Team Sky perde patrocinador e fica com futuro incerto
Cadeia televisiva que financia a equipa irá terminar envolvimento no ciclismo no final de 2019. Formação procura novos investidores para a temporada que terá início em 2020. (...)

Team Sky perde patrocinador e fica com futuro incerto
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.15
DATA: 2018-12-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Cadeia televisiva que financia a equipa irá terminar envolvimento no ciclismo no final de 2019. Formação procura novos investidores para a temporada que terá início em 2020.
TEXTO: Depois de oito anos ao mais alto nível, a Team Sky — que venceu o Tour de França por seis ocasiões, soma uma conquista no Giro de Itália e uma Vuelta em Espanha — vai deixar de existir. A Sky, cadeia televisiva britânica, anunciou que terminará todo o envolvimento da empresa com o ciclismo no final da temporada de 2019. A Comcast — gigante norte-americana de telecomunicações — tomou conta da empresa britânica em Setembro, numa manobra que ultrapassou os 33 mil milhões de euros e que deixou no ar a decisão que acabou por ser anunciada aos ciclistas na noite de terça-feira, em Maiorca, no centro de treinos da Team Sky. Citado pelo The Guardian, Dave Brailsford, director-geral da formação britânica, deixou uma palavra aos ciclistas da Team Sky, admitindo a esperança de que, em 2020, o colectivo percorra as estradas sob um novo patrocinador: “Enquanto a Sky vai deixar o ciclismo no final de 2019, a equipa está de mente aberta em relação ao futuro e ao potencial de trabalhar com um novo parceiro, caso a oportunidade surja”. Dave Brailsford — que está na formação desde o primeiro momento — acredita que este contratempo não terá repercussões no desempenho da equipa na derradeira temporada: “Não estamos acabados, de maneira nenhuma. Ainda temos um ano de corrida à nossa frente e faremos o possível para continuarmos a dar sucessos à Team Sky em 2019”. A equipa criada em 2010 tinha um objectivo claro: levar um corredor britânico à vitória do Tour, prova rainha do ciclismo a nível internacional. A montanha não foi tão difícil de escalar quanto se pensava. Em apenas duas temporadas, a Team Sky conseguiu que Bradley Wiggins mantivesse a camisola amarela até ao final da competição gaulesa que marcou o primeiro triunfo britânico na prova. Em 2012, Chris Froome, outro dos corredores da Team Sky, terminou no segundo lugar do pódio mas, na temporada seguinte, ocupou o lugar maior em Paris. Com o primeiro triunfo na Volta a França, o ciclista britânico deu início a um período vencedor no Tour, que se estendeu com três vitórias seguidas (2015, 2016 e 2017). O terceiro triunfo consecutivo para a equipa na prova gaulesa coincidiu com a vitória na Vuelta, também com a assinatura de Froome. A hegemonia da formação britânica causava mal-estar junto das restantes equipas do pelotão. Philippe Mauduit, antigo corredor e director desportivo da UAE Team Emirates mostrou-se descontente, em entrevista ao site Cycling Weekly, com a força dos britânicos: “O principal problema é a forma como eles ganham: não é de forma espectacular. Tudo o que fazem é da mesma forma, com muita arrogância e com um maço de notas no bolso que mostram a toda a gente”. Apenas sete anos após ter sido criada, a formação da Sky dominava as estradas europeias, alicerçada no forte apoio económico do patrocinador. A cadeia televisiva investiu mais de 150 milhões de libras (165 milhões de euros) na equipa, quantia que transformou a Team Sky na mais rica do pelotão. Na temporada passada (2018), houve sucesso em dose dupla para a equipa de Dave Brailsford: vitória no Tour por Geraint Thomas e o primeiro triunfo no Giro de Itália, por Chris Froome. Depois da primeira vitória britânica no Tour — protagonizada por Bradley Wiggins — um relatório parlamentar sugeriu que o corredor, com o conhecimento e auxílio da Team Sky, usou substâncias ilegais que contribuíram para a vitória na competição em 2012. Também Chris Froome, vencedor por quatro vezes do Tour, foi implicado em alegações de doping, depois de ter acusado um resultado positivo numa etapa da Volta a Espanha. A análise revelou um resultado positivo à substância salbutamol, um broncodilatador, segundo revelou em comunicado a União Ciclista Internacional (UCI). “A minha asma piorou na Volta e por isso segui o conselho da equipa médica para aumentar a dose de Salbutamol”, explicou o corredor, que acabaria por ser ilibado das acusações na investigação anti-doping. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O facto de não ter sido castigado não impediu, porém, que a reputação do britânico fosse severamente manchada. Chegou-se, inclusive, a falar do afastamento do ciclista do Tour de 2018, o que não se veio a confirmar. Chris Froome participou mas, pela primeira vez em quatro anos, não conseguiu levar para casa a vitória, que ficou para o colega de equipa Geraint Thomas. Os profissionais da Team Sky esperam, agora, pelo final da temporada e por um novo patrocinador, depois de oito anos como reis das estradas europeias.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave rainha
Dakar vai regressar ao Peru, cinco anos depois
Edição de 2018 da maior prova todo-o-terreno do mundo partirá de Lima e terminará em Córdoba. (...)

Dakar vai regressar ao Peru, cinco anos depois
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-03-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: Edição de 2018 da maior prova todo-o-terreno do mundo partirá de Lima e terminará em Córdoba.
TEXTO: A 40. ª edição do Rali Dakar arranca a 6 de Janeiro de 2018, no Peru, país que a prova não visitava desde 2013, antes de entrar na Bolívia e cortar a meta na Argentina, anunciou nesta quarta-feira a organização da prova. "O 10. º Dakar em solo sul-americano partirá de Lima, a 6 de Janeiro (de 2018), e terminará em Córdoba (na Argentina), a 20 de Janeiro", indicou Étienne Lavigne, director da prova-rainha de todo-o-terreno, numa conferência de imprensa realizada em Paris. A passagem pela Bolívia proporcionará várias aproximações ao Lago Titicaca, antes de ser cumprido um dia de descanso, em La Paz, e de uma abordagem do Altiplano boliviano - o maior do planeta depois do tibetano - "ligeiramente diferente" da dos anos anteriores. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. "Há cinco anos que não entramos no Peru, um país ao qual os participantes da nossa prova desejam regressar. Todos guardam boas recordações de etapas lá disputadas, tanto pela beleza desportiva, como paisagística", assinalou Lavigne. O Peru está a ser afectado por fortes chuvas, que estão a provocar inundações graves, em consequência do fenómeno climático conhecido por El Niño, que já tinha estado na base da retirada daquele país da edição de 2016. As datas e os percursos das etapas do Dakar de 2018, que, desde 2009, já passou por cinco países na América do Sul - Argentina, Chile, Peru, Paraguai e Bolívia -, serão apenas anunciadas em Novembro.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave rainha
Maratona do Porto com impacto de 12 milhões de euros
Organização baseia estimativa na participação de sete mil estrangeiros. (...)

Maratona do Porto com impacto de 12 milhões de euros
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Organização baseia estimativa na participação de sete mil estrangeiros.
TEXTO: A 15. ª maratona do Porto, que se realiza a 4 de Novembro, terá um "impacto económico de 12 milhões de euros", estimou a organização da prova, baseando-se numa participação de "sete mil estrangeiros". O evento foi apresentado esta terça-feira e deverá reunir perto de 16. 000 participantes nas três distâncias previstas: a maratona, com 42, 195 quilómetros, a Corrida dos Ossos Saudáveis, de 15 quilómetros, e a habitual caminhada de seis quilómetros destinada a "todas a classes etárias e sem fins competitivos". O director da corrida, Jorge Teixeira, destacou que a prova já possui o grau bronze e ambiciona subir de nível, tendo como objectivo imediato a prata, o que passa por ter mais e melhores atletas. Para o presidente da Federação Portuguesa de Atletismo, Jorge Vieira, esta é uma "excelente maratona, que ombreia com as melhores do mundo" e que este ano integra ainda o campeonato nacional da distância. Para aquele dirigente, a maratona do Porto "já tem praticamente as condições" para o grau ouro, o que a colocaria entre a elite mundial da distância. Os participantes estrangeiros representam 41% do total, provenientes de 71 países e em média permanecem na cidade cinco dias, daí resultando, segundo estima Jorge Teixeira, um "impacto económico de 12 milhões de euros". Com 970 inscritos, a França é o país estrangeiro mais representado no evento, seguindo-se a Espanha (535), a Itália (221), o Brasil (213) e a Alemanha (158). Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O melhor tempo entre os atletas inscritos na 15. ª Maratona do Porto é do queniano Richard Limo, com 2h06m45s, 149. º melhor resultado de sempre, seguindo-se o etíope Abraham Girma, com mais três segundos, 157. º do ranking mundial. Nos homens, a participação portuguesa será liderada por José Moreira (Sporting), Carlos Costa (CD S. Salvador do Campo), Mihail Lalev (Braga) e Paulo Gomes (Guilhovai), ao passo que nas mulheres o destaque vai para Filomena Costa (Jardim da Serra, da Madeira) e Carla Machado (Várzea, de Amarante). A 15. ª Maratona do Porto começa e acaba no Queimódromo, passando por Matosinhos e por Vila Nova de Gaia, desenrolando-se em grande parte ao longo da marginal marítima e fluvial dos três municípios.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens campo mulheres
Fica assustado quando ouve o nome “creatina”? Se calhar não devia…
Cada vez mais se tem visto a creatina como um suplemento não só para atletas mas também para idosos de forma a manter a massa e força muscular (e até eventualmente a massa óssea), mas também a performance cognitiva e memória a curto prazo. (...)

Fica assustado quando ouve o nome “creatina”? Se calhar não devia…
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Cada vez mais se tem visto a creatina como um suplemento não só para atletas mas também para idosos de forma a manter a massa e força muscular (e até eventualmente a massa óssea), mas também a performance cognitiva e memória a curto prazo.
TEXTO: Existem suplementos com boa reputação que não a merecem e outros que por mais que passem os anos e as notícias positivas sobre a sua utilização, não se conseguem desligar da sua reputação maldita. Por isso, o artigo de hoje é sobre o maior patinho feio dos suplementos, de seu nome creatina. Uns acham que faz mal aos rins, outros que causa calvície ou retenção de líquidos ou até que é só para quem faz musculação. Uma situação bastante irónica sobretudo quando em simultâneo existe a ingestão de outros suplementos da moda de eficácia bastante duvidosa (para usar um termo simpático) como a glutamina, CLA, L-Carnitina, Coenzima Q10 que ao invés da creatina continuam com uma opinião pública imaculada mesmo após anos de desilusões no que diz respeito à evidência científica dos seus resultados. A creatina é uma molécula produzida no nosso organismo a partir de três aminoácidos e que tem um papel decisivo na produção de energia, daí que as 80 a 130 g de creatina que possuímos no nosso corpo estejam localizadas principalmente no músculo e em pequena parte no cérebro, olhos e rins. Uma vez que as principais fontes alimentares de creatina se encontram na carne e no peixe, indivíduos que não ingerem estes alimentos com tanta frequência respondem melhor à sua suplementação. A creatina apesar de ser dos suplementos com mais anos de investigação e maior número de estudos, é sempre olhada com alguma desconfiança relativamente aos seus potenciais efeitos secundários. Como tal reunimos em seguida alguns dos mitos associados à suplementação com creatina:Não. Apesar de existirem alguns estudos de caso que observaram uma deterioração da função renal após a suplementação em creatina, é importante referir que num dos estudos o indivíduo em questão apenas tomava 15g de creatina semanalmente (5g em 3 dias), quantidade manifestamente baixa para causar algum tipo de problema, e para além disso ingeria diariamente suplementos multivitamínicos e termogénicos com vários extractos de ervas. Por isso, imputar este episódio apenas à creatina acaba por ser abusivo. Nos outros estudos, apesar de não existirem outros suplementos ou esteróides a serem utilizados concomitantemente, as quantidades usadas foram 20g/dia durante pelo menos 1 semana, protocolo de suplementação que apesar de historicamente ser usado como “fase de carga”, parece não fazer muito sentido aos dias de hoje. Por outro lado, um outro estudo de caso observou que estas mesmas 20g/dia num indivíduo já com uma elevada ingestão de proteína (2, 8g/kg/dia) e com apenas 1 rim, não exerceram nenhum tipo de alteração na função renal. Assim, muito possivelmente terão sido outros compostos presentes nos suplementos de creatina a desencadearem os episódios de nefrite e necrose aguda tubular a que se referiram os case studies acima citados. Mais uma razão para se optar uma versão de creatina que independentemente da marca escolhida, tenha segurança garantida nomeadamente na ausência de contaminantes com efeitos indesejados. Deixando de lado estes estudos de caso, quando olhamos para trabalhos com amostras maiores, é praticamente unânime que a suplementação com creatina não possui qualquer efeito nefasto na função renal (mesmo com 10g/dia durante 3 meses, ou durante 1 ano), nem em diabéticos tipo II (com 5g/dia), onde pode inclusivamente melhorar o seu controle glicémico. É importante perceber que os níveis sanguíneos de creatinina podem estar elevados quer pela suplementação com creatina, quer pela maior massa muscular do indivíduo, quer no caso da análise sanguínea ter sido feita poucas horas após o treino (algo comum em quem treina praticamente todos os dias). Como tal, níveis de creatinina um pouco acima dos valores de referência são normais em pessoas que cumpram estes requisitos atrás descritos e não são sinal de que os rins podem entrar em colapso a qualquer momento. Outros indicadores como a microalbuminúria e a cistatina C, são bem mais sensíveis e adequados à avaliação da função renal em atletas, mesmo que recreativos. Tal como falado para a função renal, existiu um estudo que observou um aumento de dihidrotestosterona após uma semana de suplementação com 25g/dia de creatina. Este metabolito da testosterona pode de facto levar ao encolhimento dos folículos capilares do couro cabeludo. Ainda assim, dos 13 ensaios clínicos que analisaram o efeito da creatina na testosterona, apenas 3 observaram diferenças ligeiras e sempre com quantidades acima das 20g/dia. Nenhum estudo investigou directamente o impacto da creatina na perda de cabelo e como tal essa ligação é muito abusiva. Convém não esquecer que um dos efeitos secundários que os esteróides anabolizantes possuem é justamente a queda de cabelo, sendo mais um dos casos em que não pode pagar a justa creatina pelos pecadores esteróides. Pode causar quando feita uma fase “de carga”. Isto é, quando se ingerem 20-25g por dia durante uma semana (ou 0, 3g/kg/dia). Dois estudos que suplementaram creatina nestas quantidades durante 1 semana, observaram um aumento até 1kg de peso total e até 2 litros de água corporal total. Como os benefícios da suplementação de creatina podem ser atingidos com quantidades bem abaixo destas (3 a 5g/dia, durante 1 mês), não é necessário arcar com este efeito indesejável decorrente desta suplementação. Que benefícios tem?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os principais benefícios associados à creatina sempre estiveram ligados ao rendimento desportivo em exercícios intermitentes de alta intensidade, força e potência muscular. Nos últimos tempos cada vez mais se tem visto a creatina como um suplemento não só para atletas mas também para idosos de forma a manter a massa e força muscular (e até eventualmente a massa óssea), mas também a performance cognitiva e memória a curto prazo tendo inclusive uma função antioxidante. Ou seja, a creatina não é um esteróide anabolizante, nas quantidades indicadas não causa nenhum dano renal, não deixa os homens sem cabelo, não aumenta a retenção de líquidos nas mulheres, é uma preciosa ajuda no treino da força e manutenção/aumento da massa muscular, e possui efeitos positivos na memória e função cognitiva em pessoas com stress crónico e em idosos. Se é obrigado a tomar? Logicamente que não. Mas sobretudo se for profissional de saúde, tente não assustar os seus pacientes (mais interessados e informados na área da suplementação), com o seu preconceito e falta de actualização científica sobre a creatina. Prefira antes educá-los a escolher uma marca segura e suplementar nas quantidades moderadas que não estão associadas a efeitos indesejáveis (3 a 5g por dia). E já agora, pode trocar neste último parágrafo a palavra “creatina” por “whey” (proteína do soro do leite) e a mensagem será praticamente igual.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens ajuda carne estudo mulheres corpo alimentos
O adeus do homem que destronou Michael Schumacher
O espanhol Fernando Alonso sai de cena da Fórmula 1, mas promete prosseguir a lenda nos palcos dos Nascar. (...)

O adeus do homem que destronou Michael Schumacher
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-27 | Jornal Público
SUMÁRIO: O espanhol Fernando Alonso sai de cena da Fórmula 1, mas promete prosseguir a lenda nos palcos dos Nascar.
TEXTO: Não se sabe ainda se é um “até já” ou o adeus definitivo e Fernando Alonso tem alimentado a dúvida. O piloto que muitos anteciparam viria a ser o melhor de sempre na Fórmula 1 sai de cena longe do topo. E menos arrogante do que quando destronou o mítico Michael Schumacher, em 2005 e 2006. “Não devo nada a ninguém”, sublinhou após festejar o primeiro dos seus dois títulos, menorizando o papel da equipa. Uma personalidade cáustica causou a Fernando Alonso dissabores e inúmeros conflitos ao longo de uma carreira pautada também por opções desastrosas. Aos 37 anos, o seu futuro próximo poderá passar pelas corridas de Nascar e pela conquista da denominada “Tripla Coroa” do automobilismo: vencer o Grande Prémio (GP) do Mónaco (já o fez por duas vezes); as 24 Horas de Le Mans (onde triunfou em Junho deste ano) e (o que ainda está em falta) as 500 Milhas de Indianapolis. Um feito só ainda alcançado pelo britânico Graham Hill. Mas recuemos 13 anos, até 25 de Dezembro de 2005, sem dúvida uma das datas mais felizes da vida de Alonso e de milhões de espanhóis. O piloto asturiano terminou em terceiro lugar o GP do Brasil e tornou-se no mais jovem (até então) a conquistar um Mundial. Tinha 24 anos e 59 dias. Foi também o primeiro título da Renault, que o espanhol representava desde 2003. Um sucesso tão mais saboroso por encerrar para sempre o longo domínio de Michael Schumacher na modalidade. Sem falsas modéstias, Fernando Alonso não teve pejo em chamar a si todos os louros. Uma entrada de rompante na galeria de notáveis da F1 que alcançaria contornos épicos na temporada seguinte. No ano em que iria despedir-se (pela primeira vez) da F1, Schumacher apostava na conquista do oitavo título, mas voltou a esbarrar com Alonso. Num duelo geracional que iria durar até à última corrida, o asturiano garantiu o bicampeonato, novamente no asfalto brasileiro. Perfilava-se uma nova dinastia na rainha das competições automóveis. “Foi fantástico lutar com o Michael, um privilégio para mim. Disse, em 2005, que era importante ser campeão enquanto o Michael ainda aqui estava […]. Os livros de história vão dizer que os dois últimos campeonatos em que ele [Schumacher] correu foram ganhos por Alonso”, concluiu no final da época. O que Fernando não anteciparia nesta altura é que o seu capítulo no livro de ouro da modalidade também ficaria encerrado com esta dupla façanha. A longa e inesperada queda começaria logo a seguir. Uma combinação letal entre azar e decisões fatais. Na temporada de 2007, o espanhol subiu na hierarquia da F1, trocando a Renault pela ambiciosa McLaren. Não teria sido uma má escolha, não fosse ter como colega de equipa um tal de Lewis Hamilton. Os êxitos do estreante inglês nas primeiras corridas desconcertaram Alonso e de nada serviu puxar dos galões de piloto principal. A “guerra” aberta entre os dois acabou por entregar o título de bandeja ao finlandês Kimi Räikkonen na derradeira prova. As polémicas com o patrão da equipa, Ron Dennis, chegaram à chantagem, com Alonso a ameaçar denunciar a McLaren por ter na sua posse informação técnica confidencial acerca da Ferrari. O caso, apelidado de “spygate” acabou por rebentar no final da temporada, retirando o título de construtores à McLaren, que ainda foi penalizada com uma multa a rondar os 100 milhões de euros. Sem condições para permanecer na escuderia britânica, o espanhol acabou por regressar à Renault. Ao serviço da marca francesa, sem argumentos competitivos para as equipas de topo, conquistou duas vitórias em 2008. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. No ano seguinte, não resistiu ao apelo da Ferrari, mas esta união, que durou até 2014, não travou a era do alemão Sebastian Vettel com a Red Bull (quatro títulos consecutivos entre 2010 e 2013) e o despontar do domínio da Mercedes, onde renascia Lewis Hamilton. O seu último triunfo remonta a 12 de Maio de 2013, no GP de Espanha. O 11. º ao serviço da Ferrari. Surpreendeu depois ao regressar à McLaren, em 2015, mas numa fase descendente da equipa inglesa. Nunca mais subiria a um pódio e o seu nome passou a ser mais comentado pelas polémicas e intermináveis desapontamentos. Este domingo encerrou, para já, o seu ciclo na F1, no GP de Abu Dhabi. O vencedor e campeão mundial Hamilton esqueceu as divergências na hora do adeus. “Fernando é uma verdadeira lenda. Foi um grande privilégio correr na mesma era que ele. Este desporto vai sentir a sua falta e eu vou sentir a falta dele neste desporto. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra rainha chantagem
Unicef diz que Portugal lidera em "saúde de qualidade" e "bem-estar" das crianças
No critério "erradicar a fome" entre as crianças o país sai-se mal. Mas aparece em primeiro lugar em matéria de saúde e "bem-estar", segundo estudo divulgado nesta quinta-feira. (...)

Unicef diz que Portugal lidera em "saúde de qualidade" e "bem-estar" das crianças
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: No critério "erradicar a fome" entre as crianças o país sai-se mal. Mas aparece em primeiro lugar em matéria de saúde e "bem-estar", segundo estudo divulgado nesta quinta-feira.
TEXTO: Portugal é o país que apresenta melhores índices de saúde de qualidade e bem-estar das crianças entre os Estados mais desenvolvidos, embora na classificação geral sobre situação das crianças apareça na 18. ª posição. Os números fazem parte do último relatório da Unicef sobre a situação das crianças nos 41 países considerados mais ricos, incluindo os da União Europeia e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Construir o Futuro: As crianças e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável nos países ricos é o tema do relatório, o primeiro que avalia a situação das crianças nesses 41 países relativamente aos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável identificados como os mais importantes para o bem-estar das crianças. Na posição 18 em termos gerais, Portugal aparece quase sempre em posições de pouco destaque, sendo a posição 32 a mais baixa, no critério "erradicar a fome". Já nos critérios "saúde de qualidade" e "bem-estar", e ainda no critério "consumo e produção responsáveis" o país está em 1. º. A posição cimeira é justificada por uma taxa de mortalidade neonatal baixa, uma taxa de suicídio de adolescentes também baixa e poucos casos de crianças entre 11 e 15 anos com problemas psicológicos. E depois tem também das taxas mais baixas (a segunda mais baixa) de crianças que consomem álcool e uma taxa a baixar acentuadamente de casos de gravidez na adolescência. De acordo com o documento, a 32. ª posição no critério "erradicar a fome e garantir uma alimentação de qualidade" indica que no país 18, 2% das crianças menores de 15 anos vivem com um adulto que enfrenta insegurança alimentar. Portugal tem também a quinta taxa de obesidade infantil mais elevada. No critério "erradicar a pobreza" o país aparece também baixo na tabela, com uma em cada quatro crianças a viver em pobreza de rendimentos relativa, diz-se no documento. Na "produção e consumo sustentáveis" Portugal é também país de topo, sendo aquele entre os 41 em que há maior proporção de jovens de 15 anos familiarizados com pelo menos cinco ou mais problemas ambientais. Sem liderar, o país tem também boa prestação em matérias como "igualdade do género" (6. ª percentagem mais baixa de mulheres jovens que dizem ter sofrido violência sexual), ou "cidades seguras e sustentáveis" (7. ª posição quanto à qualidade do ar). Mas Portugal cai depois para meio da tabela no critério "educação", avaliadas as competências em leitura, matemática e ciências, e na promoção de um "trabalho digno e crescimento económico" (26. º lugar), com 6, 1% dos jovens entre 15-19 anos que não estudam nem trabalham. Na "redução das desigualdades" o 27. º lugar indica grandes diferenças entre os salários mais altos e mais baixos do país, e na "promoção da paz, justiça e instituições eficazes" o mesmo lugar deve-se muito a actos de violência física ou psicológica. Portugal tem uma boa classificação (12. º lugar) quanto à taxa de suicídio de crianças (das mais baixas, 0, 25 por cada 100. 000 habitantes), mas a taxa dos que dizem ser alvo de bullying é a oitava mais elevada. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Em termos gerais, e sempre sobre os países mais ricos, o relatório da Unicef mostra por exemplo que uma em cada cinco crianças vive em pobreza relativa e que uma em cada oito enfrenta insegurança alimentar. Ou que mesmo em países como Japão e Finlândia cerca de um quinto dos adolescentes com 15 anos não tem níveis mínimos de competências em leitura, matemática e ciências. A tabela é positiva para os países nórdicos, a Alemanha e a Suíça, e menos positivos para os países mais pobres do grupo, como a Roménia, a Bulgária e o Chile. Na lista dos 41 países os Estados Unidos ocupam o lugar 37.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave violência suicídio educação fome consumo igualdade género sexual mulheres pobreza infantil
Nem contigo nem sem ti
Uma história de amor que atravessa as fronteiras da Guerra Fria, contada com enorme inteligência formal e narrativa. (...)

Nem contigo nem sem ti
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-11 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181011213248/https://www.publico.pt/1844375
SUMÁRIO: Uma história de amor que atravessa as fronteiras da Guerra Fria, contada com enorme inteligência formal e narrativa.
TEXTO: Foi preciso Pawel Pawlikowski regressar à sua Polónia natal depois de um início de carreira feito em Inglaterra para encontrar o “lugar” que até aí lhe escapara — Ida (2013), espécie de road movie austero e incisivo sobre uma noviça que descobre a verdade sobre o seu passado por entre as feridas por sarar do pós-Segunda Guerra Mundial, tornou-se numa sensação e valeu-lhe o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Guerra Fria, o sucessor que agora chega às nossas salas e saiu de Cannes 2018 com o prémio de realização, é um filme-irmão de Ida — partilha o mesmo preto e branco luminoso, a mesma janela de imagem 1. 33:1 que remete para o cinema dos primórdios, e, sobretudo, o mesmo olhar clínico, de panela de pressão, sobre a Polónia do pós-guerra. Realização: Pawel Pawlikowski Actor(es): Joanna Kulig, Tomasz Kot, Borys SzycA Guerra Fria a que o título se refere, contudo, não é apenas a guerra fria que acontece lá fora entre os aliados dos EUA e da URSS. É também a relação entre a Polónia do compromisso e a Polónia da liberdade, entre o coração e a cabeça, manifestada no romance impossível entre Zula e Wiktor, ele músico e director musical de um grupo folclórico que cedo se exila em Paris, ela cantora e bailarina e uma das integrantes do grupo que decide ficar na Polónia. É também o modo como, ao longo de 15 anos contados em “quadros” separados por cartões negros, cada um correspondendo a um período numa cidade, essa relação se desenvolve na ausência do outro, numa lógica de “não posso viver contigo mas não posso viver sem ti”, amplificada pelas fronteiras físicas e políticas que os afastam. Zula é uma espécie de jeune femme fatale, cuja entrada no filme sugere desde logo um ambiente de film noir, sobretudo quando compreendemos que Wiktor fica perdido de amores por ela — mas não estamos num filme negro desse género, antes num filme sobre como sobreviver quando à nossa volta tudo parece negro. E se Wiktor se sente aprisionado na sufocante Polónia controlada dos anos 1960, também Zula não se sente à vontade com a liberdade total à beira do Maio de 1968, como se tivesse trocado uma prisão por outra. A felicidade “a quente” é impossível para o casal neste mundo “a frio” — o que aliás fica bem definido no fabuloso, e muito Dreyeriano, plano final — porque o seu amor apenas pode existir “entre” os dois, num limbo neutro. Esse constante “braço de ferro” torna Guerra Fria num filme mais interessante, mais “ágil” do que Ida, mas também lhe tira algum foco, alguma tensão, como se ao “abrir o plano” para alargar o contexto e ao fazer estas viagens de ida e volta entre cidades e relações Pawlikowski dissipasse o lado compacto do filme anterior. O cineasta compensa isso com uma atenção cuidada à construção “musical” da narrativa — que vai da “etnografia primitiva” à sofisticação do jazz e da música pop, como uma aprendizagem do amor que se faz ao mesmo ritmo — e o resultado é um filme de uma enorme inteligência formal e narrativa.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
O apocalipse em San Sebastián
O sadomasoquismo e fetiches da burguesia. A ficção científica e o terror. In Fabric e High Life , dois dos filmes mais excitantes de 2018, foram programados pelo mais antigo festival de cinema da Península Ibérica e um dos mais antigos do mundo — e que talvez esteja a acordar de uma crise de identidade. (...)

O apocalipse em San Sebastián
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-13 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181013140819/http://publico.pt/1846548
SUMÁRIO: O sadomasoquismo e fetiches da burguesia. A ficção científica e o terror. In Fabric e High Life , dois dos filmes mais excitantes de 2018, foram programados pelo mais antigo festival de cinema da Península Ibérica e um dos mais antigos do mundo — e que talvez esteja a acordar de uma crise de identidade.
TEXTO: Há pouco mais de duas semanas, em San Sebastián, durante a conferência de imprensa que precedeu a entrega do prémio Donostia de reconhecimento pela sua carreira, Judi Dench falou da amizade que a unia a Kevin Spacey, desde que trabalharam juntos em The Shipping News, e lamentou a decisão de apagar a sua presença no filme que ele tinha acabado de rodar, quando surgiram as acusações de abuso sexual (Todo o Dinheiro do Mundo, onde foi substituído por Christopher Plummer). A intervenção de Dame Judi, oportuna crítica ao neopuritanismo disfarçado de conquista social que pretende reescrever a história retocando as imagens, foi citada pela BBC News referindo-se a declarações proferidas "num" festival de cinema em Espanha. Mais do que qualquer umbiguismo insular da imprensa britânica, este pormenor diz muito sobre a actual situação do mais antigo festival de cinema da Península Ibérica e um dos mais antigos do mundo. Criado em 1953, quando o regime de Franco se sentia já consolidado para procurar uma tímida aprovação internacional, foi elevado pela FIAPF (associação de produtores responsável pela regulação dos festivais internacionais de cinema) à categoria A em 1957, vindo-se assim a juntar ao restrito clube que à época incluía apenas Veneza, Cannes, Locarno e Berlim. Com um enquadramento geográfico privilegiado (importante porto de recreio e tradicional zona de veraneio, corredor de passagem entre a Península e o resto do continente) e beneficiando de um trabalho de programação criterioso que acolheu o melhor e mais moderno cinema que se fazia na altura, viu o seu prestígio aumentar rapidamente, sendo considerado, durante os anos 60 e princípio dos 70, um dos 4 ases dos festivais de cinema. As majors americanas não tardaram a utilizar San Sebastián como porta de entrada para a Europa (Vertigo e Intriga Internacional de Hitchcock tiveram lá a sua estreia internacional), e foi na bela cidade da "concha" que foi lançado muito cinema italiano (Germi, Risi, Lattuada), exibida muita da nouvelle vague francesa, dado a conhecer algum do cinema americano pré-New Hollywood mais interessante (Cinco Anos Depois, o belíssimo western e único filme dirigido por Marlon Brando, foi Concha de Ouro em 1961) ou sopraram os primeiros ventos que chegavam da Europa de Leste (Jiri Weiss, Roman Polanski). Entre 1969 e 1974, júris presididos por Josef Von Sternberg, Fritz Lang, King Vidor, Howard Hawks e Nicholas Ray premiaram filmes de Francis Ford Coppola (Chove no Meu Coração), Eric Rohmer (O Joelho de Claire), Victor Erice (O Espírito da Colmeia) e Terrence Malick (Noivos Sangrentos), o que não é dizer pouco da notoriedade que atingira na época o Festival de San Sebastián. A morte de Franco e o advento da democracia em 1975 trouxeram o fim da censura (o regime, na verdade, sempre havia feito "vista grossa" aos atentados aos costumes, preocupado que estava com a sua autopreservação e com os atentados da ETA), muita liberdade, mas também momentos conturbados, apostas hesitantes, dificuldades em reconhecer as novas tendências, o aparecimento de outros focos de interesse cinematográfico por toda a Espanha, o que veio a provocar profunda crise de identidade, que acabou por durar muito mais do que se poderia esperar. Até há pouco, San Sebastián parecia haver perdido o comboio dos outros grandes festivais. Tinha-se transformado apenas "num" festival de cinema no Norte de Espanha. Todavia, um festival que se atreveu a programar para esta edição que terminou no dia 29 de Setembro — não acantonando numa qualquer secção paralela para onde costumam ser relegados filmes de género ou vagamente experimentais, mas incluindo na sua selecção oficial — dois dos filmes mais estimulantes vistos em 2018, dentro ou fora de festivais, como In Fabric de Peter Strickland e High Life de Claire Denis, é um festival que não está moribundo, é um festival que parece afirmar que há que contar com ele. Mesmo que júris preguiçosos não o reconheçam, mesmo que seja difícil entender outras escolhas, o gesto é significativo. O britânico Peter Strickland prossegue o interesse pela revisita ao cinema de género, em particular o giallo, tornada explícita sobretudo a partir de O Som do Medo. A aparente diversidade temática da sua obra (uma mulher procura vingar-se dos homens que muitos anos antes a haviam violado; um engenheiro de som vê-se envolvido numa estranha aventura num estúdio de cinema de terror em Itália; a relação entre duas mulheres é levada aos limites do paroxismo por uma delas) não esconde alguns temas recorrentes que surgem de forma visível em In Fabric. Entre eles, o coleccionismo e o sadomasoquismo, fetiches da burguesia, aos quais não é estranho o mundo da moda, tema explicitamente central do seu mais recente filme. A história gira em torno da maldição de um vestido sobre as vidas de Sheila, uma mãe recém-divorciada, caixa de um banco, que vive com o filho adolescente pseudoartista, tendo também de aturar a invasiva namorada deste, e de Reg, um reparador de máquinas de lavar que festeja a sua despedida de solteiro, e a quem acontecem várias desgraças depois de se cruzarem com o referido vestido. Após notar que o sedutor vestido vermelho não só era de um tamanho que não lhe correspondia mas também lhe provocava uma crescente irritação de pele, Sheila regressa ao grande armazém onde o havia adquirido e dirige-se à mesma empregada que a havia atendido, e cuja aparência recorda a de um vampiro, que lhe conta que uma antiga modelo da loja havia sido assassinada depois de ter envergado o vestido. A atmosfera de estranheza adensa-se com a passagem desta empregada — através do monta cargas — ao submundo dos bastidores da moda, povoado de empregadas, modelos e manequins (que não só se satisfazem sexualmente como também alimentam ao voyeurismo masturbatório de um velho chefe) e que articulado com o mundo igualmente bizarro à superfície compõe um arriscado imaginário iconográfico cujo controlo Peter Strickland nunca perde. Confesso admirador de Lynch, é exímio em manejar os códigos do género, acabando por criar um universo próprio, cujo maneirismo não esconde uma crítica bem humorada e contundente do mundo capitalista. In Fabric é o seu filme mais ambicioso, simultaneamente surreal e sensual, impenetrável e fascinante. Os códigos do género são também utilizados — e não pela primeira vez — por Claire Denis, no seu primeiro filme inteiramente em língua inglesa, High Life. Regressa a temas que lhe são caros, os da paternidade e da transmissão, com o misto de amor e violência que frequentemente lhes estão associados. Desta feita, trata-se de uma fusão entre a ficção científica e o terror cronenberguiano, criando uma atmosfera claustrofóbica em que a referência temática é sobretudo a ficção científica literária dos anos 60. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A elíptica trama do filme divide-se em três tempos. O primeiro descreve a vida quotidiana numa nave espacial de Monte (Robert Pattinson), astronauta cujo único contacto humano é a filha pequena, de quem cuida com ternura nos intervalos da resolução dos problemas que vai detectando por entre as deambulações por corredores e compartimentos abandonados, que parecem saídos de uma estação espacial soviética dos anos 70. Um dos planos mais belos e terríveis surge quando Monte tem, por razões técnicas, de evacuar a sala de criogenização, libertando para o espaço os cadáveres do resto da tripulação. Essa descoberta macabra permite-nos passar à segunda parte, secção principal de uma série de flashbacks, memórias de quando a nave ainda contava com toda a tripulação, um grupo de reclusos perigosos recrutados para uma missão científica, provavelmente sem retorno, ao buraco negro mais próximo da Terra. O grupo parece ser dominado pela Drª Dibbs (Juliette Binoche), cientista de passado sombrio obcecada com o seu próprio programa experimental de inseminação artificial. O universo concentracionário de uma nave espacial é descrito por Denis com a sua característica combinação de sensualidade e violência, contendo algumas desabridas referências a fluidos corporais e uma das mais surpreendentes cenas de sexo "individual" que nos foi dado ver no cinema. A terceira secção volta a dar um salto temporal, naquilo que parece aproximar-se do "fim", onde encontramos Monte inexoravelmente acreditando na salvação da filha, agora adolescente. Claire Denis cria com aparente simplicidade uma das mais perturbantes e obsessivas entradas no género do "filme apocalíptico".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte homens filha violência filho mulher negro adolescente social sexo medo género sexual mulheres abuso
Cinco horas felizes na vida de um espectador de cinema
Quatro amigas, o seu percurso a solo ou em conjunto, em direcção à independência e à submissão aos homens. Ryusuke Hamaguchi é uma descoberta: um cinema pessoalíssimo, praticado com intenso rigor mas com uma imprevisibilidade igualmente intensa. Happy Hour: cinco horas felizes na vida de um espectador de cinema. (...)

Cinco horas felizes na vida de um espectador de cinema
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.8
DATA: 2018-10-13 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181013140819/http://publico.pt/1846014
SUMÁRIO: Quatro amigas, o seu percurso a solo ou em conjunto, em direcção à independência e à submissão aos homens. Ryusuke Hamaguchi é uma descoberta: um cinema pessoalíssimo, praticado com intenso rigor mas com uma imprevisibilidade igualmente intensa. Happy Hour: cinco horas felizes na vida de um espectador de cinema.
TEXTO: Happy Hour – A Hora Feliz assinala a entrada na distribuição portuguesa de Ryusuke Hamaguchi, cineasta japonês nascido em 1978. O filme já tem algum tempo, vem de 2015, mas depois dele Hamaguchi já realizou outro, Asako, apresentado no último Festival de Cannes e com exibição prevista para o próximo Leffest (seguindo-se, supõe-se, a estreia comercial). É verdadeiramente uma descoberta – um cinema pessoalíssimo, praticado com intenso rigor (na composição, no enquadramento, nos tempos internos de cada cena) mas com uma liberdade, ou imprevisibilidade, igualmente intensa: nunca sabemos, nem podemos dar por garantido, para onde seguiremos de uma cena para outra, nem podemos saber, à entrada em cada nova cena, se ela vai durar uns minutos ou umas dezenas de minutos. Realização: Ryûsuke Hamaguchi Actor(es): Sachie Tanaka, Hazuki Kikuchi, Maiko Mihara, Rira KawamuraA peculiar economia narrativa de Happy Hour é um dos seus factores distintivos. Totaliza cinco horas de duração em que nada parece a mais, e cinco horas que “sugam” o espectador para dentro das vidas das suas quatro protagonistas (e demais coadjuvantes) duma maneira misteriosa, magnética. Há ecos dos grandes filmes “femininos” que marcam alguns dos capítulos mais importantes do cinema japonês, por certo nada fortuitos num cineasta que – à conversa com o Ipsilon – se diz devoto da “santíssima trindade” (expressão nossa, não dele) da cinematografia nipónica, Kenji Mizoguchi, Yasujiro Ozu e Mikio Naruse. Mas há outros ecos que vêm irresistivelmente à memória, como as crónicas do ennui burguês de Antonioni (este filme podia chamar-se As Amigas, como o do italiano), e até já vimos críticos mais do que respeitáveis gizarem uma aproximação – favorecida por essa singular ruminação narrativa que Hamaguchi pratica, e que por vezes se pode acercar de uma lógica de série televisiva – ao Sexo e a Cidade. E são, de facto, histórias de libertação feminina. Histórias, no plural, porque cada uma das quatro amigas protagonistas tem o seu percurso a fazer, a solo ou em conjunto, e um movimento a fazer em direcção à independência e à submissão aos homens, mesmo se o preço a pagar (o final é bastante desolado e desolador) é uma solidão um tanto enevoado. É fácil esquecer, no final, porque entretanto passaram cinco horas, que o filme começara em tom festivo, as quatro amigas num piquenique nos arredores de Kobe (a cidade portuária em que toda a acção se passa) a fazerem brindes optimistas ao futuro – que “hoje”, ao contrário de épocas passadas, “é promissor para as mulheres de trinta e tal anos”. Impressionante é, ainda, o facto de todos os actores e actrizes (aparentemente sem excepção) serem amadores sem qualquer experiência prévia. O rigor da presença delas e deles quase torna incrível esta informação. Mas é um pormenor que entronca directamente na também singularíssima génese do filme, e é por aí que começamos a conversa com Hamaguchi. Sabemos, porque se lê isso na internet, que Happy Hour começou a germinar num workshop de “expressão corporal” (à falta de melhor termo) que o realizador orientou em Kobe. “Veio na sequência da catástrofe de 2011, o tsunami que afectou as regiões costeiras do Japão [o mesmo que provocou o desastre nuclear de Fukushima)]”. Hamaguchi foi então a Kobe fazer uma série de entrevistas com pessoas que tinham sido directamente afectadas pelo tsunami – “pessoas que tinham perdido parte importante das suas vidas”. Descobriu então que para essas pessoas havia algo de libertador, de catártico, no acto de relatarem as suas histórias pessoais. Partiu-se daí para o workshop – “eram cinquenta pessoas, sem qualquer experiência de actor, que se reuniam aos fins de semana”. Ao fim de quatro meses, conta, começou a nascer a ideia de um filme, “ainda sem contornos definidos”. Seleccionou 17 dos participantes, para um filme que ainda não tinha, diz ele, “uma imagem definida”, mas tinha um título, chamar-se-ia Noivas (a explicação da mudança de título, para Happy Hour, Hora Feliz, está contida numas das cenas mais impressionantes e é quase auto-explicativa). Trabalhou mais oito meses, com actores e argumentistas, e foi ao longo desse período que o filme começou a tomar. Com contributo directo das protagonistas: “estas quatro actrizes destacaram-se, e centrar o filme nelas foi a opção natural”. Transportavam um optimismo e uma determinação – “de começarem uma coisa nova” – que se transmitiu à narrativa, como um testemunho em que Hamaguchi pegou para desenvolver o argumento, e “as personalidades das actrizes influenciaram decididamente cada uma das personagens”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. No filme ficou um resquício do workshop. Uma longa cena, ainda na parte inicial, onde as protagonistas e outras mulheres praticam uma série de exercícios físicos e mentais, guiadas por um “guru” (personagem masculina que voltará a aparecer mais tarde, aliás como várias outras que vão aparecendo e desaparecendo para aparecerem outra vez, agora com uma ambiguidade pouco consentânea com a figura de mestre da auto-ajuda que nesta cena desempenha). É uma meia-hora inteira em que ficamos ali, a ver a sucessão de exercícios praticados na aula – uma espécie de performance que reproduz muito do trabalho feito no workshop, e diz-nos Hamaguchi que tinha 8 horas filmadas com material, depois reduzidas na montagem aos cerca de trinta minutos que a cena tem. Por falar em tempo, a ideia inicial previa uma duração “clássica”, cerca de duas horas, “mas o trabalho com os actores, as indicações e as sugestões deles para o arco das suas personagens, obrigaram a sucessivas reescritas e ampliações do argumento”, até se fixar nas duas horas. O carácter de performance estampado nessa cena é como que rimado por outras, igualmente muito longas, que também se situam entre uma espécie de teatro e um exercício de endurance – as cenas do tribunal, onde uma das mulheres tenta obter uma autorização de divórcio, ou outra, formidável, na sessão de leitura pública de um livro de poemas (que se chama Vapor e por alguma razão também nos parece que podia ser um bom título para o filme). A sequência do tribunal, especialmente, por focar a dificuldade de obtenção do divórcio por parte da mulher (sendo o marido bastante possessivo e orgulhoso), põe em cena de maneira muito explícita a questão da condição feminina no Japão contemporâneo, que é o tema que subjaz ao filme inteiro. Diz Hamaguchi: “À partida não tinha nenhuma intenção de fazer uma ilustração sociológica, nem pretendia que o filme fosse um retrato da sociedade japonesa, mas como tentámos ser tão realistas quanto possível esses temas começaram a entrar”. As histórias das actrizes, ou que as actrizes traziam para as personagens, começaram a fazê-lo pensar “nas coisas diferentes que o Japão dá aos homens e às mulheres”, e o filme tornou-se numa reflexão “sobre os lugares distintos que uns e outros ocupam na sociedade japonesa”. Também esta impressão de justeza, afiada como um bisturi, contribui para o clima muito particular que se respira em Happy Hour. Que ninguém se assuste com as cinco horas – são “cinco horas felizes” na vida de um espectador de cinema, que quase sem perceber como dá por si a respirar os ares de Kobe, entre o mar e as montanhas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens tribunal mulher ajuda sexo espécie mulheres japonês feminina divórcio
Xavier Giannoli: “A beleza da fé é essa decisão apesar da dúvida”
A Aparição tem um insólito par: um repórter de guerra que persegue os factos exteriores e uma vidente que se encerra na sua interioridade. Uma vibrante aliança entre a fé e a dúvida. Que acorda no filme o mistério. (...)

Xavier Giannoli: “A beleza da fé é essa decisão apesar da dúvida”
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-13 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181013140819/http://publico.pt/1845462
SUMÁRIO: A Aparição tem um insólito par: um repórter de guerra que persegue os factos exteriores e uma vidente que se encerra na sua interioridade. Uma vibrante aliança entre a fé e a dúvida. Que acorda no filme o mistério.
TEXTO: Singular “casal” este: um repórter de guerra e uma vidente. Não é excessivo elogiar a forma como A Aparição, de Xavier Giannoli, os constitui como “par” — é preciso entender isto, do “par”, sem expectativas fáceis. Isto é: A Aparição recebe de um só gesto um homem que corre atrás dos factos, para ele a única verdade, sem possibilidades de versões, e a rapariga que se encerra no mistério de ter sido visitada pela Virgem. Ele é Jacques Mayano (Vincent Lindon) e Anna (Galatéa Bellugi) vai ser uma “aparição”. Jacques foi contactado pela Comissão de Inquérito Canónico do Vaticano (sequências rodadas nos locais de Habemus Papam, o filme de Nanni Moretti) para investigar a verdade ou a falsidade de Anna. Quando alguém no início de A Aparição (a partir de dia 11 em distribuição comercial), diz: “Anna está entre nós” — apresentando a vidente às centenas que a querem ver e tocar —, o estremecimento dessa sequência dá conta de uma nova experiência para Jacques: o invisível. Uma nova dimensão, um refúgio, um consolo, abre-se às negociações que as solitárias personagens de Lindon estabelecem com a violência do mundo e da realidade, colocando um céptico mais próximo da fé, do desejo de crença, em comparação com o cinismo dos “homens da Igreja”. Não é só a Jacques que Anna aparece: pela graça de Galatéa Bellugi, pela sua “presença” tão física e disponível e ao mesmo tempo tão indecifrável, Anna passa a estar entre nós, espectadores. Por isso, e pela sensualidade de um percurso por sombras à espera de uma luz (como nos filmes do cinema americano “da paranóia” dos anos 70 em que as personagens eram ultrapassadas, quando não mesmo devoradas, pelo que investigavam), este filme-inquérito dilui muitas das armadilhas do filme de tese e de ideias — o cinéma plaidoyer que, de André Cayatte a Bertrand Tavernier, foi cultivado pelo cinema francês “do meio”, tradição em que Giannoli se insere, que o fez já ser capaz de charme (Quand J’étais chanteur, 2006), que não evitou que fosse museológico (Marguerite, 2015), e que, com a colaboração do argumentista Jacques Fieschi, colaborador de Claude Sautet nos filmes finais, revigora com uma vibrante aliança entre a fé e a dúvida. Acordando no filme um mistério. Alguém diz no filme: “Não sou crente, mas algo se passa. . . ” Todo o filme está contido nessa frase. É crente?Sim, tive educação cristã, fiz o catecismo. Dou um passo em frente em relação à personagem do filme, que é alguém mais céptico do que eu. Lembro-me, quando era escuteiro, de ter ido a Lourdes aos 10 anos e de ter sentido que não estava num lugar onde talvez se tivesse passado alguma coisa — estava num lugar onde evidentemente acontecera alguma coisa. Cresci numa família cristã, o meu pai é praticante, servi à missa. Sou praticante? A minha forma de ser praticante é através do pensamento. Sou habitado pelo questionamento, da fé, da importância dos valores cristãos. O meu problema é com a solução católica, mas isso não tem que ver com a fé cristã. Mas, tendo dito isto, sinto um tumulto. Lembro-me de em criança o meu confessor dizer: “Xavier, não esqueças que os olhos do Senhor estão sobre ti. ” Na verdade, vivia essa frase como uma ameaça, como se me vigiassem. Mas hoje, e sobretudo depois de ter feito A Aparição, entendo a frase ao contrário: como uma mãe que tem os olhos sobre mim e que me protege. Passei da sensação de ameaça para algo como: “Não te inquietes, os olhos do Senhor protegem-te. ” Na verdade, fiz o filme para isso. É verdade que a personagem de Vincent Lindon é habitada pelo cepticismo. Mas sendo ele um jornalista que quer saber de factos, sentimo-lo próximo da fé, da necessidade de crença, ao contrário dos homens da Igreja, mais cínicos sobre o que se passa. Sabe como expliquei aos meus actores como eram ou como viviam os homens da comissão de inquérito? “Imaginem que são críticos de cinema, que vão de festival em festival, conversam: ‘Acredito no filme do Paul Thomas Anderson. ’ ‘Eu não, aborreci-me’. . . Ao mesmo tempo são pessoas que têm fé no cinema. ” Quando ouviram isso, os meus actores disseram: “Já compreendemos. ”Não queria fazer um filme que fizesse proselitismo, mas também não queria fazer um filme que gozasse. Queria encontrar um olhar justo. Evidentemente que há uma emoção religiosa, encarnada pela jovem vidente, mas ao mesmo tempo há um questionamento pela razão. Numa época em que tanto se fala de fanatismo e histeria religiosa, há aquela mulher que diz: “A fé é uma decisão livre e esclarecida. ” Achei importante dizer isso hoje. Há idólatras no filme, o tipo que vende ícones. Ao mesmo tempo os bispos têm palavras sábias e críticas sobre a Igreja: “Estamos longe do homem descalço que pregava aos pobres. ” Quis filmar padres que não são iluminados, que são pessoas que têm uma relação com a fé que me interessa. Todas as pessoas têm a sua hipótese no filme. Há quem viva a fé em estado de exaltação, há quem a viva em reclusão, há quem, ao ir atrás de um mistério, acorde em si o mistério, como a personagem de Lindon. . . . e dessa forma o filme faz coabitar os mundos de personagens que estariam afastadas. Com o mesmo gesto, A Aparição está com Lindon, o jornalista céptico, e com Galatéa Bellugi, a vidente. . . . . . porque tenho os dois em mim. Começamos do lado de Lindon, olhamos para a vidente e perguntamos: “Vamos descobrir o que ela anda a fabricar”. . . . . . será que é uma mentirosa?. . . . . . nunca sentimos que mente. Estamos também com ela. É a minha relação com as personagens. Talvez isso venha da minha educação cristã: interessam-me as razões de toda a gente. Interessa-me que o filme procure vestígios de humanidade em cada personagem. Não julgo. Não quero ser ingénuo, mas não quero gozar. Essas duas personagens estão em mim. Há uma parte de mim que vai em direcção a um desejo de recolhimento, que dá importância à oração, à interioridade, que olha para o céu, simplesmente. E há uma parte que duvida, que resiste. E os dois dialogam. Antes pensava que esse diálogo era uma coisa má, porque me sentia incapaz de fazer uma escolha, mas é isso, a contradição, que humaniza. Hoje sei, depois de falar muito sobre o filme, que essas personagens expõem a contradição que me habita. O filme foi escrito para Vincent Lindon. Escrever para o actor significa o quê?Conhecia-o. E isso basta para fazer um filme. Pelo que conhecia dele, da sua vida social, sabia que ele afirma um desejo de honestidade. Tem um olhar crítico sobre a mentira política, sobre a mentira social, sobre a hipocrisia. Tem uma moral de actor — mesmo quando lhe oferecem muito dinheiro, se não gosta dos valores da personagem, não faz o filme. E, sobretudo, é alguém do princípio da verdade, não suporta que lhe mintam, que o aldrabem. Não é um intelectual, não se perde em discursos, é um tipo franco, concreto, directo, mesmo quando toma a palavra. Encarnava uma exigência de verdade. Era perfeito para o papel. Uma coisa interessante que ele me disse: “Tenho vontade de acreditar nas pessoas que acreditam. ”E essa vontade habita a personagem. Sim, não é um cínico. Não é a história de um homem a quem esta rapariga vai abrir os olhos. Pelo contrário, ela vai fechar-lhe os olhos, vai fazê-lo descobrir um universo interior e a beleza do mistério. A vida dele é esclarecer mistérios, é encontrar factos e provas, mas pela primeira vez encontra-se com alguém que, em vez de lhe revelar, um mistério mostra-lhe o seu limite: sendo jornalista, homem de factos, vai sentir a beleza de uma questão para a qual não há resposta. Lindon participou na escrita do filme?Falávamos, enquanto eu escrevia. Dava-me prazer vê-lo, vê-lo mexer-se — um prazer de cineasta. Falava-lhe dos meandros da personagem. Ele dava opiniões. Mas ele é assim, também esteve presente na montagem. Não há actor em França tão envolvido num papel como ele. Já esteve com ele?Sim, por causa de A Lei do Mercado. . . É uma pessoa devorada por tiques. Mas quando se diz “acção. . . ”. . . eles desaparecem. . . Imagina a intensidade do que se passa quando começa a interpretar? Isso significa que há algo de incrivelmente profundo que acontece. Não sei o que é. Permanece um mistério. Realização: Xavier Giannoli Actor(es): Vincent Lindon, Galatéa Bellugi, Patrick d'Assumçao, Elina LöwensohnHá em Vincent Lindon, pelo seu corpo, pela sua maneira de estar, qualquer coisa de sensual e carnal. A sensação de que não lhe podemos mentir. Ele está do lado da procura da verdade, no seu jogo de actor e na sua relação com os outros. Como um actor assim imagino que era difícil encontrar uma actriz. . . Foi a maior emoção da minha vida de realizador quando me deram um disco com os castings das actrizes. Vincent e eu decidimos que se não encontrássemos a rapariga não haveria filme. Estávamos em pânico. Deram-me o disco, não gosto nada das apresentações, “bom dia, chamo-me. . . ”, passei à cena. Era aquela em que a personagem conta a aparição. Parecia material de arquivo. Mostrei a Vincent. Nem discutimos, o que foi inquietante, porque ela “apareceu” rapidamente, no primeiro mês de casting, quando eu tinha previsto seis meses. . . Nesse primeiro mês ela veio ao escritório fazer o casting e foi-se embora. Lembro-me de a ter visto passar por lá. Mas foi quando vi a cena. . . não tive dúvida, foi um dom do céu. Mas é isso o que se passa na primeira sequência em que ela aparece. . . Queria que se sentisse que ela estava a ser ultrapassada por tudo. Isso era fundamental para a personagem ser comovente. Poderíamos crer ser a tomada de um benefício social em mãos, ela como estrela, mas ela não quer isso. A partir do momento em que sente a engrenagem nos bastidores, regressa a si própria e à sinceridade da sua fé. Não está confortável com os idólatras, há uma pureza a não querer ser comprometida. Quando filmávamos essa cena, foi impressionante: 350 figurantes. Vimos documentários sobre aparições, sobre Fátima por exemplo, e havia um enorme fervor nas pessoas. Queríamos que isso passasse. Há uma coisa especial nesta actriz: ela guarda para si o seu próprio mistério. Não suporto os actores que contam a sua vida, as suas histórias de cama, onde vão em férias, o barco que alugam. . . O actor deve guardar o seu mistério, deve existir só nas personagens. Vincent também é assim. E ela. . . não sei nada dela. Tinha de ser alguém desconhecido. E evidente. Ela tinha as duas qualidades. Além disso, é uma actriz genial, porque não sei mesmo se é actriz. Não sei o que interpretava. Para mim ela foi a personagem. Em momento algum a vi fabricar. Ela vinha, fazia, ficava bem, “obrigado Galatea, até amanhã”, e partia. Foi mesmo uma aparição para si e para Vincent Lindon. . . . . . Sim, sim. Não tinha a mesma cumplicidade com ela. Nunca jantei ou almocei com ela. De propósito?Sim, passava o dia a pensar nela, a enquadrá-la e a filmá-la, a olhar para ela, a procurar cinema na sua presença, mas não tive outro contacto com ela. Não sei se é crente ou não. Se gosta de rapazes ou de raparigas. Não quero saber. É uma das questões do filme: prefiro o pudor e o segredo à familiaridade e à transparência. Ela tem algo de secreto e de impenetrável. É um cliché do cinema essa coisa de o realizador fazer de Pigmalião com as jovens actrizes. Não sou assim, não tive uma relação de sedução com ela, nem ela comigo. Penso que gostamos um do outro. Mas partilhamos um segredo, essa personagem, e não queríamos falar disso. Há uma sequência de quatro minutos com ela. O meu montador dizia: “É longa de mais. ” “Não”, respondi, “vamos aguentar o mais tempo possível. ” Era fascinante. Ela contava qualquer coisa e era como se estivéssemos a ver essa qualquer coisa. Era um efeito de mise-en-scène que me interessava: ela conta que estava a andar, que via luzes, que pensava que era o sol sobre as rochas, descreve e “vemos”. Se lhe perguntasse qual o género do filme. . . . . . é um filme de inquérito. Mas a partir de certa altura, quer ser outra coisa. Sim, o filme espera outra coisa. O realizador e argumentista espera perder-se. É o que espera a minha personagem, que a investigação lhe escape. Dizia a mim próprio que esperava que este homem fosse ultrapassado pelo seu inquérito. Várias vezes os meus filmes contam histórias de personagens ultrapassadas pelas situações que criam, como em À L’Origine [2009]. Gosto dessa sensação como espectador. Por isso pensei num certo cinema americano dos anos 70, em que as personagens são desviadas dos inquéritos a que se propunham e tocadas por aquilo que queriam investigar ou expor. São essas as minhas referências. Há, para além disso, O Exorcista. O livro de William Peter Blatty e o filme de William Friedkin tiveram grande influência: aquela jovem habitada não se sabe por quem ou pelo quê, que se chama Regan [personagem interpretada por Linda Blair]. Todas as cenas em que a personagem feminina do meu filme é levada ao hospital vêm de O Exorcista: a ciência e todos aqueles padres a tentarem entender e a serem ultrapassados pelo mistério dessa rapariga. O momento mais misterioso e místico de O Exorcista é antes de o diabo se manifestar. Tudo isto começou por um acaso. Num jornal contava-se que o papa Francisco não dava o seu ponto de vista sobre as aparições em Medjugorje, na ex-Jugoslávia, a que vão todos os anos centenas de milhares de peregrinos. Foi então nomeada uma comissão de inquérito canónica — a primeira vez que vi essa designação. Descobri que era formada por bispos, médicos, para reconhecerem um facto sobrenatural ou para desmascararem uma impostura. Esse confronto entre um inquérito policial e um grande mistério corresponde a forças que lutam em mim: um desejo de adesão, porque é a minha cultura e educação, a um mistério e ao mesmo tempo qualquer coisa de céptico. Encomendei livros, entre os quais Faussaires de Dieu de Joachim Bouflet, que se vê no filme, em que ele enumera as falsas aparições, e ainda Medjugorje ou La fabrication du surnaturel, em que é muito crítico. Telefonei-lhe, por acaso ele habitava perto de mim, e disse-me logo que se trata de um universo muito secreto, que não podia dar-me documentos, tinha um dever de reserva — o que me deu mais vontade de mergulhar. . . —, dizendo-me ainda que a Igreja preferia passar ao lado de um milagre do que reconhecer uma impostura. Ao dizer isso é como se reconhecesse que há fenómenos verdadeiros: ou seja, sábio e crítico, ao mesmo tempo reconhecendo que há qualquer coisa. Um dia, estava em Lisboa e fui a Fátima. Depois fui a Lourdes. E pensei: em vez de fazer como Jean-Pierre Mocky em Le Miraculé (1987), gozando, vou fazer com aquilo que sou: alguém que reconhece que talvez se possa passar qualquer coisa, mas que tem dificuldades na adesão. Precisou da Igreja para o inquérito do filme?Não, tive necessidade da Igreja para falar com padres sobre essas questões. Percebi que as aparições dividem muito a Igreja, que não há idolatria, que tem uma relação distante. . . Falei com padres, crentes, fiéis. A um padre disse-lhe: “Você é mais forte do que eu, no momento da morte acreditará na vida eterna. ” Ele olhou-me como um miúdo: “No momento de morrer direi: ‘Espero não me ter enganado. ’” Essa frase perturbou-me. A beleza da fé é essa decisão, apesar da dúvida. Em momentos de fanatismo parece que não somos livres de acreditar. O que me choca no islão é não haver direito a renunciar a ser muçulmano. Uma religião que nos condena à morte, se decidimos sair dela. . . Pelo contrário, não quis reduzir o questionamento religioso à caricatura. Não sou reaccionário, não sou conservador, não sou de direita, e, no entanto, coloco-me questões. [O escritor] Michel Houellebecq fala muito de cristianismo nos seus livros e numa entrevista disse algo que para mim é uma bomba: se o cristianismo fosse uma religião de Estado em França, não haveria problemas de assimilação dos muçulmanos. Há uma histeria laica em França. Mas há algo a fazer e o meu filme é sobre isso: respeitar a laicidade, mas admitir que é possível o mistério. Espantam-me os debates na TV francesa em que os intelectuais dizem chocados que há raízes cristãs no país. Chocados, porque, segundo eles, está aí a razão por os muçulmanos não serem bem aceites no país. Ora, é o contrário: é por causa disso que os muçulmanos devem encontrar o seu lugar. O que quis explicar no filme é que há muita gente que vive o questionamento no segredo dos seus corações, de forma pudica e secreta, não de forma política e guerrilheira. O bruá mediático leva os debates à caricatura. A crença e a fé são uma matéria de tal modo sensível, tão contaditória e tão humana, que tinha necessidade de fazer um filme que se reapropriasse do lado íntimo dessas questões e que não fizesse com isso uma questão política e social que terminasse em insultos. Por isso comecei com uma imagem de televisão e com a morte de um fotógrafo: é um “fechemos os olhos”. O filme começa assim com a televisão e com o Daesh, a actualidade, e termina no deserto com um desejo de eternidade. Falando com Bertrand Tavenier. . . . . . o meu protector, o meu padrinho. . . Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. . . . sobre Jacques Becker e outros, falando de um cinema sobre pessoas e para as pessoas — um cinema desaparecido. Ele dizia: “Não desapareceu, há exemplos em França, por exemplo. . . ” E disse o seu nome. Não compreendo a oposição entre cinema de autor e cinema de público. Os grandes cineastas que me fascinam nunca colocaram essa questão. Antes de tudo, o cinema é uma arte impura. O que gosto em Apocalypse Now é que é um filme de um louco obsessivo [Francis Coppola] e ao mesmo tempo uma ópera grande público. O que gosto em Taxi Driver é que é a obra de um homem alimentado por uma cultura elitista — Scorsese fala de cineastas como Bresson — e simultaneamente quer ser uma grande obra popular. Isso é uma questão política: o povo torna-se forçosamente vulgar quando se fala de arte? Mas nesse caso Mozart não é popular? Victor Hugo não é popular? Francis Coppola não é popular? Fala-me de Becker, podia falar-me de Claude Sautet [Jacques Fieschi, um dos argumentistas de A Aparição, escreveu os argumentos dos três filmes finais de Sautet]. . . Tenho fotos do meu pai, que era um jornalista de um meio burguês, e, ao ver filmes de Sautet, parece que estão a contar a vida dos meus pais. Um dia numa emissão de televisão perguntaram-me que cineastas tinha sido importantes. Respondi: Le Feu Follet [1963] de Louis Malle, que em adolescente via e revia de seguida. Disseram-me: “Bem, não é politicamente correcto falar de Louis Malle, é filho de um milionário, e depois há Lacombe Lucien [1974, história de um camponês que se torna delator para a Gestapo na França ocupada]. . . ” Contrapus: “Também sou da burguesia. . . ”, silêncio, e continuei: “E preferirei sempre filmar um burguês inquieto do que um proletário que se quer vingar. ” Insistiram, e estava ali uma jornalista de esquerda, Laura Adler: “Como pode dizer isso? A inquietude burguesa é sempre o tema do cinema francês. ” Respondi: “Se um burguês inquieto não vos agrada, vamos pegar em Honoré de Balzac, Gustave Flaubert, Drieu de la Rochelle, Stendhall e façamos uma grande fogueira. ”A única coisa que interessa, ao lado do debate de classes, é o debate existencial. É isso a literatura e é isso o cinema. Tenho a sensação de que DeNiro em Taxi Driver é o irmão de Maurice Ronet de Le Feu Follet. A solidão nas cidades: é isso que me toca. Mas hoje a angústia existencial já não é comercial.
REFERÊNCIAS:
Religiões Cristianismo