Porto: “Turismo é bom, não na nossa casa”
Despejos inesperados, contratos enganadores, assédio, terrorismo psicológico. Lei aprovada no Parlamento deixa alguns despejos em suspenso. Mas a luta está longe do fim. Moradores reúnem-se esta sexta-feira, 25 de Maio, no Porto (...)

Porto: “Turismo é bom, não na nossa casa”
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.7
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Despejos inesperados, contratos enganadores, assédio, terrorismo psicológico. Lei aprovada no Parlamento deixa alguns despejos em suspenso. Mas a luta está longe do fim. Moradores reúnem-se esta sexta-feira, 25 de Maio, no Porto
TEXTO: As lágrimas já correm pelo rosto de Teresa Carmo quando, ao fim de poucos minutos de conversa, se levanta da cadeira da sala para mostrar o que não consegue explicar em palavras. — É por isto que nos querem fora daqui. Afasta as cortinas da janela do quarto e apresenta o Porto versão cartão-postal: telhados cor de tijolo, o Douro em frente, a ponte da Arrábida à direita. Cenário que vale milhões. Foi viver para ali há quase 70 anos. A avó paterna enviuvou, tinha medo de ficar sozinha. E ela, três anos cumpridos, foi fazer-lhe companhia. Cresceu a ver o rio, a brincar na rua, a fazer dos vizinhos segunda família. Casou-se, teve uma filha, um neto. Tinha uma vida simples e feliz. Mas um dia o marido adoeceu com cancro de pulmão. Não resistiu. Tinham passado poucos meses desse Natal onde viu partir o companheiro de uma vida quando o senhorio lhe bateu à porta. Pôs-lhe um papel à frente, pediu-lhe para assinar, jurou ser para o bem dela. Sem saber, estava a rubricar um novo contrato com fim anunciado. “Até o Rui Moreira me disse que era uma fraude”, conta a perder a voz com a emoção. Tem de sair no próximo ano. “Ando doente com isto. Pensava que ia viver aqui o resto da minha vida e agora não posso. Ir para um bairro é a minha morte. ”A dois minutos dali, na fachada do número 17 da Rua das Taipas, uma frase desenhada numa enorme faixa resume o aperto que vai no coração de Ermelinda Duarte. “Nasci na Vitória. Posso morrer na Vitória?”Uma carta registada veio dizer-lhe que não há coisa de dois meses. O aviso tinha sido dado “de boca” tempos antes: o senhorio cruzou-se com o marido de Ermelinda na rua e deu-lhe a notícia. Tinha de sair em Agosto de 2019. Eles caíram numa ansiedade diária, desejaram tratar-se de um pesadelo. Não era. “Víamos as pessoas a sair e estávamos sempre a dizer-lhes para aguentarem, para lutarem, para não desistirem. Mas foram saindo. Agora tocou-nos a nós. É muito triste. ”“Só nos levam daqui de rastos”A resistência está prometida. O marido, doente oncológico, foi há tempos à Câmara Municipal do Porto e conversou uns minutos com o presidente. Garantiu-lhe que não arredavam pé, podia até vir a polícia. “Só nos levam daqui de rastos. ”Parece haver quem esteja disposto a isso. A qualquer coisa. Na semana passada, o senhorio de Teresa Carmo apanhou-a na rua e fez-lhe um ultimato: “Dava-me 2500 euros se saísse já. ” Antes, tinha-lhe batido à porta para sublinhar a data do fim a aproximar-se. Foi a 27 de Março, às 20 horas e 15 minutos. Quem o diz é Albina Rosa Santos, a vizinha do lado a quem o mesmo proprietário repetiu a frase ouvida por Teresa. “Foi assim: ‘Só lhe venho dar uma notícia — a sua tristeza é a minha alegria. Vai ter de ir embora’. ” Albina, 65 anos, uma década de arrendamento cumprido naquela morada e uma vida inteira no centro histórico da cidade, pôs-se aos gritos, a chorar. Tal como o casal de idade da casa do lado, também surpreendido com a ordem de despejo. O prédio está já à venda em sites imobiliários. Um milhão e 295 mil euros. São oito apartamentos e só três contratos de arrendamento fixos. Os restantes já funcionam como alojamento local. Albina divide a pequena casa com vista de rio com a filha. “Isilda Linda Santos, 47 anos a partir da próxima semana”, apresenta-se. Tem uma enorme garrafa de oxigénio consigo. “Só sobrevivo três horas sem isto”, conta. Isilda vai falando e perdendo o fôlego. “A minha filha é muito nervosa, já lhe disse para não me falar mais daquele homem”, reclama a mãe. Não importa se fala ou não. Com palavras de revolta ou em silêncio, vivem desde Março numa angústia sem fim. Ainda na semana passada foram parar as duas ao hospital: Albina estava com os valores da Diabetes disparados, Isilda com problemas respiratórios. “O médico diz que ou faço o transplante de pulmão ou morro. Mas o senhorio está lixado comigo: se esta lei for aprovada não me pode mandar embora, tenho 76% de incapacidade. ”Por proposta do PS, a esquerda aprovou esta quarta-feira, 23 de Maio, uma lei que suspende todas as acções de despejo de inquilinos com mais de 65 anos e que residam na mesma casa há mais de 15 ou quem tenha um grau de incapacidade superior a 60%. Isilda e Albina ganharam nova esperança. Teresa poderia fazê-lo, não fosse o contrato que a enganou. Colectivos activistas atentosA guerra está longe de um fim vitorioso. Os proprietários já avisaram que vão pedir uma fiscalização preventiva da lei e os inquilinos sabem que não é ainda hora de baixar os braços. Na Vitória, as faixas criadas por moradores com a ajuda de colectivos activistas como O Porto Não se Vende, Rosa Imunda e Terra Viva dão nas vistas desde o dia em que o rally encheu a cidade. Um deles, a jeito para câmaras de televisão a transmitir o evento, desapareceu rapidamente (“A corrida mais louca do Porto é a imobiliária”, dizia), os outros vão resistindo (“O meu nome é Era, já era. O meu nome é Maria, fui para a periferia”, lê-se na fachada de um edifício devoluto; “Casa vazia, vizinhança desfeita”, aparece noutro). Na Associação Recreativa da Vitória, os moradores da zona reúnem-se pela segunda vez esta sexta-feira, 25 de Maio (21h, Rua da Vitória) para debater formas de resistência aos despejos. Paula Gonçalves vai lá estar. Por estes dias, o prédio onde habita, na Rua dos Caldeireiros, também vestiu uma faixa de protesto ao atropelo feito a vários moradores da Vitória e de todo o centro histórico. “Turismo é bom, não na nossa casa”, lê-se no número 194, onde persiste apenas uma família. Tudo o resto são turistas, um entra e sai diário. “Estão sempre a tocar à nossa campainha, é a única, não atinam com a chave. Nos States não devem ter fechaduras”, comenta a sorrir como se procurasse uma nesga de optimismo no meio da dúvida em que se transformou a vida dela. Divide o T1 com os pais e três filhos: duas meninas, de 11 e dois anos, e um menino de quatro. Bernardo Gonçalves, o pai, vive ali há 24 anos. Em Fevereiro receberam uma carta de rescisão de contrato. Vão espalhando um monte de papéis em cima da cama: entre os vários contratos assinados por Bernardo Gonçalves, um trazia uma rasteira, numa altura em que o senhorio mudou. “A gente é enganado sem saber”, lamenta. Bernardo tem 54 anos, é empregado de mesa num restaurante a poucos minutos dali. O médico proibiu-o de trabalhar depois de pôr uma válvula no coração, mas ele recusou-se. Assinou um termo de responsabilidade e foi. A mulher, 55 anos, é copeira num restaurante não muito afastado de casa também. Paula, 29 anos, vai fazendo umas limpezas quando os serviços surgem. Não se queixam de pouca sorte, apesar da vida sem facilidades, do rendimento baixo, do T1 para três adultos e três crianças. Só queriam continuar a viver onde têm chão. Até porque não encontram alternativas. O pedido de habitação social foi recusado. A Santa Casa da Misericórdia só lhes mostrou casas a precisar de obras. Deviam ter saído a 30 de Abril, mas não têm para onde ir. Os vizinhos vão avisando quando vêem um anúncio. Paula tem percorrido as páginas dos classificados e a internet. “O último que vimos era um T3 por 1200 euros. Os nossos salários juntos não dão isso. . . ”. Quem os “tramou”, diz Bernardo Gonçalves, foi “a lei da Cristas”. “O senhorio está no seu direito, não digo que não, mas alguém tem de nos deitar a mão”, apela Paula: “A gente só quer pagar a casa e viver ao mesmo tempo. É pedir muito?”Técnicos sinalizam cada vez mais casosSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória o sinal vermelho está ligado “há dois anos”, aponta o presidente António Fonseca. O “terrorismo psicológico” é crescente, denuncia, e a avaliação não é mera intuição. Aos gabinetes sociais da junta vão chegando cada vez mais pedidos de ajuda: 452 atendimentos em 2016, 680 em 2017, 191 só no primeiro trimestre deste ano. Os técnicos têm conhecimento de 203 situações de inquilinos intimados a abandonar as suas casas porque o senhorio não quer renovar o contrato. Registaram uma tentativa de suicídio, gente que soube que a sua casa estava à venda ao sair de casa e ver o cartaz de uma imobiliária, 40 pessoas despejadas da Pensão Esperança, a preparar uma metamorfose para se transformar em hostel. É uma teia bem instalada. Na Tabacaria das Taipas, a “mocidade da rua” vai entrando. Pede ajuda para abrir com tesoura embalagens plásticas de lambarices. Ermelinda Duarte garante que o negócio se aguenta graças aos moradores. Os turistas compram umas águas, uns sumos. Pouco mais. Mas estão por toda a parte, como se percebe pelas ementas de alguns restaurantes que parecem ter mudado de geografia, como sugerem as setas pintadas numa parede ali em frente, apontadas em todos os pontos cardeais e acompanhadas por duas palavras: “Tourists only”. “Nessa casa morava uma senhora que foi expulsa daqui. Passado pouco tempo deu-lhe um AVC e morreu”, lamenta Ermelinda. Do primeiro andar de um prédio ao lado da tabacaria, uma senhora de cachecol azul e branco acena à vizinha. “O senhorio também já lhe veio perguntar se não queria passar para o rés-do-chão. . . ”, murmura. É uma espécie de santuário da rua aquela varanda: cachecóis, peluches, bandeira a nomear o campeão nacional do ano. Sintoniza-se a Rádio Festival, decibéis que se ouvem a vários metros de distância. Dois turistas param sorridentes a olhar, levantam o telemóvel para captar o cenário. E quando a música e os cachecóis desaparecerem, vão os turistas querer ficar?
REFERÊNCIAS:
Partidos PS
O mundo cabe em Portugal
O maior evento de vinhos portugueses realizado fora da “terrinha” cresceu ainda mais: este ano são 550 rótulos à prova no Rio e 600 em São Paulo; sem falar nas aulas sobre as regiões lusas, nas provas e no tête-à-tête com os produtores, enólogos e críticos da área. (...)

O mundo cabe em Portugal
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: O maior evento de vinhos portugueses realizado fora da “terrinha” cresceu ainda mais: este ano são 550 rótulos à prova no Rio e 600 em São Paulo; sem falar nas aulas sobre as regiões lusas, nas provas e no tête-à-tête com os produtores, enólogos e críticos da área.
TEXTO: Todos com as taças a postos para começar uma experiência no maior evento sobre vinhos portugueses fora de Portugal? Na edição 2018 do Vinhos de Portugal os números são record. No Rio, acontece entre os dias 1 a 3 de Junho, no CasaShopping, e conta com 79 produtores e quase 550 rótulos à prova. Já em São Paulo será de 8 a 10 de Junho, no JK Iguatemi, com a participação de 84 produtores e cerca de 600 rótulos para o público experimentar. Sem dúvida, é possível dar um bom giro por todas as regiões produtoras de Portugal através das suas uvas e sabores. E tem muita novidade. São 20 produtores estreantes e, alguns deles, estarão aqui para contar de perto a sua história. O jovem casal Jorge Serôdio Borges e Sandra Tavares da Silva, da Wine & Soul, no Douro, é um deles. Ele, que já foi premiado como “Enólogo do Ano 2016” pela publicação portuguesa “Vinhos Grandes Escolhas”, ganhou ainda mais reconhecimento com o seu tinto Pintas 2011, que recebeu a pontuação mais alta já dada pela “Wine Spectator” a um tinto português (foram 98 pontos). Imperdível, não é mesmo? E tem mais. Jorge Moreira, da Quinta de la Rosa, localizada na vila de Pinhão, à margem direita do rio Douro, apresentará seus Porto e também seus vinhos de mesa que são sucessos pelo mundo. É também a primeira vez que o famoso enólogo Domingos Soares Franco, da José Maria da Fonseca, virá ao evento. Ele, que é o criador do Periquita, um dos vinhos mais vendidos no Brasil, estará apenas na edição de São Paulo. Um dos destaques do Vinhos de Portugal é exactamente o tête-à-tête com os produtores. Afinal, não é todo dia que se pode tirar dúvidas, saber curiosidades da vinícola e degustar junto de quem faz. No espaço, ainda acontecem os encontros “Tomar um copo”, quando, em formato descontraído e com inscrição no local meia hora antes, especialistas fazem uma degustação e explicam sobre os vinhos e as suas regiões. E há ainda as provas e os cursos comandados por conhecedores. Dos encontros mais básicos até aqueles para entendedores, tem o crítico e jornalista Rui Falcão contando sobre os grandes vinhos do Alentejo; provas especiais com o Master of Wine Dirceu Vianna Júnior, que fará delas em cada cidade, incluindo a concorrida “Grandes vinhos de anos de Copa do Mundo”, quando serão provados vinhos incríveis (pense no Cortes de Cima 1998 e no Real Companhia Velha Vinho do Porto 1974 ); o crítico Jorge Lucki, do “Valor Económico”, que este ano também participará da edição carioca, apresentando grandes e, vale destacar, raros vinhos de 2007; o jornalista Manuel Carvalho ensinando sobre a produção do Dão e muito mais. Exclusivamente em São Paulo, Luís Lopes dá os cursos “Academia de vinhos de Portugal” e “Uvas do Portugal clássico”, e a cantora e compositora Adriana Calcanhoto participa do bate-papo “Arqueologia do vinho” ao lado do professor Pedro Carvalho e do já mencionado Manuel Carvalho — um encontro que faz parte da programação do “Tomar um copo”. Para circular pelo mercado, assim como participar das provas e cursos, é necessário comprar ingresso na bilheteira do evento ou pelo site vinhosdeportugal2018. com. br. O bilhete para o mercado dá a oportunidade de passear durante duas horas por ali. Já as provas e cursos duram cerca de uma hora e contam com degustações. Para estar sempre por dentro de tudo do evento, baixe a aplicação Wines of Portugal disponibilizado pela ViniPortugal. Lá, estarão disponíveis a programação completa do evento, a lista dos produtores e os vinhos que poderão ser degustados. Quem estiver no Vinhos de Portugal ainda terá a chance de comprar óptimos rótulos portugueses na loja oficial do evento que tem apoio do grupo Pão de Açúcar. São vinhos mais raros, que não são encontrados com facilidade no Brasil. Perto dali, um outro espaço ainda oferecerá degustações de vinhos do Club des Sommeliers. Em São Paulo, a marca de copos Riedel terá um espaço para demonstração e venda de seus copos, considerados entre os mais sofisticados do mundo. Além dos vinhos, haverá comidinhas para harmonizar. No Rio, a Casa das Natas preparará pastel de nata e de bacalhau e o food truck do Espírito de Porco Porchetteria terá quitutes saborosos. No stand do Produtos D. O. C. , queijos variados garimpados por André Deolindo Brasil afora, além de tipos de mel e pães de fermentação natural. Os restaurantes do CasaShopping estarão com rolha zero para a primeira garrafa, então já dá para experimentar ali mesmo o que comprar no mercadoSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na capital paulista, também haverá loja de vinhos e degustação do Club des Sommeliers, além de um Espaço Senac São Paulo com vendas de livros de gastronomia. A programação inclui sessões de autógrafos com Dirceu Vianna Júnior e Jorge Lucki. E o chef Vitor Sobral estará presente na programação dos “Tomar um copo”, propondo as suas harmonizações entre comida e vinhos. No Rio, o Vinhos de Portugal é uma realização do Globo, PÚBLICO, Época e Valor Económico, com parceria do Vinhos de Portugal, patrocínio do CasaShopping, do Pão de Açúcar e da Construtora Canopus, apoio da Agência Regional de Promoção Turística Centro de Portugal, do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, das Comissões de Vinhos do Alentejo e do Dão, da AGO Mercedes, da Volvo AB Gotland e da TAP. Em São Paulo, o Vinhos de Portugal é uma realização do Globo, PÚBLICO, Época e Valor Económico, com parceria do Vinhos de Portugal, patrocínio do Pão de Açúcar, apoio da Agência Regional de Promoção turística Centro de Portugal, do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, das Comissões de Vinhos do Alentejo e do Dão, da Universidade de Coimbra e da TAP, apoio educacional do SENAC SP e apoio institucional do Experimenta Portugal.
REFERÊNCIAS:
A expressividade de uma casta com nome de navegante
O Tejo tem vaidade na casta branca que domina as suas vinhas. E com razão. A Fernão Pires tem nome de descobridor, mas é uma variedade que tanto dá vinhos aromáticos e modernos quando jovem como reúne trunfos na componente ácida ou no volume para criar vinhos com uma longevidade surpreendente. (...)

A expressividade de uma casta com nome de navegante
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Tejo tem vaidade na casta branca que domina as suas vinhas. E com razão. A Fernão Pires tem nome de descobridor, mas é uma variedade que tanto dá vinhos aromáticos e modernos quando jovem como reúne trunfos na componente ácida ou no volume para criar vinhos com uma longevidade surpreendente.
TEXTO: A Fernão Pires é uma casta branca, o que à primeira vista poderia configurar uma identidade de género. Não será o caso, até porque há muitas castas com o género masculino a integrar o património dos vinhos brancos, a começar na Rabigato e a acabar no Alvarinho. Também não haverá problema de maior com o facto de a Fernão Pires se chamar Maria Gomes na Bairrada. Apesar do seu nome nos lembrar mais uma figura dos Descobrimentos do que uma variedade de uva, a Fernão Pires é a casta branca mais plantada em Portugal (13. 700 hectares) e é sem dúvida a rainha dos brancos do Tejo, onde representa 30% do encepamento da região. E é uma casta tão relevante e acarinhada que os produtores do Tejo a designam como “a mais expressiva” da região e a querem mostrar como um activo, como um símbolo de distinção capaz de fazer face aos trunfos que o Alentejo exibe com a Antão Vaz, o Dão com a Encruzado, os Verdes com a Alvarinho ou o Douro com a Viosinho (num papel aqui com menor protagonismo). Terão argumentos os produtores do Tejo? Uma visita à região seguida de provas com vinhos extremes de Fernão Pires da última vindima e com vinhos de colheitas antigas parece justificar a ousadia. Os vinhos base, principalmente os que provêm da região mais fértil do Campo, na área aluvionar mais próxima do rio, são simples, directos e profundamente marcados pela expressividade da fruta. Ou, por outras palavras, são vinhos que se ajustam a um segmento muito importante do mercado nacional e internacional, que nos segmentos mais baixos, prefere a exuberância aromática, as notas de fruta tropical, uma acidez contida e um volume de boca marcante. Mas, no Tejo a Fernão Pires pode ir muito mais longe. Na zona do Bairro, na margem direita, até às faldas das serras dos Candeeiros, de Montejunto ou dos maciços de Porto de Mós ou na zona da Charneca, na margem esquerda, mais quente e com solos arenosos e mais pobres, a casta pode gerar com mais facilidade vinhos com outro requinte e complexidade. Seguindo o perfil identitário da generalidade das regiões portuguesas de vinho, o Tejo é um puzzle composto por estes três terroir e em cada um há vocações prioritárias para a produção de tinto (caso do Bairro) ou de Branco (caso do Campo, onde a Fernão Pires pode atingir produções elevadíssimas, até 30 toneladas de uvas por hectare). Dos seus 12. 500 hectares de vinhedo, saem em média todos os anos 60 milhões de litros de vinho, metade branco e metade tinto, embora uma grande parte continue a não ser certificada, acabando por ser vendida a granel. A região exporta um terço do que produz e não tem razões de queixa dos seus negócios com o exterior – a procura dos seus seis principais mercados tem crescido à razão de dois dígitos nos últimos anos. Nesta actividade, a produção de brancos é crucial e a Fernão Pires desempenha nesta tendência um papel de relevo. Não admira por isso que seja a casta que continua a ser mais plantada na região, ocupando 25% do total das novas plantações. Região antiga na produção de vinhos, o Tejo dos vinhos brancos é muito mais do que a Fernão Pires. Há por lá castas estrangeiras como a Sauvignon Blanc ou a Chardonnay, castas migrantes de outras regiões do país como a Alvarinho ou variedades em recuo presentes nas vinhas mais velhas – caso da Tamarez, a Trincadeira das Pratas ou a Vital, que produtores mais irreverentes continuam a cultivar com sucesso. Muitas destas castas cruzam-se em lotes partilhados com a Fernão Pires. De resto, a versatilidade da Fernão Pires é um dos seus mais poderosos trunfos. Tanto permite compor lotes, como produzir varietais ou ser sujeita a colheitas tardias como a que a Quinta da Alorna produz com sucesso – a edição de 2014 foi um dos vinhos premiados no mais recente concurso da ViniPortugal. Quando jovens, os vinhos Fernão Pires exibem uma exuberância aromática que compara com as castas com mais pergaminhos neste atributo – como a moscatel. A prova dos vinhos de 2017 provenientes do Campo revela aromas tropicais muito intensos, baixa acidez e volume de álcool abaixo dos 13%. Neste particular, o Quinta da Lagoalva destacou-se. Proveniente de uma vinha com 40 anos, apresenta uma acidez acima da média, aroma fino, com notas cítricas, sinais de oxidação que oferecem um toque distintivo e um volume e secura no final de prova muito interessante. É um belo branco para sinalizar o potencial da Fernão Pires. Impôs-se facilmente aos vinhos provenientes do Bairro. O caso das provas com amostras da Charneca mostra um perfil da casta muito mais elegante e sofisticado. Aqui, alguns vinhos sobem acima dos 13% do volume de álcool. O Quinta do Casal Branco mostra secura e mineralidade no final. E vale a pena ainda aguardar pelo Fernão Pires da Companhia das Lezírias que, apesar de nesta fase estar ainda muito marcado pela madeira, tem um enorme potencial de evolução. Curiosos, e muito atraentes, são também os Colheitas Tardias desta casta, em especial o Casal Branco da Falcoaria e o Quinta da Alorna. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Terão os Fernão Pires do Tejo pergaminhos suficientes para enfrentar a magnífica concorrência das castas brancas mais emblemáticas (Alvarinho, em destaque) ou emergentes (a Encruzado, que já é uma certeza absoluta pelo nível de originalidade e riqueza que emprestou aos vinhos do Dão)? Uma das suas vantagens, a versatilidade e capacidade de produzir brancos com estilos tão diversificados, é também um dos seus problemas. É difícil associar a casta a um estilo definido, facilmente identificável nos seus descritores fundamentais (volume, acidez ou personalidade aromática). Mas não há dúvidas que, desta região, podem sair brancos de grande categoria e, se forem bem trabalhados, com um potencial de guarda notável. Razão mais do que suficiente para que o Tejo aposte na sua “casta mais expressiva”. Quatro vinhos brancos de Fernão Pires, com idades compreendidas entre os 15 e os 35 anos mostram que esta casta é capaz de gerar brancos de classe que se refinam com a passagem do tempo. Herança de uma era na qual a enologia era muito mais primária do que a actual, com volumes de álcool a rondar os 12%, estes vinhos são a prova acabada de que os brancos do Tejo podem ser muito mais do que vinhos fáceis, com doçura e fruta óbvios, destinados a ser consumidos quando jovens. Caves Dom Teodósio Quinta de São João Baptista 2003 Enoport Notas de mel no aroma, vivacidade na boca, intensidade e complexidade notáveis. Um vinho branco surpreendente, gordo e vibrante, que se bebe com muito prazer à mesa ou em momentos conviviais. Parece ter atingido o seu auge. Terra Larga 5ª de Mahler, 2000 Maria de Guadalupe A. M. C. Vieira da Cruz Aroma muito atraente e original, com notas de mel, fumado, cevada, sugestões de querosene. Muito original e rico, deixando notas apetroladas no final da boca que convidam a mastigá-lo. Um grande vinho que a cada passo se encontra em garrafeiras a preços muito convidativos. Casal Branco Falcoaria 1994 Falcoaria Um branco glorioso que está ainda cheio de garra e potencial de conservação. O que o destaca é fundamentalmente a sua delicadeza e finesse. Um branco longo, seco no final de boca, com garra de acidez e frescura. Magnífico. Caves Dom Teodósio Garrafeira Particular 1983 Enoport A vitalidade, o nervo e a personalidade deste vinho da primeira metade dos anos 80 do século passado é notável. A sua acidez actual sugere que deveria ser imbebível quando novo. O tempo moldou-o, desfez a sua dimensão vegetal e transformou-o num branco cheio de personalidade e sofisticação. Está numa grande forma e dá um enorme prazer beber.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave campo rainha género
Despenalização da eutanásia: um testemunho de católicos
Numa sociedade pluralista como felizmente é a nossa, deve ser a tolerância a imperar, cabendo à lei regular as condições de afirmação dessa tolerância. (...)

Despenalização da eutanásia: um testemunho de católicos
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Numa sociedade pluralista como felizmente é a nossa, deve ser a tolerância a imperar, cabendo à lei regular as condições de afirmação dessa tolerância.
TEXTO: A despenalização da morte voluntária e assistida não opõe crentes a não crentes. Numa sociedade pluralista como felizmente é a nossa, os homens e as mulheres de fé não constituem um partido ou uma força de pressão. Desde logo, porque, felizmente, o pluralismo de opiniões existe também no seu seio. E numa sociedade pluralista como felizmente é a nossa, deve ser a tolerância a imperar, cabendo à lei regular as condições de afirmação dessa tolerância. É nesse espírito que defendemos a despenalização da morte voluntária e assistida. Somos católicos. E tomamos posição no debate sobre a despenalização da morte voluntária e assistida a partir dessa nossa condição fundamental. Assumimos que a identidade cristã não está antes de mais em códigos morais fechados mas em práticas e estilos de vida. Mais do que algo que se pensa, se sente ou se diz, o cristianismo é algo que se faz. E a vida de Jesus é o testemunho que nesse fazer prevalece o acolhimento sobre o anátema, a responsabilidade da liberdade sobre a tutela religiosa ou política. O Deus bíblico, que se fez nosso companheiro desde os começos e desde os começos nos ama como seres de liberdade e autonomia, terá de ser amorosamente convocado como proximidade afetuosa em total respeito pela nossa autonomia e consciência, na hora em que chegar o nosso fim de vida. É neste espírito que entendemos que, para o/a crente, apoiar ou defender a despenalização da eutanásia não significa a recusa do dom da vida. Acreditar no dom da vida é também acreditar que essa é uma dádiva de Deus a todos e todas (e não apenas a crentes) enquanto pessoas dotadas de consciência moral, de inteligência e de liberdade. A radicalidade destas três condições da pessoa humana obriga-nos a reconhecer a pluralidade de posições que diferentes pessoas podem ter perante os desafios e as dificuldades que, hoje, nos colocam o fim da vida e a morte. Porque, como escreveu o teólogo Torres Queiruga sobre o dom divino da vida, “justamente porque Deus me doou a vida a mim, é para que eu a administre. Não sou Deus mas também não sou escravo: vivo numa relação filial mas sob minha responsabilidade”. [1]Defender a despenalização da eutanásia, tal como ela está a ser proposta atualmente no parlamento português, significa reconhecer a cada um/a, como ser moral, inteligente e livre, o direito de, em consciência e em situações de reconhecida impossibilidade de cura e sofrimento insustentável físico e psíquico, decidir sobre o fim da sua vida. Não se trata de reconhecer um direito a matar. Trata-se de reconhecer um direito a morrer de acordo com as condições que só cada um/a pode avaliar e que só cada um/a pode assumir, de forma reiterada e acompanhada, que constituem o limite da dignidade da sua própria vida. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Nada disto contraria a defesa imperativa de um Serviço Nacional de Saúde capaz de responder às necessidades de todas e de todos, nomeadamente os que se encontram em situações de doença aguda, prolongada e de sofrimento. Nada disto contraria a defesa da urgência da cobertura nacional dos cuidados paliativos no Serviço Nacional de Saúde. Nada disto contraria a necessidade urgente de reconhecer o papel dos cuidadores informais e de a sociedade e o Estado encontrarem formas de lhes proporcionar uma rede de apoio de que necessitam e lhes é devida . Nada disto contraria o direito de cada pessoa enfrentar a doença, a degradação da sua condição física ou mental, e o sofrimento de forma estoica, digna e inelutável. Significa apenas reconhecer que o julgamento e a decisão consciente e individual perante essas condições são um direito inerente à liberdade radical do ser humano filho de Deus. É dessa liberdade que nos reclamamos. É essa liberdade que reclamamos para todos. [1] Torres Queiruga, A. (1998), “La eutanásia, entre la ética y la religión”, Razón y fe, 237, 373-389
REFERÊNCIAS:
Religiões Cristianismo
Como se constrói em contra-relógio uma “experiência pedagógica”?
No papel estão previstas novas disciplinas e um leque grande de possibilidades de gerir as que já existem. Estes são os dias em que cada escola está a definir quantas turmas inscreve no teste e como. (...)

Como se constrói em contra-relógio uma “experiência pedagógica”?
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: No papel estão previstas novas disciplinas e um leque grande de possibilidades de gerir as que já existem. Estes são os dias em que cada escola está a definir quantas turmas inscreve no teste e como.
TEXTO: São 16h30, tarde de Verão, e no Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia, vários professores estão reunidos para discutir afincadamente o que será a “experiência pedagógica” de flexibilidade curricular que arranca já a partir de Setembro. As regras saíram em Diário da República na véspera. Primeira decisão: escolheram uma turma do 5. º ano e duas do 7. º para inaugurar a nova forma de ensinar que o país quer testar. Na do 5. º ano, o docente de Português e o de História e Geografia darão todas as semanas uma aula de 50 minutos em conjunto. Dois professores, uma turma. É apenas uma de muitas mudanças. Significa isto que alunos desta turma deste agrupamento terão menos História ou menos Português do que até agora? Há disciplinas-base que vão perder horas? Aqui evita-se a palavra “perder”. “Tem que haver ajustamentos”, prefere dizer a professora Manuela Teixeira. O que é que isto significa? Vamos a contas. A distribuição na “área” das Línguas e Estudos Sociais no 5. º ano era esta até agora: cinco aulas de 50 minutos de Português por semana, três de História, mais três de Inglês. Com a “experiência”, a turma do Agrupamento Dr. Costa Matos continuará a ter cinco aulas de Português, três de Inglês, mas apenas duas de História, diz a professora. São menos 50 minutos para História, mas como os meninos ainda terão mais 50 minutos por semana “de trabalho colaborativo”, em que o docente de História e o de Português trabalharão com a turma juntos, perde-se menos. “Vai ter que ser tudo muito bem planeado”, conclui. E acrescenta César Viegas, o presidente do Conselho Geral do agrupamento, que também está na reunião: “A grande alteração desta experiência é que vamos trabalhar competências transversais. O conhecimento não é estanque, vamos mostrar aos alunos como os saberes se interligam. . . sim, é uma grande mudança para os professores, mas os professores têm grande capacidade de se moldar. ”Tudo isto contam, um após outro, ao telefone, professores do agrupamento de Gaia que interrompem a reunião para explicar como se está a montar o projecto. “Dá para perceber o entusiasmo?” — questiona Filinto Lima, que não só é o responsável pelo agrupamento Dr. Costa Matos (e também está na reunião), como é também o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos de Escolas Públicas. Filinto Lima explica que há muito que na sua escola se decidiu que se iria embarcar na experiência que o Ministério da Educação propôs há uns meses — já houve, de resto, várias reuniões, com estes mesmo professores que se reuniram nesta quinta-feira, “homens e mulheres, de diferentes grupos disciplinares, incluindo do ensino especial”, conta. Mas agora há, finalmente, um despacho a dizer o que se pode fazer, que novas conjugações de métodos de ensino se podem ensaiar, até onde se pode ir nesta nova autonomia. . . Prossegue Filinto Lima: há um ponto em que todas as escolas — e serão actualmente mais de 160 as básicas e secundárias inscritas na “experiência”, públicas e privadas — estão de acordo. “O timing é muito curto, essa é a crítica. ” O despacho podia ter saído há mais tempo. É que daqui a dois meses (as aulas arrancam a partir de 8 de Setembro) esta pequena revolução tem de avançar. “Acho que só vamos conseguir ultimar o trabalho em Setembro, naquela semana mesmo antes das aulas começarem. ”Com a “experiência” mandam as regras que sejam incluídas duas novas disciplinas: Cidadania e Desenvolvimento e Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). Como se fará aqui? No agrupamento Dr. Costa Matos já se decidiu que TIC será semestral, diz Filinto Lima, porque, feitas as contas aos minutos que as disciplinas base têm mesmo de ter só sobravam 25 minutos por semana para esta “cadeira” — e com 25 minutos nem se dá tempo para aos computadores arrancarem. Por isso, num dos semestres, os alunos “da experiência” terão TIC (50 minutos semanais). No semestre seguinte compensa-se e têm 25 minutos a menos de aulas. Ainda por afinar está a forma como se organizará a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento nas três turmas experimentais — “passa a ser uma disciplina que conta para aprovar ou para não aprovar e a que o ministério está a dar muita atenção”, lembra Filinto Lima. Apesar de estar incluída na “área” das Línguas e Estudos Sociais, pode “ser dada por qualquer professor” desde que tenha “o perfil”, prossegue. Entre as matérias a incluir estão Educação para a Saúde e media, por exemplo. Se neste agrupamento será também semestral, ou anual, está por decidir. “Estamos a lançar os alicerces de um grande projecto”, diz Filinto Lima. Em modo acelerado, mas “a pressão também pode ser boa”. O Conselho Pedagógico do agrupamento Dr. Costa Matos tem de aprovar o modelo ainda este mês. — As escolas estão nesta altura a indicar ao ministério de Tiago Brandão Rodrigues quantas turmas embarcam na “experiência pedagógica” já em Setembro. Esse processo estará fechado dentro de dias. — O Ministério da Educação (ME) tem garantido que apesar de surgirem duas novas cadeiras, a de Cidadania e a de Tecnologias, não se vai cortar em disciplinas como o Português e a Matemática nem aumentar a carga horária. Mas no despacho desta semana não estão definidos tempos “mínimos” para as disciplinas, apenas tempos de referência por grandes grupos, que a escola deve gerir. — A decisão de aderir ao projecto deve ser discutida e validada pelos órgãos competentes, designadamente o Conselho Geral onde têm assento pais, lembra o ME. “O trabalho a desenvolver em cada turma envolvida no projecto deverá ser dado a conhecer aos pais dos alunos envolvidos. ”— As escolas podem gerir até 25% da carga horária inscrita nas matrizes curriculares-base, por ano de escolaridade, como entenderem. Dá mais de 5 horas por semana no caso do 2. º ciclo, por exemplo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. — As escolas podem passar disciplinas anuais a semestrais, fundi-las, ou redistribuir a carga horária das mesmas, promovendo tempos de trabalho de projecto interdisciplinar. O leque de possibilidades é vasto e as escolas decidem. — No secundário os alunos podem trocar uma disciplina do seu curso por outra correspondente de um curso diferente. — Não haverá provas nacionais diferentes para os alunos desta experiência, ao contrário do que o PÚBLICO escreveu ontem.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens escola educação mulheres
Revista 2: A educação de Sofia
Sofia Gomes fez Belas Artes e acabou na afinação de piano. É a única mulher em Portugal nesta profissão. Tem 26 anos, tantos quantos o seu mentor, Fernando Rosado, leva de experiência num mercado tão específico e onde os “melhores se contam pelos dedos das mãos”, como nos diz o pianista Filipe Melo. (...)

Revista 2: A educação de Sofia
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Sofia Gomes fez Belas Artes e acabou na afinação de piano. É a única mulher em Portugal nesta profissão. Tem 26 anos, tantos quantos o seu mentor, Fernando Rosado, leva de experiência num mercado tão específico e onde os “melhores se contam pelos dedos das mãos”, como nos diz o pianista Filipe Melo.
TEXTO: As mãos agarram a tecla e pressionam-na contra a roda da máquina de polimento. No ar há um ligeiro cheiro acre, como quando se cheira fusível queimado. O trabalho é ritmado, contínuo, prolongado. Exige firmeza de braço e concentração a rodos. Nada pode falhar “ou acabamos com lâminas espetadas nas mãos”, avisa Sofia Gomes, 26 anos e a única portuguesa afinadora de pianos. Tenta evitar a conversa sobre género mas sabe que circula num mundo de homens — na oficina são três, contando com o “mestre” Fernando Rosado, com quem tem vindo a aprender o ofício desde que saiu das Caldas da Rainha para “vir trabalhar o ouvido”. No armazém da Cruz Quebrada que serve de quartel-general à empresa de Fernando Rosado, o ambiente não parece incomodá-la. Contorna pianos desbarrigados à espera de restauro — a verdade é que se vai desculpando pelo aparente caos — antes de chegar à ampla sala onde estão uns Yamaha de cauda imaculados. Percebemos que é aqui que as suas horas se estendem entre mecânicas, tampos harmónicos, cepos e cravelhas, martelos, forquilhas e teclas a precisar de polimento. Diz a escritora-mistério italiana Elena Ferrante que é “uma pessoa que trata da vida de todos os dias transportando sempre um livro e um bloco de notas na mala de mão” (Ípsilon, 17 Julho). Desde há um ano que da mala de Sofia — que agora se senta num dos bancos de piano e a pousa para nos mostrar de que é feito este instrumento — saltam uma chave de afinação, objecto que mede quase dois palmos e deve pesar perto de 1, 5kg, um diapasão e as cunhas. “Ainda estou para perceber qual será, nesta profissão que é tão específica, a minha dotação por ser mulher. Dizem que somos mais sensíveis aos sons agudos por estarmos treinadas por causa das crianças, mas eu. . . nem isso ainda”, ri-se. Fernando Rosado explica a situação de outra maneira: “Não há fórmulas mágicas nem pessoas sobredotadas. O que pedi à Sofia foi dedicação absoluta. Motivação e focalização no objectivo é os 50% que precisamos para o sucesso. Assumo que tinha vontade de formar uma mulher — já formei nove homens — por sentir que faltava na profissão uma sensibilidade feminina. Quando comecei a formar pessoas, preocupei-me com o número — não havia afinadores suficientes. Agora, que o mercado atingiu um certo equilíbrio, preocupa-me mais a questão da qualidade. É o momento em que ‘mais é menos’. E a Sofia reúne condições intelectuais, filosóficas e artísticas que nos levaram a criar um processo simbiótico de motivação mútua. ”Podemos dizer que a culpa cabe inteira nas mãos de um pianista austríaco. A história conta-se em poucas palavras. Em 2011, na Semana Internacional de Piano de Óbidos, ia ouvir-se Mozart e Beethoven, compositores aos quais Sofia estava particularmente atenta desde que tinha começado as aulas de piano no conservatório das Caldas da Rainha. Paul Badura-Skoda ia a meio do recital quando interrompe para afinar uma nota. Ela lembra-se de ficar agarrada ao assento. “Começo a ouvir a afinação, aquela nota. Penso: se calhar a minha relação com o piano é outra. Era um momento raríssimo, geralmente nunca é o próprio [a afinar]. Um pianista sabe que algo está a soar mal mas não consegue traduzir o que se passa e fica-se numa neblina de incompreensão. ”A esse momento iniciático seguiram-se coincidências felizes. Ou “epifânicas”, como ela prefere dizer. Calhou estar num curso com o pianista Filipe Melo, no âmbito do Festival MusiCaldas, a quem expressou vontade de se tornar “técnica de piano”. É Filipe a lembrar: “Esses cursos já nem existem. . . Era uma semana muito especial, todos fechados numa salinha, e desse grupo de estudantes uma grande percentagem veio a tornar-se músico profissional. A Sofia pareceu-me muita séria. ”Foi este pianista de jazz, que é também realizador e autor de banda desenhada, a accionar o contacto com o seu afinador de longa data e a pessoa que lhe vendeu o seu primeiro piano, tinha ele 14 anos. Fernando Rosado apresentou-lhe as contrapartidas: ela teria de estudar exaustivamente a estrutura do instrumento, reconhecer marcas e saber o seu historial, mergulhar na partição, na harmonização, na mecânica. “Tenho um grande cuidado com a futura integração no mercado de trabalho. Não é um devaneio meu quando envio alguém em formação para aquele trabalho, naquele dia, naquele local. É praticamente científico e cirúrgico”, esclarece o mentor. Para Sofia, o que se seguiu foram muitos fins-de-semana na estrada, com bilhete de ida e volta entre Caldas e Lisboa. “Não posso dizer que seja disciplinada. Mas sou obsessiva, seja a perseguir uma ideia artística ou a mergulhar no trabalho até à náusea. ” Sintomas de perfeccionismo? “Sim. Estou sempre a testar-me. Já estive três dias só à volta de um eixo, que é uma peça ínfima na mecânica mas essencial porque faz o martelo mover-se numa certa direcção”, exemplifica. Sofia Gomes chegou aqui depois de fazer Belas Artes, na Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha. Vagueou uns meses por Madrid — “precisava de provocar um divórcio com as manifestações artísticas” — e foi cozinheira para ganhar dinheiro. Agora, sobretudo desde que se mudou para Lisboa, voltou a pintar a carvão, faz fotografia e tem o projecto 7CPS com Sílvia T. , com quem tem vindo a partilhar ideias num território comum que é o som, ela como afinadora em Lisboa e Sílvia como compositora no Porto (o resultado tem sido apresentado em exposições individuais onde ambas exploram o texto, o desenho, a partitura, a fotografia). “Há quem diga que os aprendizes têm de ultrapassar os mestres, não é?”, graceja para nos explicar que faz o tempo esticar entre os dias a trabalhar na afinação, seja em instituições como a Escola Superior de Música, o CCB ou em pianos de particulares, e as noites a pintar um A3 a carvão se estiver para aí virada. É nessas alturas que ouve a folk de Angel Olsen e os sons que o tunisino Anouar Brahem arranca do seu oud, dois fascínios recentes. E como é que alguém cujo ouvido está a ser treinado para o dissonante ainda percebe a harmonia? Se ouvisse tudo como um afinador seria um desastre. Ela ri-se com a ideia. A verdade é que passou a ouvir diferente, pôs os auscultadores de lado e detém-se nos ruídos que lhe chegam da rua, por exemplo. Pode também ser traumático, avisa. Percebeu recentemente como o seu ouvido está mais sensível depois de oito horas a afinar pianos: “Fica saturado, até sinto a vibração no tímpano com o chiar dos travões de um comboio. ”Não se chega à afinação por curso universitário. É fruto da experiência, do conhecimento da mecânica de um instrumento com 88 teclas e que pode chegar a pesar 490kg. E é também a procura incansável do uníssono, “essa frequência perfeitamente igual entre duas ondas sonoras. O som é o fim de um longo processo condicionado por todo o movimento feito pela tecla, desde o dedo à corda, desde os finos papelinhos que existem por debaixo das forquilhas e que impedem o martelo de se mexer mais à direita ou à esquerda, às lãs que têm de estar completamente paralelas para nivelar as cordas”. Quando é a própria a escrever sobre esta ideia de uníssono, a coisa sai-lhe mais poética: “O que apenas há, nas dimensões que podemos nós captar, é o acidente. (. . . ) O uníssono está entre os batimentos mais audíveis e mais desconcertantes. Quanto mais próximas estão as frequências, mais choque criam. À medida que se vão afastando, vão-se tranquilizando, até fazerem intervalos perfeitos. O uníssono é o silêncio dentro do conflito” (em Diário de Afinação no seu blogue https://cravelhasemoscas. wordpress. com)A sua primeira intervenção foi ainda nas Caldas da Rainha, num Ferd Thürmer de 1920 que “teve de ir mudar molas, tinha uma corda partida e precisou de algum restauro”, recorda. Levou-lhe muito tempo, como diz ser normal com pianos antigos de particulares que têm de ir ao expurgo, levar cabeças novas, trocar materiais. “Por que é que uma tecla não toca? Se calhar porque tudo lá dentro está posto em causa, as fitas estão rasgadas ou descoladas, as molas partidas. . . ” Diz ter aprendido que o tempo nesta profissão é muito diferente do de outras e nisso é quase como se todo o processo pudesse ser catártico: “Sei que nunca vou parar de aprender. O Fernando tem 26 anos de experiência, os mesmos que eu tenho de vida, e vejo que há coisas que ainda o surpreendem. . . ” É que a afinação de um piano é um instante de quase coincidência, para logo depois começar em decomposição, a desfazer-se. “Mas é a dissonância que traz um certo charme à profissão”, conclui. Um afinador catalão, Joaquim Salamanca, explicava em 2011, numa entrevista ao diário elPeriódico, que “a técnica [de afinação] não é difícil. Difícil é aplicá-la a cada piano”. Sofia reflecte sobre estas palavras. Confessa que passou a ter uma “relação emocional com este ser vivo, um organismo em constante transformação porque a madeira é viva e está sempre em movimento”. Como nas artes, a sua ligação, sensorial até, é com a matéria. Quando não estava a tocar, Alfred Brendel escrevia que o piano é “o objecto da transformação. Pode sugerir a voz, timbres de outros instrumentos, uma orquestra, se o pianista assim o desejar. Esta propensão para a metamorfose, esta alquimia, é o nosso privilégio surpremo”. (A pianist’s A-Z, a piano lover’s reader, edições Faber and Faber). Sofia Gomes percebeu tudo isto nos três dias em que esteve a trabalhar na última edição de Dias da Música, no CCB, até agora dos mais difíceis no seu curto currículo. Ficou encarregada de uma sala sujeita a mudanças térmicas bruscas: “[A sala] levava umas 200 pessoas, o que já de si trazia bastante humidade. A acústica tornou-se difícil e nos intervalos dos concertos o ar condicionado subia ao máximo. Eu tinha 15 minutos para retocar o piano mas os primeiros sete, como as máquinas do ar faziam barulho, eu nem conseguia ouvir os batimentos. ”Nesse mesmo mês, Abril, também lhe sucedeu o inverso e acabou por ter o elogio do pianista espanhol Iván Martín, que esteve em Sines para tocar Carlos Seixas e Antonio Soler no Festival Sem Sombras. “O piano era uma Yamaha C5 e na verdade já estava a soar muito bem. Fiquei a assistir ao ensaio durante horas, o Martín é completamente obsessivo e não consegue parar de tocar. Mas soube dizer-me claramente como queria o piano. ”Um trabalho de “poesia do som” são as palavras que Filipe Melo usa para descrever a relação que se cria entre pianista e afinador. “Um bom afinador faz com que tudo soe tão bem que a atenção se dirige apenas para a música. Parece que o piano toca sozinho. E bons afinadores em Portugal contam-se pelos dedos das mãos. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Recuemos ao momento em que Badura-Skoda interrompe o recital para afinar o instrumento. Sofia compreende hoje o conflito presente naquele gesto que veio questionar o trabalho de um outro profissional. Melo ajuda a contextualizar: “Se tivesse de afinar o meu piano, provavelmente até conseguiria mas nunca iria ter um som profissional. Qualquer harpista, que trata da afinação do seu instrumento, lhe dirá que pode levar mais horas a afiná-lo do que a tocar. Mas num piano não é nada fácil porque na maioria das notas temos três cordas por cada nota e a experiência de um afinador poupa-nos tempo. ”A ela, o que a faz correr? Debruça a cabeleira ruiva em cima do tampo harmónico e quase murmura: “Este é um ser que dá luta. Já limpei um piano do princípio ao fim, esfreguei as cordas com pedra-pomes e uma borracha até ficar com tonturas. Puxa por nós, até em força física. E depois tem o outro lado, o da delicadeza total de som. ”
REFERÊNCIAS:
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Não há recordes imbatíveis. Ou há?
O atletismo tem algumas das marcas com maior longevidade no desporto. Mas há casos, como a maratona masculina, em que os recordes caem ano após ano. (...)

Não há recordes imbatíveis. Ou há?
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: O atletismo tem algumas das marcas com maior longevidade no desporto. Mas há casos, como a maratona masculina, em que os recordes caem ano após ano.
TEXTO: Pawel Fajdek enfrenta um recorde mundial cinco anos mais velho que ele próprio. O polaco de 27 anos é o detentor da melhor marca do ano no lançamento de martelo, 81. 87 metros — bem longe dos 86. 74 alcançados pelo soviético Iuri Sedykh, em 1986. Com 32 anos, este é o recorde com mais longa vigência entre as disciplinas masculinas do atletismo mundial. É notório que há marcas absolutas mais difíceis de quebrar. Entre os homens, os lançamentos e os saltos mantêm recordes com mais de duas décadas, com a excepção do salto à vara. Durante 29 anos, a melhor marca, 6. 15 metros, pertenceu ao lendário Sergei Bubka que entre os anos 1980 e 1990 dominou a modalidade — o atleta ucraniano detém os restantes nove melhores resultados de sempre. Mas em Fevereiro de 2014, o francês Renaud Lavillenie, actual campeão olímpico, derrubou por um centímetro o recorde de Bubka, ironicamente num meeting de pista coberta em Donetsk, na Ucrânia. O segundo recorde masculino com maior longevidade pertence ao alemão Jurgen Schult, campeão olímpico do lançamento do disco pela Alemanha de Leste em Seul 1988. Dois anos antes, Schult tinha superado a barreira dos 74 metros, que se mantém inviolável até hoje. O polaco Piotr Malachowski, detentor das melhores marcas dos últimos anos, e o alemão Robert Harting, campeão olímpico em Londres, são os favoritos para derrubar o recorde de Schult. O recorde do salto em comprimento demorou 23 anos a ser batido pelo norte-americano Mike Powell, com 8. 95 metros, e mantém-se há já 25 anos. Apesar de deter um dos recordes mais imbatíveis no atletismo, Powell nunca foi além da medalha de prata em Jogos Olímpicos (Seul 1988 e Barcelona 1992). A disciplina de corrida com o recorde mais longo em vigor são os 400 metros com barreiras e pertence desde 1992 ao norte-americano Kevin Young, que durante os Jogos Olímpicos de Barcelona conseguiu fazer o tempo de 46. 78 segundos. Entre as modalidades com recordes mais precários destaca-se a maratona masculina, cujo melhor tempo tem sido batido quase ano após ano. O queniano Dennis Kimetto correu os 42, 195 quilómetros da mítica prova em quase duas horas e três minutos na Maratona de Berlim, a 28 de Setembro de 2014. O recorde anterior, do seu compatriota Wilson Kipsang alcançado também em Berlim, estava a um dia de cumprir o primeiro aniversário. Curiosamente, os recordes mundiais daquela que é considerada a prova rainha dos Jogos Olímpicos têm resistido às prestações dos participantes — a última vez que a melhor marca mundial foi batida nuns Jogos foi em 1964, em Tóquio. Por outro lado, a Maratona de Berlim parece ser um palco privilegiado para obter marcas mundiais, com os seis últimos recordes a serem alcançados nesse evento. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É no atletismo feminino que o recorde há mais tempo em vigor se mantém. Em 1983, a checoslovaca Jarmila Kratochvílová correu os 800 metros em 1:53. 28 minutos, menos de dois centésimos que a anterior marca. Desde que foi atingida, há 33 anos, apenas a queniana Pamela Jelimo, em 2008, se aproximou menos de um segundo do recorde. No mesmo ano, Kratochvílová bateu o recorde dos 400 metros, mas acabou por ser batida em 1985 pela alemã Marita Koch — cuja marca ainda se mantém e é a terceira mais longa no atletismo feminino. Ao contrário do que acontece no atletismo masculino, não se nota a divisão entre disciplinas de corrida e técnicas no que toca à resistência dos recordes femininos. O recorde do lançamento do martelo, por exemplo, foi alcançado pela polaca Anita Wlodarczyk há cerca de um ano, tornando-se na primeira atleta a superar os 81 metros. O recorde mundial mais fresco ainda não celebrou o primeiro mês e pertence à norte-americana Kendra Harrison nos 100 metros com barreiras. A anterior marca tinha já 30 anos quando a 22 de Julho a jovem baixou o anterior tempo em um milésimo de segundo. A grande ironia é que, semanas antes, Harrison tinha falhado os mínimos para integrar a equipa olímpica.
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A mentalidade a mudar e as oportunidades a crescerem
Em mais de três décadas, foram criadas as condições para um salto em frente. Agora, falta a continuidade na aposta e no investimento. (...)

A mentalidade a mudar e as oportunidades a crescerem
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em mais de três décadas, foram criadas as condições para um salto em frente. Agora, falta a continuidade na aposta e no investimento.
TEXTO: Um segundo lugar, atrás da Espanha, na fase de qualificação para o Europeu de 2017, valeu a Portugal a presença no play-off. Depois, diante da Roménia, um duplo empate acabou por ser suficiente (prevaleceu o 1-1 alcançado em Cluj-Napoca) para o baptismo de voo da selecção nacional em grandes torneios internacionais. Quando a prova arrancar, no dia 16 de Julho, terão passado 36 anos sobre a estreia absoluta da equipa portuguesa. E muito mudou de então até hoje, a começar pelo número de atletas federadas: de perto de 400 passou-se para 3790. Alfredina Silva, com um percurso de múltiplos desafios no futebol (conjugado com a função de professora de Educação Física), traz-nos esse olhar transversal sobre uma modalidade que aos poucos se foi desempoeirando. “Em termos de condições, dessa época para agora, há uma diferença nos espaços físicos. Hoje é obrigatório jogar em relvados e isso permitiu uma evolução na qualidade das jogadoras. Alterou-se também o número de jogos por época, com o aparecimento de mais clubes. E o facto de termos várias selecções em actividade proporciona momentos importantes de evolução e de motivação”, elenca. Essa evolução é também palpável quando olhamos para o lote de convocadas do seleccionador Francisco Neto para o Europeu que se avizinha. Das 25 futebolistas escolhidas, nove jogam fora do país e algumas regressaram recentemente, fruto do investimento que Sporting e Sp. Braga fizeram na modalidade. Um sinal positivo, no entender de Gena, ao qual é preciso dar continuidade. “Os clubes não apostam muito na formação. Querem logo fazer uma equipa sénior, já formada. Querem formar uma equipa para ganhar no imediato. Se correr bem, o investimento continua, se correr mal, acaba”, aponta a antiga guarda-redes, que viu a carreira atalhada pela ameaça de um coágulo, depois de ter sofrido dois traumatismos cranianos — um dos quais ao serviço de Portugal, frente aos EUA. “Se têm o exemplo do futebol masculino, porque é que não aproveitam?”, questiona. A década de 1980 foi, a todos os títulos, marcante para o futebol feminino. Para além dos primeiros passos da selecção, arrancou em 1984 o campeonato nacional, sob a designação de Taça Nacional. A partir de então, houve sempre quadro competitivo, ainda que abundassem arestas para limar. Algumas de índole cultural, que só o tempo seria capaz de ir aplainando. “Nós éramos tão criticadas e isso também me aborrecia bastante. . . Aqueles comentários que ouvíamos dentro de campo, as críticas vindas da assistência, das pessoas que iam aos estádios só para criticar”, aponta Gena. “Havia homens e mulheres que iam ver os jogos por curiosidade e ouvíamos coisas do género: ‘Ide lavar a loiça, ide para casa’. Mas aos poucos fomos notando uma evolução e mais respeito”, confirma Paula Lessa. "Os clubes querem logo fazer uma equipa sénior, formar para ganhar no imediato. Se correr bem, o investimento continua, se correr mal, acaba"Eram dias difíceis, de trabalho duro e currículos desportivos construídos à custa de horas roubadas ao sono. Eram dias em que, na ausência de um técnico de guarda-redes, as atletas ficavam no fim do treino a fazer trabalho extra. “Cheguei a sair dos treinos às 00h, 00h30 e, nessas alturas, era o treinador que ia levar-nos a casa”, conta Gena. Eram dias em que Paula Lessa se levantava às 5h para apanhar três autocarros e entrar ao serviço às 7h, na fábrica. “E os nossos treinos eram depois dos juniores, à noite, o que significa que acabavam quase às 22h. Isso contribuiu um pouco para a minha saturação”, acrescenta. A própria metodologia do treino também sofreu um upgrade, com a carga física a perder peso na relação que estabelece com a dimensão táctica do jogo. “Hoje temos a componente da táctica a liderar todo o processo e essa é uma grande diferença”, reforça Alfredina, que entre sorrisos acrescenta uma curiosidade de outra natureza: “Lembro-me que tinha muita dificuldade em encontrar chuteiras. As primeiras botas de marca que tive foi quando fui a França jogar e comprei lá”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Esse é o tipo de obstáculos que nenhuma das actuais jogadoras da selecção enfrenta. Assim como não têm de “fechar os olhos” quando cabeceiam a bola em dias de chuva, um pesadelo nos tempos das bolas de couro, cosidas à mão. O trabalho de bastidores da Federação Portuguesa de Futebol, hoje um exemplo de organização a vários níveis, contribui para que as atletas se concentrem exclusivamente no treino e na competição e Gena espera que esta oportunidade sirva para impulsionar de vez a modalidade. “Esta geração é bastante razoável e Portugal tem um grupo no Europeu em que pode fazer boa figura [defronta Espanha, Escócia e Inglaterra]. Mas se não aproveitarem a formação, este trabalho cai em saco roto”. Por todas as razões, há um caudal de expectativas maior a rodear a prestação desta versão da selecção. “Agora já têm mais estágios, fazem um Mundialito, há jogos particulares. No nosso caso, foi quase um improviso e o tempo de preparação foi muito curto”, expõe Paula Lessa, num misto de lamento e saudosismo, que encerra com uma certeza. “Com as oportunidades que elas têm agora, uma pessoa nem olhava para trás”.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Adam Zagajewski e Amalia Bautista na Casa Fernando Pessoa
O programa Lisbon Revisited – Dias da Poesia abre esta quinta-feira em Lisboa com o poeta polaco de Sombras de Sombras, que conversará com Ana Luísa Amaral e Jorge Sousa Braga. (...)

Adam Zagajewski e Amalia Bautista na Casa Fernando Pessoa
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: O programa Lisbon Revisited – Dias da Poesia abre esta quinta-feira em Lisboa com o poeta polaco de Sombras de Sombras, que conversará com Ana Luísa Amaral e Jorge Sousa Braga.
TEXTO: Ana Luísa Amaral, Jorge Sousa Braga e o poeta polaco Adam Zagajewski conversam esta quinta-feira ao final da tarde na esplanada da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, numa sessão moderada por Pedro Mexia que abre a edição inaugural do programa Lisbon Revisited – Dias da Poesia. A directora da Casa Fernando Pessoa, Clara Riso, diz que a intenção é que estes Dias da Poesia venham a ter periodicidade anual e explica que escolheu os poetas desta edição “a pensar nos leitores de poesia portugueses” e procurando, num elenco que cruza poetas portugueses e estrangeiros, “variedade de género e de campos de escrita”, e ainda “variedade de língua materna “ no que respeita aos que vêm de fora. Além dos poetas já referidos, passarão ainda pela Casa Fernando Pessoa, na sexta-feira, segundo e último dia do programa, Luís Quintais, Margarida Vale de Gato, a norte-americana Harryette Mullen e a espanhola Amalia Bautista, que participarão numa segunda mesa-redonda moderada por Maria Sequeira Mendes. A estas sessões do final da tarde, com início às 18h30, seguem-se, às 21h30, sessões de leitura de poemas dos autores convidados, acompanhadas pelos músicos Margarida Campelo e Sérgio Pelágio. Agendado para o dia seguinte àquele em que nasceu, em 1888, o patrono da instituição, 13 de Junho, Lisbon Revisited – Dias da Poesia retoma noutros moldes os encontros internacionais de poesia da Casa Fernando Pessoa e adopta como epígrafe um verso do poema (versão de 1926) evocado no próprio título do programa: “Outra vez te revejo — Lisboa e Tejo e tudo”. Adam Zagajewski foi recentemente editado em Portugal por iniciativa de Pedro Mexia, moderador desta primeira mesa-redonda, que publicou o volume antológico Sombras de Sombras (2017) na colecção que dirige para a Tinta da China. A tradução, realizada a partir do original polaco por Bruno Marco, foi revista por um dos poetas que partilhará a mesa com Zagajewski, Jorge Sousa Braga. Já Amalia Bautista, de quem Inês Dias traduziu e publicou recentemente na Averno o volume Estou Ausente (2013), tinha sido também traduzida por Joaquim Manuel Magalhães no terceiro dos seus Trípticos Espanhóis (Relógio D’Água, 2005). Harryette Mullen ainda não foi traduzida em Portugal, mas o leitor interessado pode ir espreitando o que Maria Sequeira Mendes (moderadora da segunda mesa-redonda) escreve sobre o seu poema em prosa Ectopia no site da revista Jogos Florais. Nascido em 1945, menos de dois meses após o fim da Segunda Guerra, em Lviv, cidade polaca então recentemente anexada à República Socialista Soviética da Ucrânia, a família de Zagajewski foi obrigada nesse mesmo ano a mudar-se para a Polónia, para a uma cidade, Gliwice, que por sua vez fora retirada à derrotada Alemanha e incorporada no território polaco. Não admira que, como nota o poeta e crítico norte-americano Robert Pinsky, um dos tópicos centrais da poesia de Zagajewski seja “a presença do passado na vida quotidiana”. Ligado aos autores da Geração de 68 e da chamada “nova vaga”, críticos do regime comunista, Zagajewski emigrou para Paris em 1982 – numa altura de particular repressão do movimento liderado por Walesa, que passou a maior parte desse ano na prisão – e viveu 20 anos fora da Polónia, à qual só regressou em 2002. Também romancista e ensaísta, é hoje considerado um dos grandes poetas polacos contemporâneos, premiado com o prestigiado Neustadt International Prize for Literature, em 2004, e, para referir apenas mais algumas distinções internacionais recentes, com os prémios Heinrich Mann (2015), Griffin (2016), Princesa das Astúrias (2017) e Struga (2018). Num texto de 2004 dedicado ao poeta polaco, o romancista irlandês Colm Tóibin observa: “Com a sensibilidade danificada pela História, uma consciência política deformada pelo totalitarismo, uma mente profundamente afectada pelo seu estudo da Filosofia, seria fácil imaginar Zagajewski a escrever velada poesia de protesto (o que fez na sua juventude) ou poemas inteiramente privados e hieroglíficos, amargos no tom e indecifráveis no conteúdo”. Mas em vez disso, argumenta, “foi salvo por uma crença incondicional na própria poesia, no poder da sua autonomia e beleza”. Este poema recolhido em Sombras de Sombras confirma bem o juízo de Tóibin: “Só na beleza criada pelos outros/existe consolação, na música/ e nos poemas dos outros/ Só os outros nos podem salvar, / mesmo que a solidão tenha o sabor/ do ópio. Não são o inferno, os outros, / se os espreitarmos de manhã, quando/ têm a testa limpa. lavada pelos sonhos. / Por isso cismo muito sobre a palavra/ que hei-de usar, ‘ele’ ou ‘tu’. Cada ‘ele’/ é uma traição a qualquer ‘tu’, mas, / em troca, um poema de alguém fielmente/ oferece uma fresca, moderada conversa. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Zagajewski vai conversar com dois poetas portugueses quase da mesma idade – nasceram ambos na segunda metade dos anos cinquenta –, mas que se estrearam com uma década de diferença: Jorge Sousa Braga em 1980, com De Manhã Vamos Todos Acordar Com Uma Pérola no Cu, e Ana Luísa Amaral com um livro cujo título homenageava Maria Teresa Horta: Minha Senhora de Quê. A primeira é também uma especialista em literatura anglo-americana e tradutora de Emily Dickinson, e de Jorge Sousa Braga quase se pode dizer que traduz tudo em que toca, tantos são os poetas das mais diversas épocas e línguas que já deu a ler em português. Se o título da obra de estreia de Jorge Sousa Braga, bem como os dos livros seguintes – Plano para Salvar Veneza (1981) e A Greve dos Controladores de Voo (1984) – deixavam adivinhar um poeta que se colocava deliberadamente à margem das correntes mais respeitavelmente canónicas da poesia portuguesa da época, os seus livros mais recentes, e em particular O Novíssimo Testamento (2012), com o excelente poema de abertura que lhe dá título, talvez ameacem um pouco a sua aura de poeta de série B, mas não será este leitor quem se queixará. Já a poesia de Ana Luísa Amaral, no seu modo de cruzar um amplo universo de referências literárias e culturais com o seu mundo quotidiano e doméstico – movimento em que o cânone é ao mesmo tempo homenageado, questionado e subvertido a partir de um olhar (e de um idioma) marcadamente feminino –, poderia ser aproximada de Harryette Mullen, ainda que sem a mais abrupta dimensão experimental da americana, e talvez com não menos pertinência de Amalia Bautista, com quem também partilha uma certa valorização ética dos sentimentos humanos mais comuns. Mas o registo mais exuberante, e por vezes quase deliberadamente artificioso, da autora portuguesa distancia-a da lapidar concisão da espanhola, bem expressa neste poema, Ao Fim, aqui na versão de Joaquim Manuel Magalhães: “Ao fim são muito poucas as palavras/ que nos doem a sério e muito poucas/ as que conseguem alegrar a alma. / São também muito poucas as pessoas/ que tocam nosso coração e menos/ ainda as que o tocam muito tempo. / E ao fim são pouquíssimas as coisas/ que em nossa vida a sério nos importam:/ poder amar alguém, sermos amados/ e não morrer depois dos nossos filhos. ”
REFERÊNCIAS:
Fotógrafo no centro do escândalo do Nobel da literatura foi acusado de violação
Acusação formal foi formalizada esta terça-feira e diz respeito a crimes alegadamente cometidos em 2011. Gestão da investigação levou à demissão de membros da Academia e ao cancelamento do prémio deste ano. (...)

Fotógrafo no centro do escândalo do Nobel da literatura foi acusado de violação
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: Acusação formal foi formalizada esta terça-feira e diz respeito a crimes alegadamente cometidos em 2011. Gestão da investigação levou à demissão de membros da Academia e ao cancelamento do prémio deste ano.
TEXTO: A procuradoria estatal sueca formalizou duas queixas formais de violação contra o homem no centro do escândalo que obrigou ao cancelamento do Nobel da literatura de 2018, anunciou a procuradoria esta terça-feira. No ano passado, 18 mulheres acusaram o fotógrafo Jean-Claude Arnault, casado com um membro da Academia, de assédio e violência sexual, o que levou a um inquérito preliminar por parte da procuradoria estatal. A procuradora distrital Christina Voigt disse esta terça-feira que Arnault tinha sido acusado por dois crimes de violação de uma mulher em Estocolmo em 2011. “A minha perspectiva é que as provas são suficientemente sólidas para serem formalizadas as acusações”, disse Voigt em comunicado. Arnault nega as alegações, bem como as outras alegações de que foi o responsável pela fuga de informação sobre os nomes de alguns dos premiados antes do anúncio oficial. “Ele mantém que é completamente inocente”, disse terça-feira o advogado de Arnault, Bjorn Hurtig à Reuters. “Não partilho a visão da procuradoria de que as provas são sólidas. Os relatos diferem, não há provas técnicas, não há relatos de testemunhas directas e os acontecimentos datam de há muito no passado. ”Os procuradores encerraram em Março outro inquérito preliminar sobre uma série de alegações de abuso contra Arnault, justificando que não existiam provas suficientes e que nalguns casos os alegados crimes tinham prescrito. Alguns membros da Academia demitiram-se pela forma como a instituição, uma das mais prestigiadas do país, lidou com a sua própria investigação sobre as alegações contra Arnault. As regras ancestrais da Academia ditam que esses membros não podem ser substituídos e em Maio a instituição decidiu que não vai atribuir o Nobel da Literatura este ano por necessitar de recuperar a confiança do público.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave violência mulher homem violação sexual mulheres abuso assédio