Orbán, Trump, Bolsonaro: como chegámos até aqui?
Mais do que em quaisquer outros recursos do Estado, é nos aparelhos securitários que a extrema-direita se quer infiltrar. (...)

Orbán, Trump, Bolsonaro: como chegámos até aqui?
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Mais do que em quaisquer outros recursos do Estado, é nos aparelhos securitários que a extrema-direita se quer infiltrar.
TEXTO: Bolsonaro sairá amanhã à frente na corrida para a 2. ª volta das eleições brasileiras – e eu sou dos que temo que seja mesmo eleito no próximo dia 28. Os Le Pen pai e filha já chegaram duas vezes à 2. ª volta das presidenciais francesas. Trump foi eleito presidente da maior economia e do maior arsenal de armas do mundo. A extrema-direita tem 15%-25% dos votos em meia Europa e, só na UE, dirige ou participa em governos de coligação de dez países (da Itália e Bélgica à Hungria e Polónia). Há pelo menos 25 anos que este processo está em curso. Desde que a direita radical começou a assaltar o poder nos países pós-comunistas, que Berlusconi chegou ao governo aliado com a extrema-direita e que os EUA passaram a ter presidentes como Bush Jr. e Trump, que se discute se o clamor racista, xenófobo e o discurso do ódio e do Estado policial (e/ou da sociedade em armas) que se foi banalizando são ou não a versão séc. XXI do fascismo. Agora que também o Brasil pode somar-se à lista, perguntemo-nos como chegámos até aqui. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Antes de mais, o ponto a que chegámos é um estádio já avançado da transição autoritária por que está a passar o Ocidente pela segunda vez nos últimos cem anos (desde o fim da I Guerra Mundial). Ela segue efectivamente alguns dos passos que seguiu nos anos 1920 e 30: não pela via do golpe militar que rompia bruscamente com o regime mas pela via da transição legal para a ditadura. Sintoma central dessa transição é a degradação generalizada da qualidade do sistema democrático, adoptando, antes de mais, formas de reforço do poder executivo que violam constituições, atacam políticas sociais que se julgava terem-se tornado ganhos definitivos e violam tratados internacionais (suspendendo, como a França ou a Grã-Bretanha, a aplicação da Convenção Europeia de Direitos Humanos) e que são incompatíveis com a democracia. Não há fascismo sem emergência, sem que a maioria da sociedade acredite que vive em estado de emergência – social e económica por causa de uma crise, securitária por causa daquilo que lhe explicam ser uma guerra (contra “o terror”, por exemplo, ou, como no Brasil, contra “o crime”). É nesta emergência tornada permanente, e que parece não terminar nunca, que, ao mesmo tempo que se fragiliza ao extremo a vida dos mais pobres, dos sem poder, o Estado adopta medidas securitárias “extraordinárias”, concedendo poderes discricionários às polícias e aos serviços de informação, sem controlo judicial e democrático (tortura, invasão de domicílio, vigilância não autorizada. . . ). O Estado e os media banalizaram um discurso autoritário contra a democracia (disfarçado, contudo, de preocupação com a “protecção da democracia”) que defende que a lei não protege os cidadãos, e por isso há que revogar direitos e liberdades cívicas dos “suspeitos” de pôr em causa a “segurança”, mas, dessa forma, generalizando a todos os cidadãos a retirada desses direitos e dessas garantias. O discurso da paranóia securitária, não só culpabiliza minorias étnicas e grupos sociais inteiros (que podem ir dos muçulmanos em países ocidentais aos pobres e favelados no Brasil, suspeitos de parasitarem o Estado e de serem ameaças potenciais de roubo e violência), como justifica suspender, na prática, a democracia. É por isto que, mais do que em quaisquer outros recursos do Estado, é nos aparelhos securitários que a extrema-direita se quer infiltrar. Como se percebe bem pelas denúncias do Conselho da Europa sobre a polícia portuguesa, ou pelo que se passou recentemente na Alemanha, os neofascistas nem sequer precisam de chegar ao poder e nomear ministros para atingir este fim. Da Rússia às chamadas democracias consolidadas ocidentais, nas Américas ou em Israel, muita gente no topo destes aparelhos na Europa partilha os mesmos mitos dos neofascistas dos nossos tempos: que está em curso uma “invasão demográfica” (muçulmana, africana. . . ) do Ocidente, feita por homens e mulheres que são “inassimiláveis”, que vêm ofender “o nosso modo de vida”, os “valores cristãos” e/ou “tradicionais”. Outra versão desta construção do “inimigo interno” é aquela que nos últimos anos regressou em força ao Brasil, aos EUA, mas também à Europa: a de que há uma conspiração (escolha-se o adjectivo) “cosmopolita”, “marxista”, “politicamente correta” contra “a família”, a “tradição” ou a história e os “heróis” nacionais – como há dias se achou, de forma muito reveladora, que o Conselho da Europa estava a fazer com Portugal. . . O fascismo nunca triunfa só com fascistas. Os que lhes emprestam credibilidade (e lhes dão o voto) é que são o problema. Um dia acordamos com eles no governo. A criar raízes.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA UE
Obiang convidou Marcelo para festa da independência, mas Lisboa envia encarregado de negócios
Portugal vai enviar um diplomata — e não um político — à festa dos 50 anos da independência da Guiné Equatorial. Decisão é forma de mostrar a Malabo a insatisfação de Lisboa com o regime de Obiang. (...)

Obiang convidou Marcelo para festa da independência, mas Lisboa envia encarregado de negócios
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Portugal vai enviar um diplomata — e não um político — à festa dos 50 anos da independência da Guiné Equatorial. Decisão é forma de mostrar a Malabo a insatisfação de Lisboa com o regime de Obiang.
TEXTO: Não será o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa a representar Portugal na cerimónia dos 50 anos da independência da Guiné Equatorial, mas sim o encarregado de negócios colocado na embaixada de Malabo. Na Primavera, o Presidente Teodoro Obiang, que governa a Guiné Equatorial desde 1979, enviou uma carta ao homólogo português, convidando Marcelo Rebelo de Sousa para a festa do cinquentenário. “Considerando as excelentes relações que a República da Guiné Equatorial mantém com a República Portuguesa, tanto a nível bilateral como multilateral [. . . ], é com prazer que convido Vossa Excelência a participar pessoalmente nos actos comemorativos deste acontecimento histórico, aos quais a Vossa presença dará um realce especial”, diz a carta de Obiang de 15 de Maio. No convite, o Presidente guinéu-equatoriano sublinha a importância do 12 de Outubro de 1968 (“a primeira vez que se içou a bandeira nacional em todo o país, na sede das Nações Unidas e da União Africana”) e informa que o “acontecimento histórico” será festejado “com solenidade”. O convite foi entregue em mão ao ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, em Lisboa, no fim de Maio, pelo chefe da diplomacia de Obiang, após um invulgar episódio diplomático. Malabo pediu uma audiência com Rebelo de Sousa mas, não querendo informar sobre o que se tratava, Belém delegou o assunto para o Palácio das Necessidades. O Estado português acabou por decidir que far-se-á representar por Manuel Grainha do Vale, conselheiro na embaixada de Portugal em Malabo, disse esta terça-feira ao PÚBLICO uma assessora do gabinete do ministro Santos Silva. A escolha de um diplomata e não do chefe de Estado ou de um membro do Governo de António Costa tem uma intenção política: manter pressão sobre o regime de Teodoro Obiang. Lisboa considera que Malabo fez “progressos insuficientes” quanto aos compromissos assumidos ao entrar na CPLP, em 2014. Não é por acaso que Portugal continua sem embaixador na Guiné Equatorial e mantém a representação diplomática ao nível de encarregado de negócios. Um alto funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros disse ao PÚBLICO que, enquanto Malabo não ratificar a abolição da pena de morte, Lisboa não elevará o nível diplomático. As autoridades guinéu-equatorianas sabem disso e não teriam ilusões quanto à resposta ao convite a Rebelo de Sousa, disseram cinco diplomatas ao PÚBLICO nas últimas semanas. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. As agendas oficiais foram sendo preenchidas nos últimos meses e nunca contemplaram o convite de Obiang: do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa (que tem um “compromisso inadiável” no dia 12, segundo o seu assessor para a imprensa) a Teresa Ribeiro, secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (que nesse dia estará a sair de Díli, onde assinará o novo Protocolo Estratégico de Cooperação com o Governo de Timor-Leste e a caminho de Singapura). Portugal tem, de qualquer modo, uma política muito reservada em relação à representação oficial neste tipo de cerimónias. Em dois anos e meio, Marcelo Rebelo de Sousa foi às tomadas de posse de apenas dois homólogos: Filipe Nyusi, de Moçambique, e João Lourenço, de Angola, e nunca foi a cerimónias de aniversário nacionais. “Seria atípico o Presidente ir às cerimónias de Malabo”, disse um diplomata sénior. Na semana passada, o PÚBLICO contactou a embaixada da Guiné Equatorial em Lisboa para saber o programa oficial de dia 12 e os convidados já confirmados, mas não obteve resposta.
REFERÊNCIAS:
Entidades CPLP
Festival Mimo leva a Amarante Salif Keita, Seun Kuti e Mayra Andrade
Festival nas margens do Tâmega conta com mais de 50 actividades gratuitas no programa, de 26 a 28 de Julho. (...)

Festival Mimo leva a Amarante Salif Keita, Seun Kuti e Mayra Andrade
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-06-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Festival nas margens do Tâmega conta com mais de 50 actividades gratuitas no programa, de 26 a 28 de Julho.
TEXTO: A quarta edição do Festival Mimo, que se realizará de 26 a 28 de Julho, vai levar a Amarante mais de 20 concertos, com artistas de oito países. À semelhança dos anos anteriores, os concertos do festival luso-brasileiro – assim como as outras actividades – vão ser gratuitos. Lu Araújo, responsável pelo Mimo, afirma ao PÚBLICO que o festival tem “evoluído a cada ano” e que as expectativas para esta edição são “as melhores”. O festival, que na edição de 2018 contou com mais de 70 mil pessoas, volta a ter uma programação “muito diversificada”, com concertos de artistas do Brasil, de Cabo Verde, de Itália, do Mali, da Mongólia, da Nigéria e da Palestina, muitos deles com “concertos exclusivos” no Mimo. Para além, claro, de nomes portugueses. Os brasileiros Rubel, Bixiga 70 e o rapper Criolo, o grupo de hip-hop palestiniano 47Soul e a cabo-verdiana Mayra Andrade são alguns dos nomes que vão passar pelo palco principal do Mimo, juntando-se a portugueses como Samuel Úria ou os Miramar, um projecto conjunto de Peixe e Frankie Chavez. No palco principal, vai tocar ainda o vencedor do Prémio Mimo da Música. Lu Araújo destaca a “forte presença da música negra”, com nomes como Seun Kuti, filho de Fela Kuti, que assinou em 2018 um disco muito elogiado pela crítica, e o maliano Salif Keita. A responsável pelo festival destaca também a boa participação de música portuguesa “diferenciadora” e as muitas mulheres no cartaz. Além dos concertos no Parque Ribeirinho, o programa do festival abrange outras actividades em vários locais do centro de Amarante, como o Museu Amadeo Souza-Cardoso, a Igreja de São Pedro, a Igreja de São Gonçalo, o Cinema Teixeira de Pascoaes e Centro Cultural Amarante. Os claustros do Museu Amadeo de Sousa-Cardoso e o Cinema Teixeira de Pascoaes vão receber o Festival Mimo do Cinema, que este ano tem como fio condutor a música de diversos géneros e conta com várias estreias em território nacional. No dia 27 de Julho, o museu vai também estrear a mostra Abstração. Arte Partilhada, uma exposição com 30 obras de 18 autores nacionais, poderá ser visitada até 27 de Outubro, numa iniciativa que “diferencia” o Mimo de Amarante com o do Brasil, onde não há exposição de arte, segundo Lu Araújo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A “Chuva de Poesia” desta edição do Mimo vai “homenagear o amor nas suas diversas formas”, oferecendo ao público “pancadas de poesia” com versos de Chico Buarque, Jorge de Sena, Mário Sá-Carneiro, José Saramago, Sophia de Mello Breyner Andresen, Pablo Neruda, Florbela Espanca, Vinícius de Moraes, Gregório de Matos, Bocage, Fernando Pessoa, entre outros, num total de 30 poemas. O programa do evento fica completo com o Fórum de Ideias, no Museu Amadeo de Souza-Cardoso, e com o Programa Educativo, no Centro Cultural Amarante, com vários workshops dados por vários artistas presentes no festival. As inscrições para estas actividades abriram esta segunda-feira no site do Mimo e estão disponíveis até dia 15 de Julho. Nas manhãs dos dias de festival, haverá também um Roteiro Cultural que dá a conhecer o património religioso de Amarante. Todas as actividades são gratuitas.
REFERÊNCIAS:
Teresa Lago quer levar a inclusão até às estrelas
A astrofísica portuguesa é o novo rosto principal da maior organização de astronomia do mundo. Escolheu para a sua acção aí o tema da inclusão. Se olharmos para o seu papel na astronomia em Portugal nos últimos 30 anos, vemos que a preocupação com a inclusão já lá estava. (...)

Teresa Lago quer levar a inclusão até às estrelas
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.2
DATA: 2018-08-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A astrofísica portuguesa é o novo rosto principal da maior organização de astronomia do mundo. Escolheu para a sua acção aí o tema da inclusão. Se olharmos para o seu papel na astronomia em Portugal nos últimos 30 anos, vemos que a preocupação com a inclusão já lá estava.
TEXTO: Hoje parece-nos incrível, mas em 1986 havia apenas três astrónomos profissionais em Portugal – Teresa Lago era um deles. Mais de três décadas depois, o panorama é radicalmente diferente. De um país sem astrónomos e isolado cientificamente no mundo, Portugal não só passou a ter uma comunidade com duas centenas de astrónomos como faz parte de grandes organizações internacionais como o Observatório Europeu do Sul, o que permitiu o acesso dos investigadores portugueses aos mais avançados telescópios do mundo e a participação em descobertas que dão que falar, como a detecção de planetas extra-solares. É neste terreno agora mais fértil no país para a astronomia que Teresa Lago emergiu como secretária-geral da União Astronómica Internacional (UAI). Nomeada há três anos como o rosto principal da maior organização mundial de astronomia, com mais de 13. 000 membros de cerca 100 países, assume essas funções a partir desta quinta-feira, durante a assembleia geral da UAI, que decorre até sexta-feira em Viena, Áustria. Para o seu mandato de três anos (até Agosto de 2021) à frente da UAI – organização não-governamental fundada em 1919, com sede em Paris, para promover a astronomia como ciência –, Teresa Lago escolheu como lema a inclusão. “É o tema que mais me toca”, confessa. “Uma organização internacional feita para todos tem de contribuir para a inclusão, que não é só a inclusão de género, é de muitos tipos: é de culturas diferentes que têm de ser respeitadas, mas que podem dificultar ou facilitar a ciência”, começa a enumerar a astrofísica portuguesa. “A questão da inclusão é também a inclusão de regiões e de pessoas que têm limitações físicas – incluindo pessoas cegas, que têm direito a aprender astronomia e a trabalhar em astronomia – e a inclusão até na vida diária, porque o conhecimento dá poder. ”Ainda sobre esta questão, remata: “Para fazer ciência é preciso haver condições. E essas condições não existem às vezes. São muito diferentes de país para país. Há os que nascem no berço já feito, fofinho, preparado, e há aqueles que vão ter de preparar a cama onde se vão deitar. ”Teresa Lago ajudou a fazer essa cama que não existia em 1986, contribuindo para o desenvolvimento de Portugal ao ter um papel na política científica na área da astronomia. A pedido de José Mariano Gago (1948-2015), presidente, entre 1987 e 1989, da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT, antecessora da Fundação para a Ciência e a Tecnologia), a astrofísica preparou a proposta de um Plano Nacional para o Desenvolvimento da Astronomia e que viria a ser apresentada nas Jornadas Nacionais de Investigação Científica e Tecnológica, em 1987. Antes das jornadas, que reuniram em Lisboa a então pequeníssima comunidade científica portuguesa para se apresentarem propostas de desenvolvimento da ciência e que ficariam na história da política científica do país, a JNICT fez um inquérito às instituições ligadas à astronomia sobre os recursos existentes. “Éramos três astrónomos”, recorda Teresa Lago (António da Costa, do Instituto Superior Técnico, e Filipe Duarte Santos, da Faculdade de Ciências de Lisboa, eram os outros dois). E ri-se. Foi a partir daí que começaram a ser criados centros de investigação em astronomia. Depois de já ter sido a responsável pela criação de uma licenciatura em astronomia na Universidade do Porto em 1983, Teresa Lago avançou em 1988 para a fundação do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto, o primeiro centro de investigação de Portugal nesta área, que dirigiu durante 18 anos. No início de 2015, o centro do Porto fundiu-se com o Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa, nascendo assim o Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço. Com um pólo em Lisboa e outro no Porto, é agora a maior instituição de astronomia do país, com 101 investigadores, incluindo 37 estudantes de doutoramento. Segundo André Moitinho de Almeida, presidente da Sociedade Portuguesa de Astronomia, o número total de investigadores em astronomia e astrofísica em Portugal ronda agora os 200 (incluindo estudantes de pós-graduação). E, destes, 70 estão no Centro de Astrofísica e Gravitação (Centra), que inclui membros do Instituto Superior Técnico, da Universidade do Algarve, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. “Estimo que mais de 1/4 dos 200 investigadores sejam estrangeiros, o que mostra a atractividade científica dos centros de investigação portugueses”, destaca André Moitinho de Almeida, astrofísico do Centra. Portanto, uma realidade muito distante dos três astrónomos de 1986. “Teresa Lago é central na criação, desenvolvimento e visibilidade internacional da investigação e educação em astronomia feitas em Portugal”, resume André Moitinho de Almeida. “Num curto período de tempo, Portugal passou de um país essencialmente sem astrónomos para uma produção científica que figura quase todas as semanas em notas de imprensa internacionais. A qualidade internacional da comunidade teve origem no trabalho pioneiro (e muitas vezes solitário) de Teresa Lago. ”Mostrando como a astronomia pode ser um instrumento para a inclusão de um país e o seu desenvolvimento – de Portugal, neste caso –, Teresa Lago recorda uma história dos tempos de preparação do Plano Nacional para o Desenvolvimento da Astronomia. “Nunca me esqueci de que quando preparei o plano de estratégia nacional ter perguntado a três pessoas bem conhecidas de instituições de astronomia da Europa se viriam passar um fim-de-semana ao Porto para me darem sugestões. E vieram”, conta. “Também não me esqueci de que as revistas científicas da primeira biblioteca do Centro de Astrofísica [do Porto] foram doadas por astrónomos europeus, principalmente franceses e ingleses, e que para nós eram uma coisa fabulosa. Há outros colegas, de outros países, onde uma ajuda pode ser fundamental. ”Também nessa mesma altura, Teresa Lago preparou a proposta de associação de Portugal ao Observatório Europeu do Sul (ESO), uma organização intergovernamental de investigação astronómica, com 15 países-membros, sede na Alemanha e grandes telescópios no Chile. Em 1990, quatro anos e meio depois da integração de Portugal na então Comunidade Económica Europeia (hoje União Europeia), o acordo de pré-adesão ao ESO era assinado “num dia quente de Lisboa”, 10 de Julho, como registou então um artigo na revista do ESO, El Mensajero. Em 2000, ao fim de dez anos de cooperação com o ESO, em que houve um programa de apoio a projectos de investigação, infra-estruturas, formação e acesso de cientistas portugueses aos telescópios no Chile, Portugal aderia à organização como membro de pleno direito, agora com Mariano Gago como ministro da Ciência. “Passámos a ser membros de um clube de elite”, frisa hoje Teresa Lago. Durante vários anos, até 2013, a astrofísica foi membro do Conselho do ESO, o seu órgão governativo e de decisão máxima. Já a nível da União Europeia, foi um dos membros fundadores (em 2005) do Conselho Europeu de Investigação – ou ERC, que financia investigação de topo na Europa –, onde teve assento no seu conselho científico até 2013. Agora pretende levar esta ideia de inclusão mais longe, até porque, como secretária-geral da UAI, tem o poder executivo. Além dela, há um presidente (neste caso, a holandesa Ewine van Dishoeck, que assume funções também entre 2018 e 2021), bem como um secretário-geral assistente e um presidente-eleito, que daqui a três anos estarão na linha da frente da organização, tal como acontece agora com Teresa Lago, que já tinha sido nomeada há três anos. Quando se lhe pergunta o que se propõe fazer no seu mandato, responde: “Este ano preparámos, pela primeira vez, um plano estratégico global, que indica as áreas em que a UAI se vai envolver nos próximos dez anos. Existia um plano estratégico parcelar, mas só para a astronomia para o desenvolvimento. Este é o primeiro plano estratégico da UAI, que inclui, além da astronomia para o desenvolvimento, a formação de astronomia, a comunicação com o público, a discussão de futuras instalações de grande escala. Engloba todas as actividades que a UAI desenvolve. ”A inclusão consta nesta estratégia. Uma das acções nesse sentido, e que vai já ser posta em prática, diz respeito aos astrónomos mais jovens. “Antes só podiam ser membros individuais os astrónomos que tivessem a astronomia como profissão. Nos tempos actuais, há muitos doutorados em astronomia que não têm um lugar permanente. Estávamos a perder uma parte jovem e interessante dos membros. Por isso, criámos a categoria de membro-júnior”, avança. Esta categoria é por três anos, renovável por outros três. “Pelo menos têm seis anos para entrar definitivamente na profissão. ”O exemplo de uma cientista em papéis de liderança também contribui para a inclusão de género, como revela o caso de Catarina Oliveira, agora astrofísica na Agência Espacial Europeia (ESA). “A professora Teresa Lago foi muito importante quando eu estava a acabar o ensino secundário e a escolher o que ia estudar na universidade. Foi em 2000, o ano em que Portugal se juntou ao ESO e à ESA. Vi-a na televisão. Apareceu como directora do Centro de Astrofísica do Porto e foi aí que percebi que havia um curso de astronomia”, diz-nos. “Ver uma mulher a fazer astronomia inspirou-me e escolhi esse curso. Pela minha própria experiência, ter mulheres em posições de liderança mostra que é possível. ”Outra das ideias de que Teresa Lago fala é a criação de um Gabinete de Astronomia para a Educação. A UAI já tem três gabinetes espalhados pelo mundo. Um fica na Cidade do Cabo, criado em 2011 em parceria com o Governo sul-africano: é o Gabinete da Astronomia para o Desenvolvimento, que já atribuiu verbas a 122 projectos em mais de 85 países, como refere o Plano Estratégico da UAI – 2020-2030. Além disso, este gabinete já estabeleceu nove gabinetes regionais de astronomia para o desenvolvimento (na Arménia, China, Colômbia, Etiópia, Jordânia, Nigéria, Portugal, Tailândia e Zâmbia). O gabinete português dedica-se à divulgação científica da astronomia em língua portuguesa, em todos os países lusófonos, sendo acolhido pelo Núcleo Interactivo de Astronomia (Nuclio), em colaboração com o Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço. Já o Gabinete para Comunicação da Astronomia ao Público, o segundo, surgiu em 2012 no Japão, em parceria com o Observatório Nacional Astronómico japonês. Por fim, em 2015 foi criado o Gabinete para Jovens Astrónomos, com a Academia Norueguesa das Ciências e das Letras: sendo virtual, gere um programa que a UAI já tinha lançado em 1967 dedicado à formação pós-graduada – as Escolas Internacionais para Jovens Astrónomos. São escolas de Verão organizadas sobretudo em países pouco desenvolvidos em astronomia, onde especialistas de todo o mundo vão ensinar durante três semanas. “Na América Latina, em África e em alguns países da Ásia isto tem sentido”, nota Teresa Lago. E, agora, deverá ser criado um Gabinete de Astronomia para a Educação, centrado nos níveis mais baixos do ensino. Trata-se de “usar a astronomia como instrumento para a educação das tecnologias e das ciências”, explica, dizendo que deverá ser aberto um concurso internacional para procurar uma parceria para desenvolver este projecto. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Nas prioridades da UAI está também a protecção do céu nocturno perto dos observatórios astronómicos, na parte visível da luz, e não só, como é o caso da banda de rádio. Para isso, pretende trabalhar com autoridades nacionais e internacionais para estabelecer políticas e orientações de protecção do céu. A UAI é também a autoridade internacional que atribui oficialmente os nomes aos corpos celestiais ou que define a nomenclatura astronómica. Por exemplo, cabe-lhe a definição do que é um planeta, tal como coube, em 2006, a mediática despromoção de Plutão de planeta principal para planeta-anão. Ou a atribuição, em Outubro de 1990, do nome oficial a um corpo celeste especial para os portugueses: é o asteróide Portugal, ou asteróide 3933, que foi descoberto em 1986, entre Marte e Júpiter, precisamente num dos telescópios do ESO no Chile. O nome é uma homenagem a Portugal pelo acordo de pré-adesão ao ESO em que Teresa Lago foi uma peça fundamental. “Foi uma espécie de doce, um gesto de simpatia, de estímulo”, recorda agora. Ouvimos Pedro Russo, astrofísico português na Universidade de Leiden (Holanda), sobre como é que a astronomia pode ajudar à inclusão e desenvolvimento no mundo. “Se pensarmos no ESO [Observatório Europeu do Sul], fundado há mais de 50 anos por vários países na Europa, que se juntaram para construir grandes telescópios, vemos que foi um dos primeiros projectos de cooperação internacional para compreender melhor o Universo. A astronomia é uma ciência internacional em que as pessoas colaboram sem olhar para as fronteiras como uma barreira”, responde. “Muitas ferramentas, principalmente de análise de dados que temos desenvolvido na astronomia para trabalhar grandes quantidades de informação, levaram à criação de software usado mais tarde na medicina, observação da Terra ou telecomunicações e que tem impacto real na vida das pessoas”, assinala ainda o astrofísico, que foi o coordenador global do Ano Internacional da Astronomia em 2009. Por fim, Pedro Russo diz que muita da investigação em astronomia vem de bases de dados, acessíveis a todos pouco tempo depois da sua obtenção. “A astronomia é acessível a países em vias de desenvolvimento, para começarem a criar uma capacidade em ciência fundamental e de ponta. As publicações e os dados científicos estão muito acessíveis, o que permite que pessoas com um computador comum possam fazer a astronomia de ponta que os países desenvolvidos fazem. ” Além disso, pode usar-se a astronomia como um instrumento de ensino. “Desperta muito interesse quer no público quer nos alunos e pode ser uma porta de entrada dos alunos noutras ciências e tecnologias. Pode usar-se a astronomia para ensinar matemática, física, química…” Teresa Firmino
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
A democracia e os resultados eleitorais “odiosos”
A democracia contém imperfeições e tensões. Para funcionar bem necessita de uma constante reinvenção e readaptação às condições sociais e políticas. É isso que não tem existido. (...)

A democracia e os resultados eleitorais “odiosos”
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-29 | Jornal Público
SUMÁRIO: A democracia contém imperfeições e tensões. Para funcionar bem necessita de uma constante reinvenção e readaptação às condições sociais e políticas. É isso que não tem existido.
TEXTO: 1. Não há democracia sem povo (“demos”) e sem este ter o poder (“kratos”) de escolher os seus governantes. Por isso, também não há democracia sem eleições livres. Mas os resultados eleitorais podem ser algo “odioso”. Podem ser algo atentatório das nossas convicções e valores profundos e da própria democracia, pelo menos da maneira como a concebemos. É esse o sentimento de muitos com a eleição de Viktor Orbán na Hungria, de Rodrigo Duterte nas Filipinas, de Donald Trump nos EUA, e, agora, com a eleição de Jair Bolsonaro no Brasil. (Res)sentem essas escolhas como um ultraje. Fazem veementes manifestos de indignação na imprensa à maneira novecentista do “J’accuse” de Emile Zola a propósito do caso Dreyfus (ver “J’accuse”, par Emile Zola, in Le Nouvel Observateur, 12/07/2006). Todavia, o que estamos a assistir não é a um retrocesso da democracia stricto sensu, enquanto expressão da vontade popular, entendida como a vontade da maioria. O que estamos a assistir é uma crescente tensão entre a democracia e outros princípios fundamentais — direitos das minorias, ou direitos dos migrantes e estrangeiros, etc. —, os quais, até agora, estavam estreitamente associados a esta e eram assumidos como uma natural (auto)limitação da escolha política democrática. Por outras palavras, estavam fora das opções apresentadas como possíveis aos eleitores. Hoje esse consenso estilhaçou. 2. A democracia está ameaçada por iliberalismos, populismos, autoritarismos e fascismos. Formular assim a questão parece simples e inequívoco — afinal, quem não sabe o que é a democracia e que a democracia está ameaçada? Paradoxalmente, o problema é mesmo esse, saber do que estamos exactamente a falar. Há, na teorização da ciência política e na prática político-constitucional dos estados, múltiplos tipos e conceitos de democracia, frequentemente apresentados de forma antagónica. Assim, temos democracia representativa versus democracia directa; democracia social versus democracia formal; democracia popular versus democracia burguesa; democracia multicultural versus democracia monocultural; democracia liberal versus democracia iliberal; e democracia consensual versus democracia maioritária. A lista já vai longa e está longe de ser exaustiva. Normalmente, os proponentes de cada versão consideram ser essa a melhor, ou então a mínima forma de democracia aceitável. Neste último caso, a ausência de tais requisitos implicará exclusão do campo democrático. Todavia, apesar de tais pretensões “hegemónicas”, ninguém tem o monopólio desta: importa reconhecer que a democracia pode significar coisas muito variáveis, em diferentes sociedades e contextos históricos. 3. Uma solução para o problema dos múltiplos significados da democracia, poderia ser ir às origens do termo, procurando encontrar resposta na “pureza original” da democracia ateniense, na Antiguidade Clássica grega. Na realidade, isso também não ajuda muito. O conceito moderno de democracia, embora inspirado na democracia grega (ateniense) do século V a. C. , emergiu, na realidade, no Ocidente europeu a partir finais do século XVIII. Pelos parâmetros actuais mais comuns na Europa e Ocidente, a democracia ateniense não seria hoje uma inspiração para qualquer democracia (liberal), nem provavelmente para outras formas de democracia. Engrossaria, com grande probabilidade, o leque dos muitos iliberalismos e autoritarismos que hoje são vistos como ameaçando-a. Seria racista (superioridade helénica sobre os bárbaros, os não helénicos) e xenófoba (do grego “xénos”, estranho e/ou estrangeiro + “phóbos” medo e/ou aversão); violadora dos direitos humanos (os direitos fundamentais do cidadão não existiam); opressiva e patriarcal (as mulheres eram excluídas) e violadora dos direitos das minorias (metecos). Provavelmente nenhum democrata hoje gostaria de se ver associado a tal forma de democracia. Naturalmente que isso não significa que se deva ler o passado — sobretudo um passado tão longínquo —, à luz dos valores e critérios do presente. Mas olhar o passado tem um mérito: mostra como a complexidade e as contradições da ideia de democracia não devem ser subestimadas. 4. No século XIX, durante os anos 1860, já na fase das democracias modernas, surgiu uma muito citada definição de Abraham Lincoln, Presidente dos EUA na época da guerra civil norte-americana. A democracia foi configurada como sendo “o governo do povo, pelo povo, para o povo” (government of the people, by the people, for the people). (Ver Abraham Lincoln Online, “The Gettysburg Address”). Mas esta definição, apesar da sua boa ressonância, é geradora de equívocos sobre a natureza institucional da democracia moderna. Tomada à letra — e comparada com a realidade política observável — provavelmente levaria à conclusão radical de que nunca houve nenhuma “verdadeira” democracia, nem nos EUA, nem em parte nenhuma. Desde logo, porque a democracia que ganhou contornos na Europa e Ocidente não foi uma democracia directa como, por exemplo, imaginava ser possível Jean-Jacques Rousseau em finais do século XVIII (Rousseau, para além de se inspirar na Atenas da Antiguidade Clássica grega, imaginou-a a partir de uma comunidade política de pequena dimensão como era Genebra, na Suíça). Abraham Lincoln poderá ter, com a sua definição, sugerido tal ideia democrática aos mais incautos. Mas nunca houve um puro “governo do povo, pelo povo e pelo povo”, nem era essa a ideia da frase de Lincoln. O que tinha em mente era uma democracia onde uma elite, através de mecanismos de representação política, governava em nome do povo. 5. Por razões histórico-políticas o termo democracia entre nós sugere que o “povo é quem mais ordena” — um icónico slogan da revolução de 25 de Abril de 1974, retirado de uma estrofe da música Grândola Vila Morena de José Afonso. A ideia, aparentemente, ficou consagrada no artigo 3. º da actual Constituição: “A soberania, una e indivisível, reside no povo”. Mas realidade é mais complexa do que a letra da canção (e do que a simples leitura do texto constitucional) sugerem. O conceito de soberania não é unívoco, é uma abstracção político-jurídica que precisa que lhe tracem o alcance. Politólogos e constitucionalistas — secundados, normalmente, por aqueles que fazem a representação dos eleitores — não entendem a soberania do povo como um poder e uma liberdade tendencialmente irrestritos. Pelo contrário, vêem-na condicionada por meta-princípios os quais vão desde o direito natural aos direitos humanos. Assim, para os primeiros (os representantes), o facto de a vontade popular ser limitada por convenções de direitos humanos, de direitos das minorias, tratados internacionais, regras de organizações internacionais como a União Europeia, é algo normal e bom. Já para os segundos — os representados —, não é necessariamente assim. Embora tais princípios e (auto)limitações sejam amplamente aceites pelo establishment que exerce a representação política, não foram profundamente interiorizados, nem são eventualmente partilhados pela generalidade da população. Este ponto crítico das democracias está hoje no cerne dos resultados eleitorais “odiosos”. 6. É simplista reduzir o actual problema democrático e dos resultados das eleições a uma mera questão de fake news, ou de eleitores mal informados e manipulados, como muitos pretendem. Claro que esse é um problema sério das democracias, mas não é o cerne da questão. A questão mais profunda e complexa centra-se na (re)emergência da tensão entre a representação política e a vontade democrática do cidadão. É verdade que essa tensão é tão antiga quanto a própria democracia, mas adquiriu uma intensidade e contornos novos. No passado teve períodos de crise aguda — por exemplo, na Europa dos anos 1920 e 1930 — e também períodos de uma longa acalmia, como na Europa e Ocidente das décadas finais do século XX. Aí deu a ideia de o problema estar encerrado. Foi uma ilusão. Neste início do século XXI, entramos, tudo indica, numa nova fase de crise aguda de representação política. Afecta instituições fundamentais da democracia liberal-parlamentar, tal como a conhecíamos até agora: os partidos políticos e os media. Ambos são peças clássicas da democracia representativa, ambos são, cada um à sua maneira, também intermediários entre o cidadão-eleitor e quem exerce o poder. Mas temos assistido a um pôr em causa do establishment político e mediático. Explica-se por uma combinação complexa de circunstâncias sociais e políticas, onde a tecnologia, especialmente a Internet e as redes sociais, e o aumento da informação acessível cidadão, seja ela rigorosa ou falaciosa, têm um papel maior. Cada vez menos cidadãos aceitam a representação política (e os media), como no passado, como um filtro e um “educador” das “boas” opções políticas. 7. Para concluir, importa insistir nesta ideia. Peças cruciais da democracia-liberal — os partidos e os media do establishment —, habituais intermediários entre o cidadão e o exercício do poder, estão hoje a ser abalados. Entre ambos, políticos e media, existia um largo consenso que sustentava as referidas (auto)limitações da democracia. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Como já notado, isso subtraía as questões de direitos das minorias, de direitos dos migrantes e estrangeiros, de pertença à União Europeia ou à Zona Euro, entre outras, do jogo eleitoral. Os media, ao limitarem ideias políticas desviantes, ajudavam a “fechar” o espaço público. Mas a emergência da sociedade em rede está a destruir esse modelo de democracia do passado. Abriu um espaço público paralelo que permite ultrapassar os media e os seus critérios editoriais. Coloca os políticos do establishment à defesa. O problema mais profundo é que esse consenso de (auto)limitações ligadas à democracia nunca abrangeu a generalidade da população, pelo menos com a amplitude que julgava o establishment. Na era anterior à sociedade em rede era possível funcionar assim fechando o circuito, ou seja, o espaço público a ideias desviantes. Hoje cada vez menos é possível. Enganam-se os que pensam que a solução é voltar a formas de democracia liberal à maneira das últimas décadas do século XX, onde os cidadãos aceitavam, de forma relativamente passiva, a representação política (e os media) como filtro e “educador” da sua vontade. A ideia de se poder (auto)limitar a escolha democrática, colocando certos princípios e valores acima da vontade popular, garantidos, essencialmente, por um consenso de elites (representantes), não funciona quando existe um outro espaço público aberto — a Internet e as redes sociais. A democracia contém imperfeições e tensões, desde os seus primórdios na Grécia clássica ao (re)aparecimento no Europa moderna. Para funcionar bem necessita de uma constante reinvenção e readaptação às condições sociais e políticas. É isso que não tem existido.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Hélia Correia é a vencedora do Prémio Camões
Escritora é o 11.º português a receber aquele que é considerado o mais importante prémio literário destinado a autores de língua portuguesa. (...)

Hélia Correia é a vencedora do Prémio Camões
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-06-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Escritora é o 11.º português a receber aquele que é considerado o mais importante prémio literário destinado a autores de língua portuguesa.
TEXTO: O Prémio Camões 2015 foi esta quarta-feira atribuído por unanimidade à escritora Hélia Correia, o 11. º português a receber aquele que é considerado o mais importante prémio literário destinado a autores de língua portuguesa. O prémio, no valor de cem mil euros, foi anunciado no Palácio São Clemente, sede do consulado português do Rio de Janeiro, onde esteve reunido o júri. Para Francisco Vale, que vem editando a obra da escritora na Relógio d'Água desde 1983 – "praticamente desde que existe a editora" – é um prémio inesperado mas merecido. "A Hélia é um dos escritores que melhor trata a língua portuguesa, com uma obra muito diversificada – romance, poesia, obras dramáticas, contos, literatura infanto-juvenil", diz. "O português dela é muito fecundo. Tem um estilo próprio, com uma grande precisão de linguagem. Cada frase tem o número exacto de sílabas. Ela leva o rigor da escrita a esse ponto". Além de que "consegue criar personagens muito originais que vão ficar na literatura portuguesa", nota o editor. "Ela é muito inovadora na escrita, mas ligada à melhor tradição literária. Tem influências do Camilo Castelo Branco, da Emily Brontë de O Monte dos Vendavais, e dos clássicos gregos em relação aos textos dramáticos. Aliás, a Hélia, quando a vemos, parece muitas vezes acabada de chegar da Grécia Antiga", continua o editor. A Relógio d'Água planeia reeditar este ano algumas obras escolhidas de Hélia Correia em capa dura – uma colecção que inclui Virginia Woolf, Oscar Wilde e Kafka – e as novelas O Separar das Águas, Soma e Villa Celeste. A autora trabalha actualmente num novo romance. "Não é por causa dos prémios que edito a Hélia. Mas sempre editei incondicionalmente. Só fiz isso com outro autor, o Rui Nunes. Disse-lhes que publicaria tudo o que escrevessem. Publicaria mesmo sem ler. São casos perfeitamente excepcionais", diz Francisco Vale. Na obra de Hélia Correia, o que mais seduz Rosa Maria Martelo é o modo como a autora “articula um registo narrativo com tonalidades poéticas”. Uma escrita “híbrida”, através da qual “consegue uma fuga ao realismo, mas sem nunca deixar de manter uma atenção muito directa ao mundo em que vivemos”, precisa a ensaísta, que acha “muito bonito” o modo como Hélia Correia “articula o fantástico com as circunstâncias da nossa vida”. Exemplo particularmente feliz desta “ligação muito eficaz entre o inactual e o actual, entre o local e o universal” é, defende Rosa Martelo, o livro de poesia Terceira Miséria, que Hélia Correia publicou em 2012 e que recebeu o prémio literário Correntes d'Escritas. “Num dia como o de hoje, em que esperamos que a Europa resolva o problema da Grécia, o texto de Hélia Correia antecipa o que está a acontecer e chama a atenção para a necessidade de o resolvermos como um problema de todos nós, do nosso projecto de mundo enquanto humanos”. Em Terceira Miséria, a autora “consegue mostrar como aquilo que é a nossa tradição e a nossa cultura nos permite perceber a complexidade do mundo contemporâneo, ao mesmo tempo que nos dá instrumentos de salvaguarda do humano”, conclui a ensaísta. Hélia Correia veio da poesia, deixou-a, mas transporta-a em tudo o que escreve. Nos contos — o mais recente volume Vinte Degraus e Outros Contos (Relógio d’Água 2014) e nos romances — o último foi Adoecer — serão contaminados por essa experiência e a tal fé na literatura. No conto A Dama Singular, a protagonista acredita nisso como quem acredita que depois de ensinar uma menina a ler e a escrever ela pode finalmente ficar “encerrada na beleza”. Vale todo o esforço. A escrita de Hélia Correia é capaz desse efeito, apesar da inquietação que transmite: o de uma clausura quase reconfortante. É um efeito ainda mais eficaz pela clareza das frases e de um enorme poder de criação de imagens. “Lizzie passou para detrás da porta abandonada que servia de biombo e regressou vestida de rapaz. Apanhara o cabelo sobre a nuca. Mostrava as pernas e isso produzia um curioso efeito assexuado. Gabriel adiantou-se e começou a ocupar-se da figura que falava, não nos papéis de esboço, mas na tela. As personagens masculinas já se achavam muito avançadas. Ele posara para o bobo. Os pré-rafaelitas provocavam situações de entreajuda em que existia, a par de exibição, sinceridade. ”É uma passagem simbólica de Adoecer que transporta muitas das marcas de Hélia Correia, uma autora que próxima, pelo ambiente e pela linguagem, de escritores ingleses, como Iris Murdoch, mas também da pintura de Rossetti, John Everett ou Elizabeth Siddal que a inspirou precisamente na escrita de Adoecer ao criar a personagem Lizzie, alguém entre o amor e a doença, a salvação ou a condenação. Lizzie como Lillias são personagens exemplares. Duas mulheres entre a força e o pathos, condições que caracterizam muitas das mulheres que Hélia criou na sua ficção. “Eu vejo a morte — disse Lillias. ” Era um poder que ninguém queria, o de antecipar o fim. Uma frase simples que carrega toda a tragédia humana, que coloca a questão sobre a condição do homens na terra. Delicadamente, é para aí que a escrita de Hélia Correia quase sempre leva: para a essência. Hélia Correia nasceu em Lisboa, em 1949, mas cresceu em Mafra, terra da família materna. “A minha infância e a de todo o meu grupo de amigos foi de algum modo especial”, conta ao PÚBLICO, explicando que o pai era um anti-fascista que tinha estado preso ainda antes de ela nascer e que viveu sempre entre pessoas da oposição ao regime salazarista. “Tivemos uma educação extremamente progressista, muito igualitária, e nada sexista, completamente desfasada da educação normal da época”, diz. Mas essa infância “muito feliz, muito livre e criativa” coexistia com o “terror absoluto” que era “a ameaça da PIDE, de os pais serem presos, de não se poder falar, de ser preciso esconder coisas”. Além de serem tolerantes, os pais de Hélia Correia eram leitores. “Havia uma forte presença literária em minha casa: lembro-me de os meus pais discutirem porque a minha mãe era camiliana e o meu pai queirosiano”. Mas foi uma das suas amigas, desse grupo de filhos de mafrenses da oposição, que a tornou uma leitora precoce. “Era um ser fascinante lindíssimo”, diz. Mais velha quatro anos do que a futura escritora , era ela que fazia de professora quando o grupo, em dias mais chuvosos e frios, se reunia no sótão de um deles para brincar às escolas. E era uma professora tão competente, mesmo a fazer de conta, que aos quatro anos Hélia aprendeu a ler. A partir daí começou a “deitar a mão a tudo o que era livro” e leu coisas que não eram particularmente indicadas para a sua idade. “Ainda hoje tenho horror ao Victor Hugo, porque li O Homem que Ri e aquilo dava-me medo, faz parte dos meus pavores”. Não ficou nada satisfeita quando, aos seis anos, o médico da família lhe diagnosticou um esgotamento, mandou que lhe retirassem todos os livros do alcance da mão, e convenceu o pai de que a pequena Hélia não poderia ir para a escola nesse ano. “Para me compensar do aborrecimento, trepava a uma varanda da escola e assistia às aulas de uma professora que tinha sempre a janela da sala aberta”. Terminado em Mafra o que hoje seria o 9. º ano, acabou os estudos liceais em Lisboa e licenciou-se em Filologia Românica. É logo no início da sua frequência universitária, comuns 18 anos, que começa a publicar poemas nos suplementos literários do tempo, como o Juvenil do Diário de Lisboa, coordenado por Mário Castrim. Embora tenha começado pela poesia, e seja possível argumentar que, enquanto ficcionista, nunca deixou de ser poeta, foi como prosadora que ganhou notoriedade e reconhecimento crítico. Estreou-se em 1981 com O Separar das Águas e, ao longo da década de oitenta publicou, além de A Pequena Morte / Esse Eterno Canto, um livro de poemas a meias com o seu companheiro Jaime Rocha – nome literário do jornalista Rui Ferreira e Sousa –, mais cinco volumes de ficção, incluindo O Número dos Vivos (1982) e a novela Montedemo (1983), obras geralmente aproximadas do realismo mágico. A própria autora não rejeita essa filiação – “Não vou ignorar a importância que teve o realismo mágico sul-americano –, mas sublinha que nunca teve “um projecto de escrita”. E a sua escrita testemunha outras óbvias paixões, das irmãs Brontë – “A Emily Brontë é uma pessoa de minha casa, vive comigo – aos pré-rafaelitas ingleses. “É gente com quem sinto muita intimidade, mais do que com muitos vivos do meu quotidiano”. A partir dos anos 90, vieram juntar-se à sua criação ficcional várias obras teatrais, é já no século XXI, em 2001, que publica aquele que é talvez o seu livro mais apreciado, Lillias Fraser, cuja história decorre entre 1746 e 1762 entre a Escócia e Portugal, abarcando o terramoto de Lisboa, que leva a protagonista a fugir para Mafra. O livro ganhou o prémio de Ficção do Pen Club. E já em 2012, Hélia Correia protagonizou um regresso bastante extraordinário à poesia com, um livro que é um único longo poema em várias partes, e que lê o presente à luz da lição da Grécia clássica, sugerindo que “A terceira miséria é esta, a de hoje. / A de quem já não ouve nem pergunta. / A de quem não recorda”. A autora conta que, curiosamente, o PÚBLICO contribuiu involuntariamente para que tivesse escrito este livro. “Convidaram-me para escrever um poema para uma página de poesia que o jornal tinha e eu concordei desde que o poema saísse [como veio a acontecer] no dia em que ia haver uma grande manifestação dos indignados”. Acontece que “saiu um poema enorme, que não cabia numa página”, e teve de escrever outro. E ficou nas mãos com A Terceira Miséria, “sem saber o que lhe fazer”. Um poema de evidente actualidade, tendo em conta o modo como está a evoluir a situação grega, mas disso a escritora não consegue agora falar. “A raiva tira-me as palavras todas”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quanto ao prémio Camões, diz que foi “uma prenda muito bonita” e “uma grande surpresa”, e que a apreciou ainda mais por vir de um júri “onde há pessoas que admiro muito”, mas também vai dizendo que fez pouco “pelo prestígio da língua portuguesa” e que “haveria nomes muito mais indicados, pessoas que têm aquilo a que se pode chamar uma carreira literária”. Não está a ser irónica, acha apenas que a sua relação com a escrita é tão natural que o que ela possa valer não é mérito seu. “É como se me premiassem por ter olhos castanhos”. Desde que o Prémio Camões foi inaugurado em 1989 – ano em que venceu o poeta português Miguel Torga –, foram escolhidos quatro autores dos países africanos de expressão portuguesa (sem contar com o angolano Luandino Vieira que recusou): os moçambicanos José Craveirinha, em 1991, e o já referido Mia Couto, o angolano Pepetela, em 1997, e o cabo-verdiano Arménio Vieira, em 2009.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Tengarrinha
José Manuel Tengarrinha partiu. As suas ideias estão vivas como sempre. Algumas estão finalmente a ser postas em prática. Outras se-lo-ão, não o duvidemos, em breve (...)

Tengarrinha
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0
DATA: 2018-07-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: José Manuel Tengarrinha partiu. As suas ideias estão vivas como sempre. Algumas estão finalmente a ser postas em prática. Outras se-lo-ão, não o duvidemos, em breve
TEXTO: Revejo as imagens da saída dos presos políticos de Caxias, a 27 de abril de 1974, e lá encontro José Manuel Tengarrinha: prestando declarações com serenidade, com elegância, com inteligência, com aquela atenção prestada ao próximo que lhe era própria. Tendo o cuidado de lembrar que “a libertação de todos os presos políticos” foi o resultado de “uma deliberação unânime dos próprios presos no sentido de saírem todos juntos” (e não separadamente como antes teria sido preferência da Junta de Salvação Nacional). E lembro-me de outra coisa: José Manuel Tengarrinha tinha então 42 anos. Diz-se muitas vezes — corretamente — que é difícil a nós hoje imaginar o que significava fazer oposição à ditadura e estar preparado para ser preso a qualquer momento. É igualmente difícil imaginar como as gerações da oposição foram forçadas a crescer e tomar responsabilidades depressa. Vê-se nas imagens da libertação um Salgado Zenha de 50 anos e um Jorge Sampaio de 35, advogados de presos políticos que tinham vindo agora libertar à cadeia de Caxias. Vê-se militantes do PCP ou da LUAR com vinte anos de idade, alguns dos quais presos desde os seus dezoito anos. E se houvesse maneira de correr o filme para trás veríamos jovens republicanos, socialistas, comunistas e anarquistas, alguns deles enviados para o Tarrafal ainda antes de serem maiores. Grande parte deles viveram toda a sua vida adulta sob a ditadura; alguns deles terão desesperado de a ver acabar. Quando o 25 de Abril chegou, eram estes ainda jovens homens e mulheres tornados adultos pelas circunstâncias que tiveram de se preparar para tomar um país em mãos, evitar o pior que seria uma nova fratura ou uma guerra civil, e conduzi-lo à democracia. José Manuel Tengarrinha era um desses. Desde que nasceu em 1932 até àquele dia em que foi libertado de Caxias (tinha sido preso poucos dias antes, mas não fora a primeira vez: já antes fora preso político a merecer um movimento internacional de solidariedade pela sua libertação) só conhecera a ditadura, ou melhor, a oposição à ditadura: do MUD juvenil às listas da Comissão Democrática Eleitoral, que depois se transformaria em Movimento Democrático Português (MDP/CDE). Mas ao mesmo tempo José Manuel Tengarrinha era diferente. Com os seus camaradas do MDP/CDE percebeu que para haver uma democracia desenvolvida não era só necessário haver partidos, mas teria de haver partidos que fossem democráticos: os estatutos do MDP, com a criação de Movimentos Democráticos em cada distrito do país, são percursores daquilo a que hoje se chama de democracia deliberativa. Percebeu antes de muitos que era a partir do meio da esquerda, contrariando os maus hábitos sectários de centristas e extremistas, que era possível tentar ser catalisador de uma mudança política progressista em Portugal. Percebeu que na nova realidade do que viria a ser a União Europeia, Portugal precisava de ter um partido representado na família parlamentar europeia que viria depois a ser a dos Verdes Europeus: ecologistas, progressistas e lutadores pelos direitos humanos que não estivessem enfeudados a blocos geopolíticos ou a taticismos espúrios. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E mais do que isto, talvez José Manuel Tengarrinha tenha percebido o que estava por detrás destas escolhas estratégicas: uma luta inglória, difícil e permanente que era preciso levar para diante com a mesma elegância e serenidade com que ele falava à saída de Caxias. E por isso, quando as consequências daquelas escolhas estratégicas o puseram perante a incompreensão e ostracismo por parte de antigos camaradas, e perante um certo silenciamento político e mediático, José Manuel Tengarrinha percebeu que a política não era a única forma de dar o seu contributo ao país. Voltou à sua paixão que era a historiografia e o ensino da história; escreveu milhares de páginas sobre a história da imprensa em Portugal, estudou a fundo e publicou incessantemente sobre o século XIX português e o longo arco do progressismo que nele vai do liberalismo ao socialismo. E continuou a ser certamente a mesma pessoa de sorriso afável que eu conheci em 2014, quando me disseram que ele queria apoiar o LIVRE nas eleições europeias a que o partido concorria pela primeira vez com apenas dois meses de existência. Não tínhamos pedido apoio a ninguém, muito menos a José Manuel Tengarrinha. E aqui estava alguém que, podendo descansar sob os louros de um percurso cívico e intelectual único, se decidia a apoiar um partido novo de gente nova. Simplesmente porque, como nos disse, se sentia livre como nunca. Para quem como eu ele tinha sido o político mais admirado desde a infância (a primeira vez que fiz campanha foi pelo MDP/CDE nas Europeias de 1989), conhecê-lo e, depois, ter tido o privilégio de ser candidato nas mesmas listas (em 2015) e seu camarada de partido (a partir desse ano) foi passar a admirá-lo ainda mais. Vê-lo debater amenamente com quem tinha cinco vezes menos idade do que ele foi uma lição. José Manuel Tengarrinha partiu. As suas ideias estão vivas como sempre. Algumas estão finalmente a ser postas em prática. Outras se-lo-ão, não o duvidemos, em breve. Porque são ideias livres e resistentes, como ele e como a planta de que ele tinha o nome, e que é tão comum no seu Algarve natal.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE PCP MDP/CDE
Na noite em que o Super Rock foi super hip-hop brilhou Slow J
Depois de uma noite de abertura em que todos os caminhos foram dar aos Red Hot Chili Peppers, foi a cultura hip-hop, com todos os seus afluentes, a evidenciar-se no Super Bock Super Rock. (...)

Na noite em que o Super Rock foi super hip-hop brilhou Slow J
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.122
DATA: 2017-07-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Depois de uma noite de abertura em que todos os caminhos foram dar aos Red Hot Chili Peppers, foi a cultura hip-hop, com todos os seus afluentes, a evidenciar-se no Super Bock Super Rock.
TEXTO: Há um ano, o rapper Kendrick Lamar havia sido apoteótico no Super Bock Super Rock, num concerto que muitos ainda terão fresco na memória. Não houve nada parecido esta sexta-feira no mesmo local, até porque o americano parece estar hoje numa liga à parte, mas foi a cultura hip-hop, com todos os seus afluentes, que esteve em evidência, depois de no primeiro dia todos os caminhos terem ido dar aos Red Hot Chili Peppers. Logo na abertura do dia esteve o americano Pusha T, actuando a uma hora mais destinada aos nomes menos conhecidos. A opção de o pôr às 17h parece ter-se devido ao facto de nessa noite ter outro espectáculo na Bélgica. E essa ocorrência marcou a sua prestação: o rapper norte-americano, cúmplice de Pharrell Williams, Kanye West ou Jay-Z, cumpriu apenas os serviços mínimos, com uma actuação de cerca de 40 minutos que ainda assim conseguiu arrancar algum entusiasmo aos mais indefectíveis. Mais generoso foi Keso, um rapper portuense que actuou do outro lado do recinto, com as batidas densas do hip-hop a sublinharem letras poéticas e uma forma provocadora mas bem-disposta de interagir com o público. Mas se houve um nome que se destacou no segundo dia do festival foi o de Slow J, ou seja João Batista Coelho, que lançou este ano o álbum de estreia The Art of Slowing Down. Do início ao fim teve o público com ele e fez por merecê-lo, mostrando uma confiança em palco que não se confunde com soberba. Não existe nele uma vontade afirmativa premente. Claro que pede a participação popular, mas fá-lo com o desprendimento de quem sabe que, antes de pedir a toda a hora para o público pôr as mãos no ar, tem de mostrar os seus dotes vocais (e ele tem-nos, quando declama ou canta, quando a palavra é cortante ou moldada) e um som rico e denso, que parte do hip-hop para a soul, o funk, as electrónicas, os africanismos ou o rock. Às tantas, no meio da actuação, quase como se pedisse desculpa, disse ao público para não se preocupar, caso estivesse a interrogar-se se estava a ouvir hip-hop ou rock. Numa época de tantas transmutações, as proclamações de “pureza” ou “autenticidade”, que ainda são recorrentes na cultura hip-hop, não fazem grande sentido e no seu caso isso ainda é mais nítido. Não tem de se preocupar. Nele tudo acaba por soar genuíno, fluindo de forma natural: palavras, música e ritmo. E aí, é necessário dizê-lo, Slow J tem em Fred Ferreira (bateria) e Francis Dale (teclados e guitarra) dois aliados de peso. Constituem verdadeiramente um trio. É evidente que tudo passa por ele, pela forma como consegue interagir com a multidão (ainda mais evidente em temas que toda a gente canta em coro como Não me mintas ou Menina estás à janela), mas vislumbra-se uma verdadeira cumplicidade entre os três, capazes de passar da energia à flor da pele de Arte para a ginga rítmica de Mun’ dança, ou de expor um registo mais introspectivo em Serenata e Sonhei para dentro. Lá para o final, coadjuvado pelos rappers Gson e Papillon, Slow J fez a festa com Pagar as contas, descendo até ao público para um merecido banho de afecto. Foi dele o melhor momento musical do dia. Quem não teve vida fácil foram os The Gift e os London Grammar, dois corpos estranhos num dia em que o hip-hop era rei. Os portugueses foram os primeiros a confrontar-se com uma Meo Arena meio despida de público, apostando nas canções do mais recente álbum, Altar. Uma opção generosa, já que na sua maioria são canções mais planantes e descarnadas do que lhes conhecíamos até agora. O efeito final, com o som dos instrumentos bem definido a cada um dos cantos da sala, acaba por resultar bem em Lost and found, Malifest, The singles ou Love without violins. Mas o público nunca saiu de uma certa letargia. A recepção aos London Grammar, desse ponto de vista, acabou por ser mais calorosa, com o trio inglês a fazer render o facto de estar pela primeira vez em Portugal. A excelente voz de Hannah Reid acaba por ser o centro das atenções, com o cenário a ser como a música: simples e desnudado. Por vezes isso gera momentos de enlevo emocional, como na interpretação puramente vocal de Rooting for you, ou na pop electrónica em câmara lenta de Strong, ou em Hey now, talvez o tema mais conhecido do álbum de estreia, que teve ressonância junto da assistência. É verdade que também houve momentos decorativos, mas no final ficou a ideia de que o grupo não estava à espera de uma recepção tão boa, e que o público não estava com expectativa para tanto. O que não é nada mau. Antes de o rapper americano Future entrar em palco, muita gente ainda foi a correr até à outra ponta do recinto, para assistir a um pouco do espectáculo dos Língua Franca, o colectivo luso-brasileiro de Capicua, Valete, Rael e Emicida. Do que vimos, sempre que Valete entrou em acção fez a diferença, principalmente quando cantou Rap consciente, o seu mais recente tema. Incisivo, sagaz e instigador, foi críptico com o posicionamento de algumas das figuras do rap das novas gerações, declamando: “Nós só queríamos saber de rimas e inovações/ Agora só preocupados com visualizações/ Tu viralizas, enquanto vigarizas. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Claro que não estava a falar de Future, a superestrela americana que era a grande atracção da noite junto do público mais juvenil, mas até podia ser, porque este pertence a uma geração para a qual tudo se joga nas avenidas da Internet, nos signos visuais e nos códigos de identidade em que os números e o ter tantas vezes se confundem com o ser. Não é por acaso que o palco, no início, se divide em vários ecrãs de telemóvel. A rodear Future estão por vezes três bailarinos, mas em muitas alturas o palco é todo dele. Uma voz invisível interage com o público, mas o que domina a sala é o imenso rumor do som dos graves e as vozes, dele e da multidão, muitas vezes em uníssono, parecendo por vezes quase indistintas. Os lentos batimentos cardíacos vão-se impondo, as imagens sobrepõem-se, e a voz de Future, alterada electronicamente, vai fazendo com que a magia aconteça entre as gentes, que se bamboleiam como se estivessem numa coreografia ensaiada, pelo menos nas zonas mais perto do palco. Não existe grande interactividade, para além dos habituais pedidos de “façam barulho!”, mas a comunicação acontece, com temas como o excelente Draco ou a balada Comin’ out strong a serem lançados sem interrupções. Para o final fica o sucesso Mask off, com uma magnífica batida narcótica a anteceder uma explosão de confetti e aplausos, num espectáculo que parece ter agradado aos admiradores de Future e deixado confuso quem não conhece a sua música e os códigos para a apreender. Claro que não fez esquecer o Kendrick Lamar do ano passado ou o Slow J de umas horas antes, e que não é ele o Future da música popular, mas é um dos presentes possíveis e, nesse sentido, cumpriu. Este sábado o rock volta ao festival com Deftones ou Foster The People, mas também haverá Fatboy Slim, Seu Jorge, Bruno Pernadas, Taxiwars ou James Vincent Mcmorrow.
REFERÊNCIAS:
Pedro Duarte, o "craque" da bola que quer fintar Rui Rio
Pedro Duarte, 45 anos, cortou com a facção de Passos na JSD e já afrontou o ex-autarca do Porto. Afastado da vida política activa nos últimos anos, o ex-deputado já se posicionou para a corrida à liderança do PSD. (...)

Pedro Duarte, o "craque" da bola que quer fintar Rui Rio
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.2
DATA: 2018-10-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: Pedro Duarte, 45 anos, cortou com a facção de Passos na JSD e já afrontou o ex-autarca do Porto. Afastado da vida política activa nos últimos anos, o ex-deputado já se posicionou para a corrida à liderança do PSD.
TEXTO: Rezava a lenda que o candidato a primeiro-ministro que conseguisse subir ao topo da ilha do Pico ganhava as legislativas. Foi assim com Mário Soares (ainda que de helicóptero), António Guterres e Durão Barroso. O então presidente do PSD superou esta espécie de prova de resistência ao lado do líder da JSD Pedro Duarte. Nesse dia à noite nenhum dos dois conseguia disfarçar as mazelas nos joelhos. Um tornou-se primeiro-ministro, o outro desafia agora a liderança de Rui Rio. Aos 25 anos, Pedro Duarte foi o "jota" que cortou com a facção de Passos Coelho na JSD, lançou na agenda a irreverência de propostas como a legalização da prostituição, discordou publicamente do então poderoso autarca Rui Rio e bateu o pé a Alberto João Jardim. Como director de campanha conquistou a saborosa vitória do candidato presidencial Marcelo Rebelo de Sousa, mas pesa-lhe a derrota de Luís Filipe Menezes, nas autárquicas de 2013, e da sua própria como candidato à Assembleia Municipal do Porto em 2017. Nasceu no Porto, no dia 12 de Julho de 1973, é o filho mais novo de uma farmacêutica e de um professor de História, militante do PSD. Como qualquer miúdo da sua idade daquela altura brincava na rua. “O Pedro era um craque, jogávamos muito à bola e ele jogava bem”, recorda Francisco Ramos, presidente do movimento de apoio a Rui Moreira, que vivia no mesmo prédio que Pedro Duarte, perto do estádio do Bessa. Pedro chegou a jogar na equipa do Boavista em jogos particulares e a treinar no Futebol Clube do Porto. Os dois vizinhos viriam a conquistar a direcção da associação de estudantes da escola Clara de Resende. Foi quando Cavaco Silva era primeiro-ministro e líder do PSD, e reflectia uma “imagem de modernidade” que os outros partidos não tinham, como assume Pedro Duarte, que se inscreveu na JSD. Tinha 15 anos. Chegou à JSD pela mão de Sérgio Vieira, um amigo comum de Francisco, e juntos começaram por conquistar o núcleo do PSD-Porto, a concelhia e, depois, a distrital. Apesar de terem escolhido cursos diferentes – Pedro licenciou-se em Direito, na Católica – a amizade de infância não se perdeu. Francisco Ramos aceitou fazer parte do Manifesto X, o projecto de reflexão política lançado por Pedro Duarte que tem a primeira realização nesta sexta-feira, às 18h, no Facebook: é a "Conferência Vox", sobre As Artes, a Cultura e as Pessoas. Aos 20 anos Pedro Duarte foi eleito membro da assembleia da freguesia de Ramalde. Na mesma altura foi também eleito, como independente, Manuel Pizarro, futuro secretário de Estado da Saúde do Governo de Sócrates. “Era muito admirado. Toda a gente achava que aquele rapaz ia ter futuro na política. Liderava uma bancada que tinha gente muito mais velha e com mais qualificações”, recorda o actual vereador do PS da Câmara do Porto. Manuel Pizarro elogia-lhe a “coragem” de assumir “em voz alta” as suas convicções. “Corajoso”, sim, concorda Nuno Freitas, um dos seus companheiros da "jota", mas que não gosta “do confronto pelo confronto”. Mas foi com uma fractura de uma linha política interna na JSD que Pedro Duarte chegou a líder da estrutura, em 1998. Candidatou-se contra Jorge Moreira da Silva, que tinha sido eleito anteriormente com o apoio de Passos. Perdeu por 13 votos. Mas Moreira da Silva caiu num conselho nacional seis meses depois. É nesse momento que Pedro Duarte se torna líder da JSD. O secretário-geral dessa primeira equipa é José Eduardo Martins com quem estabeleceu uma relação muito próxima. “É um miúdo muito bem-educado. Nunca levantei a voz ao Pedro”, afirma o ex-deputado, que foi apoiante de Rui Rio nas directas e que foi dos primeiros a aplaudir o Manifesto X. Reconhece-lhe qualidades: “É organizado, metódico e tem uma enorme capacidade de trabalho. Não tem a soberba de achar que faz tudo sozinho. “Durante a liderança da JSD ficou célebre a “guerra” com Alberto João Jardim, presidente do Governo Regional da Madeira. Depois de Pedro Duarte ter criticado declarações que considerou racistas sobre ajuda a timorenses, Alberto João chamou-lhe “pateta do presidente da JSD” e acabou por propor um processo de expulsão do partido que nunca teve seguimento. Na altura, a liderança de Durão Barroso não convidou o líder da JSD para intervir na rentrée seguinte. Esse episódio, como nota José Luís Arnaut, então secretário-geral, não se reflectiu no empenho da JSD na campanha das legislativas de 2002, em que a "jota" elegeu 14 deputados. A somar à vitória eleitoral foi durante o seu mandato que a JSD lançou o website – o primeiro entre as forças políticas – e colocou na agenda questões como a pílula do dia seguinte, a legalização da prostituição e o fim do serviço militar obrigatório. Depois de ter sido secretário de Estado da Juventude no Governo liderado por Santana Lopes, a experiência política foi engrossando com os sucessivos mandatos como deputado, presidente de comissão e vice-presidente da bancada parlamentar. No partido, foi líder da concelhia do PSD-Porto quando Rio já tinha conquistado a maioria absoluta na câmara. E é nessa altura que assume, numa entrevista, que Rio não seria o seu candidato ao Porto. Foi levado a demitir-se. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Em 2011 deixou o Parlamento e foi para a Microsoft. Já depois foi crítico de Passos Coelho, desafiando-o à “reinventar-se” na oposição. Os mais próximos reconhecem-lhe a “preparação” e a “substância”. Os críticos também. Mas apontam-lhe a volatilidade. “Já foi de tudo: santanista, marcelista e menezista”, diz um social-democrata, que já teve responsabilidades no partido. Falta-lhe ainda – diz a mesma fonte – carisma: “Nos congressos ninguém pára para o ouvir. ”Nas últimas directas abdicou de ser candidato contra Rui Rio. Levou ao congresso deste ano com uma moção assinada por Carlos Moedas, visto como um dos rostos do PSD do futuro. O Comissário Europeu não quis falar ao PÚBLICO sobre o seu parceiro da moção. Nem o actual Presidente da República que o escolheu para o seu director de campanha nas presidenciais de 2016. Foi um período em que interrompeu a sua vida profissional. Agora, promete contribuir para destronar Rio. E, quem sabe, subir à ilha do Pico.
REFERÊNCIAS:
A cada cinco segundos morre uma criança no mundo por causas evitáveis
Em cada dia de 2017, morreram 15 mil crianças devido a causas evitáveis e doenças tratáveis como a diarreia, a pneumonia ou a malária. (...)

A cada cinco segundos morre uma criança no mundo por causas evitáveis
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em cada dia de 2017, morreram 15 mil crianças devido a causas evitáveis e doenças tratáveis como a diarreia, a pneumonia ou a malária.
TEXTO: Em 2017 morreram em todo o mundo 6, 3 milhões de crianças e adolescentes (dos 0 aos 14 anos) por causas evitáveis — fazendo as contas, é uma morte a cada cinco segundos. Dessas, 5, 4 milhões tinham menos de cinco anos e metade dos óbitos (2, 5 milhões) ocorreram durante o primeiro mês de vida. Má nutrição, infecções e acidentes lideram a lista das causas de morte, de acordo com um relatório conjunto da UNICEF, Organização Mundial de Saúde (OMS), da divisão de população do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas e do Banco Mundial publicado nesta terça-feira. Apesar dos “progressos substanciais” das últimas duas décadas em matéria de prevenção da mortalidade infantil, estima-se que 15 mil crianças tenham morrido por dia em 2017 devido a causas evitáveis e doenças tratáveis, como diarreia, pneumonia ou malária. Uma situação “inaceitável”, conforme se lê no relatório. “Estas mortes são reflexo do acesso limitado das crianças e das comunidades a actos médicos como vacinação e o tratamento de doenças infecciosas, à nutrição adequada, água limpa e ao saneamento”, analisam os autores do documento. “Alcançar metas de sobrevivência infantil ambiciosas requer que haja acesso universal a cuidados efectivos, de alta qualidade e acessíveis para mulheres, crianças e adolescentes”. De acordo com os dados das Nações Unidas, há disparidades “regionais generalizadas”, que se relacionam com “desigualdades de rendimento”, e que afectam as hipóteses de sobrevivência das crianças. Em termos regionais, os países da África Subsaariana continuam a registar as taxas de mortalidade de crianças com menos de cinco anos de idade mais elevadas do mundo. Metade das mortes nessa faixa etária ocorreu nesta região. Em 2017, na África Subsaariana, uma em cada 13 crianças morreu antes do quinto aniversário. Por comparação, a Nova Zelândia e a Austrália apresentam as taxas de mortalidade infantil mais baixas do mundo: apenas uma em cada 263 crianças morre antes de chegar aos cinco anos. Se estas estimativas se mantiverem, entre 2018 e 2030 deverão morrer 56 milhões de crianças com menos de cinco anos de idade — e “metade deles serão recém-nascidos”, lê-se no relatório. Em termos globais, a maioria dos óbitos regista-se nas faixas etárias mais jovens, sendo que o maior risco de morte se regista no primeiro mês de vida. “Em 2017, a mortalidade neonatal — a probabilidade de morrer nos primeiros 28 dias de vida — estimava-se em 18 mortes por 1000 nados-vivos em termos globais”, lê-se. Estes números estão associados a factores como a idade das mães (mulheres com menos de 20 anos dão à luz bebés com menor probabilidade de sobrevivência), o nível de escolaridade da progenitora (registou-se um decréscimo na mortalidade dos bebés entre mães com o ensino secundário ou superior) e os níveis de pobreza das famílias e das respectivas comunidades. Nas zonas mais pobres, a probabilidade de se morrer antes dos cinco anos sobe para o dobro. Entre os bebés, as principais causas de morte incluem as complicações durante o parto, pneumonia, anomalias congénitas, diarreia, sépsis e malária. Mais tarde, as principais causas de morte passam a ser lesões, acidentes rodoviários e afogamento. De acordo com os dados de 2017, foi na República Centro Africana, mergulhada em conflito desde 2013, que se registou a taxa de mortalidade infantil (de crianças com menos de cinco anos) mais elevada do globo: 88 mortes por cada 1000 nascimentos. Também a mortalidade neonatal foi a mais elevada, com 42 mortes por cada 1000 nados-vivos. Nos países de língua oficial portuguesa, é em Angola que a taxa de mortalidade infantil é mais elevada: em 2017, morreram 54 crianças com menos de cinco anos por cada 1000 nascimentos. No Brasil, registaram-se 13 mortes por cada 1000 nados vivos. Em Portugal, contaram-se três mortes em cada 1000 nascimentos. Analisando um período mais largo de tempo, a mortalidade infantil tem baixado em todo o mundo. Em 1990 morreram 12, 6 milhões de crianças com menos de cinco anos; em 2017, 5, 4 milhões. O número de óbitos entre os cinco e os 14 anos desceu de 1, 7 milhões em 1990 para menos de um milhão em 2017. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “Este novo relatório sublinha o progresso notável desde 1990 na redução da mortalidade infantil”, disse o sub-secretário-geral para os Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas, Liu Zhenmin, citado num comunicado de imprensa. “Reduzir a desigualdade ao dar assistência aos recém-nascidos mais vulneráveis, crianças e mães é essencial para alcançar o objectivo de desenvolvimento sustentável sobre o fim das mortes infantis evitáveis, garantindo que ninguém fica para trás”. Dos 195 países em análise, 118 já alcançaram os objectivos de desenvolvimento sustentável e 26 estão bem encaminhados, se continuarem com o que já fizeram até agora. Ficam a faltar 51, dos quais dois terços se localizam na África Subsaariana. “Nos restantes países, o progresso terá de ser acelerado, para alcançar os objectivos do desenvolvimento sustentável até 2030”, conclui o relatório. Se esses países conseguissem atingir esse objectivo, significaria mais dez milhões de crianças com menos de cinco anos salvas, comparado com o cenário actual.
REFERÊNCIAS:
Entidades OMS