Enquanto uns choram outros vendem lenços, diz o povo
A dança é, aqui, reduzida ao seu essencial: o poder do corpo em levar-nos aonde as palavras não chegam. (...)

Enquanto uns choram outros vendem lenços, diz o povo
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: A dança é, aqui, reduzida ao seu essencial: o poder do corpo em levar-nos aonde as palavras não chegam.
TEXTO: Um homem e uma mulher retiram do interior da boca um extenso fio branco, e com ele traçam desenhos sobre a arena forrada a negro, sobrelevado no palco: figuras gráficas que animam manualmente, como cartoons, dialogam com frases curtas, projectadas num ciclorama, e sons artesanais gravados em directo desde duas consolas colocadas em pequenas mesas a ladear a arena: respirações ofegantes, murmúrios, um badalo, água que se agita num garrafão, o tilintar de moedas, o ar sorvido por um aspirador. Com precisão de relojoeiro, destas conjugações brotam, desde o primeiro instante, densas teias e surpreendentes nexos. Com o fio, o homem torneia o corpo da mulher inerte sobre o chão. Levanta-se, e vemos em seu lugar, delineado a branco, o corpo de uma menina. “Este não é o meu corpo. O meu nome não é Omar. Eu não tenho dez anos”, lemos em fundo, e escutamos um som de respiração ofegante que, perceberemos, é o do passo acelerado da criança síria em trânsito num grupo de refugiados. Direcção artística de Cláudia Dias. Intérpretes: Cláudia Dias e Luca Belezze Teatro Municipal Maria Matos. Lisboa, 29/03, às 21h30. Anfiteatro cheio. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Accionado o gatilho de uma ficção a reportar ao real, entramos nos pensamentos de Omar durante o seu trajecto. A menina é, porém, o sujeito impreciso de uma história de tempo e espaço ambíguos, feita de micronarrativas em aberto, onde imaginário poético, factos actuais, e investigação histórica se cruzam. A relação da criança com o mundo é directa, sensorial e presentificada; o texto, engenhoso, entra e sai do seu ponto de vista, fala-nos do que Omar “não sabe” e do que “poderia ter sido a sua história se…”. Ela desconhece os massacres e êxodos que antecederam o seu; a genealogia que liga a expansão do cristianismo à promessa de uma terra entre o Nilo e o Eufrates e ao conflito israelo-árabe; ou a família Espírito Santo à família Rothschild, os contactos com Salazar, para instalar o lar judaico no planalto de Benguela; que existe em Portugal uma loja a vender máscaras de refugiados para o Carnaval; que 2017 é o centenário da revolução bolchevique e das aparições de Fátima; as disputas pelo controlo dos cursos de água; que a sofisticada colónia artística israelita de Ein Hod, rebaptizou a aldeia palestina de Ein Hawd de onde a população pobre foi retirada. “Nada sabe” dos labirintos político-económicos que movem o mundo, nem da expressão portuguesa que diz “enquanto uns choram outros vendem lenços”. O subtítulo da peça (tudo o que é sólido dissolve-se no ar), retirado do Manifesto Comunista (Marx & Engels, 1848), reflecte o compromisso dos criadores em recontextualizar a crítica ao capitalismo nos dias de hoje. Cláudia Dias (Lisboa, 1972) e Luca Bellezze (Itália, 1978), num sóbrio underacting, colocam-se com modéstia ao serviço de uma causa humanista maior. Longe do panfletismo, a dramaturgia (algum trabalho de edição pós-estreia quiçá necessário) recorre a um eloquentíssimo encadeado de alegorias subtis e metáforas fabulosas: o som ampliado de um brinquedo mecânico redunda na antevisão de um bombardeamento; desfeitos os fios brancos que desenhavam a cidade, os despojos são sugados pelo aspirador que a mulher manipula com a displicência do gesto quotidiano trivial; com um isqueiro ateiam fogo às linhas do planisfério e os continentes do planeta desaparecem sob um rastilho de pólvora. Parte do projecto Sete Anos, Sete Peças (iniciado em 2016, com Segunda feira, atenção à direita), Terça-feira…é uma declinação sobre um temário e estilo idiomático de singular coerência (patente em Visita Guiada, 2005, Das Coisas Nascem Coisas, 2008, ou Vontade de ter Vontade, 2012): com dispositivos mínimos, imaginação fulgurante e um implacável sentido de depuração, Dias constrói a eficácia comunicativa máxima. Neste ponto alguns questionarão se o que vimos é dança. Esta é uma pergunta menor. Também ela é, aqui, reduzida ao seu essencial: o poder do corpo em levar-nos aonde as palavras não chegam.
REFERÊNCIAS:
Religiões Cristianismo
A juventude foi o alvo do pior ataque terrorista no Reino Unido numa década
Tinham acabado de assistir a um concerto quando foram assombrados por uma bomba que matou mais de 20 pessoas. Polícia tenta saber se atacante agiu sozinho. (...)

A juventude foi o alvo do pior ataque terrorista no Reino Unido numa década
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -1.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Tinham acabado de assistir a um concerto quando foram assombrados por uma bomba que matou mais de 20 pessoas. Polícia tenta saber se atacante agiu sozinho.
TEXTO: Depois de uma noite trágica, em Manchester chorou-se esta terça-feira as mortes de 22 pessoas, muitas delas crianças, vítimas de um ataque terrorista quando se preparavam para regressar às suas casas após um concerto da cantora Ariana Grande. Foi o pior ataque no Reino Unido em mais de uma década. O atentado foi reivindicado pelo Daesh, mas a grande prioridade dos investigadores é perceber se o seu autor agiu sozinho. Esta dúvida está na base da subida do nível de alerta de terrorismo no Reino Unido de "grave" para "crítico" pela primeira vez numa década. Na noite de terça-feira, Theresa May admitiu que há risco "iminente" de um novo atentado e mobilizou as forças armadas. Milhares de militares vão partulhar alguns dos locais mais movimentados do país sob as ordens da polícia. As autoridades estão a divulgar com muita cautela as identidades das vítimas, mas já se percebeu que muitas são crianças e adolescentes, tornando a carga emocional ainda mais forte. “Apenas penso nestas pobres famílias. Sempre que fecho os olhos, vejo uma menina pequena a chorar ao lado da mãe, que estava caída sobre uma poça de sangue enquanto o marido tentava reanimá-la”, contou ao Guardian Emma Johnson, que estava perto do local onde ocorreu a explosão. Vídeos publicados nas redes sociais mostram o momento em que milhares de pessoas, ainda dentro do recinto, ouviram um grande estrondo. Seguem-se momentos de pânico, com muita gente a correr de um lado para o outro à procura de uma saída. No exterior da Manchester Arena, o cenário foi ainda mais aterrador. Andy Holey estava no hall de entrada do recinto, enquanto esperava pela mulher e a filha, quando um forte abalo o projectou para o chão. “Quando me levantei e andei um bocado, vi cerca de 30 pessoas espalhadas por todo o lado. Algumas pareciam mortas, podiam estar inconscientes, mas havia muitos feridos”, contou à BBC. Por volta das 22h33 de segunda-feira, um homem aproximou-se da entrada da Manchester Arena que dá acesso à estação de comboio de Victoria, e detonou um mecanismo explosivo que transportava consigo. A polícia identificou-o como Salman Abedin, um britânico de 22 anos nascido em Manchester e filho de pais líbios que tinham emigrado para o Reino Unido com o estatuto de refugiados, em fuga do regime de Muammar Khadaffi. Durante o dia, a polícia deteve também um homem de 23 anos num subúrbio a sul de Manchester. Neste momento, a grande prioridade para as autoridades é averiguar se Abedin actuou sozinho ou não. Ao início da noite, a primeira-ministra Theresa May decretou o nível máximo de alerta com a justificação de que possa haver outras pessoas ligadas ao ataque em fuga. Apesar de ser um alvo preferencial para várias organizações terroristas, desde 2005 que o Reino Unido não era palco de um ataque desta envergadura, quando várias bombas provocaram a morte de 56 pessoas em Londres. O ataque de Manchester é também o primeiro desde então em que houve recurso a explosivos – uma imagem dramaticamente próxima do quotidiano britânico durante os anos 1970 e 1980, quando várias cidades foram alvo de atentados organizados pelo Exército de Libertação Irlandês, o IRA. Os relatos de várias testemunhas e as imagens das câmaras de vigilância recolhidas pela polícia indicam que o explosivo utilizado era de fabrico caseiro a que o seu autor terá juntado pedaços de metal para serem projectos, de forma a ferirem o maior número possível de pessoas. Um pouco por toda a Internet existem manuais de instruções para o fabrico de explosivos caseiros, mas o recurso a bombas por atacantes solitários é pouco comum, notam vários analistas. “A maioria dos jihadistas descarta um ataque bombista logo nas primeiras fases: apercebem-se que é demasiado difícil de conseguir”, escreve o correspondente de segurança interna da BBC, Dominic Casciani. Desde a possibilidade de serem sinalizados enquanto adquirem os produtos de que necessitam, até aos perigos inerentes ao manuseamento de substâncias explosivas, há muita coisa que pode correr mal até que alguém consiga levar a cabo um ataque deste tipo. Restam duas linhas de investigação, sugere Casciani. É possível que Abedi tenha aprendido como fabricar um explosivo sem correr riscos com algum membro de uma organização terrorista; ou então que lhe tenha sido entregue o mecanismo fabricado por outra pessoa. Este seria “o pior cenário possível”, considera o jornalista, uma vez que iria significar que “existe um fabricante de bombas à solta pelo Reino Unido”. O grupo terrorista Daesh reivindicou o atentado através dos seus órgãos de propaganda, mas há muitas dúvidas quanto ao grau de integração do autor na organização. Uma primeira mensagem, divulgada através da rede social Telegram, usada pelo grupo, mencionava a colocação de “aparelhos explosivos” no local do concerto. Alguns minutos depois, a agência Amaq – o braço propagandístico do Daesh, que o grupo utiliza para reivindicar ataques – publicou uma mensagem em que é referido “um esquadrão de combatentes”, dando a entender que o ataque teria sido feito por várias pessoas. Pouco depois, essa publicação foi apagada e uma nova foi divulgada em que se volta a referir apenas “um soldado do califado”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Rukmini Callimachi, jornalista do New York Times que tem monitorizado a actividade de vários grupos terroristas nas redes sociais, considera que este tipo de imprecisão é “muito pouco comum”. “Pode ser sinal de perturbações nos mecanismos de comunicação [do Daesh], o que é expectável à luz das perdas que têm tido em Mossul”, afirmou Callimachi, através da sua conta de Twitter. Tal como em atentados recentes, é provável que Abedi tenha simplesmente seguido os apelos divulgados pelo Daesh para que sejam feitos ataques no Ocidente – e não que tenha havido uma ordem directa emanada da sua hierarquia. O ataque de Manchester foi lamentado pela generalidade dos líderes mundiais, desde o Presidente dos EUA, Donald Trump, – que nos últimos dias esteve no Médio Oriente, onde falou da necessidade de combater o terrorismo islamita – até ao Presidente russo, Vladimir Putin, passando pelo recém-eleito Presidente francês, Emmanuel Macron. Há vários meses que os serviços de segurança britânicos estavam em alerta para a eventualidade de um ataque deste género poder ocorrer no país. Nos últimos 18 meses, as autoridades britânicas frustraram 12 planos de atentados terroristas, segundo o presidente da comissão parlamentar de Informação e Segurança, Dominic Grieve. Porém, lembra a Economist, há limites para a prevenção. Estão sinalizados três mil indivíduos catalogados pelo MI5 como “extremistas religiosos”, porém os serviços secretos internos britânicos têm recursos para vigiar de forma constante apenas 40 suspeitos.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Marine et Marion La Peur Le Pen: O medo também tem medo?
O Partido Socialista deu-se à morte na segunda volta para votar no Partido Republicano. Isto é uma situação deveras preocupante para defensoras ?da democracia como Marine e Marion Maréchal le Pen. (...)

Marine et Marion La Peur Le Pen: O medo também tem medo?
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.6
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Partido Socialista deu-se à morte na segunda volta para votar no Partido Republicano. Isto é uma situação deveras preocupante para defensoras ?da democracia como Marine e Marion Maréchal le Pen.
TEXTO: Afinal, podemos vir a ser o Passos Coelho e o Paulo Portas de França? A esquerda é mesmo capaz de tudo contra nós? Tanto ódio porquê?!. . . Tia Marine, estou cheia de medo. — Calme-toi, Marion, temos tempo. Marine e Marion, filha e neta de Jean-Marie, tia e sobrinha na Frente Nacional. Unidas pelo mesmo sangue velho gaulês e, vejam só, juntas contra o “medo”. O Partido Socialista de François Hollande apelou aos seus candidatos e eleitores para hoje votarem nos Republicanos de Sarkozy em todas as regiões em que a Frente Nacional (FN) ganhou a primeira volta das eleições. Para duas xenófobas com mestrado e doutoramento em nacionalismo, é isso que é apelar ao medo e um “golpe contra a democracia”. — Calme-toi, Marion, cedo ou tarde, on va gagner. Em 2017, serei Presidente de França. — Mas aí já vou a caminho dos 28 anos, tia, a França precisa de nós agora, contra o medo!— Ai, a beleza da juventude. . . As minhas grandes promessas eleitorais são para cumprir: a região de Calais vai deixar de oferecer mosquiteiros antipaludismo aos prisioneiros do Senegal. — Por isso é que tem havido este descalabro das contas públicas! Redes mosquiteiras!— Mais do que isso, e em coerência com os princípios da Frente Nacional, vamos deixar de ensinar às nossas crianças (as francesas. . . as que poderão ir à escola) aonde raio fica esse Senegal. Depois, organizamos uma grande expedição à África desconhecida para descobrir a foz do mítico rio Senegal, que os nossos exploradores subirão heroicamente. Fundaremos uma grande capital a que chamaremos, sei lá, Dacar, com a sua feitoria e a sua casa dos escravos. — Bravo, tia. Mas, desculpe o meu medo. . . África não está ainda um pouco cheia, hum, de estrangeiros?— Teremos de pacificar o Senegal recém-descoberto, esmagando eventuais rebeldias indígenas, mas para isso o meu pai e teu avô poderá emprestar-nos a sua experiência na guerra da Argélia. De qualquer modo, sem mosquiteiros, a vitória é nossa, porque a malária trata com égalité do assunto dos indígenas, a bem do progresso e da civilização. Vive la France!— Viva!. . . Tia Marine, o vovô Jean-Marie e a tia ainda estão zangados um com outro?— Minha querida, metade da nossa zanga pública foi fita política combinada. Para eu aparecer como moderada. O resmungão Jean-Marie a fazer o papel do nazi mau e eu o do naz. . . oh la la, pardon, eu queria dizer o polícia mau e o polícia bom. . . Mas tenho grande planos para o teu avôzinho. Vestimo-lo de Napoleão e mandamo-lo invadir a Rússia. — Para longe desta França onde os socialistas querem impor o medo! O Putin, comparado com esse antidemocrata do Hollande, é um exemplo para o mundo. Pelo caminho, tia, o vovô Jean-Marie até pode pôr finalmente uma coroa de flores em Auschwitz. — Martine, querida. . . O meu pai sempre disse que esses pormenores do Holocausto e das câmaras de gás, e não sei quê, foram exagerados, foi tudo “um detalhe histórico”. . . Pôr flores nos fornos crematórios, é?— Ma chère tante, o vovô quer depor as flores no cadafalso onde os socialistas enforcaram o comandante do campo, o Rudolf Hoess. Um homem que se limitou a cumprir o seu dever pela pátria. . . Até dá medo pensar no que ele sofreu ali mesmo ao lado da casa onde criou os filhinhos com amor. Eu sou pela família. — Bem diz o teu avô que tens bom sangue, Marion, até eu estou gelada. . . quer dizer, impressionada. — E o problema dos terroristas-refugiados. . . não é que eu os confunda, é só para simplificar a questão. — Vamos libertar a França desta submersão migratória, bien sûr. Em Calais, os que vivem na “selva” dos acampamentos serão convidados pela tropa a escolher entre duas boas saídas para Inglaterra: ou por mar da Mancha, mas sem barco, ou pela via férrea do túnel, mas com cabos de alta tensão. . . — Só a tia me fazia rir nestes tempos de pânico socialista. Nós, as mulheres, temos medo. As mulheres francesas têm duas boas opções com a Frente Nacional: ou ficam em casa a tratar dos filhos ou vão para a política “tratar” dos estrangeiros. — E temos de trazer a Paris o Donald Trump, um grande republicano sem papas na língua. Também em 1778 le Roi-Soleil Luís XVI assinou em Versalhes um tratado com Benjamin Franklin. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. — Mas o Donald Trump não vem falar de liberdade, imagino. Vem explicar como nos vermos livres dos muçulmanos, não é, tia Marine?— Sim, Marion, mas antes disso vai ter de me dar o telefone do seu cabeleireiro. Nós somos loiras, mas ele!. . . Aquilo é que é uma franja à la Frente Nacional.
REFERÊNCIAS:
Um Verão na Gulbenkian: migrações, memória e os azulejos Bordallo do túmulo do sultão
Praneet Soi, Aimée Zito Lema e Joaquim Sapinho são os convidados do Museu Gulbenkian para os próximos meses. Exploram a própria colecção da fundação, mas também Lisboa, Índia ou o 25 de Abril. (...)

Um Verão na Gulbenkian: migrações, memória e os azulejos Bordallo do túmulo do sultão
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Praneet Soi, Aimée Zito Lema e Joaquim Sapinho são os convidados do Museu Gulbenkian para os próximos meses. Exploram a própria colecção da fundação, mas também Lisboa, Índia ou o 25 de Abril.
TEXTO: Este Verão, a Gulbenkian faz-se à estrada sem sair do mesmo sítio. A viagem começa já esta sexta-feira numa sala escura, com a primeira das três novas exposições da fundação. A directora do Museu Gulbenkian, Penelope Curtis, convidou o artista indiano Praneet Soi para uma residência em Lisboa e, um ano depois, Soi “tornou-se quase parte da mobília”. Este é um trajecto entre Caxemira, Lisboa e as Caldas da Rainha dos azulejos Bordallo Pinheiro, mas também uma ida à Colecção Gulbenkian. No cruzamento entre a Rua do Benformoso, na Mouraria lisboeta, e a arquitectura da cidade indiana de Srinagar: aí se encontra o trabalho de Praneet Soi. Ou no rosto do operário da Bordallo que o artista quis sobrepor aos azulejos reproduzidos pela fábrica portuguesa a partir do padrão daqueles que revestem o túmulo de Miran Zain, a mãe do oitavo sultão de Caxemira. Curtis conheceu o trabalho de Praneet Soi na Frieze Art Fair de Londres em 2015 e o próprio artista em 2016. Convidou-o a vir trabalhar os caminhos cruzados entre Lisboa, a colecção do fundador, Calouste Gulbenkian, e o interesse do artista por azulejos, essa fonte de repetições e sequências. “Uma enorme quantidade de peças da Colecção Gulbenkian tem como base os padrões, e queria encontrar um artista contemporâneo interessado nos padrões, na artesania e em como usar tudo isso de uma forma contemporânea”, explica a directora na visita que apresentou à imprensa, esta quinta-feira, a exposição que até 1 de Outubro ocupará o piso inferior do museu. Tendo por base as artes manuais, as três instalações com vídeo que compõem Praneet Soi. Terceira Fábrica. De Caxemira a Lisboa, via Caldas “pensam sobre elas e o que elas significam”, acrescenta Penelope Curtis, revelando que o artista, que tem a viagem e a descoberta como chamamento e ferramenta, trabalhou com quase todos os curadores da fundação, explorou os seus recantos, observou. Ao longo de um ano, descobriu Lisboa, ouviu as línguas do seu país na Mouraria. E assim chegou às três instalações que dominam a sala: peças arquitectónicas revestidas a azulejos não-vidrados onde se projectam imagens que o próprio captou na fábrica Bordallo ou no rendilhado da Mouraria. “Como artistas, muitas vezes temos uma prática solitária, no estúdio, especialmente um artista como eu, que começou como pintor. Movimentos destes ajudam-me a entrar em contacto com o mundo e com situações que de outra forma não conheceria – estar numa fábrica é ver relações humanas, como as pessoas trabalham com máquinas, como isso afecta os produtos postos depois no mundo”, diz ao PÚBLICO na penumbra propositada da sua sala. As “três estruturas quase funcionam como cenários e ao mesmo tempo são ecrãs”, atenta o curador João Carvalho Dias. Todas contêm elementos que recolheu da Colecção Gulbenkian: um tapete Kum Tapi (do final do século XIX, início do século XX) e um jarro de jade (século XVI) que pertenceu ao monarca que governou Caxemira. Foi este que “começou a fazer a conversa”, a mistura, entre os pólos da mostra, diz Carvalho Dias aos jornalistas. Até o edifício da Fundação Champalimaud, projectado por Charles Correa (1930-2015), de origem indiana – e que Soi procurou como alternativa às imagens mais comuns da relação Portugal-Índia corporizadas pela arquitectura religiosa em Goa –, é citado nas projecções. Na construção do espaço e das peças, que num dos casos incluem texto muito pessoal, em registo de diário, o artista “estava muito ciente do espectador e queria muito que ele não ficasse barricado pelo [uso do] jargão técnico, mas seduzido pelas imagens”, para que “o espaço se tornasse um ambiente”. Entre três peças desenham-se muitas rotas no escuro. “Espero que abra um espaço mental para que as pessoas pensem noutras coisas”, diz Praneet Soi. João Carvalho Dias chama a atenção para o facto de o artesão ser uma preocupação central para o artista convidado da Gulbenkian. “Os artesãos são personagens muitas vezes anónimas cujo trabalho é migrante – e esse é um dos aspectos presentes no trabalho, [que evoca] não só a forma como os objectos são construídos e pensados, mas também a forma como as próprias pessoas se deslocam e transportam em si conhecimento, técnicas, conceitos e experiências”, completa o curador. Um dos pontos de partida da obra de Praneet Soi é Caxemira, onde passou muito tempo, observando, criando. “O meu principal motivo para ir a Caxemira foi o interesse no facto de ser uma região fronteiriça problemática, com o movimento separatista. Comecei a ir lá curioso sobre as fronteiras do meu país. Sou de Calcutá, uma cidade indiana muito mainstream, e nunca tinha ido tão a norte. Saí da minha zona de conforto, estava numa região onde tinha de renegociar, recalibrar. Lá, a Índia é muito longe”, recorda, explicando que a população local se identifica mais com os países da Ásia Central. O que dá isto a um artista, onde o leva? “Estes movimentos dão-nos uma compreensão diferente da vida. Aquela parte do mundo interessa-me pela política, mas também pela sua tradição de migrações. Hoje estamos a voltar às fronteiras, toda a gente quer a sua, mas se olharmos para a História veremos que as pessoas sempre se moveram e atravessaram fronteiras e cruzaram referências; foi uma polinização cruzada que criou a cultura. ”David Maranha compôs a camada sonora que envolve a sala, com, por exemplo, sons da fábrica da Bordallo. É uma espécie de súmula da ideia titular da exposição – chama-se Terceira Fábrica porque, além das Caldas e das estruturas que Praneet Soi tão bem conhece em Caxemira, também a galeria pode ser pensada "como um espaço de produção”, diz aos jornalistas. Para ele, “o museu funciona também como uma fábrica, um sítio onde se geram ideias, fabricam coisas; não é um lugar inerte”, resume João Carvalho Dias. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Da Terceira Fábrica ruma-se à morada da Colecção Moderna da Gulbenkian para ir ao encontro de 13 Shots, de Aimée Zito Lema, que terá a sua inauguração a 29 de Junho. A artista de origem argentina, mas nascida na Holanda, filha de um refugiado político, trabalhou o tema da memória e da construção da História e das histórias numa residência em Lisboa que a levou a colaborar com o Grupo do Teatro do Oprimido e a explorar os arquivos do ACARTE, o antigo Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte da Fundação Gulbenkian. Pelo meio ficou a Sala Polivalente, o espaço onde trabalhou com o grupo, e todos os espectáculos que lá se realizaram no passado. Nas paredes estão fotografias desses processos de passado e presente que ali foram tratados pelos membros do colectivo. “As suas vozes falam da história do 25 de Abril, contando o que sabem, como são influenciados por ela”, explicou a artista aos jornalistas, explicitando um processo que quis iluminar “como sabemos as coisas e nos lembramos delas, especialmente na história transgeracional”. Na origem desta mostra que preenche uma galeria com projecções vídeo, imagens, charriots, luzes de biblioteca e fotografia, está um projecto internacional reunindo universidades e instituições museográficas de arte contemporânea, coordenado pela Universidade Católica de Lisboa e financiado em 1, 8 milhões de euros pelo programa Europa Criativa, que explora os temas do conflito e convivialidade. Ana Cachola, que com Luísa Santos e Daniela Agostinho é curadora da mostra e estendeu o convite a Zito Lema, analisa como 13 Shots “trabalha a memória diferenciada do 25 de Abril” e “a investigação da memória do ACARTE, o espaço de performance e a performance da própria revolução, a performatividade da história e performatividade do teatro e da dança”. Completando o programa de Verão da fundação, o realizador Joaquim Sapinho inaugura a 20 de Julho uma exposição com peças que ele próprio escolheu a partir da Colecção do Fundador, e que espalhará ao longo de um percurso pelo museu organizado segundo vários temas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave filha cultura educação rainha espécie refugiado
Os miúdos podem ficar em casa
The Incredibles 2 é a primeira sequela da Pixar que faz sentido para lá da exigência de mercado. (...)

Os miúdos podem ficar em casa
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: The Incredibles 2 é a primeira sequela da Pixar que faz sentido para lá da exigência de mercado.
TEXTO: Temos consciência que The Incredibles 2 é uma fita de desenhos animados - mas resumi-la “apenas” a desenhos animados é redutor e simplista. (Mesmo que o marketing pareça querer apontar o filme a uma faixa etária demasiado jovem para o que o veterano animador Brad Bird e a sua equipa fizeram. ) É a primeira sequela da Pixar que faz sentido enquanto filme autónomo, e não se limita a ser uma exigência de mercado. É um filme do momento #MeToo, onde são as mulheres que “mandam” na acção e os homens ficam em casa a tratar da loiça, da roupa, dos miúdos. É uma gentil mas firme lição de moralidade a uma América refugiada numa imagem de medo do outro (como os primeiros X-Men de Bryan Singer), com uma personagem a dizer que “os políticos não percebem que há pessoas que são boas só porque é a coisa certa a ser”. Mesmo sabendo que uma longa de animação leva 3-4 anos a fazer, e que o primeiro Incredibles é de 2004, é quase assustador como The Incredibles 2 surge no momento certo, no momento justo. De modo mais interessante, é também um filme de super-heróis que é anti-super-poderes, porque o heroísmo não é coisa visível – tanto pode ser salvar uma embaixadora como ajudar o filho a resolver a matemática do liceu. O vilão de serviço avança às tantas que não podemos ficar à espera de ajuda que pode nunca chegar, nem esperar que os outros nos resolvam os problemas, e que a existência de super-heróis é apenas pretexto para as pessoas se desresponsabilizarem da sua vida. É um argumento ambíguo, mas entronca no que Bird já fizera no seu anterior filme, o falhado mas curioso Tomorrowland, ao falar da dificuldade do ser humano de projectar esperança no futuro e de preferir ficar no sofá a ver TV. Tendo em conta que os super-heróis correspondem a uma percentagem significativa da produção de Hollywood, e que a casa-mãe Disney é o principal fornecedor de entretenimento de super-heróis através da Marvel, é como se Bird estivesse a mordiscar a mão que lhe dá de comer. Realização: Brad Bird Actor(es):Samuel L. Jackson (Voz), Sophia Bush (Voz), Holly Hunter (Voz), Craig T. Nelson (Voz)O mais espantoso, no entanto, é que Bird mete tudo isto, sem pensar duas vezes, pelo meio de uma comédia familiar certeira sobre as dificuldades da paternidade e de um pastiche retro de James Bond visualmente deslumbrante (com a música de Michael Giacchino a sublinhar as proezas de animação). Há muita coisa a acontecer, talvez coisas a mais, mas a energia e o humor e a cabeça com que tudo está feito não deixam o espectador defraudado. O ideal é ir ver a fita na versão legendada para desfrutar da perfeição dos actores (Holly Hunter inconfundível, Craig T. Nelson, Samuel L. Jackson). Os miúdos é que até podem ficar em casa.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens filho ajuda medo mulheres
Onze estreias nacionais na rentrée do Teatro Municipal do Porto
O francês Noé Soulier, a belga Anne Teresa De Keersmaeker ou a ruandesa Dorothée Munyaneza são alguns dos artistas cujas novas criações passarão a partir de Setembro pelos palcos dos teatros Rivoli e Campo Alegre. (...)

Onze estreias nacionais na rentrée do Teatro Municipal do Porto
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: O francês Noé Soulier, a belga Anne Teresa De Keersmaeker ou a ruandesa Dorothée Munyaneza são alguns dos artistas cujas novas criações passarão a partir de Setembro pelos palcos dos teatros Rivoli e Campo Alegre.
TEXTO: The Waves, um espectáculo de dança para seis bailarinos e dois percussionistas do coreógrafo francês Noé Soulier, é o primeiro de onze espectáculos internacionais que terão estreia portuguesa na nova temporada do Teatro Municipal do Porto (TMP), cuja programação, anunciada esta quinta-feira pelo seu director, Tiago Guedes, e pelo presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, arrancará a 21 de Setembro, no Rivoli, com a Companhia Nacional de Bailado a mostrar a sua faceta mais contemporânea num programa que reúne três coreografias de Tânia Carvalho, incluindo a sua mais recente criação, S. A primeira apresentação em Portugal da companhia de teatro ateniense Blitz Theatre Group, com uma peça talvez não excessivamente futurista sobre a desintegração da Europa, os regressos, com novas criações, de Anne Teresa De Keersmaeker e da coreógrafa ruandesa Dorothée Munyaneza, a estreia de Bisonte, o aguardado novo trabalho de Marco da Silva Ferreira após o sucesso de Brother, ou ainda a interpretação, pelo Ballet da Ópera de Lyon, de duas peças seminais da dança americana pós-moderna, Dance (1979), de Lucinda Childs, e Set and Reset / Reset – revisitação da peça Set and Reset (1983), de Trisha Brown –, são outros destaques da programação do TMP para o semestre que vai de Setembro deste ano a Fevereiro de 2019. Sem contar ainda com muitos espectáculos que só serão anunciados no âmbito dos vários festivais que mantêm parcerias com o TMP, a programação agora anunciada inclui 63 espectáculos, num total de 120 apresentações – nos teatros Rivoli e Campo Alegre, mas também noutros locais, como o Palácio da Bolsa – e deverá custar, segundo adiantou Rui Moreira, cerca de 575 mil euros. É a primeira vez que o TMP anuncia a programação para um semestre inteiro, opção que se prende com uma nova estratégia de comunicação, explicou Tiago Guedes, que passará também pela edição de uma agenda gráfica e editorialmente reformulada, em formato livro, que será distribuída durante a festa de lançamento da rentrée, no dia 6 de Setembro. Outra novidade é a mudança de horário dos espectáculos nos dias de semana, que são antecipados das 21h30 para as 21h00 (aos sábados, mantêm-se às 19h00). Depois do espectáculo inaugural pela Companhia Nacional de Bailado, o programa prossegue, ainda nesses últimos dias de Setembro, com Estava em Casa à Espera que a Chuva Viesse, uma encenação de Renata Portas e da companhia Público Reservado de uma das últimas criações do dramaturgo francês Jean-Luc Lagarce (1957-1995), com o já referido Waves, de Noé Soulier, um coreógrafo que já estivera no Porto em 2017 para mostrar Faits et Gestes no Festival DDD – Dias da Dança, e com Jângal, do Teatro Praga, actualmente em cena no Teatro São Luiz, em Lisboa, uma peça onde humanos e objectos comunicam ao mesmo nível numa selva digital. O programa de Outubro abre com uma proposta do programa paralelo Ver em Família, Do Bosque para o Mundo, de Miguel Fragata e Inês Barahona, que conta a história de um rapaz afegão de 12 anos, Farid, cuja mãe o envia para a Europa, tentando colocá-lo em segurança. Uma peça que se apresentará já em Julho no prestigiado Festival de Avignon e que parte de uma pergunta: “Será possível explicar a crise dos refugiados às crianças?”. A estreia nacional dos gregos Blitz Theatre Group, com a farsa apocalíptica Late Night, apresentada como “uma valsa surreal sobre as ruínas da Europa”, e Romances Inciertos – Un Autre Orlando, uma produção franco-espanhola de François Chaignaud e Nino Laisné, que cruza a dança e a música barroca espanhola – e que será apresentada no Palácio da Bolsa –, são outros momentos a reter no programa de Outubro, que é também o mês do Festival Internacional de Marionetas do Porto, que decorrerá no Rivoli e no Campo Alegre na semana de 13 a 20. A estreia nacional de A Love Supreme, incursão de Anne Teresa de Keersmaeker no universo da improvisação jazzística e da sua possível tradução na dança (o espectáculo toma o nome do célebre álbum lançado pelo saxofonista John Coltrane em 1965) abre o programa de Novembro, que inclui ainda as estreias de Boudoir, de Martim Pedroso, e de Revoluções, uma nova criação de Né Barros no momento em que se comemoram os 50 anos do Maio de 68. É também em Novembro que o Rivoli acolherá mais uma edição do festival de pensamento Fórum do Futuro, cujo tema é este ano Ágora Club e que, adiantou Rui Moreira, se propõe pensar “a inscrição da ética, da estética e da filosofia da antiguidade no panorama contemporâneo”. Grande, de Tsirihaka Harrivel e Vimala Pons, traz ao Rivoli, em Dezembro, um delirante espectáculo de novo circo, de temática conjugal, e a programação de 2018 termina com Finir en Beauté e C’est la Vie, um díptico sobre a morte e a perda do encenador e escritor francês Mohamed El-Khatib, e uma nova edição do ciclo Foco Famílias, com apresentações especialmente pensadas para serem fruídas em conjunto por pais e filhos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A estreia de Bisonte (a 11 de Janeiro no Teatro do Campo Alegre), um trabalho em que Marco da Silva Ferreira, descreve Tiago Guedes, “cruza o universo híper-masculino das danças urbanas com o universo queer e feminista”, é o primeiro grande destaque da programação de 2019, a preceder os festejos, nos dias 18 e 19, do 87. º aniversário do Teatro Rivoli. Ainda em Janeiro, o poeta e dramaturgo espanhol Pablo Fidalgo Lareo apresenta Anarquismos, centrado nas experiências de vida comunitária que ainda subsistem em Madrid, e o último mês desta temporada semestral abre logo a 1 de Fevereiro com a apresentação no Teatro do Campo Alegre de Unwanted, um espectáculo de teatro e música que procura mostrar as consequências da violação enquanto arma de guerra e que levou a coreógrafa, compositora e cantora ruandesa Dorothée Munyaneza a procurar e entrevistar várias compatriotas suas violadas durante o genocídio dos tutsi em 1994. E a fechar esta programação, a possibilidade de ver ao vivo (a 15 e 16 de Fevereiro no Rivoli) duas célebres peças fundadoras da dança pós-moderna, numa interpretação do Ballet da Ópera de Lyon: Dance, de Lucinda Childs, co-fundadora do mítico Judson Dance Theatre, e Set and Reset / Reset, uma versão retrabalhada da coreografia original que Trisha Brown criou em 1983 com cenografia de Robert Rauschenberg e música original de Laurie Anderson.
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Merkel – Um adeus que ainda não é bem
A imprensa alemã diz que a chanceler renasceu depois de ter anunciado a data de saída. Nos próximos anos, Merkel será ainda a sucessora de Merkel. (...)

Merkel – Um adeus que ainda não é bem
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.285
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A imprensa alemã diz que a chanceler renasceu depois de ter anunciado a data de saída. Nos próximos anos, Merkel será ainda a sucessora de Merkel.
TEXTO: 1. Nesta sexta-feira, o Congresso da CDU, em Hamburgo, concedeu à sua chanceler dez minutos de comovido aplauso. Podia ser apenas o adeus a uma líder que reinou sobre o partido nos últimos 18 anos e que dirigiu a Alemanha, para não dizer a Europa, nos últimos 13. Talvez não tenha sido só isso. Ao escolherem a sua sucessora designada, os 1001 delegados ao Congresso mostraram que ainda não estão preparados para pôr fim à era Merkel e lançar o partido numa nova “aventura” política, que deveria ser, na opinião de muitos, (um pouco) mais conservadora, (um pouco) mais à direita, mais amiga do mundo dos negócios, talvez mais “americana” e mais liberal e menos “francesa” e “democrata-cristã”. Um pouco mais, porque os alemães não gostam de grandes revoluções políticas, prezam a estabilidade e, sobretudo, não se deram mal com a moderação, o centrismo, a confiabilidade a que se habituaram com a chanceler. Annegret Kramp-Karrenbauer (AKK) não é igual a Merkel, nem sequer parece ser uma figura apenas destinada a fazer a transição. Demarcou-se em alguns aspectos da chanceler, é católica, o que não a impediu de se bater pelas quotas das mulheres nos conselhos de administração das grandes empresas, governou o pequeno land do Sarre, paredes meias com a França, em coligação com os Verdes e com o FDP (a mesma que a chanceler não conseguiu formar depois das eleições de Setembro do ano passado), ganhou as últimas eleições regionais quando as sondagens davam a sua vitória como incerta. É mais dura que Merkel na resposta ao expansionismo agressivo da Rússia. E tinha, à partida, uma vantagem que, noutro país qualquer poderia ser (ainda) uma desvantagem: ser mulher. Depois de Merkel, a pergunta, irónica mas nem por isso menos verdadeira, é se os alemães estarão preparados para serem governados por um homem. Desta vez, provavelmente, isso ainda não vai acontecer. A menos que nos próximos dois anos o SPD consiga pôr fim à morte lenta em que se deixou cair praticamente desde que governou a Alemanha (com Gerhard Schroeder, até 2005), ou se acentue a instabilidade e a fragmentação, que acabou por atingir também o estável sistema partidário alemão. Como escreveu o diário alemã Handelsblatt, quando Merkel anunciou a saída e Friedrich Merz avançou imediatamente com a sua candidatura, “o objectivo imediato dos seus apoiantes é bloquear a continuação do matriarcado da chanceler”. “Merz representa o partido da lei e da ordem em vez das selfies com os refugiados; o partido dos que vão à missa, dos empresários e, acima de tudo, o partido dos homens”, escreveu o mesmo diário de centro-direita liberal. 2. A escolha de AKK também pode ser a garantia de que a chanceler, tal como prometeu quando anunciou que abandonaria a liderança da CDU, terminará o seu mandato (2021) – porventura, o tempo necessário para que a Europa se habitue a viver sem ela, o que também não será fácil no momento em que uma profunda crise de identidade ameaça os fundamentos da integração. Merkel teve hesitações, enganou-se por vezes sobre o equilíbrio indispensável entre o interesse alemão imediato e o seu interesse vital (sobretudo, na forma como começou por gerir a crise do euro), mas foi determinante para manter o barco europeu a navegar, para resgatar os seus valores fundamentais, para resolver alguns dos seus problemas mais complexos e para enfrentar um mundo que lhe é cada vez mais hostil. Foi firme face à Rússia e conseguiu a missão impossível de manter a Europa unida. Foi generosa perante os refugiados da guerra da Síria, apesar do enorme custo político. Conseguiu (até agora) conter o novo “bando dos oito”, capitaneado pela Holanda, que não quer uma reforma do euro que implique qualquer solidariedade financeira e que quer diminuir o próximo orçamento plurianual da União Europeia. A prova está no apreço que conquistou entre muitos dos seus pares europeus, à direita como à esquerda, e entre muitos europeus, fazendo dela uma figura indispensável, quase familiar. A forma sistemática e rigorosa como encara os dossiers, a serenidade com que enfrenta as dificuldades, a facilidade com que constrói consensos, a maneira com que se move no palco do mundo tornaram-na incontornável. É isso também que está em causa neste congresso do maior partido alemão e na escolha que fez de quem sucederá à chanceler. “Em tempos como este que vivemos, defenderemos a nossa visão liberal, o nosso modo de vida, em casa como lá fora”, disse Merkel nesta sexta-feira no seu discurso de despedida. A imprensa alemã diz que a chanceler renasceu depois de ter anunciado a data de saída. Nos próximos anos, Merkel será ainda a sucessora de Merkel.
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Luísa Sobral despiu as canções até chegar a Rosa
Pela primeira vez com um álbum cantado por inteiro em português, Luísa Sobral chamou Raül Refree para gravar Rosa, álbum em que se liberta da educação jazzística. (...)

Luísa Sobral despiu as canções até chegar a Rosa
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Pela primeira vez com um álbum cantado por inteiro em português, Luísa Sobral chamou Raül Refree para gravar Rosa, álbum em que se liberta da educação jazzística.
TEXTO: Luísa Sobral regressou dos Estados Unidos em 2011. Tinha estado na obrigatória Berklee College of Music; tinha cantado em restaurantes e bares, e ganhado prémios de composição. E quando aterrou de novo em Portugal, após quatro anos a batalhar na terra do jazz que lhe servia de candeia à voz, trazia ainda o pó desse lugar musical colado ao corpo. Demorou sete anos a descontaminar-se dessa aprendizagem, a libertar-se do perfil que construiu dentro de uma escola e foi traduzindo num cancioneiro jazz-pop pouco habitual por aqui. Não que a descontaminação signifique um passo necessário no seu percurso, mas é sobretudo sinónimo de uma relação cada vez mais pacificada com o confronto entre a cantautora que lhe ensinaram que podia ser e aquela que, deixada à sua sorte, escolheu ser em liberdade. De certa forma, Rosa, o seu quarto álbum – descontando o disco infantil Lu-Pu-I-Pi-Sa-Pa –, é a consumação dessa progressiva descoberta pessoal. Não querendo comparar-se a “artistas da grandiosidade de Picasso ou de Miró”, Luísa Sobral acredita que a sua estrada conduz ao mesmo destino de simplicidade. “Lembro-me de ir a uma exposição do Miró e ver, logo no início, um quadro maravilhoso que ele pintou com 18 anos, uma coisa incrível, gigante, com absoluta perfeição técnica. E depois acabar com ele a pintar um traço num quadro. Não querendo dizer que estou a fazer o mesmo caminho que o Miró, sinto uma necessidade de ir à simplicidade das coisas, ir despindo, ir tirando as camadas. ”Autoria: Luísa Sobral Universal MusicCamada após camada, aquilo de que acabou por se soltar em Rosa foi, precisamente, a capa jazzística de que sempre se tinha coberto até agora. No anterior Luísa, a cantora e compositora falava de um outro movimento, em que tentava contrariar a imagem de criadora de canções “cor-de-rosa”, bonitinhas e certinhas, reclamando uma densidade adulta que antes parecia arredada de uma marca autoral demasiado juvenil e idílica. Já não era tanto o jazz então a mapear-lhe os passos – ela que andara a ouvir muito Joni Mitchell e Tom Waits na altura em que compunha –, embora o álbum produzido por Joe Henry (Elvis Costello, Aimee Man) e com músicos como Marc Ribot e Patrick Warren surgisse ainda enquadrado pela geografia norte-americana. Ao jazz juntava-se então um claro sombreado folk. Só que mesmo sendo aquele um universo natural para Luísa, a aventura adulta dirigida por Joe Henry, perfeita na execução, sofria da impessoalidade que a cantora percebeu no final do processo. “A maneira como ele me disse adeus no primeiro dia foi igual àquela como me disse adeus no último dia”, recorda. “Penso que foi um pouco uma questão cultural, e é verdade que não tem de haver uma ligação, porque é uma relação de trabalho. Mas é bom quando essa ligação existe porque, no fundo, não é só trabalho, a música tem um lado emotivo. ” Talvez ainda não o soubesse, mas quando convidou o catalão Raül “Refree” Miró (conhecido sobretudo pelas parcerias que desenvolveu com as cantoras Sílvia Pérez Cruz e Rosalía) para produzir Rosa, é provável que estivesse já a manifestar-se o desejo de passar para a música o calor de uma relação profissional que soubesse ir além disso. Até porque o universo de Rosa é bastante mais íntimo do que os dos álbuns anteriores e exigia um outro envolvimento com as canções. Um reportório escrito durante a segunda gravidez de Luísa Sobral, 100% em português e a pedir na cabeça da cantautora uma redução ao osso (as palavras pousadas apenas sobre voz, guitarra e, só se necessário, pouco mais), não se revelaria por inteiro filtrado por ouvidos clínicos e por alguém que não acabasse a despedir-se com um mínimo de emoção. Luísa não estava a partilhar apenas um conjunto de canções, mas uma porção considerável da sua vida. E tudo isso se tornou mais claro quando, por coincidência, a cantora assistiu ao concerto de Sílvia Pérez Cruz (sem Raül) no Centro Cultural de Belém, em Junho de 2017. “Sou uma grande fã da Sílvia e a ideia para este disco surgiu em parte depois desse concerto”, conta Luísa. “Foi um dos concertos mais bonitos da minha vida. Tocou-me imenso e fez-me repensar nas coisas. Era só voz e quatro instrumentos de cordas, com aquela maneira de ela se entregar às canções. E pensei: ‘É isto que quero’. Não no sentido de fazer igual, mas na procura da simplicidade. ” E foi então, pensando que em disco sempre tinha preferido os registos de Pérez Cruz gravados com Raül Refree (11 de Novembre e Granada), que decidiu ser aquele o parceiro ideal para a ajudar no parto de Rosa. Luísa Sobral está ainda a aprender a ser a intérprete de Rosa. Recém-regressada de Montevideu, onde tocou o álbum quase na íntegra e apresentou um reportório que carrega na sobriedade tudo aquilo que desacelera em temas mais animados, sentiu a insegurança de se ver perante um público uruguaio que a ouvia sem manifestações hiperbólicas de contentamento. Talvez porque Luísa, pela primeira vez, não se sente refém de uma ideia de espectáculo em que tenha de compensar com “canções mais divertidas” todas as outras em que o tom baixa e suaviza. É essa delicadeza pouco esforçada que encontramos agora, com um encanto calmo e subtil, nos excelentes Dois namorados, Benjamim ou Não sei ser. “No final do concerto de Montevideu, um senhor veio ter comigo e disse-me: ‘Não sei como é que a Luísa queria que nos manifestássemos. Estávamos a adorar o concerto, sentadinhos, mas não fazia sentido estarmos aos gritos’. Tenho de pensar que se é isto que quero dar às pessoas, então tenho de saber receber o silêncio. Não que antes andasse a fazer rock’n’roll, mas tenho de me adaptar a este novo disco, muito mais intimista e que vai ser ouvido de outra forma. ”Foi também por considerar Raül “perito a trabalhar o silêncio” que Luísa quis chamar o músico para um álbum em que a regra de base decretava que só na eventualidade de os dois não bastarem para dar vida a uma canção é que seriam chamados músicos adicionais. E, por sugestão do catalão, esses acrescentos aconteceram com recurso exclusivo a um pequeno ensemble de sopros. É essa a beleza discreta alcançada por Rosa, sem apontar ao grandioso, alinhando sempre num registo cuidado que torna o álbum muito lá de casa, tangente a uma ideia de tranquilidade – mesmo quando, como acontece em Nádia (escrita depois de “ver uma peça no telejornal sobre um campo de refugiados na Grécia” e em que Luísa é mensageira da história de uma mãe que perdeu o filho), é enganadora. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É também dessa intimidade, desse reduto caseiro, que surge o dueto Só um beijo, partilhado com o irmão, Salvador Sobral, depois de muita resistência da sua parte. E isto porque ao escrever uma canção que cruza duas melodias, inspirada por Sem fantasias, de Chico Buarque, pensou em partilhar o tema com Salvador, mas logo se lembrou das “coisas horríveis” que ouviu no pós-Festival da Canção e não quis ver-se acusada de tentar aproveitar-se do sucesso do irmão. Foi a mãe que a pôs no lugar: “Mas se nunca te importaste com o que as pessoas dizem porque te vais importar agora?”Rosa também é um disco de casa no sentido em que Luísa Sobral, empurrada pela música que tem ouvido (de António Zambujo a Márcia) e pelas encomendas de canções a que tem respondido (de Ana Moura a Mayra Andrade), se tem vindo a apaixonar cada vez mais por compor em português. E por ter vislumbrado, com uma nitidez que poucas dúvidas oferece, o quanto o público se liga de maneira muito mais afectiva às canções que escuta na sua língua, o quanto aumenta a disponibilidade de uma plateia para acompanhar as histórias que ela partilha em verso e o quanto é também em português que fala em casa, que fala com os filhos e lhes dá as boas noites. As emoções, sabe-o agora perfeitamente, sobem-lhe à boca em português. Ignorar isso, neste momento, significaria ser incapaz de escutar-se.
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De Bruxelas até Moçambique: Susana não desiste de fazer das crianças “cidadãos activos”
Fundada em 2005 por uma professora portuguesa, a AIDGLOBAL actua na área da educação e promove iniciativas em Moçambique e Portugal. A obtenção de fundos europeus “está cada vez mais difícil”, admite Susana Damasceno. (...)

De Bruxelas até Moçambique: Susana não desiste de fazer das crianças “cidadãos activos”
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.13
DATA: 2019-05-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: Fundada em 2005 por uma professora portuguesa, a AIDGLOBAL actua na área da educação e promove iniciativas em Moçambique e Portugal. A obtenção de fundos europeus “está cada vez mais difícil”, admite Susana Damasceno.
TEXTO: Como se promove a educação e um melhoramento dos níveis de literacia em territórios em que parece faltar tudo? A pergunta surge de forma natural e nunca deixa de ser pertinente. Susana Damasceno tenta dar-lhe resposta todos os dias desde 2005, ano em que fundou a AIDGLOBAL, uma organização não-governamental para o desenvolvimento (ONGD). Há 14 anos, a antiga professora do ensino básico decidiu integrar um grupo de cinco voluntários e partir rumo à província de Gaza, em Moçambique, para trabalhar num orfanato com cerca de 50 crianças. Embora inquietante, a estadia de 22 dias em Moçambique não foi o primeiro contacto de Susana Damasceno com realidades díspares da sua. Afinal, quando era mais nova bastava-lhe sair de casa e rumar à escola, onde partilhava a sala de aula com crianças com poucos recursos, para se dar conta destas diferenças. Os colegas pertenciam a famílias “provenientes das antigas colónias”, nomeadamente Moçambique, habitavam “no bairro da Portela, com os esgotos a céu aberto”, e “ocupavam a Quinta do Mocho, que na altura “eram prédios sem janelas e portas”. Foi, no entanto, a experiência como voluntária que a fez despertar para as “desigualdades profundas que nos separam logo à nascença”. Esta percepção, materializada na pergunta “O que é que eu vou fazer com a experiência que aqui tive?”, deu origem a uma cadeia de acção: constatação, inquietação, resposta. Nasceu, assim, a AIDGLOBAL, a 4 de Novembro de 2005. Muito antes de ter conseguido o estatuto de ONGD, concedido pelo Governo português pela mão do Ministério dos Negócios Estrangeiros em 2006, a fundação já tinha o âmbito de actividade bem definido: a educação, através da promoção da mesma. É que Susana “sempre quis ser professora”. “E nada mais do que isso. ” Na visão da própria, esta é a única via para que “todas as pessoas, mesmo as mais desprovidas de oportunidades, possam evoluir enquanto profissionais, seres humanos e cidadãos”. No terreno, o sonho de Susana passa da teoria à prática através de programas de capacitação de professores, criação de bibliotecas — móveis, as bibliotchovas (uma junção de “biblioteca” com carrinhos de mão, ou tchovas) e fixas —, actividades de animação da leitura e promoção do uso do livro nas salas de aula. Mesmo quando estas são a sombra de um cajueiro. Os “constrangimentos financeiros” e as complicações em criar “metodologias participativas para que os alunos possam, de facto, expressar ideias e distinguir-se” surgem de toda a parte e podem começar logo aquando da edificação de escolas. É igualmente difícil “garantir a permanência e a assiduidade das crianças” nas escolas, já que um número considerável tem que caminhar largos quilómetros para lá chegar. “Perdem-se ou acabam por desistir pelo caminho porque não têm força para chegar. Não lhes foi dado um pequeno-almoço que lhes permita ter energia suficiente para fazer uma caminhada longa e depois ainda estarem uma manhã a ouvir um professor debitar matéria”, recorda. “Todo o sistema de ensino, em termos metodológicos, assenta na base da repetição. E isto numa sala com mais 50 ou 60 crianças. ”A professora reconhece, ainda assim, que há, por parte das autoridades moçambicanas, uma “consciência da importância, urgência e necessidade de investir na alfabetização e educação”. O exemplo do percurso traçado pelos países europeus, que no passado se encontravam num igual estado de desenvolvimento, é demasiado gritante para os governos destes territórios não assumirem uma postura de aprendizagem. “Há toda uma estrutura que tem que ser repensada, mas nós [portugueses] também já passamos por isso — somos muito jovens — e foi preciso ajudarem-nos”. Os dez anos de experiência de Susana no ensino, actividade que abandonou para se dedicar inteiramente à gestão da AIDGLOBAL, permitiu-lhe acompanhar algumas das mudanças que aconteceram na escola portuguesa durante este período de tempo, e que deveriam obedecer a um princípio-chave: “despertar consciências e mostrar o mundo aos alunos, de forma a torná-los cidadãos activos, participativos e reactivos”. E isto só possível graças “àquilo que a Europa tem de melhor": “a possibilidade de intercomunicação, de mobilidade, de nos encontramos além-fronteiras, de conhecermos novas culturas, de criação de uma entidade comum, de nos compreendermos, de nos enriquecermos”. O uso deste espaço comum tem sido aproveitado pelos próprios professores — os que ainda resistem — para evoluírem em termos metodológicos, aprendendo com os seus pares europeus. Os projectos de intercâmbio, como o Erasmus, são imprescindíveis no que toca a promover uma cidadania europeia, mas também global — um dos principais lemas da ONGD que Susana dirige. “O que teria sido de nós, enquanto instituição, se não tivéssemos conseguido aceder aos fundos europeus e consequentemente a colegas com os quais temos aprendido imenso e feito trabalhos extraordinários…?”Alguns dos trabalhos a que Susana se refere são os projectos Gvets e Urbagri4Women, ambos executados com financiamento europeu. O primeiro, que beneficiou de apoios do programa Erasmus+ (com um orçamento anual superior a 15 mil milhões de euros), pretende desenvolver uma formação interdisciplinar para técnicos que trabalhem diariamente com crianças migrantes. Através da gamificação — uma ferramenta pedagógica que utiliza técnicas de jogos —, procuram melhorar as competências destes profissionais para um melhor acolhimento de crianças migrantes e refugiadas. O segundo, financiado pelo Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (com um orçamento global superior a três mil milhões de euros), visa fomentar a integração de mulheres migrantes nas sociedades de acolhimento, munindo-as de capacidades para o desenvolvimento de projectos pioneiros na área da agricultura. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os dados presentes no Quadro da União Europeia para a Cooperação Internacional e o Desenvolvimento, relativos aos projectos e programas financiados realizados entre 2016 e 2017, dizem que mais de 16 milhões de crianças beneficiaram das ajudas europeias para a frequência de instituições de ensino. E 166 mil pessoas usufruíram de programas de ensino, formação profissional ou de desenvolvimento de competências, com vista ao melhoramento da sua empregabilidade. Apesar do sucesso destes projectos, Susana admite que a obtenção de fundos por parte de organizações com a dimensão da AIDGLOBAL “está cada vez mais difícil”. Isto deve-se a uma “maior exigência que se reflecte nos grandes envelopes das linhas de financiamento”. É o caso da linha DEAR (Development Education and Awareness Raising), uma das mais usadas pela AIDGLOBAL, que só aceita candidaturas de projectos cujo financiamento mínimo seja de um milhão de euros. À partida, esta poderia ser uma notícia positiva. No entanto, há um revés da moeda: as instituições europeias apenas financiam, regra geral, 90% do custo total do projecto, com as ONG a terem que avançar com o restante valor. Para responder a esta exigência, as associações têm que formar consórcios internacionais cada vez maiores. Como os Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão longe de serem cumpridos, a AIDGLOBAL está a promover uma marcha em Vila Franca de Xira. A Walk the (Global) Walk, agendada para 15 de Maio e com ponto de encontro marcado para o Jardim Municipal Constantino Silva, vai contar com a participação de quase mil alunos dos agrupamentos das escolas daquele município. Estes jovens participaram em programas de cidadania activa — desenvolvidos em simultâneo com outros 11 países —, que questionaram os próprios estudantes sobre os ODS e promoveram uma reflexão sobre o mundo em que coabitam e no qual terão que tomar as próprias decisões. Agir é a palavra de ordem.
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Dezenas de palestinianos feridos durante demolição de casa em Ramallah
Ciclo de violência continua na Cisjordânia. Cidade sede da Autoridade Palestiniana bloqueada por checkpoints. (...)

Dezenas de palestinianos feridos durante demolição de casa em Ramallah
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Ciclo de violência continua na Cisjordânia. Cidade sede da Autoridade Palestiniana bloqueada por checkpoints.
TEXTO: Centenas de soldados israelitas chegaram antes do nascer do dia ao campo de refugiados de Al-Amari, nos arredores de Ramallah, evacuaram as casas da vizinhança e, segundo as centenas de palestinianos que ali vivem, obrigaram famílias inteiras a passar horas ao frio. Depois demoliram o edifício propriedade da conhecida activista Latifa Abu Hamid, mãe do suspeito de ter morto um militar em Maio. A atmosfera de tensão persiste pela cidade, com escolas e universidades fechadas este sábado, descreve a correspondente da Al-Jazira, Natasha Ghoneim. Antes da demolição, junto à cidade que é sede da Autoridade Palestiniana, na Cisjordânia ocupada, o Exército expulsou dezenas de jornalistas e de activistas que estavam no local para tentar travar as retroescavadoras. Durante a operação, pelo menos 56 palestinianos ficaram feridos. “Fazia muito frio. Muitas pessoas de idade, mulheres e crianças estavam doentes”, contou à AFP Samir al-Toukhi, que ali vive. O Exército disse ter destruído a casa por ser ali que morava Islam Abu Hamid, preso em Junho pela morte de um soldado, que no mês anterior tinha sido atingido por um bloco de pedra lançado de um edifício precisamente no campo de Al-Amari, durante um raide israelita. É a terceira vez que a casa dos Abu Hamid é destruída – seis dos filhos de Latifa Abu Hamid estão presos; um foi morto pelas tropas israelitas em 1994. “A primeira vez que a destruíram nós reconstruímo-la, a segunda vez também. Desta vez, mil vezes, podem destruí-la e nós iremos reconstruí-la”, promete Latifa, que em 2011 foi escolhida pela Autoridade Palestiniana para apresentar o pedido de reconhecimento da Palestina nas Nações Unidas. Nos últimos dias, pelo menos cinco palestinianos foram mortos por forças de Israel (e centenas ficaram feridos) em Jerusalém Oriental e em diferentes lugares da Cisjordânia. De acordo com a Associação de Prisioneiros Palestinianos, pelo menos cem palestinianos foram detidos desde quinta-feira. Três israelitas, incluindo dois soldados, foram mortos num ataque em que foram disparados tiros de um carro em movimento perto de um colonato, na quinta-feira. Trata-se do terceiro ataque anti-israelita em dois meses na região e o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, está sob pressão de grupos de colonos. As forças israelitas bloquearam por isso mesmo Ramallah e ergueram uma série de barreiras dentro da cidade. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Este sábado foi também dia para os israelitas enterrarem os dois soldados e para os palestinianos fazerem o funeral da sua última vítima, Mahmoud Nakha, de 18 anos, morto na sexta-feira durante confrontos com militares perto do campo de Jalazone, a 7 km de Ramallah. “Isto é um crime de guerra por parte da autoridade ocupante… Benjamin Netanyahu é completamente responsável pelos crimes cometidos contra os palestinianos”, reagiu o principal negociador palestiniano, Saeb Erekat. “Netanyahu acredita que ao demolir casas e matar palestinianos vai conseguir paz e segurança. Está a empurrar palestinianos e israelitas para um ciclo de violência e contra-violência; essa é a verdade. ”
REFERÊNCIAS:
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