Depois de seis anos no Pátio da Galé, a ModaLisboa passa para o CCB
A 48.ª edição começa esta quinta-feira com um debate sobre a sustentabilidade na indústria da moda. (...)

Depois de seis anos no Pátio da Galé, a ModaLisboa passa para o CCB
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: A 48.ª edição começa esta quinta-feira com um debate sobre a sustentabilidade na indústria da moda.
TEXTO: Em paralelo com as tendências, que se renovam de seis em seis meses, a ModaLisboa já teve os seus tempos de nomadismo. Saltou entre museus e armazéns da capital, passou uma temporada em Cascais e acabou por encontrar uma morada permanente no Pátio da Galé. Seis anos depois, chegou a altura de voltar a mudar. A 48. ª edição começa esta quinta-feira e vai encher as salas do Museu Colecção Berardo e a Garagem Sul do Centro Cultural de Belém (CCB). Mas ainda não é uma mudança definitiva: em princípio, no próximo Outono a ModaLisboa passará para o recentemente inaugurado Pavilhão Carlos Lopes, no topo do Parque Eduardo VII, revela Eduarda Abbondanza, presidente da Associação ModaLisboa, ao PÚBLICO. “Ao fim de seis anos, a narrativa estava feita. Por muitas voltas que déssemos, já toda a gente sabia onde era o quê. E precisávamos de sair da nossa zona de conforto”, conta Abbondanza. Até porque, continua, “a cidade mudou”. Se antes fazia sentido dar a conhecer diferentes espaços da capital (a ModaLisboa chegou a ocupar espaços tão distintos quanto o Museu da Electricidade, o Museu de História Natural, o Convento do Beato e a Cordoaria Nacional), hoje a cidade está mais aberta ao mundo. A edição que se segue a esta que agora chega ao CCB deverá ser no Pavilhão Carlos Lopes – o mesmo que recebe no final de Março a décima edição do Peixe em Lisboa, também inquilino de longa data do Pátio da Galé. É um espaço “em que podemos estar mais à vontade”, justifica Eduarda Abbondanza. Cada edição da Moda Lisboa começa com uma palavra – ou com uma expressão. Algumas têm uma interpretação mais literal do que outras: como Energy, que marcou a edição realizada no Museu da Electricidade, ou In The Market, quando as modelos desfilaram entre as bancas do Mercado da Ribeira. “Normalmente as semanas da moda estão na mão de empresários”, diz Eduarda Abbondanza, mas a ModaLisboa foi criada por um grupo de designers. Como tal, segue as metodologias típicas do design. “Se nós não tivermos, como num projecto de design, um território conceptual e uma paleta cromática, um mood board, não há um entendimento [entre as várias áreas criativas]”, explica. “Daqui a mês e meio ou dois meses tenho de estar a lançar o tema para a próxima edição. ”Boundless (em português, sem limites) serve de mote para a 48. ª edição da ModaLisboa. A escolha da palavra insere-se no contexto actual de divisão, “num mundo em que está toda a gente um bocadinho na retranca: muros para aqui, saídas de territórios comunitários”, refere a presidente da Associação ModaLisboa. A criatividade, acrescenta, “é uma disciplina que pode ser transversal, pode ultrapassar tudo”, assim como a espiritualidade. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A ModaLisboa vai ter, à semelhança das últimas edições, três dias de desfiles, antecedidos pela Fast Talks, uma conferência aberta ao público que terá lugar às 18h desta quarta-feira, na Sala Luís de Freitas Branco, no CCB. Joana Barrios vai moderar um debate sobre o impacto da indústria da moda a nível ambiental e ético. O painel de participantes inclui Brigitte Stepputtis, responsável pelas colecções de alta-costura de Vivienne Westwood; Brooke Blashill, directora da The Boutique Ogilvy & Mather; e Marko Matysik, ilustrador e editor das edições japonesa e chinesa da Vogue. O tema da conferência está directamente ligado a outra das grandes novidades desta edição: a parceria com a Global Fashion Exchange (GFX), uma organização fundada na Dinamarca, em 2013, que promove a sustentabilidade na indústria da moda. O espaço dedicado à Global Fashion Exchange – que todos os anos se associa a uma semana da moda diferente – vai estar aberto ao público sábado e domingo. Será, segundo o fundador da GFX, “o maior evento de troca de vestuário que já teve lugar na cidade de Lisboa”. Para assegurar a entrada, o visitante só precisa de levar uma peça de roupa. O grande momento do GFX, o Swap (troca, em português), acontece no domingo, entre as 17h e as 19h30. Paralelamente, haverá DJ, workshops, eventos de networking e instalações artísticas. Quanto ao calendário dos desfiles, segue os moldes das edições anteriores: começam na sexta-feira, com o Sangue Novo – uma plataforma para talentos emergentes, que concorrem a uma bolsa de 5000 euros –; e continuam, com criadores como Ricardo Preto, Filipe Faísca, Luís Carvalho, Christophe Sauvat, Valentim Quaresma, Dino Alves e Nuno Gama, até domingo à noite.
REFERÊNCIAS:
Tempo Março
Nove regras para comer bem sushi
Celebra-se esta segunda-feira o Dia Internacional do Sushi. Falámos com Paulo Morais, professor e chef do restaurante Kanasawa, para esclarecer algumas questões sobre a comida típica do Japão. (...)

Nove regras para comer bem sushi
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.7
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Celebra-se esta segunda-feira o Dia Internacional do Sushi. Falámos com Paulo Morais, professor e chef do restaurante Kanasawa, para esclarecer algumas questões sobre a comida típica do Japão.
TEXTO: De acordo com os calendários internacionais, celebra-se esta segunda-feira o dia do sushi. É ocasião (ou desculpa) para jantar fora ou, então, para aprender alguma coisa sobre a comida típica do Japão. O PÚBLICO falou com o chef Paulo Morais, professor na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril e responsável pela cozinha do restaurante Kanasawa, para esclarecer algumas questões sobre sushi. Deixamos-lhe uma lista de nove regras a seguir. Qual é a ordem por que se comem as peças de sushi?Normalmente, o ideal será começar pelos sabores mais simples (como pregado, robalo, pargo, goraz, imperador e camarão) e deixar os mais complexos (como barriga de atum, carapau, cavala e enguia grelhada) para o fim. Geralmente um sushiman com experiência monta o prato com as peças mais simples à frente e as com sabores mais fortes na parte de trás. Nos restaurantes mais tradicionais, o sushi é servido peça a peça portanto aí o próprio chef já decidiu quais são as que o cliente tem de comer primeiro. Com que frequência se deve limpar o palato?Sensivelmente, entre cada três ou quatro peças. A pessoa começa com sabores mais subtis e à medida que for progredindo, então, é que é preciso comer um bocadinho de gengibre, ou seja, não é preciso fazê-lo a cada peça que se põe na boca. A refeição deve ser sempre acompanha com saquê?Qualquer comida sabe-nos bem de acordo com aquilo que estamos habituados a beber. O vinho é uma boa opção: vinhos com mais estrutura para os peixes com mais gordura e mais leves para os peixes brancos. “Hoje em dia prefiro vinhos com mais acidez para fazer um contraste maior com o sushi. Tudo depende do tipo de vinho e da temperatura. Depende também da pessoa e do estado de espírito. Sou grande fã de comer sushi com chá verde – então se for chá verde com pipoca de arroz, melhor ainda”, defende o chef. Devemos comer sushi com as mãos ou com pauzinhos?No Kanazawa os clientes são encorajados a comer o sushi com as mãos. “Têm de ter o paninho ao lado para irem limpando os dedos, para o arroz não colar: limpar os dedos no início e no fim, a cada peça”, aconselha Morais. Tradicionalmente os japoneses comem os nigiris, os gunkans e alguns tipos de makis com as mãos. No entanto, se for num restaurante onde o sushi for de fusão, com muitos molhos, é melhor comer com os pauzinhos. Qual a diferença entre os pauzinhos japoneses e, por exemplo, os chineses ou os coreanos?“Quem inventou a maneira de comer com pauzinhos foram os chineses, na altura do Confúcio. Tanto os chineses como os japoneses utilizam muito os pauzinhos de bambu ou madeira. Os coreanos começaram a usar pauzinhos de metal, por várias razões, entre elas porque não tinham tantas florestas e porque o imperador só comia em louças de metal. No metal percebia-se se a comida poderia ter sido envenenada ou não. Geralmente os pauzinhos japoneses são os melhores: tem a ver com madeira lacada, a maneira como são trabalhados, o formato. . . Os japoneses, como sempre, são os mais perfeccionistas e são os que pensam mais nas coisas e trabalham as coisas até à exaustão”, explica o professor e um dos primeiros chefs a dedicar-se à gastronomia japonesa em Portugal. É tradicional comer sobremesa no final da refeição?Tradicionalmente, os japoneses comem fruta no final de uma refeição. Utilizam muito a fruta cozinhada, que é uma forma de preservar, já que a fruta no Japão é muito cara. Ou, então, um gelado ou uma espécie de gelatina. Eventualmente uma sobremesa feita com arroz, como é o caso dos mochis. “A maioria dos doces japoneses evoluíram para acompanhar o chá, por isso são coisas mais secas, como é o caso dos wagashi, dorayaki, castela (o pão de ló japonês, que foi levado pelos portugueses e que os japoneses ainda hoje utilizam). ”Qual é a quantidade certa de molho de soja?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “É suposto usarmos soja, mas com moderação – não é dar banho às peças. É só um toque de um lado ou do outro, retirar logo e tirar o excesso de soja”, recomenda o chef, acrescentando que se o sushi já tem molhos não precisa de soja. Qual é a quantidade certa de wasabi e onde se deve colocar?O wasabi é muito importante. Deveria ser sempre servido em todas as peças. Tem várias propriedades, sendo uma delas que ajuda à digestão, além das características antibacterianas. “Tem de ser usado com peso e medida, não se pode pôr demasidado de maneira a que estrague completamente o palato”, diz. Colocar wasabi no molho de soja não é muito habitual no Japão, informa.
REFERÊNCIAS:
À boleia do imperador da China que gostava de música barroca
A Orquestra Barroca Casa da Música fez dois concertos em Pequim, a comemorar o Dia de Portugal. Mostrou o esplendor da música que se fazia na corte de D. João V num país que parece aberto a conhecer e consumir todas as expressões da música ocidental. (...)

À boleia do imperador da China que gostava de música barroca
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.6
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Orquestra Barroca Casa da Música fez dois concertos em Pequim, a comemorar o Dia de Portugal. Mostrou o esplendor da música que se fazia na corte de D. João V num país que parece aberto a conhecer e consumir todas as expressões da música ocidental.
TEXTO: Há Vhils na parede da embaixada, já houve fado com Cuca Roseta na universidade e galeristas na Feira de Arte de Pequim e, agora, música barroca no conservatório de música; e há vinho Grão Vasco na ementa de um dos principais hotéis do novo quarteirão financeiro da cidade – em que se destaca o edifício em cotovelo que Rem Koolhaas projectou para a televisão nacional chinesa –, e cerveja Super Bock a assinalar uma década de implantação crescente da marca no mercado do país; e há ainda Ronaldo na televisão a marcar golos e a publicitar um automóvel de luxo de marca chinesa… Mas falta ainda muito Portugal em Pequim, e na China. Esta é a convicção do embaixador português José Augusto Duarte. Mas é uma convicção pró-activa, que leva o ex-assessor do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa a apostar num programa de acção que permita modificar este estado de coisas. Se a economia é a face mais visível do investimento português no país – em resposta, de resto, à aposta recente da China em Portugal nos domínios da energia, da banca e dos seguros –, José Augusto Duarte entende que a cultura é indispensável ao enraizamento das relações entre ambos os países. E foi por isso que, depois de ter promovido a actuação de Cuca Roseta em Março, com lotação esgotada, na mais prestigiada Universidade de Pequim, convidou agora a Orquestra Barroca Casa da Música (OBCM) a participar nas comemorações locais do Dia de Portugal. “A comunidade portuguesa na China é pequena, mas não é isso que conta; os músicos e os artistas portugueses vêm actuar para uma audiência mais alargada, e há na China um interesse crescente pela cultura portuguesa, como pela cultura ocidental em geral”, diz ao PÚBLICO o embaixador, a propósito de um programa de comemoração do 10 de Junho que, em Pequim, se prolongou por vários dias ao longo da semana seguinte. Quarta e quinta-feira, a OBCM apresentou num dos dois conservatórios de Pequim dois concertos com um programa dedicado à época de esplendor da música barroca em Portugal em volta da corte de D. João V. A antecipar essas actuações, dois músicos da formação, Filipe Quaresma (violoncelo) e Reyes Gallardo (violino), tocaram Bach para um grupo de convidados na embaixada portuguesa. O título genérico do programa da OBCM em Pequim foi Kangxi, Porto e o Barroco, e José Augusto Duarte incluiu nele uma homenagem mais abrangente a esta cidade, mas que estendeu também a Lisboa – nos cartazes no conservatório que publicitavam os concertos podiam ver-se pormenores do Museu dos Coches e um retrato de D. João V, além de azulejos da Sala VIP da Casa da Música e uma imagem da Ribeira portuense. Rui Moreira chefiou, de resto, a “delegação” da Câmara do Porto nesta viagem – que incluía também o seu assessor para a Cultura, Guilherme Blanc, e o director do Teatro Municipal do Porto, Tiago Guedes. E testemunhou ao PÚBLICO ver também em Pequim e na China “um destino a explorar do ponto de vista económico, naturalmente – até em resposta ao investimento que a China fez em Portugal nos anos da crise –, mas também cultural”. “Visitas exploratórias” a museus e ao bairro das artes e também a companhias de dança de Pequim, e posteriormente a Xangai, completaram a agenda da delegação. No horizonte, estão possíveis visitas ao Porto do Ballet Nacional da China, uma exposição da colecção de arte da Fundação Fosun e, seguramente – avançou ao PÚBLICO Fernando Rocha, vereador da Cultura de Matosinhos, também presente em Pequim –, um programa dedicado à Semana de Design da capital chinesa na primeira edição da Porto Design Bienalle, que as duas autarquias vão lançar em Setembro de 2019. O outro nome do cartaz do Dia de Portugal em Pequim identificava o imperador Kangxi (1654-1722), da dinastia Quing, a quem é atribuída uma predilecção muito especial pela música barroca, que conheceu por via do jesuíta português Tomás Pereira (1645-1708), que viveu três décadas na sua corte e se ocupou inclusivamente da educação musical dos seus filhos. Na apresentação dos concertos da OBCM, José Augusto Duarte lembrou que Tomás Pereira era originário de uma freguesia de Famalicão, perto do Porto – daí a escolha da cidade para o programa de Pequim –, e citou Kangxi como “um patrono das artes e um dos maiores imperadores da história da China”. O embaixador, que assumiu funções apenas em Dezembro, explicou também ao PÚBLICO ter decidido convidar a orquestra portuense — que apresentou como “uma das melhores formações barrocas da Europa” — depois de a ter visto a actuar no ano passado no Luxemburgo, também no Dia de Portugal. Música da corte de D. João VA OBCM respondeu com um programa que reunia três dos maiores compositores portugueses da época, Carlos Seixas, Francisco António de Almeida e Pedro Jorge Avondano, a outros tantos, estrangeiros, que marcaram o ambiente musical da corte de D. João V, como William Corbett, Giacomo Facco e David Perez. A dirigir a formação esteve o maestro e violinista italiano Federico Guglielmo, que assim viveu uma dupla estreia na sua carreira, com a Casa da Música e com a China. “A vida tem destas coincidências surpreendentes: já toquei 25 vezes no Japão, mas nunca tinha vindo à China; e, em Portugal, só actuei pela primeira vez em Novembro passado, em Lisboa, na Gulbenkian, e agora fui convidado pela Casa da Música”, realçou este violinista nascido em Pádua, com uma carreira internacional multipremiada. Por razões de agenda, Guglielmo viu-se obrigado a preparar estes concertos em tempo recorde, tendo ensaiado a orquestra no Porto em apenas um dia e, já em Pequim, teve de dividir o tempo e o palco do conservatório com formações locais. Nada que tivesse impedido duas actuações seguras, perante duas plateias bem diferentes: na quarta-feira, com meio milhar de espectadores convidados pela embaixada e pela Super Bock; no dia seguinte, já com os 800 lugares praticamente lotados por uma assistência maioritariamente formada por jovens estudantes, que em muitos casos dividiu a atenção entre música e os ecrãs luminosos dos seus iphones. “O grupo da orquestra é absolutamente adorável e tem um som fantástico. Os músicos compreendem tudo muito depressa, e não é preciso falar nem ensaiar muito”, disse, no final, Federico Guglielmo, considerando que o primeiro concerto tinha sido “melhor, tecnicamente, e o segundo melhor, musicalmente”. “Com ensaios bons ou maus, quando entrámos em palco levámos sempre uma espécie de injecção de adrenalina que nos permite tocar bem”, dizia Vanessa Pires, violinista ligada à OBCM desde a sua fundação, em 2006. Todos os 13 músicos, e a soprano Eduarda Melo, que se apresentaram em palco, fizeram-no em estreia na China. Quem tinha tocado mais perto era o cravista Fernando Miguel Jalôto, director artístico do Ludovice Ensemble, que fizera já três concertos no Japão. “O principal desafio destes concertos foi o jet lag e, no meu caso, vir tocar num instrumento desconhecido, que se encontrava em boas condições, mas que certamente é pouco usado e necessitou de afinação”, disse o cravista. A outra solista convidada, Eduarda Melo, também com uma ligação à orquestra portuense desde a sua origem, gostou principalmente de ter podido cantar para um público maioritariamente jovem. “É giro os concertos serem feitos no conservatório, e assim fazer chegar a música barroca a estudantes e a ouvintes mais jovens”, dizia a soprano, que tem dividido a sua carreira entre palcos portugueses e franceses – em Junho irá cantar O Barbeiro de Sevilha no Festival de Avignon (França). A violinista Reyes Gallardo, nascida na Corunha (Galiza) e radicada em Torres Vedras, viu na apresentação de um reportório de música barroca portuguesa tocada em instrumentos com características da época o aspecto mais motivador para o público chinês. “Aqui as pessoas estão habituadas a ouvir música barroca tocada com instrumentos actuais, que têm um som mais estridente”, notava a violinista. Que futuro poderá ter este género de música ocidental num país que declaradamente parece aberto a todas as experiências musicais? Fernando Miguel Jalôto realça que a China é já um forte mercado, e não apenas para as grandes orquestras sinfónicas ocidentais. Refere, a propósito, a digressão que a formação francesa Les Arts Florissants se encontra a fazer, por estes dias, em Pequim, com a produção Monsieur de Pourceaugnac, de Molière/Lully. “Os chineses conhecem bem a música de Bach, Händel, Vivaldi, Corelli, mas há muito mais a conhecer, e nós viemos trazer-lhes um programa maravilhoso e apelativo, que representa o melhor que se fez em Portugal no século XVIII, e mostrando as formas de tocar da época”, realça o cravista. Quem se mostrou rendido a este programa foi o violinista chinês Xuan Du, que no final do primeiro concerto não se cansava de abraçar os músicos da OBCM. Havia também uma razão pessoal e afectiva para este entusiasmo: Du, nascido em Nanjing há 42 anos, viveu e trabalhou em Portugal durante mais de uma década, onde passou por várias formações, desde a antiga Orquestra Nacional do Porto até ao Remix Ensemble, passando pela Orquestra Sinfónica Portuguesa. Regressou entretanto ao seu país, onde toca na Orquestra Sinfónica da Ópera Nacional da China. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “Actualmente, na China, e principalmente em Pequim, existe tudo e de tudo; o mundo inteiro está aqui, e há público para todo o género de música: sinfónica, ópera, barroca, world, pop-rock, tradicional, etc. ”, diz Xuan Du, convencido de que uma maior aposta na música barroca depende apenas da publicidade que se fizer dela. E acha que os concertos da OBCM são um bom passo nesse processo. Confirmando esta disponibilidade, En Shao, o consagrado maestro principal convidado da Orquestra Nacional da China, avançou ao PÚBLICO estar a preparar, no conservatório de música que recebeu a orquestra portuense, o lançamento de um curso de música barroca para o ano lectivo 2019/20. “Há muitos jovens interessados, mesmo se ela não faz parte da cultura musical da China, e há também um interesse do grande público”, disse Shao, no final do ensaio da prestação do jovem violinista Dan Zhu e da Orquestra de Câmara da Juventude Chinesa da Conservatório Nacional da Música, que fechou com um programa de barroco (Bach, Leclair e Tartini) o segundo dia da actuação da orquestra portuense. O PÚBLICO viajou a convite da Casa da Música
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cultura educação comunidade género espécie chinês
Nova lei na China pode deixar 111 milhões de toneladas de “lixo” plástico sem destino
Investigadores calcularam o impacto da proibição de importação de resíduos de plástico destinado à reciclagem na China que entrou em vigor em Janeiro de 2018. Até 2030, esta porta fechada deixa 111 milhões de toneladas de plástico sem destino (...)

Nova lei na China pode deixar 111 milhões de toneladas de “lixo” plástico sem destino
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.136
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Investigadores calcularam o impacto da proibição de importação de resíduos de plástico destinado à reciclagem na China que entrou em vigor em Janeiro de 2018. Até 2030, esta porta fechada deixa 111 milhões de toneladas de plástico sem destino
TEXTO: O problema do plástico já era suficientemente preocupante sem uma porta fechada na China que recebia muito do desperdício produzido noutros países. Em Janeiro de 2018 entrou em vigor a proibição de importação de “lixo” plástico não-industrial. Agora, uma equipa de cientistas da Universidade da Geórgia, nos EUA, fez as contas ao impacto desta nova lei na China e concluiu que, até 2030, há 111 milhões de toneladas de plástico sem destino. O artigo publicado na revista Science Advances deixa um aviso aos governantes: é urgente pensar em programas de reciclagem domésticos mais robustos e repensar o uso do plástico. A “lixeira” mundial do plástico fechou portas e as consequências vão começar a sentir-se em muitos países. “Embora a reciclagem seja muitas vezes apontada como a solução para a produção em grande escala de resíduos plásticos, mais de metade do lixo plástico destinado à reciclagem é exportado de países ricos para outras nações, com a China historicamente ficar com a maior fatia”, refere o comunicado da Universidade de Geórgia sobre o estudo com o título “A proibição das importações chinesas e o seu impacto no mercado global do comércio de resíduos de plástico”. Neste artigo, os investigadores constatam que “as importações anuais globais e as exportações de resíduos plásticos dispararam em 1993, crescendo cerca de 800% até 2016”. De acordo com o registo que começa em 1992 deste circuito, a China terá recebido cerca de 106 milhões de toneladas de resíduos plásticos, o que representa quase metade das importações de resíduos plásticos do mundo. “A China e Hong Kong importaram mais de 72% de todos os resíduos plásticos, mas a maior parte do lixo que entra em Hong Kong - cerca de 63% - é exportada para a China”, acrescenta o comunicado de imprensa, que adianta ainda que os países com mais rendimentos da Europa, Ásia e Américas “respondem por mais de 85% de todas as exportações globais de resíduos plásticos”. Globalmente, a União Europeia é o maior exportador de “lixo” plástico. "Sabemos de estudos anteriores que apenas 9% de todos os plásticos já produzidos foram reciclados, e a maioria deles acaba em aterros sanitários ou em ambientes naturais", refere Jenna Jambeck, investigadora na Universidade da Geórgia e uma das autoras do artigo. "Cerca de 111 milhões de toneladas de resíduos plásticos vão ficar sem destino por causa da proibição de importação até 2030, por isso teremos que desenvolver programas de reciclagem mais robustos internamente e repensar o uso e o design de produtos de plástico se quisermos lidar com este desperdício de forma responsável ". Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Sobre esta medida da China, os investigadores explicam que o negócio de resíduos de plástico foi lucrativo enquanto conseguiam usar ou revender o produto reciclado. No entanto, acrescenta Amy Brooks, principal autora do estudo, “muito do plástico que a China recebeu nos últimos anos foi de má qualidade, e tornou-se difícil obter lucro”. Além disso, actualmente a China produz mais resíduos plásticos no mercado interno e por isso não precisa depender de outros países. Para os exportadores, havia aqui um bom negócio porque “as baratas taxas de processamento na China faziam com que o envio de lixo para o exterior fosse mais barato do que o transporte interno destes materiais por caminhão ou comboio”. "É difícil prever o que acontecerá com os resíduos plásticos que antes eram destinados às instalações de processamento chinesas", conclui Jenna Jambeck, acrescentando: "Alguns podem ser desviados para outros países, mas a maioria destes países não tem sequer infra-estruturas para gerir os seus próprios resíduos quanto mais os resíduos produzidos pelo resto do mundo". Até para a China a situação começou a ficar difícil de gerir com o rápido crescimento económico que produziu demasiado “lixo” plástico. Sem porto de chegada, o melhor mesmo é reduzir a carga no ponto de partida. Ou seja, mudar o actual sistema, pensar em novas estratégias de reciclagem de plástico e diminuir de forma substancial e rápida a produção de plástico.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
“Deixemo-nos deslizar para o deslumbramento da dúvida”
Como um investigador de engenharia se tornou sinólogo e tradutor dos grandes clássicos do taoismo. (...)

“Deixemo-nos deslizar para o deslumbramento da dúvida”
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: Como um investigador de engenharia se tornou sinólogo e tradutor dos grandes clássicos do taoismo.
TEXTO: Culminando cerca de quarenta anos de estudo e dedicação, António Miguel de Campos traduziu e fez publicar em português duas obras canónicas da literatura clássica chinesa, que são também os dois textos fundadores do taoismo. Em 2010 foi publicado o ‘ao Te King- Livro do Caminho e do Bom Caminhar, de Lao Tse, e, não obstante anunciar-se como tradução directa do chinês (o que não será vulgar por cá), não parece ter suscitado interesse, nem por parte da crítica de divulgação, nem por parte dos sinólogos portugueses. O tradutor foi convidado a escrever um artigo para uma revista e, mais recentemente, a participar num workshop relacionado com a medicina tradicional chinesa. Pouco mais. É claro que devemos contar também com a voluntária discrição do tradutor. Quando saiu o Tao Te King, o editor terá tentado convencê-lo a ir à Feira do Livro de Lisboa, para uma sessão de autógrafos. Campos deu uma volta discreta pelo Parque Eduardo VII, para observar os costumes. E recusou. Tendo saído há pouco a sua tradução (“a partir das fontes chinesas”) de Chuang Tse, que até agora terá tido recepção, jornalística e académica, não menos discreta, quisemos entrevistar o tradutor. Não só porque os estudos sínicos em Portugal não têm sido pródigos (não obstante sermos o país europeu com mais longa tradição de relações comerciais e diplomáticas com a China), como por sabermos que António Miguel de Campos — nascido em 1951, engenheiro electrotécnico com mestrado feito nos EUA, e que foi professor universitário e investigador no LNETI e no LNEG — é um sinólogo amador e autodidacta. Pouco depois, recebemos por correio electrónico um depoimento videogravado com uma hora de extensão. No ficheiro não editado, vemos e ouvimos o tradutor, num único longo plano aproximado e fixo, discorrer sobre a língua chinesa e as peculiaridades da sua tradução, e sobre Chuang Tse e o taoismo, enquanto vai acendendo e fumando um cigarro atrás de outro. Estaria implícita a sugestão de que poderíamos prescindir da entrevista? Fosse como fosse, esta acabou por realizar-se. Desta vez, o tradutor não fumou nenhum cigarro. E nós também não. Como é que se tornou tradutor dos dois maiores clássicos do taoismo?A certa altura, tentei arranjar uma tradução do Tao Te King para oferecer a uma amiga que não percebia por que é que eu gostava tanto do taoismo, mas nenhuma delas me satisfez. Então, com base em várias traduções, tentei fazer eu uma e apercebi-me de que as várias traduções diziam coisas contraditórias. Comecei a pesquisar, encontrei na Internet o original, várias versões, dicionários, etc. , e pus-me a trabalhar. Dizia no prefácio desse livro que descobriu Lao Tse em 1976, quando estava nos EUA a fazer um mestrado. Normalmente, hesito muito antes de comprar um livro, mas nesse dia entrei numa livraria de São Francisco, li duas ou três frases do Tao Te King, e pensei: “Este livro foi aqui posto para mim!” E comprei-o logo. E desde então, quase todos os dias, antes de dormir, lia uns versículos. Às vezes ia passear e levava-o comigo para me fazer companhia. Nessa altura não havia Skype, não havia nada, tive de mudar um pouco de personalidade porque estava num sítio diferente. Comecei a pensar de outra maneira e a certa altura interessou-me muito, também, o Pessoa, o Alberto Caeiro, as várias personalidades. Passei os quarenta anos seguintes a ler os taoistas. Conserva essa edição?Sim, é uma edição muito bonita, com fotografias. Mas hoje já não gosto muito dela, porque entretanto estudei o Tao Te King e acho que há coisas que não estão correctamente traduzidas. A verdade é que a maior parte das traduções não são feitas a partir do original e as pessoas também não tiveram todo o tempo que eu tive. Fala chinês?É uma coisa curiosa. Vivi em Macau e aprendi um pouco de chinês, aprendi umas coisas muito básicas, mas, praticamente, não falo chinês. Às vezes perguntam-me: “Mas traduzes do mandarim?” Não tem nada que ver com isso! O mandarim ou o cantonense são dialectos do chinês actual. O que traduzo são textos que os chineses actuais não conseguem ler. É um chinês clássico. Até houve um chinês, aqui em Portugal, que me quis conhecer porque estava intrigado como é que eu conseguia ler aquilo. António Miguel de Campos — nascido em 1951, engenheiro electrotécnico com mestrado feito nos EUA — é um sinólogo amador e autodidacta. Traduziu para português duas obras canónicas da literatura clássica chinesa, que são também os dois textos fundadores do taoismoDurante quanto tempo foi professor na Universidade de Macau?Quatro anos. Li muito sobre a cultura chinesa naquela altura. Falava com os meus colegas chineses e japoneses, dizia-lhes que estava muito interessado na cultura chinesa, mas eles não me diziam nada. Houve um chinês, a quem que eu disse que estava muito interessado na cultura chinesa, que ficou a olhar para mim em silêncio e passado um bocado perguntou-me: “Você está cá há dois anos, daqui a dois anos vai-se embora, a que propósito é que eu lhe ia falar da cultura chinesa?”É, então, um sinólogo inteiramente autodidacta?Inteiramente. Quanto tempo investiu nesta tradução do Chuang Tse?Quando publiquei o Tao Te King, em 2010, pensei logo em traduzir o Chuang Tse. Mas entretanto morreu a mãe dos meus filhos — estávamos separados — e passei a ser pai a tempo inteiro durante uns tempos. Há dois anos, os meus filhos já não precisavam muito de mim e voltei a traduzir intensamente. Salvou-me da velhice. Às vezes, olhava lá para fora e já era dia. Nas alturas em que estou a traduzir, se um amigo me telefona e me pergunta se quero ir beber um copo, digo que não, que estou com dor de cabeça. É o aspecto obsessivo do investigador. Diria que demorei dois anos e meio. E quando digo dois anos e meio são dois anos e meio a tempo inteiro, todos os dias, e a trabalhar pela noite fora. Isso só foi possível porque agora estou reformado, tenho a minha subsistência garantida, e sou um homem da ciência, ou seja, tenho um temperamento obsessivo. Tem alguma teoria pessoal sobre o que deva ser uma boa tradução?O que defendo é que se fique o mais próximo possível das ideias originais. Eu li uma frase, percebi o que está lá, mas não vou traduzir o que percebi porque aquilo está escrito de uma maneira que, de facto, nem um chinês percebe, nem mesmo um chinês daquela época. Porque, se fizer isso, quem ler entende o que está traduzido, mas a tradução não tem a riqueza do original. Para traduzir, tive de estudar toda a história da filosofia chinesa, porque senão haveria coisas que eu traduzia e que não estariam certas. Traduzir o chinês clássico é difícil porque, tendo cada caracter muitos significados diferentes, o significado emerge do contexto. O Chuang Tse conta muitas histórias e cada história em si é muitas vezes fácil de traduzir, mas depois há uma frase, às vezes quase um caracter só, que é a chave do significado daquela história. E normalmente essa parte está escrita de maneira mais ambígua, mais misteriosa. Às vezes é uma frase com a qual não se estava a contar. O meu trabalho como tradutor é, na medida do possível, deixar ficar um bocado desse enigma presente. Socorreu-se de outras traduções, em línguas estrutural e culturalmente mais próximas da portuguesa, para cotejar a sua?Quando traduzo, traduzo eu. Às vezes, vejo como é que os outros traduziram, mas a maior parte das vezes digo: “Isto não está certo”. Também li muitos artigos de sinólogos sobre o Chuang Tse, mas o que eu escrevo depois não é o que eles escreveram. Às vezes, leio uma coisa e digo: “Estes tipos não tiveram o tempo que eu tive ou então não perceberam isto”. E houve algumas coisas neste texto que eu descobri, acho eu, e que só aparecem na minha tradução. E como é que eu descubro coisas que outros sinólogos não descobriram? Ando por aí na Internet a ver documentos chineses antigos. Posso estar a ser convencido, mas acho que não. Às vezes aprendemos com os erros dos outros. Eu li o que eles fizeram, tenho meios que eles não tiveram, dediquei muito tempo, é natural que o meu trabalho seja bom, ou seja melhor. E estou convencido de que a partir de agora vão aparecer, mesmo em Portugal, traduções cada vez melhores, cada vez mais próximas do original. No caso da língua inglesa, há uma longa tradição tradutológica do Chuang Tse e do Tao Te King. Há, mas isso pode criar vícios e não quer dizer que essas muitas traduções sejam boas. Aquelas que são consideradas melhores são aquelas que têm uma leitura inglesa que soa bem, mas que não seguem propriamente o original, e aquelas que seguem o original lêem-se mal. Não defende, portanto, que uma boa tradução deva aclimatar o texto traduzido à língua de chegada. Esse é um ponto importante. Há, por exemplo, um [sinólogo] suíço muito conhecido, Billetere, que defende uma tradução do Chuang Tse que um francês leia como se estivesse a ler Montaigne. É a escola francesa. As traduções francesas, normalmente, são as piores. Porquê? Porque lemos aquilo e é francês. E também há algumas inglesas, consideradas as melhores, que fazem isso. Destroem a ambiguidade do original e o leitor ocidental lê com mais facilidade. Eu, quando traduzo para português, tento ao máximo que as pessoas leiam e sintam que há ali outra língua por trás. Qual é a sua relação com a sinologia académica portuguesa?Quando se tratou de publicar o Tao Te King, o editor perguntou-me se eu não quereria falar com um sinólogo qualquer, muito conhecido. Eu disse-lhe que não. Fiz a minha tradução, e ou é publicada assim ou então ponho-a na Internet. É assim mesmo. E com este formato. Fui eu até que fiz a paginação e tudo. É preciso dizer que eu fiz estas traduções como um hobby. Para mostrar aos meus amigos e aos amigos dos meus filhos. Mostrei a um amigo que é tradutor de grego e foi ele que telefonou ao Francisco Vale [editor da Relógio D’Água] e disse-lhe: “Há para aí um louco que está a traduzir o ‘Tao Te King’ do chinês. Não estás interessado?” Também mostrei a um colega meu, um investigador japonês que estudou chinês, e ele disse-me que devia publicar. E eu ganhei uma certa confiança e publiquei. Não o preocupou a reacção eventual dos académicos da área?Ao princípio preocupei-me. Disseram-me: “Tu não és da área. Quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão?” Mas o que é certo, é que está ali muito trabalho. Estudei todos os caracteres do Tao Te King e pus na Internet um glossário com os 5 mil caracteres a dizer o que eles significam. A maior parte das versões destes textos disponíveis em Portugal e no Brasil, até agora, são traduções de traduções (do inglês ou do francês). Mas os jesuítas de Macau já há meio século haviam traduzido algumas coisas do chinês. Os jesuítas traduziram algumas coisas, mas são traduções cristãs. O texto original chinês é ambíguo e há a tendência para, na tradução, torná-lo claro, o que é mais natural para um ocidental. Eu procurei fazer uma tradução mantendo o máximo possível a ambiguidade original, e por isso é que o meu livro é lido por budistas e por cristãos e todos eles acham que é um livro budista ou cristão. O que eu fiz de especial, e que dá muito trabalho, foi fazer uma frase suficientemente simples que possa ter muitas interpretações. Interessa-lhe mais a riqueza literária destes textos ou os aspectos filosóficos?É a filosofia de viver, digamos assim, que me interessa. Descobri que, se seguirmos esta filosofia, a vida é mais satisfatória. É uma maneira mais sã de olharmos para a vida. Em vez de estarmos muito presos ao que está certo e ao que está errado, e depois sentirmo-nos mal e com culpa e não sei quê. Devemos fazer aquilo que achamos que devemos fazer. Como dizia Nietzsche, o que é ser livre? É não termos vergonha de sermos quem somos. Definir-se-ia como taoista?Como alguns amigos me chamam Tó Campos, eu costumo dizer que sou “toista”. Mas há ali uma sabedoria qualquer que me leva a perguntar, quando estou numa situação complicada: “O que é que diria o Chuang Tse se me visse?” Há uma certa ideia de que o taoismo é uma coisa meia mágica e mística. É uma ideia errada. Tudo o que estes filósofos dizem é perfeitamente inteligível. É tão inteligível como, por exemplo, o Camões dizer que o amor é um contentamento descontente. Isto é ininteligível? Não, só que obriga o leitor a sair da lógica da linguagem. No chinês clássico, o escritor não transcreve o seu pensamento de uma maneira que seja facilmente assimilável. O leitor tem que olhar para aquele texto e perguntar: o que é que isto quer dizer? Aquilo é um enigma e ele tem de descobrir a chave. Quando descobre a chave, percebe perfeitamente. Em chinês moderno deve haver umas mil traduções do ‘Tao Te King’. Muitas dessas traduções são feitas por pessoas budistas, ou confucionistas, e essas traduções chinesas actuais são das piores que existem, porque os tradutores estão demasiado condicionados pela sua maneira de pensar. Nos textos originais existe uma ambiguidade que é muito característica do pensamento chinês. O ‘Tao Te King’ é o livro mais traduzido em todo o mundo, a seguir à Bíblia, e é lido por cristãos, budistas, confucionistas, etc. , porque a sua linguagem é suficientemente ambígua para que cada um deles encontre lá o que procura. Quando fiz a minha tradução do ‘Tao Te King’, umas amigas católicas acharam-no um livro cristão. Mas não é! Tem é muitas leituras diferentes e a sua riqueza é essa ambiguidade. Refazendo a pergunta: é um praticante do taoismo?Dessas ideias, sim, mas muitas dessas ideias também as vemos em Nietzsche ou, se calhar, em Kierkegaard. Mas o taoismo não é nenhuma religião. Aliás, os taoistas escrevem de maneira de tal modo ambígua que há muita gente que acha que o Chuang Tse não tem mensagem nenhuma, que é uma grande confusão. Mas isso, às vezes, é por causa de estar mal traduzido. O Chuang Tse diz a certa altura que é preciso ser lúcido, ver com clareza. Vi escrito numa tradução portuguesa que o que é preciso é ser iluminado. Ora, essa ideia de iluminação é uma ideia budista que se intromete ali e que as pessoas vêem como se fosse uma coisa mágica. O taoismo filosófico não tem nada disso. Para Chuang Tse, a única magia que há é a magia de um artífice, de um grande carpinteiro, é a magia de fazer as coisas bem feitas. Às vezes, perguntam-me o que é o Tao. Mas o Tao não é nada, é só deixarmo-nos evoluir naturalmente, é fazer o que está certo em cada momento. Isso é que é mágico! Está sempre tudo a mudar e nós devemos mudar também. Para Chuang Tse, a única magia que há é seguirmos o caminho, o Tao, daquele momento, e sentirmo-nos bem. É a magia de sermos como o universo, como a natureza. O Tao é haver a Primavera, depois o Verão e o Inverno, e deixarmos que isto também aconteça dentro de nós. É fazer como a água que corre, como um riacho quando encontra uma pedra. Não fica ali a bater. Ajusta-se ao problema, ajusta-se à pedra, toma a forma da pedra e segue. E quando vemos a água seguir, nem nos apercebemos de que havia ali um obstáculo antes. O aparato dos seus comentários e notas, nesta edição de Chuang Tse, não contraria a ambiguidade do original, não restringe a liberdade interpretativa do leitor?Se eu publicasse só a tradução, as pessoas não iam perceber o que estava em causa. É necessário saber alguma coisa sobre a história do pensamento chinês e sobre as várias correntes que havia na altura. Por outro lado, o Chuang Tse tem muito que ver com o pensamento chinês actual. Era preciso falar sobre isso. A China vai ser muito importante durante este século e é importante nós percebermos o pensamento chinês. Não é para deixarmos de pensar como pensamos, mas é para pensarmos também dessa outra maneira. Porque os chineses pensaram a ambiguidade, enquanto no Ocidente, desde Platão, a filosofia não se interessou pela ambiguidade. Até Nietzsche. Disse, a propósito de Lao Tse, que não houve Platão no Oriente e que isso fez toda a diferença, e que deveríamos ser um pouco mais heraclitianos. Para Heráclito, há muito pouco que possamos dizer sobre a realidade, porque ela está sempre em transformação. No mesmo rio banhamo-nos e não nos banhamos, somo e não somos. Os chineses seguem mais Heráclito do que Platão. Porque toda a riqueza da lógica — e do certo e do errado, e do ideal — deu-nos a ciência e o progresso, mas com isso também vem uma certa maldição. Anda toda a gente em psicólogos e psiquiatras. Há qualquer coisa que não está bem. As pessoas vão à procura da felicidade no Oriente porque o pensamento chinês tem um efeito terapêutico para um ocidental. Não defendo que pensemos como os chineses, mas há momentos em que gente lê estes orientais e aquilo nos dá uma paz, uma calma. Não devemos ter tantas certezas. O que hoje nos parece certo, amanhã estará errado. Deixemo-nos deslizar para o “deslumbramento da dúvida”, como se diz no Chuang Tse. A expressão demorou-me bastante tempo a traduzir mas fiquei muito contente com essa forma. O que não devemos fazer é dizer: eu sou assim, e penso assim, e sempre fui coerente comigo mesmo, e hei-de ser sempre assim. É uma parvoíce. E realmente, depois, ficamos mesmo sempre assim. E isso até é mau para a saúde! Chuang Tse frisa, sobretudo, que há varias perspectivas e que não nos devemos prender a nenhuma delas. Não existe uma verdade absoluta. As verdades só existem a partir de perspectivas parciais. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Não há aí um certo relativismo ético?Chuang Tse o que diz, no fundo, é o mesmo que diz Nietzsche e que é: a sociedade diz-nos que isto está certo e aquilo está errado, mas isso não é absoluto. É mau fazer isto? Noutra religião ou noutra sociedade dizem que é o contrário. Há um certo relativismo, neste sentido. Se nos convencemos de que temos a verdade dentro de nós, isso é mau. Saber o que é a verdade! Eu já ando por cá há sessenta e seis anos e meio, sou um tipo inteligente, que lê muito, e ainda não percebi bem o que é que ando aqui a fazer e qual o significado disto. E não vou saber. Até porque se calhar não tem significado nenhum. Porque são as palavras que têm significado. Há uma palavra copo que significa o objecto copo. Mas o copo não tem significado. Como pensamos em termos da linguagem, procuramos um significado para o mundo como se o mundo fosse uma palavra, ou como se fosse um conceito. Mas não é. O mundo é o mundo. Claro que não tem significado nenhum. Qual é o significado da vida? Essa frase nem faz sentido. Porque a vida não é uma palavra. Fazemos perguntas que nunca terão resposta. O que o taoismo nos dá não é a resposta para as nossas perguntas. Ajuda-nos a perceber que não tem sentido fazer essas perguntas. Temos de ter uma certa humildade perante a vida. Não é ser relativista, é em cada momento decidir um bocado intuitivamente. Eu às vezes decido fazer coisas completamente contra o que me diz a minha cabeça. Porque eu confio mais na minha intuição do que no que me diz a minha cabeça. A presente ascensão da China deve-se ao pensamento tradicional ou ao domínio da racionalidade e da técnica ocidental?Às duas coisas. Quando seguimos o Tao, ou seja, o caminho natural, fazemos as coisas gradualmente. Como a natureza. A China comunista adaptou-se e começou a perceber que também precisava de ser capitalista. Começou a mudar. Neste momento eu acho até que eles já estão a voltar um bocadinho mais ao comunismo, quando pensávamos que iam ficar todos ocidentais. É o movimento do Ying e do Yang. O Partido Comunista Chinês já não tem nada que ver com o que era no tempo de Mao Tse Tung. Os seus quadros são tipos com doutoramentos feitos na Califórnia e em todo o lado, estão lá os capitalistas, e está tudo sempre a mudar. Eles hoje sabem pensar à maneira ocidental e sabem pensar como eles. Nós sabemos pensar como nós e não sabemos pensar como eles. Isso dá-lhes muita força. Há a história de um camponês que tem um campo de trigo que estava a crescer lentamente e ele chegou lá e começou a esticar as plantas. O campo secou. Nós, os ocidentais, temos esse método, queremos alterar as coisas muito depressa. Mas o tempo das evoluções é lento. Eles fazem as coisas de tal maneira que nem se nota, é invisível. O Tao também é invisível. Nesta edição está uma parte substancial do original. Vai continuar a traduzir?Do Chuang Tse acho que não, porque vi tudo o que estava escrito e há coisas que são, na minha opinião, sem interesse, porque já estão contaminadas por Confúcio e por outros pensadores. Escolhi aquilo que eu achei que realmente tinha interesse e que merecia ser traduzido. Há um outro clássico, que é o Lié Tse, mas que para mim não tem interesse, porque já tem umas magias. Foi-me feita uma proposta de traduzir poesia chinesa clássica, mas ainda não sei se vou aceitá-la. Traduzi o Lao Tse e o Chuang Tse porque quase sentia a obrigação de o fazer. São duas pessoas a quem eu devo muito. Devo muito ao conselho destes meus amigos. Vivi a minha vida sempre atento ao que eles me ensinaram. E, por isso, achei que tinha a obrigação de escrever o que escrevi, de passar o testemunho aos outros. Dá mais sentido à minha vida.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Uma seguradora portuguesa na mais longa OPA da bolsa francesa
Oferta da Fosun pelo Club Med começou nos 17 euros em 2013 e acabou nos 24,6 euros por cada acção em 2015. Esforço da Fidelidade, revelado nos cenários da oferta, oscilava entre 69 e 135,7 milhões de euros, até 19,5% do capital. (...)

Uma seguradora portuguesa na mais longa OPA da bolsa francesa
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Oferta da Fosun pelo Club Med começou nos 17 euros em 2013 e acabou nos 24,6 euros por cada acção em 2015. Esforço da Fidelidade, revelado nos cenários da oferta, oscilava entre 69 e 135,7 milhões de euros, até 19,5% do capital.
TEXTO: Setembro de 2014 – enquanto em Lisboa havia um mês que a resolução do BES tinha sido decretada pelo Banco de Portugal, Paris vivia o auge daquela que seria a mais longa disputa por uma empresa na bolsa francesa: o Club Méditerranée. Foi nesse Setembro que foi registada a (segunda) oferta firme da Fosun sobre a cotada francesa, em disputa com a Global Resorts, tendo a Fidelidade como parceira de investimento, e aliada ainda a Henri Giscard d’Estaing, filho do antigo Presidente francês Valéry Giscard d'Estaing e na altura presidente da organização hoteleira. O empresário brasileiro (e accionista minoritário da Oi) Nelson Tanure iria juntar-se mais tarde. Os chineses da Fosun tinham entrado no Clube Med em 2010, e em Maio de 2013 publicitaram que, juntamente com a Axa Private Equity (mais tarde Ardian), igualmente accionista, tencionavam lançar uma OPA amigável sobre o capital do Club Med. Ofereciam então 17 euros por acção. Acabaram por ver a oferta concluída só em Março de 2015, pagando então 24, 6 euros por cada acção (e avaliando o Club Med em quase mil milhões de euros), ganhando a disputa ao empresário italiano Andrea Bonomi (via Global Resorts, que desistiu no início de 2015), que em quase dois anos, os fizera aumentar o preço em 7, 6 euros (ou 45%) por cada título do gigante hoteleiro francês. No meio da disputa, entrou a Fidelidade. Isso mesmo é descrito nas várias comunicações oficiais sobre as ofertas à AMF – Autorité des Marchés Financiers, regulador francês. A 15 de Janeiro de 2015, o conselho de administração do Club Med explica que a mais recente (e terceira) oferta do consórcio liderado pela Fosun e dominado por Guo Guangchang (fundador, principal accionista e presidente do grupo chinês) apresenta uma estrutura simplificada, na medida em que “a Fidelidade já não age tanto como co-iniciadora [da OPA, por distinção aos documentos apresentados em Setembro e Outubro de 2014] mas investe directamente na Gaillon Invest II, ao lado de pessoas que actuam de forma concertada com ela”. A Gaillon Invest II, segundo a documentação sobre a oferta publicada a 22 de Janeiro de 2015, era “uma sociedade não cotada integralmente detida pela sociedade Holding Gaillon II, ela própria detida a 100% pela Fosun Luxembourg Holdings Sarl, ela própria detida a 100% pela Fosun Industrial Holdings Limited, filial a 100% da Fosun International Limited, finalmente controlada pelo sr. Guo Guangchang”. Já a Fidelidade era descrita como “controlada indirectamente em 80% pela Fosun International Limited, [e] Caixa Seguros Saúde SGPS”. Ambas – Gaillon Invest II e Fidelidade - segundo o mesmo documento, detinham “uma participação minoritária inferior a 20% do capital” da sociedade sobre a qual lançavam a OPA. Um acordo de investimento fora "concluído a 12 de Setembro de 2014 entre Fosun, Fidelidade, as entidades JD, Ardian, Henri Giscard d’Estaing e Michel Wolfovski, Gaillon Invest II e Holding Gaillon II”, e um outro, separado, entre os três gestores (Guangchang/d’Estaing/Wolfovski), as duas Gaillon e a Ardian. Este acordo accionista respondia, no início de 2015, por 22, 99% do capital e 28, 66% dos direitos de voto do Club Med. E, era ainda adiantado nesse Janeiro, a “Docas Investimentos, o conglomerado brasileiro dirigido por Nelson Tanure, activo no turismo e já parceiro operacional do Club Mediterranée, reiterou o seu interesse de tomar uma participação na Holding Gaillon II, podendo ir até 20%”, caso a OPA fosse bem sucedida. No documento complementar à informação da Gaillon Invest II e da Fidelidade sobre a OPA que ofereceu 24, 6 euros por cada título do Club Med e 25, 98 euros por cada obrigação (OCEANE, a sigla francesa para obrigação convertível em acções novas ou existentes, em português VMOC), visando “adquirir a totalidade das acções Club Méditerranée”, não detidas, representativas de 77% do capital – avaliando a visada em 939 milhões de euros - eram esboçados dois cenários para os esforços financeiros dos principais intervenientes. Num primeiro cenário, em que a OPA resultasse na “detenção, pela Gaillon Invest II, de 50%+1 acções Club Mediterranée e 50% das OCEANE”, com um endividamento de 140 milhões pela oferente, a Fidelidade desembolsaria 69 milhões de euros, para 19% do capital. Neste cenário, o esforço global do consórcio liderado pela Fosun para ficar com 59, 6% do Club Med seriam 216 milhões de euros. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na “hipótese de uma detenção, pela Gaillon Invest II de 100% do capital do Club Mediterranée e 100% das OCEANE, e um endividamento da Gaillon Invest II até 280 milhões de euros”, a Fidelidade investiria 135, 7 milhões de euros para deter 19, 5% do capital. Já à Fosun custaria 482, 8 milhões de euros ficar com 69, 5% do capital. Entre os dois cenários, era variável, e condicionador do investimento, o número de acções ordinárias, preferenciais e de obrigações convertíveis. Os resultados da OPA, que garantiu mais de 98, 29% do capital do Club Med ao consórcio Gaillon Invest II, foram comunicados a 10 de Março de 2015, a que se seguiu a retirada da cadeia hoteleira de bolsa. A Fidelidade, pelo relatório e contas da accionista chinesa de 2017, detinha a 31 de Dezembro 19, 53% do Club Med.
REFERÊNCIAS:
Entidades OI
A tempestade per-Trump-feita?
Quem julgasse que a crise da zona euro tinha sido definitivamente ultrapassada decerto foi surpreendido pela abrupta subida das taxas de juro de Itália e de Espanha em poucos dias. (...)

A tempestade per-Trump-feita?
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Quem julgasse que a crise da zona euro tinha sido definitivamente ultrapassada decerto foi surpreendido pela abrupta subida das taxas de juro de Itália e de Espanha em poucos dias.
TEXTO: A ordem internacional está sob enorme pressão, em não pequena medida devido à postura da Administração Trump. As sanções económicas à Coreia do Norte e, mais recentemente, na sequência da denúncia do acordo nuclear com o Irão, a reintrodução das sanções económicas àquele país, num prazo de 90 a 180 dias, ameaçando com severa punição as empresas, mesmo de países aliados, que fizerem negócios com o Irão, colocam sérios problemas a nível político e económico. Com efeito, esta decisão da Administração Trump pressiona países como a França, Reino Unido, Alemanha, China e Rússia, que se mantêm, até ver, no acordo com o Irão não o tendo e não o pretendendo denunciar. Mas, é muito provável que a maior parte das empresas desses países, devido à importância do mercado dos EUA, respeitem a política de sanções económicas dos EUA ao Irão, não realizando quaisquer negócios com este país. A ser assim, a política externa desses países, num assunto tão importante como um acordo nuclear internacional, é na prática ditada pelos EUA, comprometendo a soberania e a sua “palavra”. Note-se que Trump e o presidente chinês Xi Jinping concordaram esta semana em levantar a proibição de vendas de empresas americanas à empresa chinesa de telecomunicações ZTE, imposta no mês passado pelo Departamento do Comércio, tendo a empresa chinesa aceite não só pagar uma multa de 1, 3 mil milhões de dólares, mas também penalizar funcionários e administradores da empresa responsáveis pela violação das sanções e ainda contratar gestores para verificar o cumprimento de sanções americanas. O acordo entre os dois presidentes tem ainda de ser ratificado pelo Congresso dos EUA. Estima-se que a empresa chinesa ZTE utilize 25% a 30% de componentes, bem como software para telemóveis e tablets, fornecido por empresas americanas. A proibição de compra de produtos americanos poria em causa a viabilidade da ZTE. O Departamento do Comércio impôs no mês passado a proibição às exportações americanas porque a ZTE reconheceu que teria enganado os EUA, ao não punir a maior parte dos funcionários responsáveis pela violação das sanções, não cumprindo parte dos termos de um acordo de 2017 em que foi sancionada com uma multa de 1, 2 mil milhões de dólares por violação das sanções à Coreia do Norte e ao Irão, ao fornecer, em 2016, microprocessadores, servidores e equipamento de telecomunicações a esses países. No passado, os EUA também impuseram sanções a empresas europeias por violação de sanções económicas impostas a outros países. Por exemplo, em 2014, o BNP Paribas concordou em pagar 9 mil milhões de dólares por ter violado as sanções económicas ao Sudão, Cuba e Irão. E, já este ano, o BCE forçou o terceiro maior banco da Letónia a encerrar na sequência da proposta de acusação, pelo Departamento do Tesouro dos EUA, ainda em fase de contraditório, de que esse banco teria violado as sanções económicas à Coreia do Norte e promovido lavagem de dinheiro. Vários grandes bancos europeus têm, na sequência de acordos a que chegaram com as autoridades americanas, funcionários que verificam o cumprimento por esses bancos de normas americanas, nomeadamente relacionadas com lavagem de dinheiro e a transacções com empresas e residentes de países sujeitos a sanções económicas impostas pelos EUA como, por exemplo, Irão, Coreia do Norte e Rússia. Esses custos de compliance oneram a actividade económica desses bancos. Um dos casos recentes mais interessantes foi a imposição, pelos EUA, de sanções ao oligarca russo Oleg Deripaska, próximo de Putin, e à Rusal (empresa russa), o segundo maior produtor de alumínio do mundo, controlada por aquele oligarca. A Rusal foi obrigada a interromper o fornecimento de alumínio e o preço do alumínio disparou 15%, afectando numerosas multinacionais como a Boeing, a Airbus e a Rio Tinto, desestabilizando o mercado global de alumínio. As sanções foram retiradas, após Oleg Deripaska ter concordado em reduzir a sua posição accionista na Rusal, mas também provavelmente porque se reconheceu o impacto desproporcional das sanções àquela empresa no mercado do alumínio. Este é um tema importante que tem estado fora da agenda nacional porque, por um lado, não existem multinacionais portuguesas e, sobretudo, porque as trocas comerciais de empresas portuguesas com países sujeitos a sanções americanas e simultaneamente com presença nos EUA são diminutas. Na União Europeia, estes desafios não são, porém, de menosprezar e acrescem a uma longa lista de problemas internos. Ao Brexit e à ameaça de uma guerra comercial com os EUA somam-se as alegadas violações de princípios basilares do Estado de Direito dos governos nacionalistas da Polónia e da Hungria, o processo político independentista da Catalunha, a formação de um governo populista em Itália e a possibilidade de queda do Governo espanhol. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E, claro, o maior dos desafios internos da União Europeia, a afirmação (e a sobrevivência) do euro. Quem julgasse que a crise da zona euro tinha sido definitivamente ultrapassada certamente foi surpreendido pela abrupta subida das taxas de juro de Itália e de Espanha em poucos dias. Há quem se comece a interrogar sobre o que acontecerá ao euro após a saída de Draghi da presidência do BCE em Novembro de 2019. Estas ‘perturbações’ provocadas pela administração Trump ao statu quo internacional, bem como a incerteza causada pelo novo governo italiano, ainda que expectáveis, podem ter consequências inesperadas. O actual consenso cristaliza um ‘equilíbrio’ político-económico que é, de forma crescente, inaceitável em países como os EUA, Inglaterra e Itália, em certa medida países que perderam mais do que ganharam com este processo de globalização. Partidos ou candidatos populistas com mensagens cada vez mais drásticas tendem a subir ao poder, prometendo colocar em causa esse statu quo. Este processo é um desafio à globalização e afigura-se irreversível. O sistema internacional tem de demonstrar ser capaz de se adaptar e reagir ao descontentamento manifestado por países e povos. De preferência a bem.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Portugal continua em alta, mas o futuro é da China
Durante três dias, 330 jurados provaram 9180 vinhos de todo o mundo, na primeira vez em 25 anos que o Concurso Mundial de Bruxelas saiu da Europa. (...)

Portugal continua em alta, mas o futuro é da China
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.08
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Durante três dias, 330 jurados provaram 9180 vinhos de todo o mundo, na primeira vez em 25 anos que o Concurso Mundial de Bruxelas saiu da Europa.
TEXTO: Foi a primeira vez que o Concurso Mundial de Bruxelas (CMB) saiu da Europa em 25 anos de existência. Na semana passada, durante três dias, 330 jurados de todos os continentes (jornalistas, compradores, enólogos e sommeliers) reuniram-se no distrito de Haidian, em Pequim, para provar 9180 vinhos de todo o mundo. Foi um dos maiores concursos de vinhos alguma vez realizados. À semelhança das últimas edições, Portugal voltou a ser um dos países que mais amostras enviaram a Pequim: 1062. E é provável que volte a ser também um dos países mais medalhados. Em 2017, em Valladolid, foi o quarto, com 368 medalhas, logo a seguir à França, Espanha e Itália, que também concorreram com mais vinhos. Os resultados deverão ser anunciados nos próximos dias. As medalhas que se ganham nestes concursos devem ser sempre relativizadas, porque correspondem apenas à opinião de um painel formado por cinco ou seis jurados. Mas podem ser muito importantes para os produtores premiados, porque há mercados que ainda as valorizam bastante, como é o caso da China, por exemplo. Tanto assim é que a empresa que gere o CMB estabeleceu um protocolo com quatro cadeias de supermercados chinesas para promover os vinhos medalhados. No entanto, o mais relevante destes concursos é o contributo que podem ter no reforço da notoriedade e do prestígio de um país. Nesse aspecto, Portugal tem ganho muito com o Concurso Mundial de Bruxelas, que é um dos mais renomados e influentes do sector (é o único que viaja pelo mundo e é também o único que realiza testes de qualidade aos vinhos medalhados). Apesar de ainda haver produtores que insistem em enviar os seus piores vinhos, na esperança de obterem uma medalha que facilite a sua venda, é evidente a crescente boa impressão que a maioria dos jurados estrangeiros tem dos vinhos portugueses. E a opinião de muitos deles, alguns dos quais são masters of wine ou jornalistas influentes, é tida em bastante conta nos respectivos países. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A grande surpresa deste ano foi a China. Depois de ter começado a sua participação neste concurso em 2006 com apenas oito vinhos, inscreveu desta vez cerca de 500 vinhos, quase o dobro das amostras enviadas no ano passado. O histórico recente da China no CMB é um espelho do crescimento do país no negócio mundial vinho, onde já ocupa um papel de destaque. Além de não parar de crescer em área de vinho, tem vindo de forma surpreendente a posicionar os seus vinhos num segmento cada vez mais elevado. Em Valladolid, foi mesmo o país que mais vinhos inscreveu na faixa dos 35 a 50 dólares. No total, na edição do ano passado, a China obteve quatro grandes medalhas de ouro, 33 medalhas de ouro e 41 medalhas de prata. Mais: este ano houve um aumento de quase 60% no número de vinhos orgânicos e biodinâmicos a concurso e um dos países que mais contribuíram para esse aumento também foi a China. Um terço dos vinhos que enviou são orgânicos. Como sublinhava Baudouin Havaux, o presidente do CMB, na cerimónia de abertura, a China já desempenha um papel fundamental no mercado global de vinhos e “está posicionada para desempenhar um papel ainda maior” no futuro. É só uma questão de tempo. No próximo ano, o Concurso Mundial de Bruxelas volta à Europa, desta vez a Aigle, na Suíça. A sua primeira internacionalização, recorde-se, deu-se em Lisboa, em 2006. O concurso voltou a realizar-se em Portugal em 2012, em Guimarães.
REFERÊNCIAS:
Cidades Lisboa Guimarães Bruxelas Pequim
Médicos, activistas e Ai Weiwei pedem à China que deixe sair Liu Xiaobo
Foi um dos impulsionadores do movimento pró-democracia de Tiananmen, ganhou o Nobel da Paz, está detido e sofre de cancro terminal. Pediu para partir, juntamente com a mulher. (...)

Médicos, activistas e Ai Weiwei pedem à China que deixe sair Liu Xiaobo
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Foi um dos impulsionadores do movimento pró-democracia de Tiananmen, ganhou o Nobel da Paz, está detido e sofre de cancro terminal. Pediu para partir, juntamente com a mulher.
TEXTO: Liu Xiaobo, o mais famoso preso político chinês que está a morrer de cancro no fígado, pediu às autoridade de Pequim que o deixem sair do país para receber tratamento paliativo. Os médicos ocidentais que foram autorizados a vê-lo e activistas de direitos humanos fizeram o mesmo apelo – sem êxito, até agora. As autoridades chinesas argumentam que o estado de saúde de Liu não permite a viagem. Porém, o oncologista da Universidade do Texas Joseph M. Herman, e o especialista em cirurgias a tumores pancreáticos Markus Büchler, da Universidade de Heidelberg, disseram num comunicado que a viagem é possível e deve ser feita imediatamente. "Apesar de haver algum nível de risco ao mover-se o doente, os dois médicos acreditam que pode ser transportado em segurança com o devido cuidado e apoio médico", disseram num comunicado conjunto citado pela BBC. "Contudo, isto terá que acontecer o mais depressa possível". Liu Xiaobo foi um dos principais promotores do movimento pró-democracia que culminou na repressão na Praça Tiananmen, em Pequim, em 1989. Em 2009, depois de ter assinado um manifesto pela democracia e o respeito pelos direitos humanos, foi considerado culpado de crimes de subversão e condenado a 11 anos de cadeia. Após sete anos de prisão, foi levado para um hospital devido à progressão do cancro no fígado e está em fase terminal. Pela sua luta "persistente e não violenta", foi-lhe concedido o Prémio Nobel da Paz em 2010 – na cerimónia, foi representado por uma cadeira vazia, depois de Pequim não lhe ter dado autorização para receber o prémio. Após o Nobel, a sua mulher, a poeta Liu Xia, foi posta em prisão domiciliária. Os seus movimentos são agora limitados e Liu quer levá-la consigo para fora da China. Organizações não governamentais de defesa dos direitos humanos condenaram o Governo chinês por não aceitar a recomendação dos médicos ocidentais. Nicholas Bequelin, director para a Ásia da Amnistia Internacional, disse que o comunicado dos médicos "expõe a mentira das autoridades e o seu argumento de que Liu está demasiado doente para ser transferido". Pediu ao Presidente chinês, Xi Jinping, para deixar partir o activista imediatamente. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. "Só uma pessoas tem autoridade para decidir o destino de Liu Xiaob, Xi Jinping", disse Bequelin. "Os dirigentes em Pequim deviam fazer o que já deviam ter feito há muito: calcular friamente quais são os riscos e os benefícios e deixar Liu Xiaobo ir para o estrangeiro para ser tratado, concluindo que deixá-lo partir é do interesse de todos". Este domingo, o artista chinês Ai Weiwei juntou-se aos apelos. "Penso que o Governo chinês deve libertá-lo. Este é um erro histórico", disse ao The Guardian a partir de Berlim. Jared Genser, o advogado dos Estados Unidos que representa Liu, disse que ao não permitir que o dissidente procure, no estrangeiros, tratamentos que lhe prolonguem a vida, Xi será visto como a pessoa que deliberadamente lhe encurtou a vida. "Na minha opinião, se Xi não [o deixar sair], isso será visto pela opinião pública como uma decisão insensível que colocará a China numa posição de fraqueza", disse ao Guardian o advogado que já trabalhou com outros dissidentes, por exemplo a birmanesa Aung San Suu Kyi.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos humanos mulher prisão chinês
O Apartamento é uma casa aberta para partilhar Lisboa
Podemos entrar e dar com uma loja temporária de uma grande editora internacional, uma exposição de fotografia ou um churrasco. O Apartamento convida revistas internacionais a instalar-se nele e a explorar Lisboa. E convida-nos a todos para partilhar essas descobertas. (...)

O Apartamento é uma casa aberta para partilhar Lisboa
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Podemos entrar e dar com uma loja temporária de uma grande editora internacional, uma exposição de fotografia ou um churrasco. O Apartamento convida revistas internacionais a instalar-se nele e a explorar Lisboa. E convida-nos a todos para partilhar essas descobertas.
TEXTO: O prédio é o primeiro do lado esquerdo de quem começa a descer a Av. Duque de Loulé, o nº 1. Tocamos na campainha do 5º andar dt. e ouvimos o som da porta a abrir. Subimos no elevador de grade de metal e somos recebidos por um Armando Ribeiro sorridente. O Apartamento é claro e luminoso. E está aberto a quem o quiser visitar. O projecto já vem de trás, mas só há poucos meses é que Armando, que entretanto se juntou a Paula Cosme Pinto e Inês Matos Andrade, ambas vindas do jornalismo, encontrou o espaço ideal para uma ideia em que andava a pensar há já algum tempo. “Tenho uma paixão por revistas há muitos anos, sempre as comprei muito, umas 40, 50, 60 por mês”, conta. “E a minha ideia era ter um apartamento e convidar as revistas de que gosto a vir cá, mostrar-lhes Lisboa, pô-las em contacto com as pessoas de cá. ”Agora, dizem os três parecendo ainda nem acreditar bem, “está a acontecer”. A partir do dia 23 e até 28 de Junho, O Apartamento recebe, vindos de Barcelona, Mari Luz Vidal, Andrew Trotter e Nobu Kawagoe, da revista Openhouse, que se ocupa precisamente de casas abertas. Os membros da revista são convidados a instalar-se no espaço, que tem seis assoalhadas, com quarto de dormir, cozinha, sala, e tudo o que é necessário numa casa. E, ao mesmo tempo, são desafiados a trazer a sua própria programação – que neste caso será uma exposição fotográfica (Mariona y yo, um trabalho de Mari Luz Vidal, directora criativa da Openhouse, sobre a perda da relação com a sua maior amiga), a marca espanhola de produtos de beleza naturais Alex Carro e um jantar preparado pelo chef japonês Nobu Kawagoe, que acontece no dia 24 marcando a inauguração oficial do Apartamento. A única experiência anterior do projecto foi com a revista Cereal, que esteve em Lisboa em 2014 mas num espaço ainda provisório, onde organizou uma loja pop-up. Um dos resultados dessa visita foi um longo artigo sobre Lisboa na Cereal e um guia da cidade que deverá sair em Novembro. E esse é também um dos objectivos desta troca de experiências – dar a conhecer Lisboa. “Eles vêm, nós podemos levá-los a um arraial, a jantar fora, conhecem uma pessoa ligada ao turismo, um artista, e se calhar nasce um projecto”, diz Paula. “É o que acontece quando pessoas com este tipo de interesses se cruzam, é uma coisa natural, nós só providenciamos um espaço onde isso pode acontecer. ”No dia em que visitamos O Apartamento, ainda está a decorrer a loja temporária da editora berlinense Gestalten. Os (poucos) livros que ainda não foram vendidos estão espalhados por uma mesa e pelas estantes da sala. Desde que a loja “abriu”, a 26 de Maio, todos os dias têm aparecido pessoas para ver e comprar os livros, conta Armando. Alguns porque já conheciam o projecto desde a vinda da Cereal, outros vieram pela primeira vez porque ouviram falar. A agenda do Apartamento está completamente cheia para os próximos meses. “Até ao final do ano temos o programa já preparado”, conta Armando. Para já, depois da Openhouse, vai haver um “churrasco à americana” com o chef Nuno Bergonse, do Duplex, marcado para 25 de Julho. “As pessoas inscrevem-se, pagam e vêm, como se fosse a casa de um amigo”. Na lista de iniciativas, ainda sem data confirmada, está ainda um “workshop de snacks macrobióticos para levar para a praia” com Marta Varatojo. Julho será também mês de receber outro projecto, os Freunde von Freunden, de Berlim, que farão em Lisboa a apresentação oficial de dois livros sobre casas de criativos no mundo, organizarão um jantar, e trarão com eles vários dos objectos que vendem habitualmente, “de óculos de sol a skates, passando por plantas com vasos específicos, fotografias de artistas, t-shirts, malas. ” E em Setembro, as portas do Apartamento abrem-se para os livros da editora Rizzoli, de Nova Iorque. “Não queremos que este espaço seja apenas de uma coisa, um projecto de design ou de arte”, explicam os três. “Queremos que seja de quatro, cinco, seis coisas. ” O que os surpreendeu foi a reacção das revistas e editoras que contactaram. “Todos têm adorado a ideia e aceitam imediatamente”. Para o projecto funcionar, contam já com vários parceiros oficiais “que limitam muito os custos”, desde a marca de mobiliário Magis, que ajudou a decorar o apartamento, até à TAP, que apoia as viagens das revistas internacionais. E para a viabilidade financeira esperam também vir a alugar o espaço para marcas que queiram fazer lançamentos, sessões fotográficas ou simplesmente a quem queira organizar um jantar. Conversamos com Armando, Paula e Inês enquanto os três vão preparando o almoço, porque O Apartamento é também o espaço onde trabalham naquela que é a actividade profissional de todos, a agência de comunicação e consultoria Plataform-a. Na cozinha, decorada com um mapa do mundo, cada um ocupa-se de uma tarefa diferente e em pouco tempo a mesa está posta e a comida está servida na sala de refeições ao lado. É aí que continuamos a falar sobre os projectos que estão para vir. “O objectivo é a casa vir a servir também para residências artísticas”, diz Inês. Às ideias iniciais de Armando juntaram-se entretanto as de Paula e Inês. E como todos têm personalidades e interesses diferentes, a programação vai reflectir isso mesmo. “Eu e o Armando temos uma onda mais holística”, reconhece Paula. “E eu gostava muito de trazer cá o [monge budista, escritor e fotógrafo] Matthieu Ricard. É uma daquelas pessoas que à partida parece impossível. ”“Mas”, interrompe-a Armando, “tudo isto à partida parecia impossível. ” Porque é que está a resultar? Porque há uma espécie de linguagem comum que une muitos destes projectos. Apesar de terem características diferentes, revistas como a Openhouse, a Cereal ou a Kinfolk, e um projecto como O Apartamento falam a mesma língua. “O que une estas revistas é serem sobre cidades, sim, mas sobretudo sobre pessoas, pessoas nas cidades”, explica Armando. “E o nosso também é um projecto de pessoas”. E há mercado para este tipo de revistas? “Sim, porque são visões completamente diferentes, não estão vendidas à publicidade, não dependem disso. Têm uma estrutura mínima, geralmente de duas ou três pessoas, e trabalham muito com parcerias. Muitas vezes fazem trabalhos de fotografia ou styling que ajudam a pagar estes projectos, que são pessoais”. O facto de serem em inglês garante-lhes uma audiência global. “A Kinfolk já vai numa tiragem de 100 mil, se contarmos que têm uma edição em russo, uma em coreano e uma em chinês. ” Há leitores em Portugal, garante Armando, “e a maioria são pessoas de vinte e poucos anos”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ao mesmo tempo que têm identidades muito próprias – “nos últimos dois, três anos, saíram muitas ligadas à natureza, uma só de plantas, outra sobre pessoas que se juntam à volta de uma mesa” – estas revistas têm em comum essa visão do mundo que parte da ideia de que “há cada vez mais pessoas que estão a mudar de vida e a fazer aquilo que querem”. Armando lembra, por exemplo, que essa é “a aposta da Monocle desde o primeiro dia: mostrar pessoas que conseguiram mudar de vida”. Estes projectos, apesar de pequenos, “partem de uma vontade de partilhar uma visão do mundo, um ideal, coisas bonitas, especiais”. No fundo, conclui Armando, “eles fazem aquilo que querem, que é o maior luxo, e nós aqui também podemos fazer o que quisermos”. As portas estão abertas. É só tocar à campainha, apanhar o elevador e entrar. O Apartamento (também) é nosso.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave espécie chinês japonês