Rua da Madeira, Porto: Subindo a muralha
Subi-la é uma canseira mas em chegando ao topo está-se na Praça da Batalha. A antiga Calçada de Santa Teresa, agora Rua da Madeira, acompanha a antiga muralha da cidade. (...)

Rua da Madeira, Porto: Subindo a muralha
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Subi-la é uma canseira mas em chegando ao topo está-se na Praça da Batalha. A antiga Calçada de Santa Teresa, agora Rua da Madeira, acompanha a antiga muralha da cidade.
TEXTO: Vista do largo da Estação de S. Bento, a Rua da Madeira cria um estranho efeito de óptica. Parece pequena, parece estreita, parece que não vai ter saída e que, se a começarmos a percorrer, mais cedo ou mais tarde teremos de voltar para trás. Não é verdade, como qualquer incauto descobrirá se se meter por ela fora num dia de particular calor. Porque a rua, que parece um beco com uns cafés e restaurantes alinhados, alarga-se de repente, ganha corpo numa curva ampla que sobe, decidida, até se encontrar com uma pequena escadaria que termina em mais uma subida. É uma canseira, a Rua da Madeira, bem mais traiçoeira que a sua vizinha e rectilínea 31 de Janeiro, que não engana ninguém e mostra logo ao que vai, sempre a subir até Santa Catarina. Pela Madeira, chegamos à Praça da Batalha sem saber que era ali que íamos dar e a pensar como é que nunca reparámos naquela rua encaixada entre um hotel e um café com a esplanada carregada de turistas. A verdade é que devíamos ter sido mais prevenidos. Sabíamos que a rua seguia o percurso da antiga muralha da cidade e, se ali há uma ligação entre a zona baixa e a zona alta, era certo que só podíamos ter de subir e subir. Antes de mudar o nome para Rua da Madeira, na primeira década do século XX, a artéria era a Calçada da Teresa, nome cuja origem ainda permanece um mistério, embora se admita que pudesse existir alguma moradora com esse nome. Antes, também, a Calçada da Teresa não fazia fronteira com uma estação ferroviária, não era local de onde se podiam ver os comboios, mas sim a via que corria ao lado do Mosteiro de S. Bento de Avé-Maria, que existia antes de ser demolido para que a modernidade feita locomotiva chegasse ao centro da cidade. O primeiro comboio chegou à estação em 1896 e, por essa altura, já o Café Brasil, no início da rua, se tinha transformado num dos pontos de encontro do Porto. Aberto em 1859, lá continua, ao lado de outros locais bem conhecidos dos portuenses, como os restaurantes O Rápido (memória do nome que se dava ao comboio que ligava o Porto a Lisboa, saindo de São Bento) ou Viseu no Porto, que são exemplos de resistência. Porque a Rua da Madeira foi, durante anos e anos, um dos locais esquecidos da cidade. Encaixada entre a lateral da estação, com os seus armazéns, e as traseiras dos prédios da Rua 31 de Janeiro, com alguns restaurantes e tascas, estrategicamente instalados antes de se começar a subir a sério, não era local que atraísse portuenses e turistas, apesar de estar mesmo no centro. A excepção era o domingo de manhã, quando a Feira dos Passarinhos animava a rua, enchendo-se de aves e tudo o mais que os vendedores levavam. Nunca foi legalizada, mas era tolerada, e há quem ainda lamente a sua partida, há mais de dez anos, para as imediações da Cadeia da Relação. Depois disso, a rua parece ter-se fechado sobre si própria. De dia, quase não se dava por ela. À noite, era procurada por sem-abrigo e prostitutas. À Câmara do Porto, iam, amiúde, donos dos restaurantes locais pedir que, pelo menos, não se esquecessem de ir lá limpar a artéria, de vez em quando, já que o negócio se ressentia do abandono e do mau cheiro que a sujidade trazia. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Este ano, uma nova Locomotiva está a ver se dá a volta à rua. O programa de animação cultural tem levado diversas actividades à Rua da Madeira, e o que era antes um local de estacionamento, junto aos armazéns da Refer, na estação, é hoje uma área de acesso controlado, com sofás protegidos do sol. E, lá ao cimo, junto às escadas, o edifício da antiga Fábrica de Máquinas Agostinho Ricon Peres parece agora estar disfarçado de zebra, depois de uma intervenção da dupla italiana de artistas de rua Sten & Lex. Os serviços da câmara parecem ter incluído definitivamente a Madeira no seu roteiro de limpeza e os turistas aventuram-se nos restaurantes típicos que acompanham a antiga subida da muralha. Ainda é cedo para dizer que a Rua da Madeira tem uma nova vida. Que a mudança terá um impacto tão grande como quando uma outra locomotiva, de ferro e a fazer esvoaçar fumaça em todas as direcções, estacionou ali ao pé. Mas é bom que não seja preciso tapar o nariz quando se sobe, de S. Bento até à Batalha. Quando se pára, a meio da subida, para apreciar a vista da boca dos túneis de onde surgem dos comboios e as locomotivas estacionadas na estação. Ou quando nos voltamos, já nas escadas, para apreciar a vista da cidade, com a Torre dos Clérigos a parecer, dali, particularmente alta e destacada do cenário. Só por isso (e pelos filetes de polvo que comemos num dos restaurantes da rua) já valeu o esforço.
REFERÊNCIAS:
Um planeta chamado infância
A Laura, a Margarida, a Marta, o Martim, a Matilde e o Pedro fizeram os seus auto-retratos, com fotografia, desenhos, palavras. Falaram do brincar, dos sonhos, das pessoas importantes da sua vida, dos lugares para onde dirigem a atenção. Mostraram-se crianças como as outras, pessoas como as outras. Ou seja, todas diferentes entre si. 1 de Junho é Dia da Criança. (...)

Um planeta chamado infância
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Laura, a Margarida, a Marta, o Martim, a Matilde e o Pedro fizeram os seus auto-retratos, com fotografia, desenhos, palavras. Falaram do brincar, dos sonhos, das pessoas importantes da sua vida, dos lugares para onde dirigem a atenção. Mostraram-se crianças como as outras, pessoas como as outras. Ou seja, todas diferentes entre si. 1 de Junho é Dia da Criança.
TEXTO: Chamo-me Martim, fiz dez anos em Janeiro. Vivo com o meu pai e a minha mãe, o Ricardo e Sónia. Os meus irmãos chamam-se Manel, Madalena e Mateus. Tenho um cão, o Mojito. Acho que sou um menino feliz. Porque tenho tudo o que é preciso para ser feliz. Tenho pais, irmãos, avós, tios. Tenho uma casa. Não queria mudar nada na minha família. O dia mais feliz da minha vida foi quando a minha irmã nasceu. Eu queria um irmão mais novo. Eu queria ser o irmão mais velho. Ao princípio, tive ciúmes. Depois, sorriu para mim e comecei a gostar dela. As pessoas mais importantes para mim são os meus irmãos e os meus pais. Com o Manel, gosto de brincar. De vez em quando andamos à pancada porque gozo com ele e ele fica demasiado irritado. Digo-lhe: “Não jogas nada de futebol!” O Manel tem 13, vai fazer 14. Dividimos o quarto. Partilhamos as coisas. Prefiro assim. A Madalena pede-me muitas coisas. Por exemplo, para desenhar com ela. Tem cinco anos. Às vezes vou buscá-la à escola de trotinete, e ela queixa-se: “Não me trouxeste a minha trotinete!” Nunca fui buscá-la sozinho, mas às vezes vou à mercearia sozinho. A primeira vez que andei sozinho tinha quase nove anos. Fui comprar batatas e outras coisas para uma festa cá em casa. Gosto da responsabilidade, apesar do medo de perder o dinheiro ou de me esquecer do recado. O Mateus tem seis meses. Estou sempre a brincar com ele. A fazer com que se ria. A relação com o pai e a mãe é diferente. Com o pai, gosto, quando ele não está à espera, de lhe tocar no ombro e fugir. Outras vezes, brinca comigo a torcer os dedos, aos encontrões. Com a mãe: gosto de fazer piadas que a façam rir. É um tipo de brincadeira que não sei explicar. A mãe é mais meiguinha. Quer abraçar-me muito e eu deixo-me abraçar, mais ou menos. Como é que imagino que vai ser a minha vida? Ocupada. Gostava de ser tenista profissional. Sendo tenista, tendo dois ou três filhos, uma mulher desempregada ou com emprego, acho que teria o mesmo dinheiro que os meus pais têm agora. Quando tinha seis anos, recebi uma nota de 50 euros. Dos meus avós. Os meus pais também me deram uma nota de 50. Fiquei louco, louco! Comecei a gostar de ter dinheiro — para poupar. Tenho 400 euros ou mais. Gasto algum dinheiro, cinco, dez euros. Para gelados, nas férias. Agora ganho num mês, pelo menos, 20 euros. Os meus pais fizeram uma coisa: nos testes, se tirarmos negativa, temos de lhes dar dinheiro. Satisfaz: damos-lhes cinco euros. Bom: dão-nos 12 euros. Muito bom: é 24. Eu andava a tirar “satisfaz” a mais e o Manel a ter negativas. Se não fosse o dinheiro, trabalhava na mesma, mas assim é como ter uma profissão: trabalho para ganhar dinheiro. No dia a dia, não penso muito no preço das coisas. Não sei quanto custam as coisas no supermercado. Com este dinheiro, se oferecesse um presente, dava aos meus pais uma viagem ao Brasil. Aos meus avós, depende. Os avós maternos: estão separados. Para a avó, uma ida à Madeira. Para o avô, uma prova de vinhos. Para o avô paterno, uma ida ao teatro. Para a avó materna, um curso de cozinha. Destes presentes todos, a prova de vinhos está excluída. Já provei vinho. Não gostei do sabor. De cerveja, gosto. Gosto mas não bebo. Se o ténis não correr bem, posso ser negociador. Negociador de várias coisas. Tenho talento para convencer as pessoas. [longa pausa] Há uma coisa que quero saber: o que é ser adulto?Eu sou a Marta. Tenho oito anos. A minha vida está a correr bem. Não está a correr nada mal. Tenho três irmãos, uma irmã e dois irmãos. Sou a segunda. Primeiro foram as meninas e depois os rapazes. Agora partilho o quarto com a minha irmã. Temos um beliche. Durmo na parte de baixo, mas vamos trocando. Acordo às sete da manhã. Primeiro visto-me e depois tomo o pequeno-almoço. Uma torrada e leite. Depois vou de carro para a escola. Demora meia hora. Vivo em Oeiras e a escola é no Cacém. Andamos os três mais velhos nesta escola. O mais pequenino, não, anda na pré. Os pais vão buscar-nos à escola às três da tarde, à terça e à quarta. No resto da semana, é uma amiga. De manhã, são os pais que nos levam. Esta amiga deixa os filhos no nosso carro, e eles vão connosco. Costumo brincar à apanhada. Nos intervalos vamos ao parque. Temos um parque ao pé da escola. Gosto de ver as plantas. Há umas que se pode chupar. É assim: a planta tem uma parte que se chupa e sai um suco docinho. Não sei o nome da planta. Tenho muitas flores preferidas, mas aquela de que gosto muito é a tulipa. No parque não há tulipas, mas o nosso vizinho tem flores, e costumo ver as tulipas dele. Nós temos plantas, em casa. Manjericão plantado. Está na varanda e os pombos vão lá. Em casa ajudo a mãe a cozinhar. Não gosto de polvo, lulas, cogumelos, camarão. O cogumelo não tem sabor, mas a textura. . . Do polvo e da lula, também é da textura que não gosto. De lula grelhada é que não gosto mesmo nada! Às vezes tenho de comer, outras vezes, não. Gosto de lasanha, bife, do peixe que a minha mãe faz. E gosto muito de limpar!, de ver tudo organizado. O meu pai é pastor evangélico. Penso todos os dias em Deus. Fazemos o culto doméstico no final do dia, ao domingo fazemos o culto na igreja. Depois da refeição, vamos buscar as bíblias e o meu pai lê. Depois dizemos versículos de cor. Depois eu e os meus irmãos lemos alguns versículos. Depois a minha mãe conta histórias da Bíblia. Depois cantamos alguma coisa. Depois vamos para a cama. Gosto muito do culto de domingo. A minha parte preferida é quando cantamos. Deitamo-nos às oito ou nove. Quase não vemos televisão. Ao domingo, temos o culto, de manhã. Durante a semana também não dá. Ao sábado, vemos um bocadinho. O que gosto mais é Os Cinco em Acção. Não penso no futuro. Simplesmente faço o que acontece. Não penso se vou casar ou ter filhos. Mas gostava de ser cantora. Gosto muito da Marisa Monte. O meu pai também é músico. Não conheço as canções todas, que ele tem muitas!Gosto muito da minha família, dos meus amigos. A minha melhor amiga é a Fabiana, que conheci no acampamento das crianças de Água de Madeiros, no ano passado. (Água de Madeiros é muito longe!) Tenho outra melhor amiga, que vive ao pé de mim, a Inês. Não costumo estar muito sossegada. Mas sou um bocadinho tímida. Às vezes sou distraída, outras vezes sou atenta. Sou parecida com a minha mãe, de cara. Apesar de não ter caracóis. Tinha, quando era pequenina. Mas perdi-os. Os desenhos: agora já não faço tudo à pressa. Faço devagar, para sair bem. Mas quem desenha mesmo bem é a minha irmã, que tem 11 anos. Somos amigas. Como ela está no quinto ano e eu no segundo, ajuda-me com os trabalhos. Gosta mesmo muito de ler. Emprestaram-lhe a colecção Uma Aventura e está a ler aquilo tudo. Eu também gosto de ler. Nós os três gostamos de Português e não gostamos de Matemática. Eu estou bem na Matemática, mas não gosto das matérias. Quero fazer-te uma pergunta: quantos anos tens?De manhã acordo, como toda a gente. Acordo às 6h45. Não acordo sozinha porque ainda tenho preguiça. Já sou bastante autónoma. Gosto de me aventurar. Aventura é descobrir coisas novas. Correr riscos. (Correr o risco de não saber qual é a página do TPC, não o fazer, e ver o que acontece. O que é que a professora vai fazer?, os pais vão-me pôr de castigo ou não?)As pessoas fundamentais da minha vida são a minha mãe e o meu pai. A minha mãe é uma pessoa muito simpática, com grande carácter e sempre alegre. Está sempre lá para nos ajudar. Tem cara de advogada, mas não é advogada. O meu pai é uma pessoa com características muito fortes, que se diverte muito e é muito divertido. Tem cara de pessoa que faz filmes de animação. Gosto muito dele. Foi em quem me inspirei mais. Somos muito parecidos. Fazemos piadas. Tem aquelas frases que nos fazem ser uma pessoa melhor. Por exemplo: “Pai, ajuda-me com os trabalhos de casa. ” “Não, Margarida. Porque quando fores maior, não vais ter ninguém que te ajude. Tens de aprender a fazer as coisas sozinha. ”Outras pessoas importantes: a Jô. É a senhora que limpa a casa e trata de nós. Está lá em casa desde que nasci. Foi como uma segunda mãe para mim. O meu irmão Francisco tem menos dois anos do que eu. Zangamo-nos muito, como é normal. Temos muito em comum, brincamos, ajudo-os nos trabalhos. Há uma coisa em que somos completamente diferentes: ele é muito meiguinho e eu sou um bocadinho mais bruta. Não é para ofender as pessoas, mas digo mesmo o que penso, e isso nunca me ajuda muito. É um defeito que tenho. Também pode ajudar as pessoas a mudar. O meu irmão António: é como se eu me preparasse para ter um filho. Sou cinco anos mais velha. Nunca lhe mudei a fralda. Aos sábados, dou-lhe banho. Em casa, se a minha mãe está doente e o meu pai está fora, dou-lhe o jantar. É uma questão de paciência. Alguém tem de o fazer. A minha avó Sheila é muito importante. Ela ensina-me a criatividade e a abstracção. É muito solta. Tem umas folhas grandes onde podemos pintar. É uma avó mais para o lado divertido. A minha avó Margui, que não se chama Margui, mas é o que lhe chamamos, também brinca muito comigo. Ensina-me a jogar jogos de cartas. Preocupa-se com as notas e a escola. “Margarida, faz os trabalhos. Se não fizeres agora, fazes logo, mas tens de fazer. ” É mais calma. No almoço de domingo, estou com ela, os meus primos, os meus tios. Aos sábados, também costumo estar. A minha mãe fala comigo em inglês. Tenho sangue de lá. O inglês ajuda-me. Fico preparada para correr o mundo inteiro. Índia, Nova Iorque, México. Falo inglês com a minha avó Sheila. Naturalmente. Se não sei alguma palavra, paro e digo em português. Gostava de ter uma boa vida, no futuro. Viver bem. Ser bom no que se faz. Ter orgulho em quem se é. Gostava de ter dois filhos. Um, não. Posso mimá-lo demasiado. Pode ser uma menina e um rapaz. Assim, posso estar concentrada nos dois. Mais fácil do que três. Estou a trabalhar na escola para ter boas notas, entrar numa universidade e ter o meu trabalho de sonho. O que quero mesmo muito, muito é ser cozinheira. Chef de cozinha. Gosto de ajudar o meu pai na cozinha. A minha tia entrou no Master Chef e isso empolgou ainda mais o meu gosto pela cozinha. Empolgou: estas palavras aprendo na leitura. Leio livros de aventura, de magia. Agora estou a ler o Harry Potter, em português. Música, ah, pois. O meu avô está muito ligado à música, a minha mãe, também. Fui para uma escola de música quando tinha cinco anos. Sempre gostei da flauta transversal e da lira, que é o símbolo da Academia de Música de Santa Cecília. Só que não pude ir para a lira. A lira é muito cara e há pouca gente que a toque. É uma harpa pequenina. Antigamente é que se tocava. Não gosto muito de cantar porque tenho nódulos nas cordas vocais. Adoro, adoro, adoro dançar. Gostava de aprender breakdance e dança contemporânea, tenho aulas de hip hop. Samba, vou aprendendo, com a Jô, que é brasileira. Uma coisa que me esqueci de mencionar: adoro ler. Gosto de acabar livros e saber o fim da história. Também gosto de ver jogos de futebol com o meu pai. Vamos ao estádio do Sporting. E gosto de viajar. Já fui a Paris, à Disneylândia, a Londres, a Nova Iorque, a Espanha, Alemanha. O meu nome é Pedro, nasci no dia 23 de Setembro de 2006. As minhas festas de anos normalmente não são temáticas, mas a última foi sobre culinária e fizemos pizzas. A cozinha lá de casa era pequenina para seis meninos. Tenho uma família boa. A família principal é constituída por: avô, avó, outro avô e outra avó, pai e mãe e a minha irmã. Se for a família maior, acrescento os meus primos, os meus tios, os tios-avós, os tios-avôs. A minha rotina também é boa. Acordo às oito. Tenho oito anos mas continuo a gostar de comer Nestum. Depois vou lavar os dentes. Depois dispo o pijama e visto a roupa. Depois pomos os lanches na mochila e vamos para a escola. Vamos a pé. Vivo perto da escola, nos Anjos. É uma escola pública. Quando acaba a escola, o pai, a mãe ou a avó vêm buscar-me. Nunca é às cinco e meia. Há uma coisa que é o Centro de Apoio à Família para pais que chegam mais tarde. Às terças e quintas, faço ginástica. Estou uma semana com o pai e uma semana com a mãe. Na semana da mãe, às terças-feiras ficamos com o pai, e na semana do pai às segundas-feiras ficamos com a mãe. Estou habituado a isto. Estão separados desde a pré-primária. As minhas amigas meninas são mais do que os amigos rapazes. Porque eu não costumo jogar à bola. Fora da escola, até jogo. Mas na escola fazem batota. E quando uma equipa ganha, começam à bulha. Nunca andei à bulha com ninguém. O assunto de que gosto de falar é animais. Rapazes e raparigas não costumam prestar atenção. Estão mais interessados em brincar. Eu também brinco. Brincamos aos pais e às mães. Brincar aos pais e às mães é assim: existe um pai, existe uma mãe. Às vezes existe apenas uma mãe. Os outros são os filhos. Existe o mais velho, o mais novo. Às vezes até existe um bebé. De vez em quando existe um animal de estimação. É mais ou menos brincar ao faz-de-conta. O pai ou a mãe mudam a fralda e dizem: “Vão pôr a mesa. ” Há cenas mais dramáticas, uma filha foge de casa. A família toda vai procurar essa filha. Eu gosto mais de fazer de filho ou de animal de estimação. Recebo a atenção dos outros. Tenho um vocabulário bom. Aprendo lendo muitos livros, ouvindo os pais a falar. Os meus livros preferidos são os do Harry Potter. Conheço a história da Menina do Mar e da Fada Oriana porque a minha mãe leu à noite, a mim e à minha irmã. O meu pai está a ler o Dom Quixote para nós. É um livro mais para adultos. Ainda não chegámos a essa parte, mas já ouvi falar do Sancho Pança. A minha irmã tem uma camisola que a minha mãe trouxe de um país que já não me lembro qual é, e que tem o Dom Quixote e o Sancho Pança. Ser adulto é ter a responsabilidade de cuidar de mim mesmo, das minhas coisas. É ter a responsabilidade de ganhar dinheiro para me alimentar e alimentar a minha família. Ser criança não é o melhor do mundo, mas ser adulto também não é o pior do mundo. O meu animal preferido é o flamingo. A minha cor preferida é violeta, mas não há nenhum animal violeta. A segunda cor é rosa. E o flamingo é cor-de-rosa. No futuro gostava de ter filhos. Dois ou um. Uma casa arrumada. Um bom emprego. Um bom emprego é um emprego em que uma pessoa trabalha bem e recebe bem. Quero ser zoólogo, veterinário e poeta. Não faço poesia, mas gostava de ser poeta. Um poeta escreve poemas que são versos bonitos; podem não ser bonitos, mas acho que deviam ser bonitos. Servem para as pessoas lerem e sentirem-se felizes. 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REFERÊNCIAS:
Entre os nus de Mapplethorpe e o parafuso: a distância de Serralves à Pasteleira
Na Pasteleira, as polémicas notícias de Serralves passam. Mas não entram. Está a vida no bairro forçosamente apartada da arte de um museu? As opiniões e queixas dos vizinhos de Serralves. E a história de um parafuso que se fez metáfora (...)

Entre os nus de Mapplethorpe e o parafuso: a distância de Serralves à Pasteleira
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-03-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: Na Pasteleira, as polémicas notícias de Serralves passam. Mas não entram. Está a vida no bairro forçosamente apartada da arte de um museu? As opiniões e queixas dos vizinhos de Serralves. E a história de um parafuso que se fez metáfora
TEXTO: — Sabes porque é que o bairro não vai a Serralves? Porque nós somos pobres e Serralves é para os ricos. Conceição Soares ajeita-se na cadeira de plástico como quem acomoda os pensamentos. À porta da Associação de Moradores do Bairro Antigo da Pasteleira, compõe o avental rosa vivo. Abana a cabeça e prossegue a argumentação, entre o facto consumado e o lamento das coisas que não têm remédio: “Alguma vez o bairro é para ali chamado?!”Pasteleira e Serralves são quase siamesas no mapa da cidade. Das janelas de algumas casas do bairro vêem-se os jardins do museu. Mas a rua que separa os edifícios amarelo pálido e o muro de pedra a circundar os jardins do museu fez-se fosso profundo entre dois mundos. A polémica exposição de Robert Mapplethorpe e a demissão do director do museu bateram à porta do bairro? “Isso não é connosco”, conforma-se Jorge Cunha, sob o aceno dos dois vizinhos do lado. As opiniões atropelam-se perante o desafio inesperado. Aos cinco moradores que desfiavam conversa à porta da associação, bloco 13 do bairro com mais de 1500 moradores, vai-se juntando mais gente. Palpite de um lado, provocação do outro, gargalhada geral. E Jorge Vidal, o presidente, a pôr ordem na agenda: “O que aconteceu foi a demissão do director”, comunica. E logo Rosa, anexada à conversa há poucos segundos, se lembra do que ouviu na televisão por estes dias: “É por causa dos nus!”Vidal despega-se da galhofa para deixar uma opinião organizada. “Pode escrever”, apela: “Se a exposição traduz o sexo tem de ter um letreiro. Acho bem que exista, mas as crianças não podem ver. ” Camisola vermelha, grave semblante, calças de ganga a prender um molho de chaves: “Se a administração interferiu está mal. Eu também me demitia. ” Palavra de presidente. Debate-se o “benefício zero” da condição de vizinho de Serralves quando, ao fundo da rua, entalada entre dois blocos do bairro, se avista “Cocas”. José Silva no Cartão de Cidadão. “Oh Cocas, tem calma que o Benfica ganha para a semana”, brinca uma moradora, a aludir ao empate da equipa da Luz em terras transmontanas na noite anterior: “Queres um pastel de Chaves?”. Risada faustosa de um lado, um aviso a enterrar o tema do outro: “Sou do Benfica até morrer”. José “Cocas” é figura emblemática do bairro. E jornalistas não são novidade para ele: pai do “Siga”, o “rei da Pasteleira”, que há uns anos se fez notícia pelas suas fugas à policia, Silva deu na altura várias entrevistas a jornais. Foi à televisão. E só lamenta que isso não lhe tenha valido uns trocos extra. Em Serralves, entrou uma única vez. Nada que o impeça de formular teorias sobre as fotografias da discórdia no Museu de Arte Contemporânea. — A professora não ensina o nu nas escolas? Então não pode estar numa exposição porquê?— Então achas bem pornografia?! É verdade que a canalha agora já nasce ensinada. . . Mas aquilo era uma quinta antes. Não acho jeito nenhum aquela exposição. José “Cocas” encolhe os ombros — “esta é revolucionária”, segreda perante o confronto de Rosa, para logo deixar soar alto: “Vê lá se queres voltar aos anos 70!” E a vizinha de resposta pronta: “Nos anos 70 a gente namorava no R/C e aparecia grávida no primeiro andar. ” José “Cocas” desiste do debate. Leva um parafuso na mão e anuncia estar apenas de passagem para a drogaria mais próxima: o trabalho avolumou-se por estes dias e precisa de comprar mais peças. Mas a urgência não é coisa que vença quem passa no bloco 13. “É o conforto de passagem”, comenta, baixinho, o presidente da associação. “Cocas” pede um copo, deixa-se ficar mais um pouco. No bairro, as notícias de Serralves passam, mas não entram. Não há visitantes habituais do museu no grupo ali formado. Aventuram-se no território vizinho no Serralves em Festa, na celebração de Outono deste fim-de-semana. Eventos de portas abertas, sem bilhete pago. Pouco mais do que isso. Regalias de proximidade, garantem, não existem: nessa matéria, Serralves está tão longe deles como de Campanhã. Um divórcio sem brigas, apenas um divórcio: “Nunca negociámos nada com Serralves. Nem nós fomos lá, nem eles cá”, admite Jorge Vidal, morador há nove anos, presidente há quatro, antigo trabalhador da Singer e ex-guardião da igreja da Lapa. “Claro que um bairro também pode ir a um museu”, responde, assertivo, quando questionado pelos porquês do afastamento: “Mas há uma distância tão grande entre aquilo e isto”, aponta a aceitar uma espécie de destino traçado: “Talvez não seja para nós. . . mas quem sabe um dia a gente fale. ”No Café Carlos, noutro bloco do bairro, esmiúçam-se memórias de cenários inverosímeis para os mais pequenos. “Isto era a Quinta de Riba d’Ave”, aponta Manuel Nogueira, 47 anos de vida e de bairro, logo corrigido por Marta Ferreira, a proprietária do café: “A Quinta do Conde, era assim que eu lhe chamava”. Manuel sorri como se ainda fosse miúdo na Pasteleira e deixa-se levar pelas lembranças pueris: “Entrava por um portãozinho de metal que ainda hoje existe e ia lá buscar couves. A caminho da [escola] Leonardo Coimbra apanhávamos laranjas, sempre de olho nos cães para não nos apanharem. ”Arquitectada para residência privada pelo segundo Conde de Vizela, Carlos Alberto Cabral, a casa e parque de Serralves ergueram-se entre 1925 e 1944. Mas a família não ficou ali por muitos anos. Em 1955 a propriedade era vendida a Delfim Ferreira, Conde de Riba d’Ave, sob o compromisso de manter o espaço tal e qual como era. E três anos depois, os primeiros moradores da Pasteleira ocupavam o bloco 1 do bairro ali ao lado. Margarida Cunha, ao balcão do café, ouve a conversa e acrescenta uns pozinhos. Não se alonga sobre a controvérsia dos quadros de Mapplethorpe — “ouvir falar ouvi, mas entra a 100 e sai a 200, a gente aqui tem mais em que pensar” —, mas deixa-se ficar se o desafio é falar sobre a Pasteleira e “Serralves antigo”: “Ia lá buscar o leite à lavradeira”, recorda, “a minha filha vai fazer 40 anos, veja há quanto tempo foi. ” Margarida traz letras tatuadas no braço esquerdo: P D P R: “São os nomes dos meus netos: Pedro, Diogo, Paulo e Rafael. ” É com eles — e os três filhos — que ocupa o pensamento. Por eles, jura agarrar-se bem às muletas este fim-de-semana e esquecer as dores para passear na Festa do Outono de Serralves. “Nesses dias a gente vai. Agora o resto. . . não nos diz respeito. ”A cidade passa ao lado da Pasteleira. Há dias, dezenas de pessoas manifestaram-se pela alegada “censura” a João Ribas. A poucos metros dali e tão distante. De manhã e ao fim da tarde, carros de alta cilindrada passam para apanhar as crianças no Colégio Francês. A poucos metros e milhares de quilómetros. Um casal de turistas pedala por ali, alheio a rótulos de zona perigosa. Na Pasteleira sem saberem. Museu e bairro partilham uma geografia, mas são universos apartados. Não se olham, não se vêem, nunca se tocam. Será que “nascer numa viela inclinada de Lordelo”, como questionava em 1994 Luís Fernandes, no prefácio da obra Pasteleira City, do morador Raul Simões Pinto, “traça a sina a um homem”? Será a vida no bairro forçosamente apartada da arte de um museu? “Ninguém quer saber de nós, a menos que haja roubos, aí já falam do bairro”, queixa-se Jorge Cunha. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quadros em paredes brancas de assinatura Pritzker não amansam o quotidiano, às vezes bravo, de quem ali mora. Mas engane-se quem vê no bairro apenas um caldo de tristezas. Naquele, plantado em zona nobre da cidade, criou-se e ganhou a sua primeira alcunha (“Carlos Tarado Musical”) o letrista Carlos Tê. Por ali, passou Aurélia Monteiro (a “Lela” ou “Ceguinha dos 9”), musa da escultura da Menina Nua que milhares fotografam, ainda hoje, na Avenida dos Aliados. “Aqui Serralves passa ao lado”, concede Marta Ferreira como se desse a sentença alheia a dilemas da elite. Serralves está tão longe da Pasteleira que nem o sonho de Serralves, de cultura e saber, parece caber ali. Mas não ir a exposições é apenas uma linha na definição deles. O bairro é um manifesto colectivo: gente nas ruas, nomes decorados, alcunhas para quase todos, gargalhadas sem aviso prévio, paradigmas de lealdade talvez alheios a museus. Jorge Vidal acaba de mostrar os troféus que enchem a associação de orgulho e José “Cocas” ainda ali está, sentado numa cadeira no “corredor do conforto”. Não foi à drogaria comprar os parafusos, mas “Xerife” pôs-se no carro e foi lá por ele. “Cocas” estende a mão já recheada dos objectos metálicos e mostra a cultura que ali verdadeiramente importa: “Quem tem amigos não morre na cadeia. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave trabalhador filha escola cultura homem sexo espécie cães divórcio
O maior desastre nuclear chega aos ecrãs com Chernobyl, 33 anos depois
Protagonizada por Jared Harris, Stellan Skarsgård e Emily Watson, a minissérie é um recuar no tempo ao momento zero do desastre nuclear — e à forma como a catástrofe foi gerida pela comunidade soviética. (...)

O maior desastre nuclear chega aos ecrãs com Chernobyl, 33 anos depois
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-07-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: Protagonizada por Jared Harris, Stellan Skarsgård e Emily Watson, a minissérie é um recuar no tempo ao momento zero do desastre nuclear — e à forma como a catástrofe foi gerida pela comunidade soviética.
TEXTO: Passaram 33 anos desde o desastre em Tchernobil, o maior acidente nuclear da História. O que aconteceu, afinal? Quem foram as pessoas que tentaram evitar a catástrofe? A minissérie da HBO, Chernobyl, tenta dar resposta a estas questões. A série estreia-se em Portugal no dia 7 de Maio e só estará disponível no serviço de streaming HBO Portugal (que chegou em Fevereiro a solo nacional). Para já, só está prevista uma temporada com cinco episódios. O primeiro episódio tem o nome “1:23:45”, a hora a que foi accionado o botão de emergência no reactor nuclear número 4 da central de Tchernobil pelo supervisor nocturno Alexander Akimov (interpretado por Sam Throughton) — foi o momento zero daquela que viria a ser uma das maiores catástrofes da humanidade. Tudo aconteceu na noite de 25 para 26 de Abril de 1986. O criador da série é o norte-americano Craig Mazin, cujo currículo não faria adivinhar uma viragem para um registo mais sério e documental: Mazin foi um dos argumentistas por detrás dos filmes Scary Movie 3 e Scary Movie 4, assim como A Ressaca — Parte II e Super-Herói: O Filme. O trailer da minissérie deixa claro que o tom é bem diferente e mais sombrio, como seria de esperar de um tema como Tchernobil. A primeira frase que se ouve no trailer mostra-o: “Não houve nada são em relação a Tchernobil. ” Os cinco episódios, grande parte deles filmados na Lituânia, são realizados por Johan Renck, que também trabalhou em The Walking Dead e Bates Motel. “Tchernobil está a arder e cada átomo de urânio é como uma bala que penetra tudo no seu encalço: o metal, o cimento, a carne humana. Tchernobil tem mais de três biliões destas balas. E algumas delas não pararão de ser disparadas ao longo de 50 mil anos”, assevera a personagem do químico Valery Legasov (interpretada por Jared Harris) no trailer divulgado no final de Março. Legasov foi o cientista chamado pelo regime soviético depois do acidente nuclear e, enquanto as autoridades tentavam minimizar o impacto do desastre, foi um dos primeiros a aperceber-se das verdadeiras consequências da radioactividade na saúde humana. Dois anos depois do desastre, Legasov suicidou-se. Na sua extensa carreira de representação, esta não é a primeira vez que Harris interpreta um papel de alguém que parece condenado: fê-lo no papel de rei Jorge VI na série The Crown ou com Lane Pryce, em Mad Men. Também interpretou Andy Warhol (Um Tiro para Andy Warhol, 1996) e o arqui-inimigo de Sherlock Holmes, James Moriarty (Sherlock Holmes: Jogo de Sombras, 2011). “Estamos a lidar com algo que nunca aconteceu antes neste planeta”, ouve-se no trailer, em inglês — o idioma da minissérie, ainda que a acção se desenrole na União Soviética e conte com uma mão-cheia de actores que não são anglo-saxónicos. A série começa com um vislumbre dos momentos que se seguiram ao acidente nuclear: a evacuação da zona, a incerteza quanto aos mecanismos de segurança a serem tomados, os animais a sofrerem os danos, os homens e mulheres outrora saudáveis que morreram numa questão de semanas, dias até. A dois quilómetros da central, os 50 mil habitantes da cidade de Pripiat (agora fantasma) ficaram durante 36 horas a serem contaminados, sem o saberem, com os materiais radioactivos que foram lançados com a explosão do reactor. Depois, as autoridades soviéticas chegaram e levaram-nos em autocarros — o mundo ainda não sabia do perigo à espreita. Foi ainda preciso lutar durante 12 dias contra um incêndio da grafite, um material presente no núcleo deste tipo de reactores; muitos dos bombeiros não tinham protecção adequada e acabaram por sentir na pele os efeitos da radioactividade. Hoje, nos quatro mil quilómetros quadrados da zona de exclusão criada na Ucrânia e na Bielorrússia, a vida foi voltando através dos animais e das plantas que brotaram do solo radioactivo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O enredo tenta explorar o motivo por trás da catástrofe, mas a série vai além do relato do desastre. A HBO diz que esta é a “verdadeira história que não foi contada”. Segue a história das pessoas que tentaram salvar vidas e que tentaram controlar a propagação da catástrofe: além de Valery Legasov, há a física Ulana Khomiuk (Emily Watson, duas vezes nomeada para Óscar de Melhor Actriz) e o então vice-primeiro-ministro soviético Boris Scherbina (interpretado pelo sueco Stellan Skarsgård, que entrou em O Bom Rebelde, Ninfomaníaca, Piratas das Caraíbas e Os Vingadores). Estes dois últimos já tinham contracenado no filme de 1996 de Lars von Trier, Ondas de Paixão. O site especializado IndieWire adianta que, a acompanhar a série semanal, existirá um podcast “de companhia”: chama-se “The Chernobyl Podcast” e será apresentado pelo criador da série, Craig Mazin (que também participa num para argumentistas, chamado “Scriptnotes”) e pelo actor e apresentador do podcast Wait Wait, Don’t Tell Me, Peter Sagal. A missão do programa áudio é dar um olhar mais aprofundado às histórias reais que serviram de base à narrativa da série, explicando a forma como “moldaram as cenas, as personagens e os temas representados”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens exclusão carne mulheres
Petição anti-eutanásia vai mesmo a plenário
Desde 2015, deram entrada 512 petições , 364 foram concluídas, há 97 em apreciação, 23 aguardam deliberação sobre admissibilidade. Foram propostas para apreciação em plenário 28. (...)

Petição anti-eutanásia vai mesmo a plenário
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Desde 2015, deram entrada 512 petições , 364 foram concluídas, há 97 em apreciação, 23 aguardam deliberação sobre admissibilidade. Foram propostas para apreciação em plenário 28.
TEXTO: A Federação Portuguesa pela Vida, promotora da petição Toda a vida tem dignidade, com 14. 196 assinaturas, quer mesmo que a sua iniciativa seja discutida no plenário da Assembleia da República, apesar de os projectos de lei que previam a despenalização da morte assistida terem sido todos rejeitados no final de Maio. A garantia foi dada ao PÚBLICO por António Pinheiro Torres, dirigente da federação. “Claro que queremos que a nossa petição seja apreciada; era essa a intenção dos milhares de pessoas que a assinaram. As questões que colocamos, as nossas opções e estratégias [pela dignidade da vida] merecem ser debatidas publicamente num espaço como o Parlamento”, afirmou. A questão colocou-se há duas semanas, quando a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias analisou o parecer da deputada Vânia Dias da Silva sobre a petição e o grupo de trabalho que lhe deu origem. Houve deputados que consideraram que já não faria sentido seguir com a petição para plenário e decidiu-se questionar a federação – que diz, no entanto, que os serviços ainda não a contactaram. Em Fevereiro de 2017, a petição Despenalização da morte assistida, subscrita por 8428 pessoas e da responsabilidade do movimento cívico Direito a Morrer com Dignidade foi também discutida em plenário e na altura houve partidos que anunciaram a intenção de legislar a eutanásia. Entre o mais de meio milhar de petições encontram-se os mais variados temas e solicitações. Há quem peça obras em estradas, ferrovias, aeroportos, hospitais e escolas, melhoria dos serviços públicos, abolição de portagens, protecção do património ou legislação nas áreas fiscais, laborais (como a progressão na carreira, concursos de admissão ou direitos do trabalhador), sociais ou da deficiência e da vida autónoma. Mas também pela revisão dos currículos dos vários graus de ensino, pela protecção ambiental e animal (contra e a favor da caça, de circos e outras formas de interacção com os animais), criação de dias nacionais, pela investigação judicial (como o caso das adopções da IURD). E há até duas petições pela legalização da prostituição em Portugal – cada uma com apenas um subscritor. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Entradas – 512Concluídas – 364Aguarda deliberação sobre admissibilidade – 23Em apreciação – 97Propostas para apreciação em plenário – 28Anos anteriores:Entre 2011 e 2015 – 552Entre 2009 e 2011 – 181Entre 2005 e 2009 – 592Entre 2002 e 2005 – 113Entre 1999 e 2002 – 83Entre 1995 e 1999 – 185Entre 1991 e 1995 – 339
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos morte trabalhador lei prostituição animal eutanásia
E agora algo divertido para a mente com Superorganism
Foram uma das mais gratas surpresas do Primavera Sound do Porto. Os multinacionais Superorganism deixaram um rasto de sorrisos à sua volta, graças às canções pop contagiantes do seu homónimo álbum de estreia. (...)

E agora algo divertido para a mente com Superorganism
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.3
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Foram uma das mais gratas surpresas do Primavera Sound do Porto. Os multinacionais Superorganism deixaram um rasto de sorrisos à sua volta, graças às canções pop contagiantes do seu homónimo álbum de estreia.
TEXTO: Foram uma das mais gratas surpresas do último Primavera Sound do Porto. Já se sabia que o seu homónimo álbum de estreia era um documento revestido por canções pop imaginativas, mas existiam algumas reticências em relação à forma como poderiam ser expressas em palco. Cinco minutos depois do início do concerto não restavam dúvidas: as canções dos Superorganism ao vivo resultam ainda mais contagiantes. Autoria: Superorganism Domino, distri. PopStockEnquanto no festival existia quem se dedicasse a experienciar unicamente concertos rock, ou de hip-hop, ou sessões de música de dança, numa comprovação, apesar de tudo surpreendente para os tempos que se vivem, de que as diferentes afirmações identitárias ainda estão conectadas com géneros de música e formas específicas de expor esses mesmos sons ao vivo, em palco os Superorganism misturavam tudo da única forma possível: com a descontracção insolente de quem não percebe que, estando hoje tudo baralhado na horizontal, ainda existe quem procure guiar-se por hierarquizações artificiais, dividindo, em vez de assimilar. Existe quem lhes chame pós-modernos, típica afirmação esvaziada de conteúdo, que não entende que os Superorganism não querem afirmar nada, ao contrário do que acontecia nos anos 1980 com essas correntes. Eles não querem parecer. Eles são. Pertencem a um agregado de pessoas – chamar-lhe geração talvez seja excessivo – com afinidades globais, que já digeriu um vasto leque de referências na era da internet. Não procuram a mistura fragmentada de alusões. Simplesmente fazem parte do que são. E isso tanto está presente na música, aparente amalgamento de elementos – dinâmicas electrónicas, técnicas e motivos resgatados ao hip-hop, ou modelo de canção pop envolvido em balanço funk – como na forma como o colectivo se apresenta em palco, mistura de modelos rock, linguagem audiovisual e performance dançante. Em palco as atenções concentram-se numa pequena vocalista de ar oriental que de vez em quando também toca teclados, enquanto à sua volta se movimentam três performers-bailarinos-cantores (duas raparigas e um rapaz) que não param por um momento quietos e três músicos, em bateria, guitarra e teclados. A atribuir sentido ao todo um cenário imparável de imagens e luzes coloridas, onde tanto a natureza é hiperbolizada como a vida nas urbes. Mas, afinal, quem são os Superorganism? Quando a sua primeira canção, Something for your M. I. N. D. , começou a circular na internet, no final do ano passado, não era fácil encontrar informações sobre eles. E não era estratégia. Simplesmente o colectivo não esperava que tivesse impacto, com aquele ritmo desengonçado, linhas de baixo redondas e vozes em colisão psicadélica, a produzirem novos sentidos para uma pop arco-íris. Mas o boca-a-boca virtual foi funcionando e alguns nomes, como Frank Ocean, Ezra Koenig (Vampire Weekend), ou David Byrne, como constatámos em entrevista recente, foram-se deixando conquistar. Chegou a especular-se que poderiam ser um projecto paralelo de Kevin Parker dos australianos Tame Impala, mas nada disso. Quando finalmente, no decorrer deste ano, surgiram as primeiras entrevistas, o mistério aclarou-se. O grupo decorria de um outro, os neozelandeses The Eversons, que com essa designação nunca conseguiram grande projecção. Mas tinham, pelo menos, uma admiradora: Orono Noguchi, uma japonesa de, na altura, 17 anos, que estava a estudar nos Estados Unidos, e que os contactou pelas redes sociais, para lhes declarar devoção, tendo depois assistido a um concerto do grupo, tornando-se amiga e próxima deles. Na altura compunham temas instrumentais, recorrendo aos mais diversos fragmentos de sons – de caixas registradoras a gravações de filmes ou pássaros a cantar – mas faltava-lhes uma voz convincente. Foi aí que decidiram enviar a Orono Noguchi o instrumental de Something for your M. I. N. D. para que ela criasse uma letra e cantasse por cima da estrutura instrumental o que acabou por acontecer com celeridade. Quando ela reenviou o resultado tinham nascido verdadeiramente os Superorganism. Depois de algumas conversações, os membros do colectivo, que haviam decidido rumar a Londres, no âmbito de uma residência artística, acolheram também a japonesa, tendo deste então aí permanecido todos juntos. Entre neozelandeses, australianos e japoneses, acabaram por juntar-se também ingleses, e agora são oito. O resto é mais ou menos conhecido. A editora Domino (Arctic Monkeys, Franz Ferdinand) interessou-se por eles e em Abril deste ano lançaram o álbum de estreia, tendo vindo a conquistar paulatinamente cada vez mais público. O curioso é que o álbum foi gravado integralmente antes de qualquer concerto. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O que é desarmante é a maneira simples, mas extremamente eficaz e inventiva, como as canções resultam, alternando entre o deslumbramento e a melancolia, o divertido e o aborrecido, com a voz e atitude de Orono Noguchi parecendo ausente, para logo de seguida nos ligar à terra de uma forma irónica. Os diversos elementos que constituem a música coordenam-se, sustentam um corpo pop nada previsível, sem comprometerem a exaltante frescura que transpira da maioria das canções. No Porto deu para perceber que a sua música estapafúrdia, por vezes povoada pelo imaginário dos videojogos, resulta mesmo aliciante ao vivo, parecendo fazer eco de bandas excêntricas de outras décadas (como os B-52’s ou Talking Heads) ou do presente (como os The Avalanches), embora o resultado final respire singularidade por todos os poros, como é audível em canções que auguram o Verão como Everybody wants to be famous, Nobody cares ou Reflections on the screen. No dia em qua actuaram no Porto, o céu estava cinzento, parecia que a qualquer momento se abateria uma tempestade no local. Mas não. Em palco envergavam-se impermeáveis coloridos, as imagens eram tecnicolor e a música emanava total diversão, contagiando todos os que assistiam, como se suspendesse a realidade. A chuva só chegaria no dia seguinte.
REFERÊNCIAS:
Partidos BE
Centro de Inclusão Social de sete milhões na Madeira quer ser referência nacional
Infra-estrutura abre as portas em Janeiro e apresenta um leque alargado de respostas às pessoas com necessidades especiais. Associação Portuguesa de Deficientes discorda da opção. (...)

Centro de Inclusão Social de sete milhões na Madeira quer ser referência nacional
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.044
DATA: 2018-12-25 | Jornal Público
SUMÁRIO: Infra-estrutura abre as portas em Janeiro e apresenta um leque alargado de respostas às pessoas com necessidades especiais. Associação Portuguesa de Deficientes discorda da opção.
TEXTO: O Centro de Inclusão Social da Madeira (CISM), que será inaugurado em Janeiro próximo no Funchal, é apresentado pelo executivo madeirense como uma infra-estrutura de “referência” para o país, mas a Associação Portuguesa de Deficientes (APD) preferia que os quase sete milhões de euros que vai custar fossem investidos em medidas de inclusão. O edifício, com uma área a rondar os 10 mil metros quadrados, apresenta um leque alargado de valências, entre as quais um apartamento para treino de vida diária e uma área complementar para formação e treino de autonomia. “Responde às necessidades actuais da região e também perspectiva as necessidades futuras”, resumiu aos jornalistas a secretária regional da Inclusão e dos Assuntos Sociais, Rita Andrade, numa visita recente ao futuro centro, que está em fase de conclusão. Será, acrescentou, uma infra-estrutura de referência para Portugal, e mesmo dentro do espaço ibérico. Rita Andrade sustenta o discurso no conjunto de serviços e de respostas que o CISM vai dar. Área terapêutica com ginásio de psicomotricidade e fisioterapia, psicologia, terapia ocupacional e da fala, música, sala de snoezelen para estímulos sensoriais, cozinha, sala de trabalhos manuais, sala de têxteis, sala de cerâmica e pintura, horta pedagógica e um canil. O centro tem também um lar de internamento para 51 pessoas. É principalmente em relação ao lar que a APD é mais crítica. “Julgamos que os milhões de euros investidos poderiam ter sido aplicados em assegurar uma educação inclusiva de qualidade, formação profissional inclusiva de qualidade e na acessibilidade”, diz ao PÚBLICO a presidente da APD, Ana Sezudo, argumentando que estas, sim, são medidas que visam a inclusão das pessoas com deficiência na comunidade e não o seu isolamento e segregação. “Retrocesso civilizacional”A APD fala mesmo em “retrocesso civilizacional” quando olha para o CISM, considerando que a “institucionalização de pessoas com deficiência”, mesmo em “equipamentos dotados de serviços bem apetrechados”, mais não é que a “segregação de seres humanos”. O governo madeirense rejeita esta leitura. O Instituto de Segurança Social da Madeira (ISSM) lembra ao PÚBLICO que a “estrutura de lar residencial sempre existiu quer a nível regional, quer a nível nacional”, e que os utentes que irão ocupar este espaço já se encontram em regime de internamento, noutras instalações com menos condições. “Só são institucionalizados os utentes cujos pais não têm condições ou possibilidades de transportar diariamente os seus familiares. A decisão de institucionalizar cabe sempre aos familiares”, indica o ISSM, sublinhando que a única preocupação é “providenciar as melhores condições de vida possíveis” a pessoas com necessidades especiais, promovendo o acompanhamento das respectivas famílias. Para o CISM, além do lar residencial, transitam serviços e valências dos vários centros de actividades ocupacionais (CAO) do Funchal. Os restantes, dispersos pela ilha, vão continuar a funcionar, mas também vão beneficiar das ofertas disponibilizadas na nova infra-estrutura. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A APD carrega nas críticas. O Estado português, lembra Ana Sezudo, ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, reconhecendo a igualdade de direitos que todos têm de viver em comunidade. “[Portugal] comprometeu-se a tomar as medidas eficazes e apropriadas para a sua total inclusão e participação na comunidade”, diz, considerando que a “concentração e isolamento” de pessoas com deficiência numa instituição constitui uma “violação clara” destes compromissos. “A Comissão sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência nas observações finais sobre a implementação da convenção recomendou ao Estado português que eliminasse os locais de trabalho segregados, incluindo a revisão da legislação que regula os CAO, o que não foi feito até à data”, alerta a responsável pela APD. O CISM, ressalva o executivo madeirense, não é única resposta da Madeira às pessoas com necessidades especiais. Existe, garante o gabinete de Rita Andrade, um conjunto de programas que promovem a inclusão, tanto ao nível do ensino como do emprego, que vão desde a majoração de subsídios a bolsas de formação e incentivos à contratação.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos humanos concentração educação comunidade social violação igualdade canil
Serralves não quis fechar a Bienal de São Paulo no museu
Cinco jovens ateliers de arquitectura do Porto constroem pavilhões no parque para mostrar uma bienal de arte que chegou do Brasil. (...)

Serralves não quis fechar a Bienal de São Paulo no museu
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Cinco jovens ateliers de arquitectura do Porto constroem pavilhões no parque para mostrar uma bienal de arte que chegou do Brasil.
TEXTO: As duas torres da brasileira Lais Myrrha, o trabalho mais monumental apresentado pela Bienal de São Paulo há quase um ano no pavilhão desenhado por Oscar Niemeyer na cidade brasileira, parecem mais pequenas no Museu de Serralves, onde no átrio dão as boas-vindas a quem visitar Incerteza Viva: Uma Exposição a Partir da 32. ª Bienal de São Paulo, que abre ao público este sábado no Porto. Parecem mais pequenas, porque, de facto, diminuíram alguns metros ao adaptarem-se ao pé-direito mais baixo do edifício desenhado por Álvaro Siza em Serralves, mas, como explica Lais Myrrha ao PÚBLICO nas vésperas da inauguração, a sua obra já não é a mesma um ano depois, nem podia ser. Dois Pesos e Duas Medidas são duas torres exactamente iguais, mas uma ergue-se em tijolos, betão, ferro e PVC, com as matérias-primas da arquitectura moderna e contemporânea, e outra toma forma em bambu, madeira, taipa e colmo, utilizando elementos usuais das construções indígenas ou autóctones. Se as medidas destas torres gémeas são iguais, o seu peso, como indica o título, é bastante diferente devido à natureza dos materiais e o trabalho quer mostrar como a arquitectura que hoje fazemos, nomeadamente a brasileira, pouco incorpora das culturas indígenas. Se o confronto com a arquitectura de Siza, muito atento às tradições vernaculares, traz outro sabor e questões à obra desta mineira de 42 anos, Lais Myrrha destaca a dimensão narrativa que a obra ganhou nos últimos meses com a crise no Brasil. Se esse olhar estava lá latente, passou agora para primeiro plano: “Dois Pesos e Duas Medidas tem muita relação com a fase política que está a acontecer no Brasil. Vocês também têm aqui a expressão ‘dois pesos e duas medidas’?. . . É essa imprecisão, de que estas palavras falam, que permite a fraude e a corrupção. ”O problema de João Ribas, o director adjunto do Museu de Serralves e curador da exposição no Porto, foi perceber qual devia ser a “cor local” da Bienal de São Paulo agora apresentada no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, questão que dá título ao seu texto no catálogo. Sete meses depois do encerramento da grande exposição de São Paulo, que juntou cerca de 80 artistas durante três meses, como é que se reagrupam obras de arte que entretanto começaram a sua vida pós-bienal, com todas as contaminações inerentes? Juntamente com o alemão Jochen Volz, curador-geral do evento brasileiro e co-curador da apresentação em Portugal, optou por sair do “cubo branco”, escolhendo mostrar apenas 14 artistas e colectivos que se espalham, principalmente, pelo Parque de Serralves e escapam ao museu, naquela que já é a segunda apresentação da Bienal de São Paulo no Porto, que teve um primeiro momento em 2015 com a anterior edição da exposição paulista. “A nossa proposta permite aos artistas e curadores continuarem a pensar a bienal para lá de São Paulo”, diz Suzanne Cotter, directora do Museu de Serralves, acrescentando que tal como em São Paulo, onde a bienal tem uma identidade fortemente ancorada no Pavilhão Ciccillo Matarazzo situado no Parque do Ibirapuera, a imagem de Serralves, “e o seu DNA”, passa pelo edifício do Siza, igualmente implantado num parque. João Ribas entende que a 32. ª edição da bienal, dedicada à incerteza numa perspectiva também ecológica, é já “pós-Niemeyer”, uma vez que já em São Paulo se expandia para fora do edifício. fugindo de certa maneira à omnipresença do arquitecto brasileiro, e conquistando o Parque de Ibirapuera. Aqui, Ribas e Serralves quiseram também sair das salas desenhadas por Siza e encomendaram cinco pavilhões a cinco ateliers jovens do Porto para albergar parte das propostas artísticas apresentadas. Um gesto que de certa forma, reconhece o curador, quase transforma esta bienal de artes numa bienal de arquitectura, devido à sua ambição. Os cinco pavilhões temporários, que respondem também ao tema da bienal, foram desenhados pelos ateliers depA, Diogo Aguiar, OTTOTTO, Fala e Fahr 021. 3 para receber as obras de Gabriel Fernandes (Portugal), Priscila Fernandes (Portugal), Jonathas Andrade (Brasil), Cecilia Bengolea & Jeremy Deller (Argentina, Reino Unido) e Bárbara Wagner & Benjamin de Burca (Brasil, Alemanha). Fora dos pavilhões, mas ainda no parque, podem ver-se também as obras de Carla Filipe (Portugal), Alicia Barney (Colômbia) e Öyvind Fahlström (Brasil/Suécia), enquanto no museu, além de Lais Myrrha, estão os trabalhos do colectivo Vídeo nas Aldeias (Brasil), Leon Hirszman (Brasil), Lourdes Castro (Portugal) e Sónia Andrade (Brasil), onde também é apresentada a performance de Grada Kilomba (Portugal). Nesta cidade de arquitectos que é o Porto, continua Ribas, “quiseram mostrar o trabalho de uma nova geração, entre os 30 e os 40 anos, e pensar a ecologia neste contexto que junta arquitectura, paisagismo e artes visuais”, acrescentando o curador que a encomenda aos arquitectos passa também pela vontade de tornar visível o trabalho de uma geração que não tem tido muitas oportunidades de trabalho, além de obras de pequena escala. “Como museu de arte contemporânea trabalhamos com aquilo que pensamos ser o futuro e isso aplica-se também aos jovens arquitectos”, afirma Suzanne Cotter. O Museu de Serralves, segundo os seus directores, inaugura com estas encomendas uma ocupação mais intensa do parque como área de exposição, explorando a serendipidade. João Ribas deseja que as pessoas descubram os pavilhões ao acaso, chegando a áreas do parque que normalmente não visitam e criando novas relações com a obra de arte, necessariamente mais livres. De certa maneira, é curioso que esta ideia que germina como uma ambição curatorial na sua cabeça há uns tempos tenha encontrado a Bienal de São Paulo e a companhia de Jochen Volz, que reside há uma década no Brasil e é conhecido pelo seu trabalho de curadoria no Instituto Inhotim, considerado o maior museu ao ar livre da América Latina e cujo conceito gravita à volta de pavilhões dedicados a artistas. Com Volz, que dirige desde Maio a Pinacoteca de São Paulo, Serralves espera estabelecer uma relação que lhe permita aprofundar as relações luso-brasileiras, comenta João Ribas. Depois de passarmos pela peça radiofónica de Öyvind Fahlström, cujo som sai das copas das árvores próximas do museu (a obra não chegou a ser vista em São Paulo), seguimos à procura do pavilhão dos depA, um colectivo de três arquitectos que tem o seu projecto instalado no lago que se segue ao parterre central da Casa de Serralves. Depois da paisagem francesa, em pleno paisagismo de gosto inglês, encontramos um poliedro com as faces espelhadas. “É um meio octógono, cuja geometria saiu do museu de Siza, que provavelmente saiu do Parque de Serralves”, diz Carlos Azevedo, 32 anos, um dos três sócios dos depA. “O volume parece camuflado, mas mais do que esconder a peça, interessou-nos assumir a materialidade do que está à volta. Começámos com uma planta clássica, mas conseguimos distorcer a volumetria, através dos planos da cobertura, de maneira a que o pavilhão surja diferente conforme o ponto de vista. ” Lá dentro, com a água do lago aos nossos pés, podemos ver o vídeo O Peixe (2016), de Jonathas de Andrade, uma mistura entre documentário e ficção sobre o quotidiano de uma comunidade de pescadores do Nordeste brasileiro. Para evitar os espaços mais óbvios do Parque de Serralves, o pavilhão dos Fala, que exibe “o fenómeno brega” da obra em vídeo de Bárbara Wagner & Benjamin de Burca, situa-se ao lado do lameiro e do prado grande da propriedade. A dupla Filipa Almeida e Hugo Reis, de 35 e 31 anos, pegou na ideia de cone de luz da própria projecção e trabalharam-na em três dimensões, recorrendo também a uma distorção, para adaptarem a forma com 16 metros de comprimento ao terreno, pontuado pela presença de várias árvores. Inspirados nas caixas de madeira que transportam as obras de arte, marcadas por traves diagonais, surgiu um pavilhão construído como uma estrutura tubular em aço, enquanto os painéis das paredes são em aglomerado de madeira. Um cubo no meio de uma pequena elevação no terreno, feito pelo atelier Fala, exibe o trabalho de Priscila Fernandes, uma portuguesa a viver em Roterdão, que mostra Gozolândia, uma obra filmada no Parque Ibirapuera, uma interrogação sobre os usos dos espaços do lazer e da arte. “Não parece, por causa da ilusão óptica, mas é um cubo”, diz Priscila Fernandes, que por causa das condições de projecção discute com João Ribas, na ausência dos arquitectos, até onde pintar as paredes interiores de azul. “É uma situação excepcional este encontro inesperado com os trabalhos no meio do parque”, acrescentando sobre o seu trabalho que em Portugal é exibido no meio do parque, ao contrário do que aconteceu em São Paulo. Muito perto, está o pavilhão feito por Teresa Otto, 34 anos, que aproveita um pequeno tanque de água e ergue um volume aproximando dois “L” que desenham as paredes do espaço. O revestimento é de chapa ondulada reutilizada, um material que está a desaparecer. Foi preciso ir até Penafiel para encontrá-lo. “Dantes havia nas empenas do prédios. Agora é difícil de encontrar. Queria que tivesse a cor dada pelo oxidado, mas como não foi possível encontrar, utilizámos também a tinta spray usada nos graffiti”, explica a arquitecta. O pavilhão desenhado por Diogo Aguiar, que exibe a peça de Gabriel Abrantes, é o que está mais perto do museu. Dois círculos em madeira trazem neste dia em que choveu uma dimensão inesperada, a do cheiro, ao trabalho do realizador que conta a história de amor entre uma jovem indígena que quer ser comediante e um robô. Os Humores Artificiais, uma produção que contou com o apoio de Serralves, sublinha João Ribas, mistura a estética de Hollywood com a do documentário num filme que tem agora a sua estreia em Portugal e em que o realizador quis explorar as formas de comédia indígena. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Se em São Paulo a maioria dos artistas eram mulheres, o mesmo cuidado houve na apresentação em Serralves. Entre os portugueses, todos repescados para o Porto, há apenas um homem num grupo de cinco artistas. A Bienal de São, que existe desde 1951 e é uma das mais antigas do mundo, é o evento internacional onde a presença portuguesa tem sido mais constante. Os artistas portugueses vão à Bienal de São Paulo há 65 anos, sem nenhuma interrupção. É bom que através desta nova colaboração entre a bienal e Serralves se possam ver em Portugal as razões para esta participação com uma intensidade única na internacionalização das artes visuais nacionais.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Nos Açores, à procura de homens que são máquinas do tempo
Começou no século XIX e só terminou mais de cem anos depois. O último cachalote foi caçado nas águas dos Açores há 30 anos. Ao longo de dois anos, um realizador açoriano e um investigador lisboeta viajaram por todo o arquipélago para ouvir e gravar as histórias dos baleeiros que ainda restam. (...)

Nos Açores, à procura de homens que são máquinas do tempo
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Começou no século XIX e só terminou mais de cem anos depois. O último cachalote foi caçado nas águas dos Açores há 30 anos. Ao longo de dois anos, um realizador açoriano e um investigador lisboeta viajaram por todo o arquipélago para ouvir e gravar as histórias dos baleeiros que ainda restam.
TEXTO: O bananal fica à sombra de uma arriba, na fajã larga de Santa Cruz das Ribeiras, no Sul da ilha do Pico. Nas bananeiras, os novos cachos vão começando a rebentar. A esses rebentos dá-se o nome de “netos”, explica-nos Luís Bicudo. Pode parecer um preâmbulo estranho para iniciar uma história sobre uma actividade que terminou nos Açores há três décadas — a baleação — e sobre como duas pessoas quiseram resgatar do esquecimento a memória dos seus protagonistas. Mas os netos que brotam destas bananeiras têm tudo a ver com um dos fios desta meada. Quando estava no último ano do curso de Cinema, Luís realizou a curta-metragem A Banana do Pico, que o próprio resume como “uma desculpa” para falar sobre os avós. O bananal, o tal que fica à sombra da arriba, pertence-lhes e Luís vai ajudando a tomar conta do terreno. “Olho muito para os meus avós como máquinas do tempo. Quando falo com eles, ou com pessoas da idade deles, o que sinto é que estou a falar com homens de outro planeta. ” O fascínio não se explica, portanto, é de outro tempo e quase extraterrestre. Com este encantamento, enriquecido pelas recordações da baleação que ia arrancando do avô, antigo baleeiro, iniciou em 2010 um novo projecto, a longa-metragem Baleias e Baleeiros, que concluiu três anos depois. Queria registar o contraste entre passado e presente que lhe saltava à vista, quando escutava as histórias contadas pelos baleeiros ainda vivos e quando olhava para as regatas de botes baleeiros que mobilizavam uma nova geração. O processo não era apenas pessoal, era também o de um arquipélago a acordar para a baleação açoriana após alguns anos de esquecimento. Com o fim da actividade, na década de 1980, o património baleeiro correu o risco de ser tragado pelo tempo e só com o aproximar de um novo século, no final dos anos 1990, se iniciou um movimento de valorização e recuperação deste legado. A herança material, na qual cabem os botes usados na caça, mas também as fábricas onde se processavam os produtos extraídos dos cachalotes, e mais tarde a herança imaterial. Foi sobretudo esse imaginário intangível que cativou Luís. “Foi uma espécie de ciclo vicioso. ” Filmou novamente os avós. Passou para outras pessoas da mesma geração na freguesia. Mais tarde, alargou as filmagens para mais aldeias, tanto no Pico como no Faial. “Queria ouvir mais e mais. Percebi que já não estava a filmar só para fazer o filme, estava também a trabalhar numa recolha que ia muito para além dele. A certa altura tive mesmo de parar. Mas foi difícil. ” Ao mesmo tempo, mas em Lisboa, Francisco Henriques encontrava neste filme uma outra forma de olhar para a baleação. “O Luís estava a dar voz aos baleeiros”, precisa o investigador em História Contemporânea e aluno de doutoramento do Instituto de Ciências Sociais de 30 anos. Para Francisco — que tinha chegado à baleação, como muitos outros, através do livro Moby Dick de Herman Melville e que aprofundou esse caminho nos anos que passou nos Açores — o filme funcionou também como a confirmação de algo que já remoía na sua cabeça. Num seminário, em que apresentou o seu trabalho de mestrado sobre a formação da indústria baleeira, a orientadora perguntou-lhe: “E então os baleeiros?” A dúvida encontrou um eco. “Isso tinha sido uma inquietação. Os documentos com que tinha trabalhado diziam muito pouco sobre o impacto social que a baleação tinha na comunidade. ” Dois anos depois iniciava com Luís um projecto de recolha de memória oral da baleação, que os levou às nove ilhas para filmar os depoimentos de dezenas de antigos profissionais. O tempo continuava a passar, explica Francisco. “Há uma espécie de canto do cisne, estes homens estão a desaparecer”. No Pico, os dias prolongam-se na justa medida do necessário. Vinte e quatro horas servem para tudo, incluindo viajar no tempo. Na maior parte das vezes, o dia começa cedo para Luís e Francisco — com uma entrevista combinada, semicombinada ou ainda por combinar. Entram no carro, avançam uns quilómetros até à freguesia mais próxima. Perguntam por um baleeiro, recebem outras indicações e avançam numa nova direcção. Porta a porta, vão encontrando aquilo que procuram. Noutros dias os planos não correm bem: nenhum baleeiro lhes aparece no caminho, os que aparecem preferem não falar. Este dia de Setembro de 2016 está a ser um destes. No entanto, precisamente quando o sol já começa a descer e a entornar sobre a água uma luz que a torna opaca, parecem reconhecer ao longe um dos baleeiros que procuravam. Porte maciço, braços longos, mãos robustas. “Vê-se logo que é um baleeiro”, comentam. É verdade, encontraram mais um. Joaquim Quaresma acaba de sair do mar, na Ribeira do Meio, perto da vila das Lajes. Ao fundo a silhueta da chaminé da antiga fábrica da baleia. Logo ao lado a rampa pela qual os cachalotes eram erguidos para terra. As gotas de água ainda escorrem pelas costas largas deste homem de 74 anos, quando Luís e Francisco se aproximam dele, numa abordagem suave, quase tímida, mas que na verdade esconde um respeito imenso. “Falaram-nos de si. Andou à baleia, não é verdade?” A conversa prossegue como muitas outras que já foram tendo sempre que se aproximam de um baleeiro. Conseguimos adivinhar as respostas. “Agora já restam poucos. ” “Não vão encontrar muitos. ” “Esse já morreu. ” “Agora já há pouca gente. ” “É a vida. ” A conversa fica combinada para o dia seguinte, na casa da cunhada de Joaquim, a uns cinco minutos dali. Por esta altura, Francisco e Luís já têm dificuldade em enumerar rapidamente quantos baleeiros entrevistaram nos últimos dois anos. O trabalho começou em 2015, depois de receberem um apoio financeiro da Direcção Regional de Cultura do governo açoriano. Numa primeira fase percorreram em duas semanas as ilhas do Faial, Flores, Corvo, São Jorge e o Norte da ilha do Pico. No início de 2016 estiveram na Terceira, Graciosa, São Miguel e Santa Maria. No total entrevistaram cerca de 70 pessoas, sobretudo baleeiros, mas também, em alguns casos, mulheres de baleeiros e vigias da baleia. Na última fase, que decorreu em Setembro do ano passado, passaram duas semanas no Sul do Pico para finalizar esta recolha. “Quando chegámos aqui, há uma semana e meia, eu e o Francisco ainda vínhamos com a ideia de tentar repetir algumas dessas entrevistas que fiz há seis anos [para o documentário]. Repetimos algumas e foi difícil”, desabafa Luís. Em primeiro lugar, foi-lhe difícil reconhecer os efeitos que a passagem de um tempo tão breve teve nestas pessoas. À sua frente encontrou fragilidade, quando anteriormente tinha presenciado energia e longevidade. Preferiram concentrar-se em novos testemunhos. “Neste momento o projecto é a construção de um arquivo de memórias, o arquivo possível”, reconhece Luís. “Se calhar é um bocadinho perverso dizer isso, mas o tempo colocou um processo de selecção natural neste trabalho. Já só vamos encontrar e arquivar as memórias dos baleeiros que estão vivos. ”Em Julho de 1982, quando João Carlos Lopes e Miguel Vale de Almeida chegaram ao porto da Horta, na ilha do Faial, ainda encontraram baleeiros no activo. Mas poucos. Dessa ilha — a única com uma armação em funcionamento na época — João Carlos recorda cerca de 20 ou 25 baleeiros e o mais novo já teria 35 anos. Nesse ano a Comissão Baleeira Internacional anunciou a suspensão da caça de todas as espécies de baleias com início a partir de 1985 e 1986 — em dois séculos, a população de cachalotes tinha sofrido uma quebra de aproximadamente um milhão. “Era agarrar naquilo ou nunca mais ver a caça à baleia nos Açores”, explica João Carlos, actualmente técnico superior autárquico e investigador local, e que em 2009 editou em livro o resultado desta pesquisa. Os dois finalistas de Antropologia tinham a oportunidade de “assistir ao vivo ao último acto de uma epopeia”. João Carlos não é o único a usar a palavra epopeia para falar desta actividade nos Açores. Os ingredientes estão lá, elevando uma história de superação, sobrevivência e de aparente impossibilidade que se iniciou na monarquia, passou pela I República e pelo Estado Novo e apenas terminou quando a democracia portuguesa dava os primeiros passos. A história começa no século XVIII. Foi por esta altura que os míticos navios baleeiros norte-americanos começaram, ao parar nos Açores, a incorporar nas suas tripulações elementos açorianos. Começou assim também a diáspora açoriana, o primeiro de muitos episódios ao longo da História. Foram alguns destes homens que estiveram na origem das primeiras comunidades portuguesas na costa leste dos Estados Unidos. Foram alguns deles que, a partir de 1850, e após aprenderem as técnicas da actividade, regressaram às suas ilhas e formaram as primeiras armações baleeiras nos Açores. Essa herança ficou no próprio vocabulário: aparelhar o bote, “to rig” em inglês, ficou “rigar” para os baleeiros açorianos que, durante décadas, extraíram o óleo da baleia em “traiois”, outra corruptela do inglês, desta vez da palavra “try-outs”. “Era uma história grande e longínqua, que tinha mobilizado gerações de baleeiros”, explica João Carlos. “Nós iamos assistir ao último acto dessa grande história que estava prestes a fechar os panos. ” Durante quase dois meses partilharam os espaços e o tempo com os baleeiros da Horta. Dormiram numa escola primária a poucos minutos do Bairro das Angústias, onde viviam praticamente todos os baleeiros. João Carlos, em entrevista por telefone ao PÚBLICO, regressa a esses dias com uma memória vívida, fotográfica. “Estou a rever o rosto daquelas pessoas e pareciam-me já homens muito marcados pela vida difícil, mas não encaravam o trabalho como nada de transcendental, era mais um trabalho, como o dos pescadores. ”Imagine um pequeno bote, com sete homens lá dentro, um homem de pé com uma lança na mão a fazer a aproximação a um bicho do tamanho de um autocarro“Nessa altura, o heroísmo não estava em cima da mesa” — Miguel Vale de Almeida não tem dúvidas acerca disto. De facto, reteve da altura duas dimensões de percepção através das quais os baleeiros se encaravam. Com a lupa do “sacrifício e da dureza da actividade”, por um lado, e pela “ambiguidade da relação com o cachalote”, por outro. “Com reminiscências do que se pode encontrar, por exemplo, no toureio — o respeito pelo animal, a tristeza pela sua morte”, define o antropólogo e professor universitário. Em 1982 ainda conseguiram assistir às caçadas à baleia e foram precisamente esses momentos aqueles que melhor se fixaram na memória de ambos. “Imagine um pequeno bote, com sete homens lá dentro, um homem de pé com uma lança na mão a fazer a aproximação a um bicho do tamanho de um autocarro. E tudo aquilo dependente de um balançar de cauda que pode deitar tudo abaixo. ” João Carlos é o primeiro a reconhecer que aquilo que guardou na sua memória é quase irreal, próximo de um filme de acção. “O que é muito impressionante”, conclui João Carlos, “é a quantidade de mar vermelho. Parece que olhamos para o mar e só vemos vermelho. Os ecologistas não achariam muita graça a esta riqueza tradicional dos Açores mas não víamos os baleeiros como assassinos ou pessoas que faziam algo de reprovável. ” Para ele eram “seguidores, os elos de uma cadeia” de uma história maior. “Eles utilizavam muito uma palavra que nós tínhamos de desvendar. Não se podia ver na percepção mais literal”, recorda João Carlos Lopes. Essa palavra era “vício”. Aqueles homens sabiam que iriam ser os últimos. O seu arquipélago vivia um momento de mudança económica e social e os jovens procuravam olhar mais além, para outras possibilidades distantes do quotidiano duro e de sacrifício que associavam aos seus ancestrais. “O que eles chamavam de ‘vício’ era essa dificuldade de encarar o fim de uma coisa que tinha marcado gerações. Era uma prática, uma ritualização de uma actividade que fazia parte da identidade deles, dos pais, dos avós. Nós sabíamos que não era vício. Era agarrar-se simbolicamente a uma coisa que tinha sido demasiado importante para aquelas comunidades. ”“O trabalho mais perigoso que o homem tem é a baleia. Não há nenhum mais perigoso, no mar, na vida marítima — porque aquilo é um animal que tem munta força. Só o ar daquilo! E sempre aparece aqui algua que se defende. ” Manuel Silveira Carvão, baleeiro da ilha do Pico, em discurso directo. “Eu andei uns poucos anos de trancador e nunca baleia nenhua me quebrou o bote, nã senhor. Porquê? É porque eu nunca mandava o bote por cima delas. Mandava o bote sempre cma daqui bem a essa parede, ou mais longe. O mais perto era cma daqui a essa parede. Tinha lugar quanto quisesse pra trancar à vontade. Elas às vezes vêm c’o rabo mas nunca partiu. ”O testemunho não faz parte do Arquivo de Memórias da Baleação que Luís e Francisco andaram a reunir. Na verdade, são palavras com mais de 30 anos, recolhidas pelo escritor açoriano José Dias de Melo na década de 1980, quando percorreu a sua ilha, o Pico, para falar com os conterrâneos. O “Mestre Carvão”, como era conhecido, tinha 74 anos e a baleação açoriana continuava, ainda que já nos seus anos de estertor. Nessa recolha, um dos mestres baleeiros comenta mesmo que “havia mais embarcações do que pessoas para arrear nelas”. A recolha de Dias de Melo foi publicada numa série de sete volumes sob o título Na Memória das Gentes e é ainda hoje um retrato à flor da pele de uma ilha, das suas tradições e simultaneamente da sua multiplicidade — o escritor optou por passar para o papel os testemunhos de forma oralizada sem os passar por um qualquer filtro de uma ortografia mais ortodoxa. A acumulação de depoimentos e histórias acaba por adensar o retrato do tecido social da ilha. O escritor, cuja restante obra (romances, contos, recolhas etnográficas) também se deixou dominar pela ilha negra em que nasceu, é uma referência assumida para o trabalho de Francisco e Luís. Não é por acaso que o documentário de Luís tem como subtítulo Para que a Memória Permaneça na Gente. “O Dias de Melo conseguiu perceber na baleação características únicas, de comunhão entre a comunidade à volta de uma actividade, para mais sendo uma actividade que já não se realizava com estas técnicas em lugar nenhum do mundo”, explica Luís. Esta mesma singularidade foi o motivo para que muitos outros, maioritariamente estrangeiros, tivessem vindo aos Açores, sobretudo às ilhas do Faial e do Pico, testemunhar a caça à baleia — aquilo que o biólogo marinho britânico Robert Clarke chamou de “indústria-relíquia”, dado o convívio do uso de técnicas ancestrais com o aproveitamento industrial dos cachalotes capturados. Clarke foi o autor do primeiro estudo de relevo publicado sobre a baleação açoriana, em 1954. No seu Open Boat Whaling in Azores (ou Baleação em Botes de Boca Aberta nos Mares dos Açores, em português), resultado das dez semanas que passou em 1949 nas nove ilhas dos Açores, Clarke faz um relatório exaustivo sobre a baleação açoriana, enumerando o número e tipo de embarcações, passando ainda pelo número de cachalotes capturados ou mesmo pelo tipo de arpões utilizados. A baleação açoriana chegou a cativar um príncipe italiano. Em 1956 Mario Ruspoli passou dois meses na casa dos faroleiros nos Capelinhos, ilha do Faial — um ano antes da erupção do vulcão. Para isso conseguiu um empréstimo de dois milhões de francos do famoso armador Aristóteles Onassis (ele próprio envolvido na baleação, ainda que de uma forma industrial diametralmente oposta ao que se passava nos Açores). Na sua mira estavam aqueles que considerava os últimos baleeiros do tempo de Moby Dick. O Verão que Ruspoli passou no Faial ficou eternizado no documentário Les Hommes de la baleine, de 25 minutos e filmado a cores, com porções ponderadas de realismo e lirismo. Por ele passa a faina baleeira mas também a tradição musical representada pelos bailes das chamarritas e o ambiente da comunidade, conduzindo o espectador para um desfecho quase de anticlímax, rumo à “maior morte do mundo” — a expressão usada pelo narrador para descrever a morte do cachalote, mesmo no final do filme. Os exemplos sucedem-se, constantemente atraídos por essa ameaça de extinção que se abatia sobre a baleação açoriana. Seja Barbed Water, de Adrian J. Wensley-Walker, filmado em 1969, ou The Last Whalers, curta-metragem documental que William Neufeld filmou no Pico, ou ainda Os Últimos Baleeiros, documentário realizado para a RTP e estreado já no final dos anos 1980. Ou mesmo o caso da norte-americana Gemina Garland-Lewis, que passou alguns períodos de tempo entre 2008 e 2012 a recolher, para a National Geographic, os depoimentos dos baleeiros ainda vivos nas ilhas do triângulo (Faial, Pico e São Jorge). O Arquivo de Memórias da Baleação de Luís e Francisco acrescenta uma componente audiovisual sem precedentes. Cada testemunho foi captado individualmente e é apresentado sem edição - num registo que mantém as hesitações e a linguagem corporal, aquilo que fica por revelar num suporte escrito ou fotográfico - com vista à criação de um arquivo consultável num futuro próximo. Para além disso, pela primeira vez reúnem a memória oral de todas as ilhas do arquipélago. “Tem sido interessante fazer este trabalho com este distanciamento. A maior parte são pessoas idosas, com mais de 70 e 75 anos. Se as entrevistas tivessem sido nos anos 1990, o registo seria completamente diferente. Poderia ser mais azedo, de ruptura traumática. Aqui há um distanciamento que marca esse registo”, explica Francisco. Joaquim Quaresma aguarda junto à estrada, como combinado. Com um sorriso. Reage ao atraso com um “it’s okay” arrastado, de quem sabe que o tempo sobra e que em simultâneo denuncia as décadas de vivência no Canadá. Está de regresso ao Pico para as suas férias habituais, a ilha onde cresceu e viveu até conseguir sair. “Os meus filhos e os meus netos não sabem o que é uma baleia. Não sabem se é apanhada com anzol ou com arpão. . . ” É assim que retoma a conversa do dia anterior. Joaquim nasceu num tempo em que nenhum rapaz da ilha podia fugir da aspiração de ser baleeiro. “Não havia Lady Gaga ou Spice Girls, os baleeiros eram os heróis”, vai dizer-nos Luís Bicudo uns dias mais tarde. O pai de Joaquim foi baleeiro toda a vida. Andou por quase todas as ilhas dos Açores. “Só não esteve em Santa Maria e no Corvo. E não foi só o meu pai, foram muitos. . . ”, conta. A baleação foi, para além de um elo de ligação entre a ilha e o mundo, uma actividade que fez mexer o arquipélago. Enquanto fala, revelam-se dois Joaquims. Aquele que fala do presente de forma vivaz e aquele que recorda o passado com uma contenção pungente. No primeiro, o inglês atropela o discurso, como quando fala dos “buses” que a filha conduz no Canadá. No segundo, as memórias em português são muitas vezes cruzadas por uma pausa para engolir em seco. Pela comoção. “Saí da escola com 13 anos, tirei a licença aos 14. Fui para a baleia aos 15. Era uma criança ao pé deles, uns homens de 50 ou 60 anos para cima. ” O respeito imperava dentro do bote. Era “senhor acima, senhor abaixo, senta-te mais aqui, senta-te mais ali”. Joaquim fazia o que o mandavam fazer. “Até ir abrindo os olhos. ” E fica em silêncio, ensimesmado. Os meus filhos e os meus netos não sabem o que é uma baleia. Não sabem se é apanhada com anzol ou com arpão. . . ”Ainda consegue recordar o odor fétido que tomava conta do ar e os obrigava a fechar as janelas de casa durante uns dias, enquanto ao lado, na fábrica, se processavam os cachalotes. Quando as condições do tempo não permitiam, era por ali que ficava. Caso contrário, e sempre que o foguete soava, convocando os baleeiros para mais uma caçada, Joaquim “largava tudo, nem levava o caminho certo, até saltava muros”. No Verão trabalhava na pesca do atum, praticamente em simultâneo com a baleação. Quando havia saída à baleia e ele não podia, o pai, na altura já com mais de 50 anos, ia na sua vez. “Sempre recebia mais uns trocos”, resume. Mal houve uma oportunidade, saiu dos Açores. Emigrou para o Canadá em 1972, com 30 anos. “Sempre tive a ideia de tirar a carta de trancador, mas vi que não era vida para mim. A pesca da baleia é pesca de pobre”, resume Joaquim. “Graças a Deus a minha vida correu bem lá fora, no estrangeiro. A minha vida foi a fazer barcos. Não sou rico, mas tenho saúde. Criei dois filhos, tenho o meu backyard. ” O futuro não estava na baleação. Sem nos apercebermos, regressa o Joaquim recolhido nas suas próprias memórias. “É a vida que passou. A vida que passou, amigo. ”Um grupo de turistas alemães está siderado a olhar para um expositor do Museu dos Baleeiros. Em destaque, um arpão de ferro, retorcido, testemunha perene do temível poder do cachalote. Manuel da Costa Júnior cumprimenta-os com regozijo, recebe-os como hóspedes de casa. Filho de baleeiros, é o director do Museu do Pico — estrutura da qual fazem parte o Museu dos Baleeiros, nas Lajes, mas também o Museu da Indústria Baleeira, em São Roque — desde 2000. É uma figura carismática na ilha. Seguimo-lo até ao principal espaço do museu. No centro, o elegante Santa Teresinha, um dos primeiríssimos botes baleeiros dos Açores. “A baleação tem um lado romântico muito interessante, porque acabámos a caçar baleias como os bascos o faziam nos séculos VIII, IX e X. Com um bote muito semelhante, arpão e lança. ” O bote posicionado no centro da sala impressiona, mais ainda se pensarmos que os seus dez metros de comprimento empalidecem, quando comparados com a dimensão de um cachalote. Um macho pode chegar aos 18 metros de comprimentos e pesar 50 toneladas. “Isso cria um certo fascínio”, explica o director do museu. A preservação do património baleeiro tem estado em cima da mesa para o governo regional açoriano, pelo menos desde 1998. Foi por essa altura que foram introduzidas as primeiras políticas governamentais para esta área. Corria-se então o risco de perder o património baleeiro móvel — os botes e as lanchas de reboque, embarcações a motor introduzidas em algumas ilhas a partir dos anos 1930 —, explica em entrevista por email Nuno Ribeiro Lopes, director regional da Cultura dos Açores. Dois anos depois, um novo decreto fixava a regulamentação dos apoios àquele património. Manuel da Costa Júnior acompanhou de perto esse processo. Através do museu — instalado há décadas em três antigas casas dos botes — mas também à sua volta. Os botes foram recuperados, ganharam nova vida com as regatas, outras casas dos botes fugiram à decadência que lhes parecia destinada. O enquadramento legal acabou por ser central num processo de construção de uma identidade açoriana. “Não é por acaso que a região encontrou para a sua imagem identitária um cachalote a mergulhar no oceano. É a imagem dos Açores, que é colocada nos aviões, em tudo o que é revista. . . ”, refere o director do Museu do Pico. Nos anos 1980, quando esteve no Faial, João Carlos Lopes já conseguia antever essa direcção. “Em confronto com o resto da realidade açoriana, mais prosaica, a baleação é uma coisa singular, rara, marcante, com toda essa força que permite reconstituir uma identidade ou construí-la mesmo ou sonhar uma identidade que vá para além do que ela foi. Não seria criar vacas ou plantar ananases em São Miguel”, defende. O director regional da Cultura dos Açores reconhece que este “tem sido um processo complexo e intenso”. “[Esta apropriação do mar] como elemento essencial do imaginário iconográfico e mitográfico [é] a nossa razão de ser. ”Um cachalote a mergulhar no oceano é a imagem dos Açores, que é colocada nos aviões, em tudo o que é revista. . . ”Essa espécie de renascença baleeira consolidou-se também na dotação orçamental do governo regional destinada a esta área. O projecto Baleiaçor, executado entre 2008 e 2010, contou com um orçamento de 450 mil euros (dos quais 382. 925 euros provenientes do Fundo Comunitário EEA Grants (Noruega, Islândia e Liechtenstein). Visou a recuperação de dez botes baleeiros e de uma lancha de reboque, o apoio à realização de regatas de botes baleeiros (já consideradas património baleeiro regional) e o levantamento de documentação. Segundo o director regional da Cultura, o projecto permitiu uma reformulação e reinvenção do património baleeiro, “colocando-se ao serviço das populações e do fortalecimento da sua identidade cultural”. Em 2014, por exemplo, o apoio regional anual para esta área ultrapassou os 100 mil euros. Nos últimos anos, e de acordo com dados fornecidos pela Direcção Regional de Cultura, o montante total de apoio fixou-se acima dos 150 mil euros anuais. Só este ano foram financiados 23 projectos, num total de 166. 405, 23 euros. Francisco Henriques compreende que “num contexto democrático e de autonomia, para compensar as diferenças locais entre ilhas, se tente valorizar um denominador comum que seja apelativo e que seja símbolo de transição da tradição para a modernidade”. A transição entre a baleação e as várias empresas turísticas de observação de cetáceos que existem pelo arquipélago é um testemunho claro desse processo. “Mas, quando ouvimos os baleeiros, percebemos que a narrativa é mais complexa”, defende Francisco. “Parece-me que os baleeiros terão sido o parente pobre nesse processo, que a experiência individual poderá ter sido considerada algo irrelevante na construção desses discursos que pretendiam criar uma narrativa que una as pessoas à volta da identidade regional da baleação. ”“A memória não é uma realidade, é uma construção”, argumenta o director do Museu do Pico. “Passados estes anos, quando falamos de uma actividade, falamos da sua memória e nessa perspectiva há ilhas que não se apropriaram dessa memória como outras. Há ilhas que corporizam e centralizam essa identidade ou identidades da cultura baleeira insular. ”É aqui que entra o projecto de recolha da memória oral feito por Francisco e Luís. Francisco adverte: “Não estamos a fazer isso para descobrir novos enigmas. Este projecto é feito clara e confessadamente com uma intenção de influenciar as políticas de património baleeiro. ” É o próprio Francisco a assumir que gostava que esta perspectiva tivesse uma expressão no museu, indo ao encontro daquilo que o director regional da Cultura sugere, quando nos fala da “actualização da museografia dos museus dos baleeiros e da indústria baleeira, em curso neste momento, que dotará estas unidades da visão regional, que agora lhes falta”. A investigação sobre a baleação açoriana não é recente nem escassa. Sabe-se que existiram armações, que havia turnos longos nas fábricas. Os rostos dos baleeiros estão presentes em alguns espaços museológicos. No Museu dos Baleeiros há até uma parede repleta de retratos destes homens. Francisco e Luís querem dar a oportunidade de eles se explicarem, de descreverem a sua vida. “Os baleeiros não reclamaram para si esta construção da memória; agora nós achamos que isso é relevante, até porque a comunicação que pode ser feita dessa experiência dando-lhes a voz, mesmo a um nível quase cénico e de descrição pormenorizada das técnicas, os baleeiros fazem-no na perfeição. São os melhores artistas, nesse sentido. ” Por agora, o olhar dos baleeiros continua a seguir-nos pelo museu a partir das molduras, em surdina. Luís Bicudo tinha-nos avisado. Quando era mais novo, tinha de ser ele a puxar pelo avô quando queria ouvi-lo falar sobre a baleação. Francisco da Silva parece agastado por ter de contar estas histórias mais uma vez, mas acede, e com um fôlego intemporal muito particular. Ouvimo-lo dizer “naquele tempo não havia outra coisa. Era o mar, era a terra e era a baleia” e quase que conseguimos imaginar um livro a iniciar-se à nossa frente. Podia ser “Chamem-me Ismael”, o arranque de Moby Dick. Encontramo-lo no final de Setembro do ano passado em Santa Cruz das Ribeiras, no Sul do Pico. Tanto o avô como a avó de Luís estão de passagem pela aldeia. Mudaram-se para o Faial nos anos 1970 e hoje em dia, ultrapassados os 90 anos, passam a maior parte do tempo junto dos filhos do outro lado do canal. Na casa pequena e pontuada por fotografias de família, Luís trata os avós com um cuidado ostensivamente carinhoso, o de quem sabe estar a lidar com relíquias. Ao avô parece que já fez todas as perguntas e que sabe todas aquelas histórias de cor, mas continua a segui-lo atentamente com o olhar. Pede-lhe para contar uma história em particular. Aquela em que o avô, Francisco da Silva, falhou a saída ao mar por estar “pregado no sono”. Para sua sorte, o vigia perdeu a baleia depois de esta mergulhar e só à tarde, quando já estava bem acordado e conseguiu ir no bote, é que a apanharam. “A baleia estava à espera do avô”, sussurra-lhe Luís. No pátio da casa, o antigo baleeiro vai sacudindo memórias. Começou aos 15 ou 16 anos. Não consegue dizer exactamente. O seu pai também era baleeiro, um trancador, o homem responsável por arpoar o cachalote. Um dia, o pai lançou o arpão, mas a baleia atirou-o pelo ar e teve de ser levado para o Hospital no Faial. Depois disso, pediu ao mestre do bote para procurar um substituto. O próprio Francisco também foi apanhado de surpresa algumas vezes durante a caça à baleia. Lembra-se de uma em particular. A baleia estava praticamente moribunda, mas uma distracção pôs em perigo os baleeiros. “Ela veio do fundo para cima, deu uma marrada no fundo do bote e meteu uma tábua para dentro. ” Valeram-lhes as grossas camisolas de lã de ovelha que levavam na altura. Taparam o buraco com as camisas e a lancha arrastou-os juntamente com o bote para terra. “Hoje em dia os novos não acreditam”, garante Francisco. Não será o único antigo baleeiro a largar um desabafo semelhante. Praticamente durante todo o seu período activo, a baleação foi uma actividade subsidiária. A vida nas comunidades desenrolava-se de forma orgânica, muitas vezes num formato de auto-sustentabilidade. A baleação representava portanto um suplemento orçamental para as famílias. No final de uma temporada, quando os produtos extraídos dos cachalotes eram vendidos no mercado internacional, os baleeiros recebiam a sua parte, a soldada. “Havia aqui três ou quatro lojas, eu tinha uma caderneta e o dono tinha outra. A gente comprava fiado e, quando a gente recebia o dinheiro, ia pagar. ” Comprava-se farinha, açúcar, café, um pequeno electrodoméstico, tudo aquilo que a terra e o mar não podiam providenciar. No caso da baleação açoriana não faria sentido recorrer aos grandes navios-fábrica com que os norte-americanos, entre outros, baleavam. As próprias ilhas, suspensas no meio do Atlântico Norte e em pleno habitat e rotas migratórias dos cetáceos, faziam as vezes dessas embarcações. Este facto não é um pormenor. Esta baleação costeira implicava, desde logo, um envolvimento maior da comunidade. Luís toma a palavra. “Toda a gente era baleeiro. Quando o foguete rebentava na vigia, a vida em terra parava e as pessoas — que estavam na construção, a lavrar a terra, na pesca artesanal — paravam para ir apanhar baleias. Se os homens paravam o que estavam a fazer, alguém tinha de ficar atrás a tomar conta do que eles estavam a fazer. A avó costuma contar-lhe que os homens corriam em direcção ao porto e que as mulheres corriam também, seguindo-os. Elas sabiam que eles não estavam preparados, faltava-lhes roupa e comida para ter no mar. Francisco da Silva resume: “Quando a gente saía de casa para a baleia, a gente era como ir para a guerra. Não sabia se iam voltar para trás, porque naquela altura morria muita gente. ”Ela veio do fundo para cima, deu uma marrada no fundo do bote e meteu uma tábua para dentro"Lembra-se desses dias de alvoroço, sobretudo do ambiente de uma época em que em Santa Cruz das Ribeiras havia três companhias, em que a aldeia vibrava, quando em cada casa viviam quatro ou cinco pessoas. “E todos viviam, trabalhavam as suas terras, iam ao mar. Faziam-se festas bonitas aqui nas Ribeiras”, assegura. “Era uma actividade que criava realmente um imaginário em toda a comunidade”, acrescenta Luís. Os nomes dos antigos baleeiros escorrem pelas bocas de ambos com facilidade. Os apelidos, as alcunhas. Há algum peso romanesco por estes lados. Encontramo-lo gravado na pedra. Não directamente no basalto que domina a ilha, essa rocha impermeável e sombria, rija, mas que se quebra em biscoitos, que arquiva a história milenar dos que a pisaram. Na marina da vila das Lajes do Pico, uma estrutura em forma de pórtico em mármore branco contrasta visualmente com o cenário da terra e do mar. É o monumento ao baleeiro, assinado por Pedro Cabrita Reis. Nele se inscreveram os nomes de baleeiros, de vigias, de construtores de botes, de quem fez da actividade a sua vida durante décadas. “Está ali o nome do meu bisavô, o pai da minha avó. ” Luís aponta para o nome Artur Silveira, mais conhecido por “Artur Faidoca”. A origem da alcunha perde-se no tempo. Imediatamente acima há mais um Faidoca e um pouco por todo o monumento vão-se formando pequeno núcleos. É a conceito de linhagem a fazer-se notar, os nomes a ecoar com um significado maior do que à primeira vista lhe daríamos, como se pertencessem a uma mitologia perdida. “O que eu sinto é que as pessoas não dependiam da baleação, mas era uma actividade que só era possível com estas pessoas. Era dura e as pessoas estavam habituadas a uma vida dura”, explica Luís. A actividade contava com o conhecimento empírico destes homens, que à sua maneira tinham de perceber de mares, de meteorologia, quase até de biologia. “Quando ando hoje nos botes, percebo que as gentes de hoje não podiam andar à baleia, levam montes de tempo a fazer uma coisa. [Na altura] a vela e o mastro tinham de vir para baixo imediatamente, era preciso pôr o remo de esparrela e era preciso ter atenção à linha que estava a correr, enquanto tudo isto acontecia. Até era preciso molhá-la, porque era tal a velocidade que ela passava aqui a fumegar [depois de o cachalote ser arpoado]. ”Quase que ouvimos a voz do avô de Luís, a dizer-nos sem qualquer vestígio de azedume: “Hoje em dia os novos não acreditam. São criados de outra maneira. Era uma vida triste, mas não havia outra vida. ”A alguns quilómetros dali, na freguesia de São Mateus, uma casa parece ter sido rebocada há pouco tempo. Algumas marcas de cimento destoam da brancura das outras paredes exteriores. As janelas estão fechadas, tal como a porta. A rede que se agita à entrada é o único sinal de vida. É a casa de José Silvino, o homem que ficou na boca do cachalote e sobreviveu. A história corre. Há quem a conte de forma mais detalhada, há quem a recorde com uma névoa de onde apenas se distinguem os principais momentos. O próprio já não pode esclarecer os contornos reais do acidente. Está debilitado e mudou-se para a casa de uma sobrinha. Um sobrinho resume o episódio de forma directa. “Levou 55 pontos. Mas, pronto, salvou-se. ” Manuel Bettencourt, um outro sobrinho que baleou apenas durante dois breves períodos nos anos 1979 e 80, recorda a história com os pormenores aventurosos de uma lenda. “É um caso inédito”, inaugura o relato. “Na altura ele era o arpoador do cunhado, que já era oficial. Trancou a baleia e não houve problema nenhum”, continua em suspenso, antes de desembrulhar de uma vez só os pormenores do acidente. O cachalote irrompeu debaixo do bote, de boca ainda aberta e pegou em José Silvino, que ficou preso nos dentes enquanto a baleia submergia ligeiramente à tona da água. Só quando o animal mergulhou um pouco mais e abriu a boca é que o baleeiro se soltou. “Teve uma sorte impecável”, conclui Manuel, enquanto aponta para a sua barriga a explicar a dimensão das costuras com que José Silvino ficou, como marcas de um episódio inacreditável. “Há a construção individual e também há a construção social”, diz Francisco Henriques. “Não temos uma postura demasiado rígida quanto à fiabilidade. Às vezes ouvimos histórias que poderão não parecer inteiramente reais — até podem sê-lo, mas não as conseguimos imaginar precisamente por ser uma actividade que já não existe. Mas há sempre algum tipo de informação factual que podemos cruzar com outras informações. ” “Mesmo dentro dessas narrativas criadas estão vários detalhes da vida social que vamos apreendendo e que consideramos muito importantes”, conclui. Atrás da casa de Luís Bicudo impõe-se uma encosta que ocupa o horizonte. Uma escarpa verde que perdemos de vista, cortada por uma neblina familiar na ilha. “O mundo está diferente, as pessoas têm mil interesses à sua disposição”, desabafa. “Há 50 anos uma pessoa estava aqui. . . ” e dirige o seu olhar para a tal encosta. “Ainda há bocado o meu padrinho falou de ter nascido aqui e pensar que atrás daquela colina era a América. Nunca tinha saído daqui, e agora vive na América. Se calhar o mundo era mais pequeno. ”Luís procurava uma explicação para aquilo que define como um desinteresse pela história desta actividade que terminou há exactamente três décadas no arquipélago. Há investigação sobre o tema, há investimento regional, as regatas mobilizam anualmente a comunidade, incluindo os jovens. Mas Luís sente que esse interesse não se traduz para outros domínios — como os baleeiros. É também por isso que nestas dezenas e dezenas de entrevistas Francisco e Luís optaram por uma abordagem simples. A câmara de vídeo acaba por ser o único intruso entre eles e os baleeiros. “Deixamo-los falar muito”, conta Francisco. As conversas tomam o rumo que as memórias dos baleeiros sugerirem, ainda que haja alguns pilares essenciais, como o conhecimento empírico, a economia familiar e da comunidade, a religião. “Embora o nosso objectivo seja constituir um arquivo que possa ser trabalhado por outras pessoas, claro que temos uma empatia enorme, um fascínio. E muitas vezes também nos comovemos com os registos que ouvimos”, revela Francisco. “A verdade é que há registos múltiplos e é difícil ter só uma linha de interpretação sobre isso. O importante não é tanto a síntese, mas a recolha. ” Francisco confessa mesmo que é (ainda) difícil fazer uma síntese. “Cada baleeiro tem uma história para contar e tem uma história própria. E é essa diversidade que é rica e que deve estar disponível. ”Este projecto é uma luta contra a perda de memória?, perguntamos a Luís Bicudo. “Sim, contra a perda de memórias, contra a perda da identidade. ” Depois de uma longa--metragem e deste arquivo de memórias da baleação, Luís já aprendeu a refrear a sua emoção sobre o assunto. A passagem do tempo trouxe-lhe uma serenidade que lhe permite dizer coisas como: “O rumo natural das coisas é que as pessoas morram, não é?” Ou: “Vai chegar o dia, e eu provavelmente vou assistir, em que já não resta nenhuma pessoa viva que tenha estado ligada à baleação nos Açores. ”O bananal da família de Luís Bicudo é também um dos sinais do tempo que passa. No tempo dos bisavós não se plantavam bananas naquele terreno, nem nos circundantes. O solo servia para plantar e colher aquilo que as necessidades diárias impunham. Milho, batatas, batatas-doces. As bananeiras apareceram quando as pessoas passaram a estar menos dependentes das suas culturas. Em redor, muros de pedra basáltica delimitam pequenas vinhas, mas também outros bananais, aparentemente mais organizados do que aquele que o avô de Luís plantou há já alguns anos. As bananeiras desenham os seus próprios carreiros, desordenados, desarrumados, estimulantes. Como os filamentos ardilosos da memória. Luís Bicudo deixa o bananal para trás, encaminhando-se para casa, escolhendo um caminho diferente daquele que nos levou até lá. Um percurso que o faz percorrer grande parte da aldeia de Santa Cruz das Ribeiras, e ao longo do qual vai apontando aquilo que mudou desde que a conheceu pela primeira vez. Estanca numa rua longa, no caminho para casa. “Isto também é arquitectura baleeira. A rua vai dar directamente à rampa onde estavam os botes. A rua acaba e começa ao mar. ” Tudo isto é dito com um sorriso intrigante. “Foi um período da história que passou”, diz Luís, rejeitando à partida qualquer rasgo nostálgico. Aquilo de que sente falta não é da actividade, mas do pulsar quotidiano que ela de alguma forma trazia àquela aldeia. “Esta freguesia chegou a arrear à baleia nove botes. Sete homens em cada bote, as famílias deles, o pessoal das lanchas. Era uma freguesia cheia de vida, com muitas crianças. Chegou a ter três padarias. Hoje não tem nem uma. Tenho medo de que isto caminhe para o fim, que daqui a 50 anos não haja ninguém daqui. É disso que sinto saudade. De pessoas que mantenham as tradições. E manter as tradições não quer dizer fazer como os avós faziam, mas que se parta daí. As pessoas não estão atentas às histórias orais e portanto vai-se perdendo. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Foi isso que fez — que tem feito, aliás. Ouvir, fazer perguntas. Ouvir de novo. Com isso aprendeu que não há narrativas simples para explicar a baleação. Aprendeu que a baleação foi também um importante factor de comunicação entre ilhas, e bastava olhar para o avô, um “filho da baleação”, que nasceu porque o pai dele foi balear para a Terceira e lá conheceu a mulher. Aprendeu que, apesar de estes homens não serem biólogos marinhos, conheciam bastante bem o cachalote. Se não o conhecessem, não o poderiam caçar. “Aprendi muito. Nunca cacei uma baleia mas. . . mas quase sei como se faz. Apesar de, se calhar, se o fizesse, ia correr muito mal”, reconhece. “O meu consolo é daqui a uns 50 anos ser um especialista. Quando já não houver ninguém. ”A viagem do jornalista teve o apoio da Direcção Regional de Cultura - Governo dos Açores
REFERÊNCIAS:
Eleições antecipadas na Áustria após escândalo envolvendo a extrema-direita
O chanceler Sebastian Kurz diz que não pode continuar a governar com o partido de extrema direita FPÖ cujo líder, Heinz-Christian Strache, foi filmado a discutir troca de favores políticos por financiamento ilegal. (...)

Eleições antecipadas na Áustria após escândalo envolvendo a extrema-direita
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.1
DATA: 2019-05-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: O chanceler Sebastian Kurz diz que não pode continuar a governar com o partido de extrema direita FPÖ cujo líder, Heinz-Christian Strache, foi filmado a discutir troca de favores políticos por financiamento ilegal.
TEXTO: O chanceler austríaco Sebastian Kurz, cujo partido conservador ÖVP (Partido Popular da Áustria) governa em coligação com o partido de extrema-direita FPÖ (Partido da Liberdade da Áustria), anunciou este sábado que não continuará esta coligação depois de o vice-chanceler e líder do partido, Heinz-Christian Strache, ter sido gravado em video a discutir várias acções ilegais para beneficiar o seu partido. O vídeo foi divulgado na sexta-feira à noite, Strache demitiu-se este sábado. “Chega”, disse o chanceler, depois de enumerar outros problemas na coligação, que defendeu dizendo que nenhum outro partido do país quis governar com o seu partido. Kurz acrescentou que propôs ao Presidente, Alexander Van der Bellen, marcar eleições “o mais rapidamente possível”. Strache foi apanhado em vídeo a discutir negócios duvidosos e ilegais com uma suposta sobrinha de um oligarca russo em Ibiza. Os videos, editados de um total de sete horas de filmagens, foram divulgados pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung e pela revista Der Spiegel. Em declarações aos jornalistas em que anunciou a sua demissão, Strache pediu desculpa pelo erro, mas manteve que não fez nada ilegal. Apresentou a armadilha em que caiu como uma tentativa de acabar com a coligação e disse que se sacrificaria pelo bem do partido. Em 2017, ou seja, antes da chegada do FPÖ ao Governo, Strache reuniu-se com a alegada sobrinha de um oligarca russo discutindo, em linguagem colorida, modos de ganhar influência nos media, falando de pessoas “com muita massa” e referindo-se a jornalistas como “prostitutas” (ainda recentemente o FPÖ tentou afastar um jornalista da televisão pública ORF por uma pergunta incómoda a um candidato). Estavam presentes ainda um intérprete e dois políticos do FPÖ, incluindo Strache. O chanceler tem-se distanciado da extrema-direita para evitar sair prejudicado com as suas acções, em casos como a suspeita de troca de informações com a Rússia, por exemplo. Ainda este sábado um jornal alemão, o Welt am Sonntag, dizia que a agência para a protecção da Constituição da Alemanha (BfV), responsável pelos serviços de informação interna, Thomas Haldenwang, disse a semana passada numa comissão parlamentar que havia um “risco aumentado” de partilhar informação com a Áustria por causa das ligações do FPÖ à Rússia. Num comentário jornal suíço Neue Zürcher Zeitung (conservador), a jornalista Meret Baumann escreve que com este caso não pôs fim apenas à carreira política de Strache, mas também “à experiência de Kurz governar com os extremistas e de os tentar domar”. No video, a suposta sobrinha do oligarca, Alyona Makarova, afirma querer investir dinheiro “não completamente legal na Áustria”, e o grupo discute que um bom investimento poderia ser o jornal Kronen Zeitung. “Se nos ajudarem”, comentou Strache, “conseguiremos não 27%, mas 34%” nas eleições, quer se realizariam dali a três meses, disse o líder do FPÖ. E Strache evocou mesmo a possibilidade de “ter uma paisagem mediática como a de Orbán” (na Hungria, o primeiro-ministro conseguiu gradualmente dificultar a vida aos meios que não são pró-Fidesz; entre os grandes meios, não restam jornais ou televisões críticas). Em troca, o líder do FPÖ prometeu adjudicar contratos públicos — com valores inflacionados — a empresas que a investidora russa viesse a criar. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Também foram mencionados esquemas ilegais para financiamento do partido através de associações ou clubes. A bomba estourou mesmo uma semana antes das eleições europeias, levando alguns apoiantes do FPÖ a questionar o interesse de quem organizou o encontro, filmou e divulgou as imagens. A Spiegel diz que a fonte do vídeo é conhecida dos editores de ambos os jornais mas deseja permanecer anónima. Não é claro o interesse de quem organizou a reunião e a filmou, mas ambos os meios de comunicação social justificaram a divulgação, após verificação de peritos independentes, pelo interesse público. Enquanto isso, em Viena uma manifestação espontânea juntou centenas de pessoas em frente à sede do Governo, com slogans como “Abaixo Strache”, “Eleições já” ou “Que vergonha”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave social vergonha ilegal