de desafio: "Mas também o movimento era muito menor!"Mas há coisas que se mantêm iguais e que nos levam a um sorriso. Maria Adelaide: "Quando fui ao centro de controlo pela primeira vez, reparei que o relógio da parede estava uma hora atrasado. No dia seguinte, a mesma coisa, e pensei: "Coitados, estão tão atarefados que não têm tempo para acertar isto. . . " Só que quem estava enganada era eu; o relógio marcava a hora UTC, a hora internacional da aviação!"Só por uma vez Maria Adelaide fraquejou nas suas funções. "Estava um temporal horrível e o meu filho ia fazer exame para tirar o brevet. Lembro-me de lhe ter perguntado se ia jantar a casa, mas depois tive de pedir para ser substituída, estava muito nervosa. " Desta vez não era possível cumprir a regra tácita dos controladores, que consiste em não pensar nos pontos ou luzes que comandam como aeronaves cheias de pessoas. "Não o fazemos de forma deliberada", explica Pedro Barata. "A primeira abordagem é resolver aquela equação, colocar os aviões no espaço disponível dentro dos limites de segurança. Só se alguma coisa falha, é que a ideia nos salta à mente: há pessoas lá dentro! E isso não é agradável. . . " O contacto directo com a aviação civil parece até ser a melhor forma de superar medos ocultos. "Antes de ir para o curso, sonhava muito com aviões, mas sempre desgraças! Quando o meu pai ia voar, fazia uma rezinha", admite Filipa. Agora não tem medo de voar e não vê razões para tal. Porque, mesmo com milhares e milhares de aviões no ar todos os dias, os acidentes são muito raros. Fechados em centros de controlo ou empoleirados em torres de aeroporto, os controladores lá estão para cumprir o seu papel. Discretos e anónimos, como o são todos aqueles de que só nos lembramos quando as coisas correm mal. Para eles, não ser notícia é mesmo a melhor das notícias.
REFERÊNCIAS:
Austrália tem pela primeira vez uma mulher à frente do Governo
Julia Gillard substituiu Kevin Rudd como primeira-ministra da Austrália, tornando-se na primeira mulher a liderar o Governo deste país. A substituição aconteceu numa eleição interna para a liderança do Partido Trabalhista. (...)

Austrália tem pela primeira vez uma mulher à frente do Governo
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.25
DATA: 2010-06-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Julia Gillard substituiu Kevin Rudd como primeira-ministra da Austrália, tornando-se na primeira mulher a liderar o Governo deste país. A substituição aconteceu numa eleição interna para a liderança do Partido Trabalhista.
TEXTO: Rudd, enfraquecido por uma enorme queda de popularidade, reconheceu a derrota e escolheu não se sujeitar à votação dos trabalhistas. Gillard foi então escolhida com os votos dos parlamentares do partido. Tudo aconteceu muito depressa e de forma inesperada. “A velocidade das mudanças realizadas foi alucinante”, disse à AFP a politóloga Elizabeth van Acker. “Ontem à mesma hora, ninguém anteciparia um tal cenário. ” Analistas citados pela BBC consideram que Rudd não foi a votos porque sabia que ia perder. “Sinto-me honrada”, afirmou Gillard à saída do Parlamento de Camberra. Admitiu depois que não foi “eleita pelo povo australiano” e que pedirá “nos próximos meses ao Governo geral para convocar eleições de forma a que os australianos possam exercer o seu direito original e escolher o seu primeiro-ministro”. Em Outubro há eleições na Austrália. Gillard, vice-primeira-ministra desde 2007, entrou no Parlamento em 1998. Tinha também a cargo o Ministério do Emprego e da Educação, onde geriu um ambicioso programa de investimento nas escolas. Assumidamente celibatária, disse numa entrevista em 2008 que admirava “as mulheres que conseguem gerir a vida de família e a vida profissional”, confessando não ter “certeza de ser capaz”. Gillard tem agora como primeira missão reunificar o partido, enfrentando em seguida os mesmos problemas que levaram à queda de apoio popular a Rudd, nomeadamente o projecto de lei sobre comércio de emissão de carbono (que Rudd abandonou depois de perder o apoio do Parlamento e ela já anunciou que vai reactivar) e o imposto sobre as actividades mineiras, ao qual os donos das empresas do sector se opuseram com uma campanha milionária. Em termos de política externa, não se antecipam grandes mudanças, nomeadamente no envolvimento no conflito afegão, onde a médio prazo os australianos vão permanecer.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave lei educação mulheres
Lagarteiro: Daqui (quase) ninguém sai
Porta fechada, janelas fechadas, persianas corridas. Dentro de Emília está mais escuro do que fora dela. Amanhã, começa o julgamento das duas filhas. “Duas meninas” teve Emília e “duas meninas” tem em prisão preventiva; “um menino” teve Emília e um “menino” tem em prisão efectiva. (...)

Lagarteiro: Daqui (quase) ninguém sai
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-27 | Jornal Público
SUMÁRIO: Porta fechada, janelas fechadas, persianas corridas. Dentro de Emília está mais escuro do que fora dela. Amanhã, começa o julgamento das duas filhas. “Duas meninas” teve Emília e “duas meninas” tem em prisão preventiva; “um menino” teve Emília e um “menino” tem em prisão efectiva.
TEXTO: Emília parece ter falido, como o bairro que habita, no Porto Oriental, já na fronteira com Gondomar. É como se aqui dentro, neste apartamento com janelas que só abrem para estender e tirar roupa, esperasse que algo libertasse as filhas e ao libertá-las a libertasse também. O presidente da Junta de Freguesia de Campanhã, Fernando Amaral, acredita que este lugar periférico – inscrito numa zona com laivos de ruralidade, mal servido de transportes públicos, dotado de uma rede viária deficiente – se libertará. O Lagarteiro é um dos três contemplados com a Iniciativa Bairros Críticos, promessa de reabilitação urbanística e de reforço de cidadania. Não haverá obras dentro das casas, como Emília e os vizinhos tanto desejam. Apenas nos espaços comuns. Os políticos anunciam-nas para agora – para o segundo semestre deste ano. Os promotores distribuíram informação nas caixas de correio, mas Emília sabe lá. “Vivo aqui desde a idade do meu Miguel. Eu tinha 18 anos quando tive o meu Miguel. Nunca vieram fazer obras. ” Emília diz isto a apontar a tinta branca a escamar no tecto da cozinha, mesmo por cima dos armários brancos que ela e o marido há tanto ali colocaram. Vive aqui desde que o bairro foi inaugurado, em 1973, então com 248 habitações distribuídas por nove blocos. Já vivia aqui quando o bairro foi ampliado, em 1977, e passou a ter 446 habitações em 13 blocos. Está atarantada com uma carta que chegou da Segurança Social por causa da suspensão do Rendimento Social de Inserção (RSI) da filha mais velha. E com a técnica da Reinserção Social que anda pelo bairro a fazer perguntas – tem de escrever os relatórios sociais. As “meninas”, a Alice e a Tânia, estão presas desde 15 de Fevereiro de 2009. Respondem por tráfico de droga. O “menino”, o Miguel, está preso desde 28 de Março de 2008. Batia na companheira. Um dia, bateu-lhe tanto que ela não aguentou mais e foi à esquadra que antes era no bairro e agora é ao pé dos correios. Para os ver, a mãe corre ao fim-de-semana. De manhã, Emília vai “às meninas”, ao Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo, em Matosinhos. De tarde, vai “ao menino”, ao Estabelecimento Prisional Regional do Vale do Sousa, e ao ex-genro, a dois passos, ao Estabelecimento Prisional de Paços de Ferreira. Não vai sozinha. Leva as crianças – apesar do ex-genro já ter ameaçado a ex-companheira, já ter ameaçado a ex-sogra, já ter ameaçado a filha. Sobrevive com o Rendimento Social de Inserção (RSI) e com os abonos. Nem consegue pensar em trabalhar. Nem ela nem o marido, que teve um enfarte quando “as meninas” foram presas. Ainda é novo para a reforma – 59 anos, mais quatro do que a mulher –, mas perdeu o alento. Já era diabético, já tinha “problemas nos pulmões”. Agora, é um pai entristecido, de coração débil. Há muita doença neste bairro. Rita Mendes, a coordenadora do projecto Escolhas, sente-o todos os dias. O queixume está sempre a entrar nos gabinetes dos técnicos que lidam com o Lagarteiro. E são tantos – Segurança Social, junta de freguesia, projecto Escolhas, Associação Norte Vida, Centro de Respostas Integradas Porto Oriental, Cooperativa Arrimo… Emília está desfeita. Basta olhar para ela para a perceber desfeita. Reza. Não procura um psicólogo ou um psiquiatra, não vá isso servir para lhe retirarem os netos: o filho de Miguel e a filha de Alice, que ela ajudou a crescer. Aqui, o RSI não estigmatiza. Aqui, há mais processos de RSI do que casas. Paradoxo: houve um salto inusitado desde de que foi anunciada a Iniciativa Bairros Críticos. Em 2006, 237 famílias recebiam RSI; hoje, 488. Não lhe venham falar em cursos que não sabe para que servem nem em empregos que a impediriam de cuidar do marido e dos netos. O marido distribui publicidade quando aparece. Um trabalho tão incerto e tão mal pago que nem com ele terá contado o técnico que fiscaliza o RSI. Não falta economia informal dentro destes blocos cor de tijolo ou cinzento-encardido. Enquanto Emília reza, Filomena senta-se na carrinha branca que está a pagar “à financeira” e que tem uma bandeira de Portugal atrás e um cachecol de Portugal à frente. É entre aquela toalha e aquele cachecol que guarda a fruta e os outros produtos que tenta vender a quem passa. “No ano passado, a assistente social da Segurança Social viume aqui sentada e cortou-me 100 euros no RSI. Fiquei com 86 para o mês inteiro! O RSI é para a casa! Se a gente ganha alguma coisa a vender, é para comer. Ela diz que eu posso trabalhar! Eu trabalho desde os sete anos!” A fábrica que a empregava fechou. Como fecharam muitas fábricas na zona oriental do Porto, no distrito, na região. E ela não se deprimiu. Recusou-se a ser mais uma mulher deprimida num dos mais deprimidos bairros de uma das mais deprimidas zonas de um país deprimido. O Porto ampliadoO Lagarteiro é o Porto ampliado, interpreta Virgílio Pereira, da Faculdade de Letras da Universidade do Porto: “Não é só a baixa escolaridade e a baixa qualificação profissional [a reproduzir pobreza, exclusão]. É também a ausência de trabalho ou a existência de trabalho muito precário. ” A industrialização do Porto, que principiou em meados da segunda metade do século XIX, atraiu muita gente do interior, do campo. E foi para resolver os severos problemas dessa gente que se amontoava, que vivia em condições insalubres, que em 1956 arrancou um megaprograma de realojamento em bairros que se foram construindo na periferia. A desindustrialização das últimas décadas deixou pais desempregados e filhos sem perspectivas de emprego. “Noutras zonas, houve desindustrialização, mas a população tem relações mais móveis com o trabalho. No Porto, o enraizamento geográfico é intenso”, salienta Vergílio Pereira. Que quer isto dizer? O fechamento do Lagarteiro, como o fechamento de Emília, não é só físico. As pessoas que aqui moram tendem a viver quase só em torno do espaço do bairro e da área envolvente. E isso impede-as de irem à procura de oportunidades onde elas existem. “Filomena da fruta”, volta de ouro ao pescoço, argolas de ouro nas orelhas, mostra um bilhete de penhora: “Fui empenhar um anel e uma aliança para ter dinheiro para esta semana: 189 euros! Quantas vezes vou empenhar coisas! Se lhe fosse a mostrar o saco de papéis que tenho em casa! Oh! Gasto 130 euros por mês em medicamentos e vou à doutora pedir ajuda e ela diz que não tem dinheiro. Sou diabética. Tenho dois nódulos na tiróide. Tenho um fibroadenoma na barriga. Há tempos, caí da carrinha e parti os dentes. Ando a tirá-los. Se fosse outra, metia-se em casa. ” Vive com a filha, de 32 anos, e com um neto, de oito, num T3 impecavelmente arrumado: “O menino é hiperactivo e o pai é um garoto: não ajuda! Até se desempregou para não dar nada ao filho. Trabalhamos muito eu e ela para lhe dar tudo o que ele precisa, para ele ser mais do que a gente. Ele não vai a lado nenhum sem ela. Ela também tem RSI. Ela andou a fazer o 9. º ano, no Novas Oportunidades, mas foi de noite. Vai fazer o 12. º agora!” São sempre as mesmas caras no gabinete de atendimento de junta de freguesia, a funcionar duas tardes por semana – e a fazer monte, apesar de, com a Iniciativa Bairros Críticos, a Segurança Social aqui ter colocado uma técnica. O assistente social José António Pinto trabalha no bairro desde 1997. Conhece-as, conhece as suas vidas. Albina ajuda-o a aliviá-las. “Bininha” também ficou sem emprego aos 50, quando a fábrica fechou. E assim, desocupada, começou a ocupar-se de quem dela precisava. “Estive dez anos a olhar por um velhinho. Ele tinha Alzheimer. Eu dava-lhe o banho, fazia-lhe a barba, cortava-lhe o cabelo. ” O “velhinho” chamava-se Adelino e “estava muito sozinho”. Uma doutora, lá do centro de dia, é que lhe disse: “’Bininha’, é preciso deitar a mão a este senhor. ” A casa “estava muito velha”. “Bininha” até lhe pregou tábuas no chão. Um dia, fez um requerimento à câmara e a câmara chamou a Segurança Social para o levar para um lar. Ele deixou de andar ao terceiro dia. O sr. Adelino ainda dormia em casa e já alguém falara com “Bininha” sobre o sr. Manuel. Não deixava a mulher, alcoólica, dar-lhe banho. E lá ia “Bininha”. Também ia ajudar a vestir o sr. Ernesto, que “passava a vida no Hospital do Conde de Ferreira”. A certa altura, eram três. Aqueles dois e uma senhora, “que morreu aos 90 anos”. Mas para essa pagavam-lhe. “Os filhos ganham bem”. “Bininha” ficava lá “de dia e de noite”. “Se ela durava mais tempo, eu não aguentava. Estava sequinha, sequinha. Mal comia para estar à beira dela!” Ajuda no posto dos correios; dois dias por semana, ajuda no gabinete da junta; e com isso faz vida. Chega às 13h45, abre a porta, toma nota (na cabeça) dos nomes por ordem de chegada. Limpa. Se for preciso, vai entregar um papel, vai chamar alguém. Ainda há pouco, foi “com o dr. Pinto dar banho a um homem”. Lavaram-no, vestiram-no, levaram-no ao hospital. “Foi despejado. A cabecinha não regula bem. Agora dorme nas urgências do Hospital Santo António. ” Às vezes, “é complicado”. Há pessoas “desesperadas, que precisam de dinheiro para pagar a água, a electricidade ou a medicação”. Acontece entrarem furiosas. Apesar do técnico ser acarinhado, ainda há pouco “Bininha” teve de se meter à frente de um que o ameaçava. Ela não mora aqui. Mora a uns metros. Mas há uma relação de anos. Vem um e diz: “Ó ‘Bininha’, dê-me uma moeda para um café!” E ela leva a mão à carteira. É preciso qualquer coisa: “Vai à ‘Bininha’, que ela resolve!”. E a pessoa não tarda a procurá-la: “Ó ‘Bininha’!” “Este bairro é uma miséria!” “Só Deus nos pode julgar” Como é que se chegou a esta dependência? José António Pinto, mestre em Sociologia, culpa o modelo de desenvolvimento económico, “que não cria oportunidades de inserção através do trabalho”; a formação profi ssional, “que leva a concluir que fazer cursos não traz emprego” (se a bolsa for inferior ao RSI, “ninguém se inscreve”); e as “políticas sociais desajustadas” (“ganha 450 euros, tem de pagar infantário, renda, água, luz”). O comportamento do poder local também lhe faz comichão: “A junta tem um posto de atendimento, a câmara manda cartas. ” E o dos moradores: “Não há uma associação de moradores. Parte-se um vidro, insulta-se o carteiro, conduz-se sem capacete. Ninguém toma uma posição porque não há uma estrutura organizada. As pessoas não têm noção do que são deveres, direitos, cidadania. E não têm auto-estima, estão sem energia, acreditam que fracassaram, que não são capazes de mudar a sua vida nem a da comunidade. ” Quem aqui mora sabe ser olhado de lado por quem não mora aqui. Ninguém quer vir aqui. E quando alguém sai daqui leva, quase sempre, o bairro consigo. Nos jeitos – de andar, de falar, de estar. E, também por isso, muitos parecem colados aos muros. Numa das paredes da escola de primeiro ciclo, marcada pelo insucesso e pelo absentismo, alguém escreveu: “Só Deus nos pode julgar”. Às vezes, só resta a fé. “Lúcia do avental”, empertigada nos seus 75 anos, nunca a perdeu. Tem uma colecção, logo na entrada, de nossas senhoras e de santinhos com sensibilidades diversas. E passa rifas, mas já passou drogas. E teve dez filhos, mas já viu morrer seis. “Passaram tanta fome quando eram pequenos e não morreram! Morreram grandes. Dois de acidente, um de cancro, dois por causa da droga. O último morreu há uns meses com uma cirrose. Ele pedia a Deus para levá-lo. Eu dizia-lhe: ‘Tens de sofrer. Quando Deus quiser, vais’. ” Está cansada. Recebe 230 euros de reforma. E, com isso, nem água nem luz paga – aqui há muitas As pessoas que aqui moram tendem a viver quase só em torno do espaço do bairro e da área envolvente. E isso impede-as de irem à procura de oportunidades onde elas existem puxadas de água e de luz (cada vez que os fornecedores cortam, chama-se quem sabe ligar). “Já devo uns quatro mil euros de luz, uns cinco mil de água. Deixou-se de pagar quando estava presa. Enquanto uma filha aqui viveu, pagou tudo direitinho. Depois ficou outra, a mãe desta minha neta que está aqui, e essa gastava tudo em droga. Se me deixassem pagar cinco contos por mês, eu abatia…” A neta instalou-se no T4. E trouxe o marido e o filho, bebé. E ainda há pouco ficou um neto com pulseira electrónica. “Já pedi tantas vezes para mudar! Queria ter uma casa tipo 1, para estar sossegada o resto da minha vida. ” Bailarina dos The Puppet’sÉ este convívio forçado de gerações que aqui gera mais processos de RSI do que de casas. Daisy, uma rapariga de 28 anos com uma lágrima tatuada no rosto, acaba de perder a sua. “Trabalhava poucas horas. Não tinha ordenado fi xo. Estive um ano e tal sem pagar a renda. Tive uma ordem de despejo. Fiz um plano de pagamento. Recebia 180 euros de RSI e fui pedir um subsídio extra à Segurança Social. Quando pedi que me baixassem a prestação, disseram-me que tinha de sair, que a casa estava só em nome da minha mãe. A minha mãe já saiu há tanto tempo! Eles sabem! Estou com a minha avó há um mês e meio. É horrível. É muito empenhada como bailarina do grupo de hip-hop The Puppet’s. Não o é como aluna do “curso de autonomia” que acaba de iniciar. Isto “é só um curso daqueles que ensinam a cozinhar, a lidar com a família, com o emprego”. E ela está lá “só por causa do dinheiro”: 420 euros mais subsídio de alimentação e de transporte, bem melhor do que os 180 de RSI. O que queria era tirar um curso de organização de eventos. Adora dançar, adora organizar espectáculos. The Puppet’s faz dois ou três por mês. The Puppet’s Kids faz outros tantos e ela ajuda-os sem cobrar. Dá aulas de dança hip-hop. Mas nem juntando o que ganha no hip-hop ao que ganhava com o RSI conseguia enfrentar as despesas básicas. Não morre de amores pelo trabalho. Sempre tiveram uma relação estranha. Abandonou a escola aos 12 anos para trabalhar numa fábrica. Aos 17, engravidou e o companheiro proibiu-a de trabalhar. Só voltou a trabalhar quando o deixou – aos 25. E desde então saltita de trabalho em não trabalho. “Não fico muito tempo. Não gosto que me calquem. Se calhar, tenho de aprender a engolir. Se calhar, sou assim e nunca vou mudar. ” Não vê o emprego como fundamental? “Neste momento, o único curso que tenho é de ajudante de cozinha. Se arranjo um trabalho a ganhar 500 euros e uma casa a pagar 300, com que dinheiro fico? O que como? Estou um bocado perdida. Tenho de conseguir recuperar o meu espaço, os meus dois filhos, mas vai demorar. Vou viver o dia-a-dia. Não vou fazer planos. Fazer planos não leva a lado nenhum. ” Alguém fez planos para ela, como alguém fez planos para o bairro. O plano feito para o bairro combate a pobreza? “Ainda decorrem negociações para ultimar aspectos do projecto, pelo que se considera prematuro produzir declarações neste momento”, respondeu o assessor do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, quando se lhe pediu para conversar sobre isto com a coordenadora da equipa que aqui se instalou em Fevereiro de 2009. José António Pinto não acredita que a Iniciativa Bairros Críticos resgate o Lagarteiro à letargia: “As pessoas estão cansadas de projectos. Os resultados têm sido zero. O que é a Iniciativa Bairros Críticos? Uma comissão de festas! As questões centrais passam-lhe ao lado. As pessoas precisam de obras dentro de casa, de desdobramentos, de equipamentos sociais, de emprego. Nem só o edificado é importante? É verdade. É preciso melhorar a auto-estima? É verdade. Mas o bairro está pior. Há mais pobres, mais putas, mais tráfico, mais esquemas, mais economia paralela. Também há mais parabólicas…”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos filha escola exclusão campo filho mulher fome ajuda homem comunidade social doença pobreza deveres rapariga
Especialistas defendem que está na altura de fazer balanço e rever a lei do aborto
Passados três anos da vigência da lei que despenaliza o aborto até às dez semanas em Portugal, os especialistas consideram que o balanço é positivo, mas apontam para a necessidade de adequar o diploma à realidade. O elevado número de mulheres que, após uma interrupção de gravidez, falta à consulta de planeamento familiar (prevista na lei) e as repetições de aborto são as questões que mais preocupam os profissionais de saúde. Apesar de admitir que "tudo pode ser melhorado", o director-geral da Saúde, Francisco George, responde que "não é oportuno voltar a debater a IVG". (...)

Especialistas defendem que está na altura de fazer balanço e rever a lei do aborto
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-07-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: Passados três anos da vigência da lei que despenaliza o aborto até às dez semanas em Portugal, os especialistas consideram que o balanço é positivo, mas apontam para a necessidade de adequar o diploma à realidade. O elevado número de mulheres que, após uma interrupção de gravidez, falta à consulta de planeamento familiar (prevista na lei) e as repetições de aborto são as questões que mais preocupam os profissionais de saúde. Apesar de admitir que "tudo pode ser melhorado", o director-geral da Saúde, Francisco George, responde que "não é oportuno voltar a debater a IVG".
TEXTO: "Agora está na altura de começar a diminuir o número de abortos. Este ano será a prova de fogo", avisa Miguel Oliveira da Silva, presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV). Para o especialista - que aplaude os ganhos conseguidos na mortalidade e morbilidade materna associadas a abortos clandestinos -, está na hora de rever a lei. Preocupado com as mulheres que fazem um aborto e faltam à consulta de planeamento familiar - "é uma falta de civismo que uma mulher que faz um aborto de borla, às nossas custas, não se dê ao trabalho de comparecer à consulta" -, o médico volta a defender que o aborto deveria deixar de ser gratuito nos casos de reincidência. Os números de repetições de aborto em Portugal (340 mulheres das 19 mil que abortaram em 2009 fizeram-no duas vezes) estarão ainda abaixo da média de outros países. Luís Graça, director do serviço de Obstetrícia do Hospital de Santa Maria (Lisboa), insiste na defesa do pagamento da taxa moderadora e numa "eventual punição a posteriori" nos casos de repetição. "Um aborto deveria ser pago, tal como é paga uma operação ao apêndice", afirma. Referindo que apenas uma em cada três mulheres comparece à consulta de planeamento familiar, lembra que a "lei concedeu um direito, mas também acarreta deveres". Luís Graça elogia ainda o "inegável progresso nas mortes e complicações maternas" e critica a "vaga de objecções de consciência". Francisco George diz que "não faz sentido" debater uma revisão da lei e admite apenas que "é preciso reforçar as consultas de planeamento familiar". George defende ainda que "o problema das repetições de aborto é complexo e a solução não estará numa forma de repressão". "Foram 54 mil abortos, ou seja, 54 mil crianças que daqui a cinco anos estariam nas escolas portuguesas", diz a presidente da Federação Portuguesa Pela Vida, Isilda Pegado, defendendo uma revogação da lei e mais investimento no "apoio à maternidade". Duarte Vilar, director executivo da Associação para o Planeamento Familiar, afirma que é altura de "começar a debater o que deve ser adequado à realidade". E, além das falhas no planeamento familiar, lança mais uma acha na fogueira do debate sobre mudanças na lei e propõe que se avalie um eventual alargamento do prazo de dez semanas para a interrupção da gravidez (à semelhança de Espanha, onde o aborto foi recentemente despenalizado até às 14 semanas).
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave aborto lei mulher mulheres deveres
Ana Vidigal é pintora e nunca lhe passou pela cabeça ter filhos
Menina Limpa, Menina Suja é o nome da sua exposição antológica no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian. A mostra conta a história de uma menina bem comportada que aprendeu com Mae West que, quando era boa, era boa, quando era má, era muito melhor. A inauguração é a 22 de Julho. (...)

Ana Vidigal é pintora e nunca lhe passou pela cabeça ter filhos
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-07-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Menina Limpa, Menina Suja é o nome da sua exposição antológica no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian. A mostra conta a história de uma menina bem comportada que aprendeu com Mae West que, quando era boa, era boa, quando era má, era muito melhor. A inauguração é a 22 de Julho.
TEXTO: Ana Vidigal vai fazer 50 anos. Pinta há 30. As suas peças têm títulos como Secura de Boca Depois de Arfar, Sempre Gostei de Uma Flechada de Cupido, For All the Girls I Loved Before. Os assuntos do coração podem ser, são quase sempre, os seus assuntos. Interessam-lhe os "estragos emocionais" quando fala de um acontecimento que é eminentemente político - por exemplo, a guerra colonial. Faz parte do blogue Jugular. É feminista. "Posta" coisas que quer dizer, mais do que tudo, em imagens. Mas a política e a arte são campos que não gosta de misturar. Gosta de artistas como Louise Bourgeois ou Sophie Calle. Gosta de poesia. Trabalha sobre sedimentos, despojos, memórias, cartas, fotografias, a vida. Pinta quem é como outros escrevem quem são. Pinta sobre os vestígios de uma vida obsessivamente guardada, reconfigurada. O seu trabalho artístico, de certa forma, é um abrir de caixas, caixas, caixas. Faz um "trabalho paralelo" mais experimental que durante muito tempo não expôs na sua galeria de sempre, a 111. Muito disso está na exposição da Gulbenkian, a inaugurar-se a 22 de Julho. A entrevista aconteceu em casa. Tudo acontece em casa. Um mundo, uma infância, uma memória palpável confluem num único espaço. A casa tem vista para o rio, o bairro faz parte da geografia da família há mais de 20 anos. O atelier e a casa estão construídos em círculo; mais do que comunicantes, parecem umbilicais. Como na obra de Ana Vidigal, aliás. Um alimenta-se do outro. Existe por causa do outro. Um é sintoma do outro. É filha de uma família conservadora, de homens e mulheres licenciados há pelos menos duas gerações. Há na casa vestígios desse conforto e finesse. Nas louças antigas, numa cómoda de extremo bom gosto. O pai é arquitecto, a mãe é mãe. Ana é pintora e nunca lhe passou pela cabeça ser mãe. Isso seria outra vida, outra pessoa. Foi educada para ser uma menina limpa que podia sujar-se de vez em quando?Hum. Fui educada para ser uma menina limpinha. Tudo se transforma em 1974. A minha mãe, que foi educada para casar e ter filhos, pensou que o quadro anterior ao 25 de Abril se poderia manter; eu percebi rapidamente que a revolução me iria permitir, um dia que fosse autónoma, fazer aquilo que muito bem entendesse. O que é ser limpinha? A menina limpa corresponde ao modelo de uma família conservadora. Uma família de mulheres que estudaram, mas não trabalharam. Todas as minhas amigas de infância e adolescência casaram e tiveram filhos. Sou a única que exerço uma profissão que não me dá disponibilidade para mais nada. Sou uma menina de colégio de freiras. Andei até aos 15 anos, até 1976, nas Doroteias. O 25 de Abril afectou a vida da família? Houve uma mudança radical, no sentido de a família achar que algumas das suas prerrogativas deixavam de existir?Não. O meu pai não tinha qualquer actividade política, nem à esquerda nem à direita. Tinha sido chamado para fazer a tropa pela segunda vez. Isso foi a primeira desestabilização na família. Ele tinha 30 e poucos anos quando teve de ir para a Guiné e nós ficámos cá sozinhos com a nossa mãe. Quando foi o 25 de Abril, a mãe respirou de alívio: os meus irmãos já não seriam mobilizados. Era um sentimento muito presente nas famílias portuguesas: ou as famílias se desfaziam porque os homens fugiam para não ir à tropa; ou se desfaziam porque iam para a guerra e morriam. Há uma peça que evoca esse período. É uma cama feita com as cartas que os seus pais trocaram. Chama-se Penélope.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens guerra filha mulheres feminista