Quando cortar o cabelo é recuperar a beleza dos dias
Num terminal rodoviário do Porto, uma barbearia improvisada abriu as portas a pessoas sem-abrigo e com carência financeira. Ao espelho, viu-se a esperança de restaurar a beleza dos dias. (...)

Quando cortar o cabelo é recuperar a beleza dos dias
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.6
DATA: 2018-12-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Num terminal rodoviário do Porto, uma barbearia improvisada abriu as portas a pessoas sem-abrigo e com carência financeira. Ao espelho, viu-se a esperança de restaurar a beleza dos dias.
TEXTO: Patrick Braido achava saber ao que ia. Mas, sentado na cadeira do barbeiro, enquanto lhe davam ao cabelo uma forma arrojada, ia percebendo não saber coisa nenhuma. Antes de cruzar o oceano em busca de uma vida melhor, também ele era barbeiro. E na escola paulista onde aprendeu o ofício, havia volta e meia iniciativas semelhantes àquela em que participou esta quarta-feira. Mas, desta vez, ele estava do outro lado da história. Em vez do pente e da tesoura nas mãos, vestiu a bata de quem precisa de amparo. No Terminal Rodoviário do Campo 24 de Agosto, a empresa de transportes Transdev improvisou um cabeleireiro e abriu as portas a pessoas sem-abrigo e com carência financeira. Patrick entrou: “Só hoje vi o sentimento de quem se senta naquela cadeira”, comentava no final, cabelo rapado dos lados, volumoso e com poupa em cima. “Vir aqui devolve a vontade de continuar. ”Dezembro é mês de sentimentos agitados. Patrick Braido completou 25 anos no dia 10 e tem agora de superar um Natal e passagem de ano longe da família. Há coisa de dois anos arriscou o sonho de uma vida nova no Porto, confiante na profissão para a qual estudara. Prometeram-lhe um lugar como barbeiro, mas boa parte do tempo viu-se limitado à função de varrer o chão. Em Portugal, percebeu, a confiança e fidelidade dos clientes era mais difícil de conquistar. Ao fim de dois meses, desistiu. Procurou outras formas de se manter: foi agente comercial numa empresa de telecomunicações, depois numa imobiliária. Passou pela restauração. Agora está desempregado, sem qualquer rendimento ou apoio. Viveu num carro durante nove meses. Há semanas foi morar “de favor” para a casa vazia de um conhecido. Sónia Pinto acelera o passo à saída do cabeleireiro improvisado no terminal rodoviário. Na mão, leva uma senha que lhe dará direito a um galão e um pão com manteiga, cortesia do café Terminal 24, que ao perceber a acção solidária a poucos metros dali se deixou contaminar. No cabelo negro, Sónia tem agora duas tranças impecavelmente desenhadas por uma das voluntárias do Centro de Formação Certificada. Não quer fotografias do rosto, mas do penteado sim. Tranças como aquelas só tinha feito uma vez em 40 anos de vida, para ir a um casamento. A iniciativa conheceu-a através da Casa – Centro de Apoio ao Sem-Abrigo, onde volta e meia vai fazer uma refeição. Na sua casa de poucos metros quadrados, numa ilha na zona oriental do Porto, vai-se mantendo com os menos de 200 euros do Rendimento Social de Inserção. Ficou desempregada há já oito anos e nunca mais conseguiu recompor-se. A filha adolescente está à guarda do pai, visita-a de 15 em 15 dias. Ela mora sozinha, com o aconchego dos vizinhos. Às vezes, imagina como seria a vida se o sonho dela tivesse um dia ganhado asas (“queria ter sido educadora de infância”) e dá conta do abismo entre anseios e realidade. Mas não se deixa levar em lamentos: “Pago 50 euros de renda e sou muito poupadinha. Vai dando para viver”, diz, para logo fazer um reparo em forma de prece: “Devia haver mais apoios. ”Jason Parodi vive sem nenhum. Nascido no norte de Itália há 35 anos, mudou-se para o Porto há meia dúzia de meses, seduzido pela fama da cidade. Quando cruzava a fronteira de Espanha com Portugal encontrou uma cadela abandonada e fez dela companhia de viagem: “Não podia deixá-la na rua”, afirma categórico. Índia, coleira vermelha com bolinhas pretas, espera sentada numa manta à porta do barbeiro enquanto ele se entrega nas mãos de uma voluntária. “Isto é importante, estava a precisar de cortar o cabelo e de um saco-cama”, comenta num português com pouco sotaque, feliz com a dupla oferta da iniciativa da Transdev, que também já tinha acontecido em Coimbra. Durante o Verão, Jason juntava alguns trocos a fazer bolas de sabão gigantes na Rua das Flores. Agora que o tempo se pôs invernoso, o negócio não dá para quase nada. Com Índia, improvisa a sua casa sem paredes e tecto nas ruas do Porto. Pede esmolas para se alimentar, frequenta associações. Se não encontrar emprego nos próximos meses, tentará a sorte na capital. Depois, rumará ao norte de Espanha, onde chegou a trabalhar como empregado de mesa. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Num jantar numa associação, Artur Moreira ouviu falar da iniciativa solidária desta quarta-feira e memorizou a data. Era dia de ir ao cemitério compor a campa da esposa e, estando ali perto, decidiu sentar-se na cadeira. Jura que não é por necessidade, ou não fosse a filha cabeleireira, mas por um reverso acto solidário: “Assim as meninas podem treinar”, conta sorridente. Litógrafo de profissão, Artur Moreira trabalhou num serviço da Câmara do Porto por quase 20 anos: atendia telefones, fazia recados, era o homem para toda a obra. Quando a mulher adoeceu, reformou-se para cuidar dela na ilha onde viviam, na Rua de São Victor. “A médica dizia-lhe: oxalá o seu marido tenha alguém que olhe por ele como ele olha por si agora. ” Para o Machado Vaz, um “bairro de categoria” onde habita agora, leva sempre que pode alguns mantimentos dados pelas associações. “Temos de nos ajudar uns aos outros. ”Para os 52 sem-abrigo e gente com carência que passaram pelo barbeiro do terminal rodoviário, ainda falta um plano de vida. Mas, ao espelho, o cabelo e barba feitos podem ser por um instante a ilusão de uma vida reinventada. “Vaidosa” assumida, Sónia Pinto já se sente “mais bonita” na hora da despedida. E Patrick Braido, 25 anos, não deixa cair o sorriso. Agora que cruzou o oceano, não vai voltar atrás. “Sou muito novo, ainda vou dar a volta”, diz. E um dia, quem sabe, poderá concretizar o sonho de abrir uma taberna, com comida rápida e bebida farta: “Sempre vi os donos de tasco tão felizes, só sonho ter a felicidade deles. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave filha escola campo mulher mantimentos negro homem adolescente social casamento
Imunoterapia salvou Judy Perkins de um cancro da mama terminal
Tratamento experimental usou as próprias células do sistema imunitário de Judy Perkins, uma mulher que hoje tem 52 anos, para identificar e combater o cancro da mama que já se tinha espalhado pelo seu corpo. Para já, este é um caso único de sucesso neste tipo de cancro avançado com metástases. (...)

Imunoterapia salvou Judy Perkins de um cancro da mama terminal
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Tratamento experimental usou as próprias células do sistema imunitário de Judy Perkins, uma mulher que hoje tem 52 anos, para identificar e combater o cancro da mama que já se tinha espalhado pelo seu corpo. Para já, este é um caso único de sucesso neste tipo de cancro avançado com metástases.
TEXTO: Uma mulher de 52 anos está há dois anos sem qualquer sinal de cancro depois de ter sido submetida, nos EUA, a um tratamento experimental que usou as suas próprias células imunitárias. Judy Perkins tinha cancro da mama avançado com metástases espalhadas pelo corpo e recebeu 90 mil milhões de células do sistema imunitário (linfócitos T) que tinham sido antes cultivadas em laboratório. O promissor resultado deste caso único de tratamento com imunoterapia de cancro da mama avançado foi publicado na revista Nature Medicine. A notícia da reviravolta na vida de Judy Perkins corre mundo. A norte-americana de 49 anos fez um tratamento experimental que parece ter eliminado o cancro avançado da mama que se estava a espalhar por vários órgãos e que a tinha condenado a poucos meses de vida. Passados dois anos desta inovadora terapia, ainda não há sinal do cancro no seu corpo. O caso de Judy Perkins está agora a espalhar a esperança neste tipo de tratamento experimental mas os médicos avisam que este foi apenas o primeiro sucesso e que é preciso estudos mais alargados para demonstrar que esta abordagem resulta neste e noutros tipos de cancro. Para este tratamento altamente personalizado, os investigadores começam por realizar uma minuciosa análise do ADN de uma amostra do cancro para identificar as mutações. No caso de Judy Perkins foram identificadas 62 mutações no tecido tumoral mas apenas quatro foram consideradas como alvos a atacar. Depois, o tratamento passa por procurar no mesmo tecido as células do sistema imunitário que são capazes de identificar estas quatro mutações. Estes linfócitos, uma espécie de soldados especializados, são extraídos do doente e depois cultivados em laboratório. Tal como numa guerra, segue-se então o reforço do contingente de “tropas” personalizadas e especialmente dirigidas a este tumor que são injectadas no doente, juntamente com outros fármacos destinados a aumentar a eficácia destas células. Judy Perkins recebeu 90 mil milhões de novos “soldados” (linfócitos T) preparados para atacar este cancro, o seu cancro. Esta estratégia de combate que se baseia num recurso e reforço a linfócitos retirados do próprio doente já demonstrou ser eficaz nalguns cancros, mas até agora tinha falhado no cancro de mama com metástases. Aliás, as diferentes imunoterapias experimentadas até agora têm revelado sucesso sobretudo em cancros associados a um elevado número de mutações e outras características, deixando sem resposta os tumores causados por poucas mutações como era o caso do cancro da mama de Judy Perkins. “Estamos à procura de um tratamento – uma imunoterapia – que possa ser amplamente usada em doentes com os cancros mais comuns”, diz à rádio NPR Steven Rosenberg, oncologista e imunologista do Instituto Nacional do Cancro nos EUA e um dos autores do artigo que descreve este tratamento publicado na Nature Medicine. Na mesma entrevista, o especialista avisa mesmo que a abordagem que agora teve sucesso pode não resultar para outras mulheres com o mesmo tipo de tumor avançado. Aliás, nota, o mesmo tratamento falhou noutras duas doentes com cancro de mama e, de uma forma mais geral, ajudou sete dos 45 doentes com outros tipos de cancros (do cólon, fígado e colo do útero), o que representa uma taxa de sucesso de cerca de 15%. Assim, sobre a possibilidade de termos hoje este tratamento disponível ou de o podermos usar na maioria dos tumores a resposta é, por enquanto, “não”. Ainda assim, o resultado obtido agora com um cancro avançado da mama com metástases (que até agora estava fora do alcance destas terapias e era encarado como uma sentença de morte) não deixa de ser uma excelente notícia. “Acho que é o tratamento mais promissor que está actualmente a ser explorado para resolver o problema do tratamento de cancros metastáticos”, refere Steven Rosenberg à NPR. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para Judy Perkins, uma engenheira reformada que vive na Florida, este tratamento é mais do que uma esperança ou promessa. Foi diagnosticada com cancro de mama e tratada pela primeira vez em 2003. O caso parecia relativamente simples, como em tantas outras histórias semelhantes. No entanto, dez anos depois sentiu um novo “nó” no corpo. O cancro tinha regressado e estava a espalhar-se rapidamente pelo organismo. O prognóstico do cancro metastático era mau. Fez várias rondas de quimioterapia e outros tratamentos, mas o cancro continuava a ganhar esta luta e ia invadindo o seu corpo. Alguns dos seus tumores cresceram até ao tamanho de bolas de ténis. Quando parecia estar perto de desistir, ouviu falar do tratamento experimental que estava a ser desenvolvido no Instituto Nacional do Cancro dos EUA. Tinha 49 anos quando começou a participar no ensaio clínico. Apesar dos duros efeitos secundários que incluem febre alta, enjoos e tremores, levou o tratamento até ao fim. E ainda bem. “Toda a sua doença detectável desapareceu. É notável”, confirma Steven Rosenberg. Judy Perkins está consciente de que é “uma das sortudas”. “Conseguimos ter os linfócitos T certos no lugar certo na hora certa. E eles entraram e comeram o meu cancro. Estou curada. É muito irreal”, disse à NPR. Agora, segundo as várias notícias publicadas sobre esta história, Judy Perkins corre, faz caminhadas, anda de caiaque, e faz hoje uma vida normal. Num comentário que acompanha o artigo publicado na revista Nature Medicine, Laszlo Radvanyi, presidente e director científico do Instituto de Investigação do Cancro de Ontário, no Canadá, considera que os resultados obtidos são notáveis e “sem precedentes” neste tipo de cancro, sublinhando que é necessário avançar com esta linha de investigação e fazer mais estudos com mais doentes. O difícil desafio agora é tornar esta abordagem mais fácil e acessível.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Português Suave: a operação de charme da indústria tabaqueira
Em Portugal, além das tímidas medidas legislativas para controlo do tabaco, assistem-se a convivências no mínimo caricatas com a indústria do tabaco. (...)

Português Suave: a operação de charme da indústria tabaqueira
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.55
DATA: 2018-12-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em Portugal, além das tímidas medidas legislativas para controlo do tabaco, assistem-se a convivências no mínimo caricatas com a indústria do tabaco.
TEXTO: Era por volta de 1560 e o senhor Jean Nicot, embaixador de Henrique II da França na corte portuguesa, estava encarregue de negociar o casamento de Margarida de Valois com o jovem Dom Sebastião. Quando, intrigado pelos efeitos que lhe tinham sido mostrados por Damião de Góis, enviou certas folhas de tabaco à rainha Catarina de Medicis, na esperança de lhe curar as famosas enxaquecas, não imaginava que despoletava assim uma das maiores epidemias da história. Estas folhas, moídas e inaladas, tornaram-no famoso entre a elite parisiense, rapidamente adicta, levaram Lineu a dar o seu nome ao género Nicotiana, e mais tarde à própria nicotina, princípio activo responsável pela disseminação mundial da dependência. Este nome tornou-se primeiro sinónimo de panaceia medicinal, depois de hábitos de elegância e elite, democratizou-se com o cachimbo, industrializou-se com a máquina de fazer cigarros de Bonsack e explodiu com as guerras mundiais. Depois, o pesadelo: desde o primeiro relatório do Surgeon General (Smoking and Health: Report of the Advisory Committee of the Surgeon General of the Public Health Service, 1964) que se acumula a evidência, avassaladora, inatacável, arrepiante, de que o consumo do tabaco é o responsável directo por um sem número de doenças, com o cancro do pulmão, a doença cardiovascular e a doença pulmonar obstrutiva crónica à cabeça, causando a morte precoce a milhões de pessoas e, pior que isso, a perda de anos saudáveis, o sofrimento, o abandono do trabalho, o gigantesco consumo de recursos médicos, com um peso tremendo para as famílias, para os Estados e para o ambiente. Este panorama sombrio tem mudado nas últimas décadas, precisamente porque têm sido dados importantes passos pelos governos e autoridades de saúde do Mundo para o controlo desta praga, minimização dos seus efeitos e protecção dos não fumadores. A legislação restritiva, os impostos elevados, a proibição da publicidade e da venda a menores, o controlo da contrafacção têm tido efeitos claros e mensuráveis no consumo, sobretudo no mundo ocidental. A Convenção-Quadro da OMS, o maior tratado internacional de Saúde Pública, ratificado já por 181 partes, prevê isso mesmo: controlar e, em última análise, acabar com a epidemia do tabaco. O objectivo de tornar residual o consumo de produtos de tabaco, irrealista há uma década, entrou já nas metas de vários países ate 2030. Entretanto, a indústria produtora de tabaco não dorme. Perante a quebra do consumo e em risco de ver encolher os seus astronómicos lucros, reinventa-se e abre novas frentes. A estratégia não é nova e a utilização do marketing enganoso tem um século de vida. À medida que se tornavam públicos os grandes estudos que ligavam de forma indelével o tabaco a doença grave, a indústria lançava novos produtos, com filtros, slims, menos irritantes, com baixo teor de alcatrão, suaves, light. Todos se revelaram igualmente perigosos. Nos seus anúncios de fascínio, cowboys másculos, estrelas de cinema e até médicos e cientistas apregoavam as qualidades do produto, prometendo-o mais saboroso, mais prestigiado, mais seguro. A indústria namorava a ciência ou tentava desmontar os seus argumentos, manobrando o público e conseguindo obter o seu bem mais valioso: um consumidor dependente que, apesar da alta probabilidade de ter a sua vida abreviada, proporcionará décadas de lucro fiel. Provavelmente nenhum outro ramo da economia provoca a morte a metade dos seus consumidores, nem mesmo a indústria do armamento. E no entanto, esta morte é protelada e lenta e, por isso, compensadora. Na era da tecnologia e dos gadgets atraentes, a indústria acena-nos agora com cigarros electrónicos e tabaco aquecido. Lustrosos, tecnológicos, espaciais, estes dispositivos têm ligações USB e LEDs, lembram smartphones de última geração, piscam o olho a uma geração de instagramers e youtubers que procura o bem-estar e que está na crista da onda, uma espécie de hedonismo high-tech que repudia os velhos cigarros mal-cheirosos. Ao tabaco aquecido chama-lhe heat-not-burn, como se os 350ºC de temperatura que atingem estes pequenos cigarros fossem inocuamente tépidos. A indústria vestiu-se da bata da ciência e quer agora parecer credível, preocupada, financiando duvidosas instituições como a “Fundação para um Mundo sem Fumo” (repare-se, sem fumo, mas não sem tabaco, que se pretende que por cá ande muitos anos mais, angariando clientes à mercê da poderosa nicotina). A indústria quer ser a campeã da Saúde Pública, a aliada dos médicos e a parceira das autoridades, protegendo agora os consumidores que, alega, não conseguem deixar de fumar e transferindo-os para produtos de “risco reduzido”. Contrata cientistas das grandes farmacêuticas, recorre à linguagem do marketing científico, assume-se perita em toxicologia e epidemiologia, ao mesmo tempo que promove (ilegalmente) os seus glamourosos produtos nas redes sociais e nos festivais de Verão. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O que sabe afinal a ciência sobre o “risco reduzido” destes produtos? E quando digo ciência refiro-me à investigação isenta produzida por cientistas credíveis, não à que a própria indústria divulga e publica. Que: 1) os cigarros electrónicos e tabaco aquecido não são isentos de compostos perigosos e de riscos para a saúde, alguns dos quais semelhantes aos do cigarro convencional; 2) que concentrações menores de alguns tóxicos não significam segurança ou menores riscos a longo prazo, que ainda não estão estudados; 3) que a experimentação destes produtos está em crescimento explosivo pela população jovem, provoca elevada dependência e serve de porta de entrada a outros consumos, como o cigarro; 4) que não têm nenhum efeito comprovado para ajudar a deixar de fumar. Em Portugal, além das tímidas medidas legislativas para controlo do tabaco, assistem-se a convivências no mínimo caricatas com a indústria do tabaco: em Setembro deste ano, a Tabaqueira ganha um prémio da Associação Portuguesa de Ética Empresarial na área “Saúde de Qualidade” (leram bem, saúde!). Em Novembro, a prestigiada Fundação de Serralves promove um encontro sobre “A Ciência ao Serviço da Comunidade” em que participam o deputado e investigador Alexandre Quintanilha, Paulo Célio Alves, investigador do CIBIO-InBIO da Universidade do Porto, e Gizelle Baker, alto cargo da Philip Morris International, sob o mecenato da Tabaqueira. A estratégia de charme é subtil mas clara e visa a credibilização de uma indústria que continua a não ser capaz de assumir que só tem dois caminhos possíveis: ou encerra ou muda efectivamente de ramo, utilizando os seus gigantescos recursos em prol da humanidade, ao invés de lançar mais produtos baseados no uso recreativo da nicotina. E que resta aos fumadores, vítimas de umas das mais poderosas substâncias psicoactivas utilizadas pelo Homem? Ao contrário do que se alega, há respostas eficazes com recurso a apoio médico especializado. E há sobretudo uma enorme estrada que se abre na prevenção: evitando novos consumidores, evitaremos novos dependentes e todo o rasto de doença, incapacidade e morte que se lhe seguem.
REFERÊNCIAS:
Entidades OMS
O testamento do Doutor Godard
Com 88 anos acabados de fazer, Godard estreia o filme mais arrojado que podemos ver este ano, uma pequena fogueira que deixa o cinema em chamas. Filme sobre a violência – da história, do mundo, das “ardentes esperanças” – onde o discurso poético e o discurso político se conciliam e se contradizem. Não forçosamente um “último filme” – Godard tem energia para dar e vender – mas certamente o filme mais testamentário do seu autor. (...)

O testamento do Doutor Godard
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: Com 88 anos acabados de fazer, Godard estreia o filme mais arrojado que podemos ver este ano, uma pequena fogueira que deixa o cinema em chamas. Filme sobre a violência – da história, do mundo, das “ardentes esperanças” – onde o discurso poético e o discurso político se conciliam e se contradizem. Não forçosamente um “último filme” – Godard tem energia para dar e vender – mas certamente o filme mais testamentário do seu autor.
TEXTO: Já perto do fim de O Livro de Imagem, a voz áspera de Jean-Luc Godard cita, a partir daquele trono em off que é o seu em todo o filme, uma frase de Bertolt Brecht: “só o fragmento pode conservar a autenticidade”. Tirada do seu contexto, ou posta no contexto deste filme, é como se a ideia de Brecht se dirigisse ao Livro de Imagem e ao seu método, sumamente godardiano, que não é novo mas é aqui levado a um paroxismo: um filme feito na mesa de mistura, um filme de mestre mixeur, uma colagem fragmentária que, dir-se-ia, fragmenta (e às vezes violenta, destrói) os próprios fragmentos – que por sua vez podem ser restos, resíduos, “ruinas”, de tudo e vindas de todo o lado, do cinema, da televisão, da pintura, da literatura, da música e, evidentemente, através de tudo isso, do mundo, da História, da realidade (sendo que também se ouve JLG propor que se ponha “realidade na realidade”, ideia poderosa num mundo cada vez mais cheio de “virtualidades” e de fakes). Talvez, no fundo, uma imagem seja apenas isso, um fragmento, portador da sua autenticidade. Este é o seu Livro, das imagens e dos fragmentos. Realização: Jean-Luc Godard Actor(es): Jean-Luc Godard, Dimitri Basil, Buster KeatonFala-se muitas vezes da “pedagogia godardiana”, que pode assumir várias formas mas tem neste exemplo uma boa expressão: ao aludir, no interior do filme, ao seu processo de trabalho, torna-se claro que para JLG a diferença entre a “fabricação” de um filme e o objecto resultante desse trabalho é mínima, o “fabrico” já é o filme, já é o objecto – talvez por isso, se se pode dizer que nele a obsessão pelo fragmento é antiga (que são os jump cuts de O Acossado?. . . ), e o que o trabalho de colagem e “mixagem” é uma constante da sua obra desde as História(s) do Cinema (mas com muitos anúncios anteriores), o filme que mais nos vem à memória durante o visionamento do Livro de Imagem é aquele seu pequeno ensaio dos anos 80, Scénario du Film Passion, obra “pedagógica” (como nasce um filme?) que punha em paridade o trabalho do filme e o filme (era, para usar terminologia simples e vaga, um making of de “Passion”, estreado em 1982). Aí, víamos Godard, em pequeno demiurgo, perante um ecrã branco, a introduzir nele, pelas artes mágicas da tecnologia e da mecânica, formas, cores, sons, movimento. Aqui, podemos imaginá-lo na mesma posição, só que o ecrã está negro e ao negro estamos sempre a voltar quando as formas e os movimentos se suspendem – como se fosse le noir du temps, o “negrume do tempo”, para citar outro dos pequenos filmes de Godard (Dans le Noir du Temps, dos anos 2000) cuja lembrança O Livro de Imagem convoca. E este é certamente, e de muitas maneiras, um filme sobre o “negrume do tempo”. Da “pedagogia” vem também aquele momento em que Godard elabora sobre a diferença entre a melodia e o contraponto. Esse é também o seu método, a dissonância. Método e preocupação, souci: é preciso que haja “contradição”. É uma forma de ver, por exemplo, o longo (e o mais contínuo) segmento do Livro de Imagem, aquele em que, apoiado na narração de excertos de um livro de Albert Cossery, Godard se detém sobre o Médio Oriente e o mundo árabe, entre alusões à conflituosa política da região (veladas referências à Palestina e a Israel) e a uma memória mais ou menos mítica e romântica (a “Arabia Felix”): o mundo árabe como “contradição” do mundo ocidental, “excepção” ameaçada pela “regra”, de uma forma que faz lembrar o nada eufórico filme que fez a seguir à queda do Muro de Berlim (Allemagne, Neuf Zéro), onde também se tratava de registar a aniquilação de uma “contradição”, de uma “dissonância”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Expressões da violência da História, com certeza. E esse é o grande tema do Livro de Imagem. Imagens da guerra e da violência, tiradas da ficção mas também tiradas da “história” (velhos filmes de actualidades ou reportagens televisivas), sucedem-se e prolongam-se umas nas noutras, como naquele raccord (absolutamente genial) em que à imagem de um caça da II Guerra decorado com uma pintura de dentes de tubarão se sucede a bocarra de um verdadeiro tubarão (que até podia vir do filme de Spielberg). Este violento diálogo com a violência, que também tem a forma de um diálogo do cinema com o mundo, subjaz ao filme todo, mas há uma espécie de bizarra (e irónica) conformação – e para isso Godard serve-se de passagens dos escritos de Joseph de Maistre, filósofo francês reaccionário e “ultramontano”, que explicou (ou aceitou) a Revolução Francesa como um “castigo de Deus”. Daí o carácter “sagrado” da própria revolução, mas também a natureza “divina” da guerra e da violência, mencionadas em frases dispersas ao longo do filme e que assim, descontextualizadas, têm um alcance poético (ou “poético-político”) bastante vasto, ao trazerem a violência, a necessidade do castigo (“o carrasco é a pedra angular da sociedade”, ouve-se também, sempre a partir de Maistre), para o coração da História e para o coração do mundo. Que pode o cinema perante isso, perante a História e perante essa violência? Pouco, esboroa-se: O Livro de Imagem também é um relato do embate do cinema com a História (a do século XX, incluindo as primeiras décadas do século XXI), embate violento que resulta numa multitude de fragmentos desfigurados. Porque as “imagens do cinema”, não raras vezes, são violentadas na mesa de mistura, cortadas aos pedaços, as proporções e dimensões alteradas, as cores desbotadas, queimadas. O cinema arde, aqui, talvez por falta de lugar, talvez por se ter tornado inútil, talvez por se ter tornado “arte” (como também se ouve dizer, quando uma actividade continua a ser praticada depois de ter perdido a sua utilidade torna-se numa “arte”, e depois desaparece – e parece evidente que Godard se refere ao cinema e ao seu “desmembramento”, que ele acelera, trabalhando por vezes como se tivesse por base uma compilação de clips do YouTube da pior qualidade). Mas é uma fogueira de uma beleza inexcedível, na quantidade de raccords, rimas, contradições, leitmotivs (os comboios, que tanto “chamam” a memória do Holocausto, e as mãos, na sua ambiguidade essencial: as mãos que “acusam”, as mãos que “trabalham”) extraídos por Godard da sua montagem, do diálogo de imagens com imagens, imagens com sons, sons com sons (sendo que o trabalho de som é uma coisa assombrosa, sobretudo na sua versão para salas equipadas com o sistema 7. 1, o que não é o caso do Cinema Ideal, que mostrará uma versão preparada para Godard para salas com sistemas tecnologicamente menos avançados – o filme está lá todo, o som também, a relação do espectador com eles é que muda, torna-se mais “intelectual” e menos “sensorial”, e já agora convém notar quão peculiar é o facto de ser um cineasta de 88 anos, a partir do seu atelier caseiro, a puxar os limites da tecnologia a um ponto quase insustentável). Tudo isto, mas também ele próprio, Godard, que mais uma vez filma duma posição de “solidão” e de “fim”. Tema poético antigo, certamente caro ao recanto mais romântico da sua alma, mas aqui um pouco mais do que apenas poético. Está off, a sua voz está escondida por cima do edcrã, mas pelo ecrã passa pelo menos uma imagem dele, aquela fotografia de infância que fora a imagem central de JLG/JLG, o “auto-retrato de Dezembro” nos anos 90; ou a memória de amigos e companheiros (as efigies de Rivette e Rohmer); ou as mulheres, Karina no princípio, vinda do anos 60, a despedir-se (“je ne t’embrasse pas tendrement”), e perto do fim o nome e a voz de Anne-Marie Miéville. Mas é uma imagem de “substituição” a imagem mais poderosa que Godard traz de si para dentro do filme, naquele final onde os planos da dança e da síncope de um dos protagonistas do Le Plaisir de Max Ophuls tomam conta do ecrã, em silêncio, depois da voz de Godard se ter debatido com um ataque de tosse (em si mesmo, o momento mais pungente do filme) enquanto fala das “ardentes esperanças”. Também elas ardem, também a si próprio o velho cineasta lança fogo, como se por via das imagens de Ophuls encenasse o seu desaparecimento. Só faz lembrar uma coisa: a “auto-encenação” do seu desaparecimento que Manoel de Oliveira fazia em Visita ou Memórias e Confissões. Em Oliveira ficava um ecrã branco, em Godard fica um ecrã negro.
REFERÊNCIAS:
ONU abre investigação à conduta israelita nos protestos em Gaza
O responsável pelos direitos humanos da ONU disse que a acção das autoridades israelitas, que causaram a morte a mais de cem palestinianos, foi “totalmente desproporcionada”. (...)

ONU abre investigação à conduta israelita nos protestos em Gaza
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: O responsável pelos direitos humanos da ONU disse que a acção das autoridades israelitas, que causaram a morte a mais de cem palestinianos, foi “totalmente desproporcionada”.
TEXTO: O Conselho de Direitos Humanos da ONU deu luz verde à abertura de uma investigação à forma como as forças de segurança israelitas dos protestos organizados pelos habitantes da Faixa de Gaza e que causou 106 mortos desde 30 de Março - só num dia, o da inauguração da embaixada dos EUA em Jerusalém, 60 foram mortos. O alto-representante das Nações Unidas para os direitos humanos, Zeid Raad al-Hussein, considerou a acção das forças israelitas “totalmente desproporcionada”, acrescentando que há “poucas provas” de que as autoridades tenham tentado minimizar o número de vítimas - apesar de os EUA defenderem que Israel actuou com "moderação". Hussein disse que a resposta israelita aos protestos pode ter incluído “execuções intencionais”, o que representa uma violação da Quarta Convenção de Genebra, que protege civis em territórios ocupados. O dirigente dirigiu também um apelo para o Governo israelita para que acabe com a ocupação dos territórios palestinianos. Os habitantes de Gaza “estão, essencialmente, presos numa lixeira tóxica desde o nascimento até à morte, privados de dignidade, desumanizados pelas autoridades israelitas a um ponto em que parece que os responsáveis não consideram que estes homens e mulheres têm direito, bem como todas as razões, para protestar”. “Acabem com a ocupação e a violência e a insegurança irão desaparecer quase por completo”, acrescentou. Numa sessão convocada por vários Estados árabes, o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou o “envio urgente de uma comissão de inquérito internacional e independente” para apurar potenciais abusos cometidos pelas forças israelitas. A resolução foi rejeitada pelos EUA e pela Austrália, apoiada por 29 dos 47 membros deste órgão. Catorze países, incluindo o Reino Unido, a Alemanha e o Japão, abstiveram-se. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Esta sexta-feira houve manifestações de apoio aos palestinianos e condenação de Israel em vários países muçulmanos. Em istambul, na Turquia, o Presidente Recep Tayyip Erdogan, que tem criticado alto e bom som Israel, participou no protesto pediu a todo o mundo muçulmano que apoie os muçulmanos face ao que classificou como a crueldade israelita. Criticou tanto os Estados Unidos com a ONU por causa da morte dos manifestantes em Gaza. Erdogan é um populista com raízes no islão político, que descrevem a acção do exército israelita como um "genocício" e chamou a Israel "um Estado terrorista".
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU EUA
Bienal de Coimbra fica com parte de Santa Clara-a-Nova
Protocolo entre autarquia e Estado vai permitir utilização de parte do mosteiro nas próximas edições do Anozero (...)

Bienal de Coimbra fica com parte de Santa Clara-a-Nova
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Protocolo entre autarquia e Estado vai permitir utilização de parte do mosteiro nas próximas edições do Anozero
TEXTO: A Câmara Municipal de Coimbra (CMC) aprovou nesta segunda-feira uma medida que vai permitir ao Anozero – Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra regressar ao mosteiro de Santa Clara-a-Nova. Os vereadores deram luz verde a um protocolo entre a CMC, o Estado português e o Turismo de Portugal para que parte do edifício que se encontra no lote dos imóveis do programa Revive seja afectada à realização da bienal que é produzida pelo Círculo de Artes Plásticas de Coimbra. O programa Revive tem como objectivo promover a requalificação de imóveis históricos na posse do Estado, através de concessões a privados para fins de exploração turística. Não ficou estabelecido que parte do mosteiro poderá ser utilizada pela bienal. Essa divisão será feita “em termos a acordar entre o Estado e o município”, informou a vereadora da Cultura, Carina Gomes, que acrescentou que têm decorrido reuniões de trabalho com várias entidades governamentais. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O edifício que foi construído para albergar uma ordem religiosa e que mais tarde serviu de instalação militar tinha já sido utilizado pela bienal na última edição, em 2017, sendo que o director o curador da edição de 2019, Agnaldo Farias, já tinha demonstrado interesse em utilizar novamente aquele espaço, mesmo que de forma parcial. Actualmente, uma parte do complexo monástico que começou a ser construído no século XVII continua a ser propriedade da Confraria da Rainha Santa Isabel e a outra, incluída no programa Revive, está devoluta. A medida foi aprovada com os votos da maioria dos vereadores, excepto Francisco Queirós, da CDU, que se absteve. O responsável entende o mosteiro de Santa Clara-a-Nova deveria ser retirado do programa Revive e que a totalidade do sua área poderia ser utilizado para usufruto da cidade, para instalar residências artísticas e de espaços museológicos ou artísticos.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cultura rainha
Von Wong, de engenheiro a “artivista” em busca da próxima história com impacto social
Aos 32 anos, Benjamin Von Wong cria campanhas artísticas virais com impacto social positivo que misturam a fantasia com a realidade. Através de crowdsourcing e em colaboração com pessoas "muito mais interessantes" que ele. (...)

Von Wong, de engenheiro a “artivista” em busca da próxima história com impacto social
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.016
DATA: 2018-12-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Aos 32 anos, Benjamin Von Wong cria campanhas artísticas virais com impacto social positivo que misturam a fantasia com a realidade. Através de crowdsourcing e em colaboração com pessoas "muito mais interessantes" que ele.
TEXTO: Von Wong tem duas versões para a sua história. Aquela que o engenheiro feito "artivista" “conta ao mundo” e a que merece ser contada e ouvida: “o relato do que realmente aconteceu” desde que, há seis anos, um engenheiro de minas “promissor”, mas “profundamente aborrecido”, comprou uma câmara fotográfica (no rescaldo de um desgosto amoroso). Esta última é a versão que tropeça em incertezas, projectos falhados e planos alterados mais vezes do que seria desejado — os mesmos que Benjamin se senta a contar ao P3, horas antes de subir ao palco do National Geographic Exodus Aveiro Fest, que decorreu no fim-de-semana de 1 e 2 de Dezembro. O festival reuniu conhecidos fotógrafos e videógrafos de viagem e aventura no Centro de Congressos de Aveiro e ele, o único que “não encaixava em nenhuma das categorias”, sussurra, sentia-se “a pessoa estranha na sala”. Benjamin Von Wong, 32 anos, desenvolve campanhas artísticas virais com impacto social. "Extravagantes, únicas, partilháveis", enumera, em jeito de mantra. Através de imagens conceptuais e hiper-realistas, em cenários fantasiosos quase retirados da ficção-científica que ele mesmo cria com o que tiver à mão, alerta para o excesso do lixo electrónico, o (ab)uso dos plásticos descartáveis, a contaminação das microfibras sintéticas, a poluição provocada pela indústria da roupa rápida. Tanto os materiais como as dezenas de voluntários, artistas, organizações, associações com que colabora e sofás onde muitas vezes dorme são conseguidos por crowdsourcing, através de apelos nas redes sociais e de comentários da comunidade online que luta por juntar. Exemplo: "Estou em São Francisco, com quem é que devo trabalhar?"“As pessoas gostam de fazer parte de algo maior que elas. Posso não conhecer ninguém quando chego a uma cidade, mas só é preciso uma pessoa que acredite em ti para que o projecto se alinhe, já que toda a gente conhece sempre alguém”, disse à Adobe, quando o blog da empresa que detém o Photoshop o descreveu como a "personificação de uma nova geração de criativos”. Ficaram impressionados com a energia, entusiasmo e rapidez com que o artista “constrói algo do nada”. O canadiano nem tão pouco se vê como fotógrafo — antes, considera-se um “criativo” ou "artivista" (alguém que usa a arte como activismo). Mais ainda porque, agora, planeia pousar a câmara e focar-se em instalações artísticas. Deixou de ver a fotografia como a forma "mais eficaz de conseguir criar impacto”, conta. Para o artista, “o problema com a fotografia e com todo o conteúdo digital é a saturação de conteúdos e distribuição algorítmica”. Ou seja: “Não importa o quão bom o teu trabalho é, só vai ser popular durante um dia ou dois. E se tiveres sorte. ”Com as instalações que agora planeia erigir, primeiro no Egipto e em Janeiro no Vietname, recorrendo a cem mil palhinhas, quer “poder construir um só mundo para depois toda a gente com uma câmara poder tirar uma fotografia". E, assim, consigo escalar o impacto. Talvez. Talvez não. "Não sei porque ainda não experimentei”, esquiva-se, entre risos. Vai andar por estes dias no Egipto, a tentar construir “o armário mais alto do mundo”. Imagina-o com dez metros para que lá dentro se exponha “a quantidade absurda de roupa que usamos durante a vida toda” (Ben usa quase todos os dias as mesmas peças de roupa: umas calças pretas largas e uma camisola com o seu nome e logótipo). Já em Abril último, Von Wong chamou a atenção para o mesmo tema com o projecto Clothing The Loop, em colaboração com o movimento global Fashion Revolution. Com a ajuda de 45 voluntários, armados com máscaras, encheu um armazém abandonado no Camboja com os milhares de sacos de roupa inacabada que a fábrica que ali existia deixou para trás, depois de falir. A ideia: resgatar 2500 quilogramas de tecido no qual ninguém tocava há dez anos. A mesma quantidade de roupa que, em média, uma pessoa usa durante a sua vida e que, “muitas vezes, fica esquecida no armário”. Os panos foram pendurados de forma a simular um tornado (para mostrar o quão “destrutiva e poluente é a indústria de moda rápida”), uma cascata (“São precisos 2700 litros de água para fazer uma só t-shirt de algodão. ”) e uma árvore (“Sabias que 70 milhões de árvores são cortadas todos os anos para fazer a roupa que usamos?”). Metáforas que ele depois imortalizou numa fotografia. “Ouvir estas estatísticas é uma coisa, mas ficar cara a cara com elas é outra. É esmagador ficar tão perto da verdade”, comentou, ao ver a instalação, Laura François, a coordenadora da Fashion Revolution em Singapura que encontrou o armazém abandonado depois de Benjamin lhe ter pedido para “procurar o maior monte de roupas que conseguisse”. É este o modus operandi do artista: “Tudo o que faço é andar constantemente à procura de pessoas interessantes para depois lhes dizer ‘Ei, vamos fazer alguma coisa juntos’”. Como se coleccionasse peças de um puzzle. “Falo com muita gente para perceber em que é que estão a trabalhar, o que é que gostam, quem conhecem, com o quê que se preocupam. Colecciono as informações como um esquilo a coleccionar nozes e depois planto-as na esperança que algumas delas cresçam para algo, sendo que a maior parte delas se perdem. Muito do meu trabalho é fazer o melhor com o que tenho. ”Enveredou pela Engenharia porque, aos 17 anos, “não tinha nada melhor para fazer”. O pai até era engenheiro e o programa de minas “era o que pagava melhor e tinha as melhores oportunidades de viagens”, mas depois de três anos e meio a trabalhar como consultor numa mina em Nevada, abandonou a área. Apercebeu-se que não se imaginava a fazer o mesmo, dez anos depois. “E que por isso devia começar a pensar no que queria realmente fazer. ”Antes de se despedir da empresa de consultoria, já tirava fotografias depois do trabalho e aos fins-de-semana. Usava a sua primeira máquina, que comprou depois de uma rapariga lhe ter dito que, entre eles, estava tudo acabado (e ele, com menos de 21 anos, “ainda não podia beber para esquecer"). Na altura, “só queria viajar” e arranjou uma forma de o fazer sem gastar muito dinheiro: “Dava um workshop [de fotografia ou produção], tinha um voo grátis, ganhava algum dinheiro, esperava até alguém me convidar para o próximo local e repetia. Porquê parar?”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Estava ainda no capítulo um: “Von Wong, o fotógrafo louco” (que começou por falhar logo ao tentar fotografar o céu estrelado). Como não sabia falar com modelos, retratava-se a si mesmo, cobria eventos, aventurava-se no Photoshop, nos efeitos especiais, no cosplay, levava a câmara para todo o lado, aprendia com tutoriais e versões trial de programas de edição. Por ter “aprendido tanto na Internet” é que partilhar, até os "falhanços", faz parte do seu processo criativo: tem vídeos a explicar, por exemplo, como é que para tirar uma fotografia pegou fogo a uma pessoa, pendurou ciclistas e corredores amadores num arranha-céus para a Nike ou amarrou uma modelo aos destroços de um barco em Bali, 30 metros debaixo de água. "Fiz muitas destas coisas por nada mais do que ser criativo, ser reconhecido e pago. Mas depois de perceber como é que podia ser pago como fotógrafo comercial, fartei-me disso. " Entramos noutro capítulo: Von Wong, o "artivista" que só procura e aceita projectos com impacto social positivo. E que, a cada um deles, "perde a esperança". "Na vida real acho que estamos lixados, mas tento sempre mostrar um lado mais optimista e encorajador no meu trabalho", confidencia. "Parece fazer mais sentido tentar deixar o mundo melhor, do que simplesmente não tentar de todo. Isto é a base do que faço", ri-se, a medo.
REFERÊNCIAS:
“O Salvador tem qualquer coisa de carismático.” Vai uma aposta?
O país que nunca ganhou a Eurovisão está céptico, mas a peculiaridade do vencedor do Festival da Canção pode ser o ingrediente da fórmula indecifrável. Nas casas de apostas, Salvador Sobral é o oitavo favorito à vitória final na capital ucraniana. (...)

“O Salvador tem qualquer coisa de carismático.” Vai uma aposta?
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.5
DATA: 2017-03-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: O país que nunca ganhou a Eurovisão está céptico, mas a peculiaridade do vencedor do Festival da Canção pode ser o ingrediente da fórmula indecifrável. Nas casas de apostas, Salvador Sobral é o oitavo favorito à vitória final na capital ucraniana.
TEXTO: Não teve um espectáculo de luzes impressionante, dispensou grandes efeitos e subiu ao palco sem bailarinos e com uma balada. A escolha de Salvador Sobral para representar Portugal na Eurovisão, após a vitória de Amar pelos dois, está a dividir os fãs do Festival da Canção. Há muitos que duvidam do impacto que um tema que foge ao lado mais festivaleiro do concurso televisivo pode ter em Kiev. Não só. Da indumentária ao comprimento do cabelo e aos gestos que acompanharam a interpretação, são vários os comentários negativos sobre a actuação no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, no passado domingo. No entanto, as casas que aceitam apostas para a Eurovisão e apresentam já probabilidades de vitória de cada concorrente dão ao cantor português números que podem surpreender os mais cépticos, quando comparados com 2015, o ano mais recente em que houve portugueses a concorrer. O Oddschecker, que agrega as probabilidades dadas de 27 sites de apostas online (embora a maior parte não tenha apostas abertas para o concurso da capital ucraniana), põe Salvador Sobral como oitavo favorito. Um feito histórico, nota Rasmus Petersen, um dos responsáveis pelo site de fãs Eurovisions World, tendo em conta que em 2015 a música a concurso — Há um mar que nos separa, de Leonor Andrade — não conseguiu subir para lá da 27. ª posição no ranking das apostas internacionais reunidas pelo mesmo site. Em primeiro lugar está a Itália, seguida pela Suécia e pela Rússia (mesmo que os concorrentes destes dois países ainda não estejam escolhidos; acima de Salvador Sobral e com participante já seleccionado estão cinco países). Seja nas casas de apostas, seja no YouTube, Amar pelos dois está a ganhar dimensão. Esta terça-feira ao final da tarde, o vídeo da meia-final contava mais 607 mil visualizações. Já o momento da final conta com outras 336 mil visualizações. A cantora Filipa Sousa — que em 2012 representou Portugal em Baku, Azerbaijão (com Vida minha), e integrou um dos júris regionais da edição deste ano do Festival da Canção — diz ao PÚBLICO que, no meio do brilho da Eurovisão, quem se distingue é quem leva para o palco algo que o diferencie dos países concorrentes dos outros países. “O festival tem vindo a primar pela diferença, como foi Conchita ou o grupo de idosas que, no meu ano, representou a Rússia”, lembra. “Não sei até que ponto é que esta balada, que é tão simples, tão bonita, tão despida de tudo, não tem esse factor diferenciador. ”Inês Santos partilha da mesma opinião. A cantora, que também serviu como jurada regional no domingo e que participou na Eurovisão em 1998 como voz do grupo Alma Lusa (o tema era Se eu te pudesse abraçar), antecipa até o silêncio da arena em Kiev. “Esta canção pode surpreender exactamente pela diferença e acredito também que esta conjuga melhor voz, melhor interpretação, arranjo e composição, e que levar uma canção de qualidade devia ser sempre o nosso melhor trunfo. Quanto mais não seja, para, com orgulho, dizermos ‘somos portugueses’”, sublinha ao PÚBLICO. Em resposta às críticas feitas a Amar pelos dois, Filipa Sousa nota que “vai ser sempre complicado levar uma canção” dentro dos cânones da Eurovisão “que não seja pimba”. A cantora elogia por isso a música que, “de longe”, foi “a melhor em termos de qualidade e de interpretação do cantor”. “Nota-se à primeira vista que o Salvador tem qualquer coisa de carismático” e isso, acredita, deverá “cativar a comunicação social e os fãs” do festival. “Em democracia, é natural que surjam opiniões contraditórias acerca de quem deve ser o nosso representante em Kiev”, observa Inês Santos. “O que já me custa a aceitar é a falta de educação, o 'achincalhamento' e o mal dizer gratuito, só porque a canção escolhida não era a da preferência de A ou B. ” “É do conhecimento geral que o nosso representante atravessa um problema de saúde complicado, pelo que tenho que lhe dar os parabéns pelo profissionalismo e desejar rápidas melhoras”, destaca ainda a antiga concorrente. No festival internacional, não é apenas a canção que está em competição. “É difícil competir com as grandes potências e com os países que se ajudam entre si”, lembra Inês Santos, recordando também “as boas canções pop, mais alegres e mais de acordo com a ideia pré-concebida do que é uma canção festivaleira" que se apresentaram a concurso no passado. “Não sou nada contra levar uma canção pop/electrónica, desde que seja muitíssimo bem produzida e muito bem cantada”, diz. "Mas a Eurovisão não deve ser uma fábrica de produtos que se regem por fórmulas. "“[Apesar de todas as opiniões e todos os comentários, ] não há fórmulas certas e nós, portugueses, já tentámos várias e nem por isso fomos mais bem sucedidos nos últimos anos”, sublinha a cantora. “Em 1998 fiquei em 13. º lugar com Se eu te pudesse abraçar, uma canção com raízes e sonoridades tipicamente portuguesas, que foi uma excelente classificação, mas acredito que nesse mesmo ano a Eurovisão deu uma grande viragem, e nem por isso para melhor. Defenderei, sempre, que devemos levar algo de qualidade e que nos represente. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Filipa Sousa admite que não houve nenhum tema do Festival da Canção que “ficasse imediatamente no ouvido”. No entanto, Amar pelos dois “é aquela que tinha o conjunto mais bem conseguido”. “As pessoas têm falta de sensibilidade”, critica, referindo-se aos comentários que tem lido. “O que interessa é criticar e vê-se claramente que as pessoas não têm acompanhado os anos anteriores. Já se fez com bandas ao vivo e não correu bem”, exemplifica. Sobre a experiência enquanto membro do júri Filipa Sousa assinala a dificuldade da tarefa, uma vez que exige uma avaliação “à canção em si, ao gosto pessoal, ao que merece vencer o Festival da Canção e ao que poderá funcionar melhor lá fora e colocar tudo na mesma balança”. A cantora acredita que Salvador Sobral “pode ser uma surpresa” e deixa conselhos ao representante desta edição: ir aos eventos que antecedem o festival, “uma pré-Eurovisão”, onde os concorrentes se dão a conhecer a grande parte da comunicação social e aos fãs do festival.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave educação social cantora
12 facadas de raiva e um alerta geral
Quando a civilização recua, por um milímetro que seja, avança sempre a barbárie; silenciosa, sob múltiplas capas. (...)

12 facadas de raiva e um alerta geral
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.22
DATA: 2018-10-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Quando a civilização recua, por um milímetro que seja, avança sempre a barbárie; silenciosa, sob múltiplas capas.
TEXTO: Um homem de 36 anos matou com 12 facadas um de 63, foi notícia no Brasil. O assassinato ocorreu no Estado da Bahia, no dia 8 de Outubro, e em si não difere muito de outras notícias dos últimos anos. Basta correr o Google por minutos para deparar com várias. Paraná, 2011: “Homem mata esposa com 22 facadas e chama a polícia”; São Paulo, 2016: “Homem mata mulher com 22 facadas”; Teresina, 2017: “Homem é morto com 22 facadas e arrastado para matagal”; Jacobina, 2018: “Suspeito de matar mulher grávida com 22 facadas é preso”; Mato Grosso, 2018: “Homem é morto com 22 facadas em Santa Margarida”. Até mesmo em Portugal, dois dias antes do crime na Bahia, lemos esta notícia: “Homem morre esfaqueado após discussão sobre o Benfica-FC Porto em Salvaterra de Magos. ” Crimes, todos eles, a pretexto de futebóis ou ciúmes, reveladores do lado mais negro da condição humana. O caso da Bahia, porém, suscita outro tipo de reflexão. Foi numa discussão política que um matou o outro, e pelas costas, 12 facadas de raiva que trazem em si as sementes de um ódio antigo. Que não é só brasileiro, é universal, vem do início dos tempos, e se nalguns momentos o vamos domando, noutros ressurge-nos ao caminho como fera sedenta de vingança e sangue. A vítima apoiava Haddad e o PT, o assassino gritava por Bolsonaro. De cada um dos lados, há uma legião de cidadãos que se vão histericamente desumanizando em acusações, gritos, ameaças, reacendendo antigos ódios ou criando novos, recuando anos ou mesmo décadas num grau de civilização que se julgava adquirido. Puro engano: nada o é. Na Europa dos anos terríveis da II Guerra Mundial, mesmo antes de ela ser declarada, o escritor austríaco Stefan Zweig, homem cordato e educadíssimo, via com pasmo e horror como pessoas de educação idêntica à sua se tornavam monstros à medida que o fanatismo delas se apossava, desenfreado, insultando-se ou agredindo-se fisicamente em lugar de discutirem como dantes. Todo esse ódio, irracional e flamejante, fez das cidades campos de batalha e mortes sem fim. Zweig, que ironicamente se suicidou no Brasil (onde até vivia em paz, embora atormentado com o rumo que levava a sua amada Europa), escreveu em O Mundo de Ontem (1942): “O povo alemão, um povo desejoso de ordem, não sabia o que fazer com a sua liberdade e já lançava os olhos, com impaciência, para aqueles que haviam de lha tirar. ” Quantas vezes já vimos isto, depois da guerra? E em quantos países? Quando a civilização recua, por um milímetro que seja, avança sempre a barbárie; silenciosa, sob múltiplas capas, nas mais das vezes aparentemente inofensivas ou até risíveis (ninguém levava Hitler a sério, no início). Multiplicam-se, nos últimos dias, apelos contra Bolsonaro. Mas pior do que Bolsonaro é o vírus do ódio que à sua sombra vai alastrando, cada vez mais ameaçador e fanfarrão. Se olharmos para Espanha, esse mesmo ódio latente ressoa nos comícios da Vox. Ainda não agridem ninguém, fisicamente, mas dêem-lhe espaço de manobra e verão as garras do velho monstro. No Brasil, temos nas 12 facadas de raiva um “programa” de futuro. O homicida defendeu-se com a política, claro. Foi a política que matou o velho mestre de capoeira, ele foi apenas o executor. Defensor do PT, mereceria todos os ódios, as facadas, a morte. É nisto que estamos, milénios depois de termos evoluído de vulgares bichos? Pobres de nós. A propósito do seu livro Caros Fanáticos, recém-lançado em Portugal, o escritor israelita Amos Oz disse há dias ao PÚBLICO o seguinte: “Os problemas estão a tornar-se mais complicados e muitas pessoas procuram respostas muito simples; procuram respostas de uma frase, capazes de pôr tudo na ordem; frases que nos digam quem são os maus, quem são os inimigos, quem são os perigosos. Acham que se souberem isso o paraíso pode vir. ” Ora, como avisadamente escreveu o poeta e romancista alemão Hölderlin, “a terra nunca se parece tanto com o inferno como quando os seres humanos tentam fazer dela o céu. ”Há quarenta anos, em 1978, a cantora brasileira Alcione gravou a canção Alerta Geral, que era mesmo um “alerta geral” pela identidade musical brasileira. Dizia assim: “Como viver calada/ Se também sofro as dores da situação/ Cada dia mais difícil de cantar/ Minha gente não concebe/ Mais chorar/ E eu, cantora popular/ Tenho minha obrigação/ Com toda essa nação// Alertar o povo inteiro/ Provar que ri melhor/ Quem sorri primeiro. ” Mesmo que não seja fácil ao Brasil, talvez sorrindo possa mudar o futuro.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave crime morte guerra humanos educação mulher negro homem assassinato morto cantora
Ainda te lembras quando a palavra do ano era um emoji? A de 2018 é, digamos assim, tóxica
A Oxford Dictionaries escolheu a palavra ''toxic'' para palavra do ano. O vocábulo expandiu o seu alcance em 2018, sendo usada principalmente para acompanhar outras palavras. (...)

Ainda te lembras quando a palavra do ano era um emoji? A de 2018 é, digamos assim, tóxica
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-19 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181219183711/https://www.publico.pt/n1851210
SUMÁRIO: A Oxford Dictionaries escolheu a palavra ''toxic'' para palavra do ano. O vocábulo expandiu o seu alcance em 2018, sendo usada principalmente para acompanhar outras palavras.
TEXTO: Em 2015, a Oxford Dictionaries escolhia para palavra do ano um emoji que chora a rir, mas este ano o caso muda de figura. 2018 é tóxico, ou pelo menos é assim que o define a empresa que elegeu ''toxic" como a palavra internacional do ano. A palavra Oxford do ano é sempre um vocábulo ou expressão que é escolhida por reflectir os hábitos, costumes, humor ou preocupações do ano em questão e que tem potencial para permanecer como termo duradouro com significado cultural. A Oxford Dictionaries explica que houve um grande aumento no interesse e na procura pela palavra no site dos dicionários durante este ano. A escolha da palavra não passou, porém, apenas por razões estatísticas, mas também pela grande variedade de contextos em que foi usada: de conversas sobre venenos tóxicos a reclamações sobre discursos políticos venenosos e até ao #MeToo, por causa da expressão "masculinidade tóxica" usada pelo movimento. "Toxic" foi também usada em assuntos que ganharam grande atenção mediática, como o caso do envenenamento do ex-espião russo Sergei Skripal no Reino Unido ou das acusações de tentativa de violação de que Brett Kavanaugh, agora juiz do Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América, foi alvo. Em 2018, "toxic" ganhou novos significados, principalmente acompanhada de outros vocábulos, tornando-se o adjectivo perfeito para comentar para os tópicos mais falados do ano. Do top 10 de palavras que mais frequentemente acompanharam ''toxic'' durante este ano constam vocábulos como "chemical", "masculinity", "environment", "relationship", "culture", "waste", "algae" e, por fim, "air". A palavra tóxico provém do latim toxicum e foi usada pela pela primeira vez em inglês em meados do século XVII para significar algo "envenenado" ou "imbuído de veneno". Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na corrida para palavra do ano estavam também vocábulos como “incel”, um homem involuntariamente celibatário que tem opiniões hostis em relação às mulheres, “gaslighting”, uma forma de manipulação psicológica que faz a vítima duvidar da sua própria sanidade mental, "overtourism", a presença de demasiados turistas numa determinada cidade ou país, e "cakeism", a doutrina de "manter um bolo e comê-lo também (da expressão inglesa "you can't have your cake and eat it"), a propósito das negociações do "Brexit". Em 2017, a Oxford Dictionaries escolheu como palavra do ano “Youthquake", expressão que traduz uma mudança social, cultural ou política significativa consequente das acções ou influência das gerações mais jovens.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave tribunal homem social violação mulheres